Quarta, 31 Janeiro 2018 08:59

 

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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT

Em meio a um agitado período político, a última semana de janeiro foi aberta com a informação de que o MEC divulgaria – como, de fato, o fez – a lista dos aprovados, em 2018, no SISU (Sistema Integrado de Seleção Unificada).

Conforme matéria da Folhapress (29/01), estavam sob disputa 239.716 vagas distribuídas em 130 instituições de ensino superior público, incluindo os institutos federais. Para participar da seleção de vagas, os candidatos tiveram de prestar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) em 2017 e não ter zerado a redação.

Na mesma matéria, é dito que “As inscrições ocorreram entre os dias 23 e 26 de janeiro no site do Sisu. Na página do MEC, o estudante consultou as vagas disponíveis, as instituições participantes e os seus respectivos cursos. Ao longo das inscrições, o sistema também divulgou a nota de corte de cada curso como uma referência para os candidatos optarem por cursos aos quais tinham mais chance de aprovação”.

A parte final do parágrafo acima tem sido naturalizada, mas não poderia ser. Nenhum candidato ao ensino superior deveria optar por cursos aos quais tivessem chances de aprovação advindas de mera pontuação num sistema. Isso equivale àquela escolha abominável do tipo em que “a mensalidade cabe no bolso”. O SISU é relativamente novo entre nós. Também por isso, mas não somente, o problema ainda não tem sido percebido da forma como deveria.

O SISU, e eu já registrei isso em outros momentos, está no mesmo conjunto das desobrigações de decisões mais responsáveis por parte das novas gerações. A responsabilidade disso, obviamente, é dos mais antigos, que não se opuseram com a devida força às imposições governamentais sobre os rumos da educação. As gerações mais novas, em geral, acabam sendo vítimas disso.

Explicando: escolher um curso superior não poderia se parecer com a escolha de quais alimentos quero para o meu prato, quando estou em restaurante fast food. Tampouco esse momento poderia se parecer com algo que lembrasse jogos de azar.

O SISU, como sistema integrado, desobriga o jovem a escolher seu futuro curso superior pelo motivo que deveria ser óbvio: afinidade acadêmica. A maioria acaba “escolhendo” o que tinha para hoje; ou seja, o que os pontos do sistema davam para aquele momento. Problemas à vista.

Por isso, não raro, um aluno que gostaria de cursar, p. ex., Direito, para não perder a vaga em uma federal, pode “escolher” Biologia, Matemática, Física etc. Em muitos casos, os pontos disponíveis de determinado candidato não são suficientes sequer para opções a curso de área afim.

Resultado: em geral, esse tipo de “escolha” é o caminho do fracasso acadêmico e do desperdício do dinheiro público. A falta de afinidade pode trazer problemas de várias ordens. A mais comum é o desânimo de vencer dificuldades que podem aparecer. Como consequência, problemas psicológicos podem ser desencadeados facilmente; e são. Antes dele, no âmbito público, a evasão é outro registro recorrente, mas as universidades estão fingindo que nada está acontecendo; e está.

Enfim, mais do que nunca, as universidades vivem dias complexos. Com a perda gradativa da autonomia para a realização dos antigos vestibulares e com a consequente presença do ENEM e Sisu, aliás, duas das imposições dos governos petistas, os cursos de licenciatura, principalmente, mas não apenas eles, passam por visível momento de desestímulo e esvaziamento.

Pergunto: até quando continuaremos a fingir que o ENEM e o SISU não são problemas graves para as universidades brasileiras?

Quarta, 24 Janeiro 2018 18:00

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT

 

Depois de quase um mês de férias, retomo a escritura de meus artigos tratando de um importante tópico de nossa educação: a aprovação automática e um recente questionamento judicial sobre a questão por parte de uma escola particular do Distrito Federal (DF).

Antes, algumas lembranças. A quem viveu tempos estudantis mais rigorosos, sempre foi difícil entender a lógica que move a aprovação automática na educação brasileira. Naqueles idos tempos, ou aluno estudava, e era “aprovado de ano”, ou gazeteava tanto que, ao final, “reprovava de ano”. Simples assim.

Para a maioria, as dificuldades tinham de ser superadas, e pronto. Para isso, restava o estudo sério dos “pontos”. Em tais estudos, a memorização nunca foi condenável. Era até salutar e prazeroso ver como todos tinham de usar o cérebro para reter informações e depois processá-las como era possível. E sempre era possível.

Claro que muitas “maquinas humanas” foram produzidas por aquele sistema, mas o contrário também é verdadeiro. Os grandes intelectuais deste país se formaram naqueles moldes. Com o atual formato, duvido que este país consiga formar, nos limites da escola, algum outro intelectual. No máximo, continuará formando apenas acadêmicos; e às toneladas. Produção em série!

Mas o que mudou tanto em nossa educação?

Quase tudo. Das mudanças, destaco a aprovação automática. Por ela, nenhuma escola pode reter seus alunos antes dos períodos pré-marcados; ou seja, apenas a cada três anos, os professores, em tese, têm alguma autonomia para esse encaminhamento, hoje, considerado traumático e ineficiente para o desempenho escolar.

Após a inserção desse novo modelo de avaliação de nossos estudantes, acompanhado de um conjunto de consequências gravíssimas, o país vem colhendo os piores resultados na educação formal. Em todas as avaliações (nacionais ou internacionais) descemos a ladeira.

Das gravíssimas consequências, destaco a perda do papel social de nossos professores. Conforme as novas teorias, os docentes não devem ultrapassar o limite de um mediador do conhecimento. Logo, transmitir um saber, jamais. Essa postura é vista como autoritária etc. A lista da estupidez segue na mesma proporção da abundância dos teóricos estúpidos, todos vinculados à lógica da pós-modernidade.

Pois bem. Em meio ao caos, uma escola particular do DF, recentemente, entrou, e ganhou, na justiça, o direito de exercer as avaliações de desempenho de todos os seus estudantes com absoluta autonomia (conf. https://globoplay.globo.com/v/6363698/).

Essa decisão está na contramão de uma recomendação do MEC de 2010. Recomendação que, no caso das escolas públicas, significa imposição sem nenhum direito ao contraditório. A escola que se opuser a qualquer “recomendação” do MEC está condenada à miséria. Por isso, ninguém se opõe. Todos se submetem. Como consequência desse servilismo, o desânimo em relação à profissão vai se proliferando como praga em nossa educação.

Como consequência da consequência anterior, as escolas públicas vão despencando a cada nova avaliação.

É claro que no processo ensino aprendizagem não se deve apostar, previamente, na reprovação de nossos estudantes, mas isso não pode ser retirado de cena. Verificações mais rigorosas do aprendizado devem ocorrer sempre. Isso auxilia o estudante a buscar responsabilidades.

Depois dessa corajosa atitude localizada, espero que o país comece a repensar toda a dinâmica de nosso sistema educacional. Quase tudo está no rumo da descida de tom. É preciso rever a situação. 

Quinta, 07 Dezembro 2017 11:25
 
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Benedito Pedro Dorileo

Aprovada em Paris a Declaração Mundial sobre o Ensino Superior para o século XXI, em 1998, a UNESCO no Brasil honra a histórica decisão. Apoiando-se no Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras – o CRUB, e com participação da CAPES  (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior) editou os Anais da Conferência, e passa a promover e estimular debates sobre o significado e implicação da Declaração para a universidade no Brasil.

Naturalmente que o marco maior da educação superior brasileira está na reforma amadurecida, em 1966, partindo da premissa central da autonomia. Para sempre histórico o VII Forum no Rio de Janeiro, com a presença de 25 universidades, que, em 30 de abril desse ano, criou o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras ao aprovar a proposta do Irmão José Otão (PUC – RS ). Visando ao estudo e solução de problemas vinculados ao desenvolvimento das universidades, a proposta dos reitores presentes, incluindo Pedro Calmon da UFRJ, apresentou à segunda Plenária, em Salvador, o projeto do seu primeiro Estatuto, e sendo aprovado, quando o reitor,  Miguel Calmon, o primeiro eleito presidente, proclamou: “ espero que este Conselho de Reitores contribua decisivamente para que as universidades possam adquirir total maturidade... conscientes estamos dos seus problemas e decididos em obter do Governo diálogo e compreensão para atingirmos os seus objetivos perante a Nação Brasileira”. Seguem-se tantas reuniões plenárias em sedes diversificadas das universidades no País.

Foi em Brasília, na XIII Reunião Plenária na UnB, quando lá estávamos com a UFMT, durante os dias 4 a 5 de agosto de 1971, quando me emocionei com o Irmão Otão, idoso e valente a sustentar a autonomia da universidade. É preciso, historicamente, compulsar o Estatuto do CRUB para conhecer o seu trabalho pioneiro, conhecer suas finalidades, que começam (artigo 1º) com: “promover estudo e solução dos problemas do Ensino Superior; intercâmbio entre universidades brasileiras com as notáveis  estrangeiras; estimular estudos e atividades científicas e tecnológicas; elevar o nível de formação docente; valorização do magistério superior; acentuado apoio à vida do estudante; contribuição direta com o Governo da República no projeto do desenvolvimento nacional”.  A autonomia fora sempre tema constante, como na Plenária seguinte, em Fortaleza com o reitor Miguel Reale.

Organizado o Conselho de Reitores durante o Regime de Exceção Política, contribuiu para a conquista de novas universidades públicas, comunitárias e particulares. Detém o maior acervo da história da universidade brasileira a registrar acertos, conflitos, e adversidades. Inacreditável é que, após a abertura política com promulgação da Constituição Federal de 1988, houve queda acentuada da autonomia, em flagrante descumprimento do seu artigo 207. Instalou-se controle imperante e polarizador da gestão administrativa, reduzindo as ações dos Conselhos Superiores ( principalmente do Conselho Diretor) e da Reitoria pela centralização burocrática do Planejamento e Controladoria Geral brasilienses.

Prestar contas é dever, obrigação legal perante o Tribunal de Contas da União, mediante prévias auditorias regulares durante o ano financeiro, como outrora. Funcionava plenamente, auditando possíveis deslizes. Por oportuno, bom é consultar a posição legal de um reitor de universidade federal no Protocolo da Presidência da República. (continua)

 Benedito Pedro Dorileo é advogado

                                                                e foi reitor da UFMT

Quinta, 30 Novembro 2017 13:49

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Desde o início da exploração portuguesa, é sabido que nossa educação, resguardadas algumas ilhas, foi e vai de mal a pior. Desde sempre, poucos puderam dizer que receberam educação de qualidade. Por isso, a cada novo resultado de pesquisas sobre nosso ensino, apenas vai se confirmado o que todos já sabem: estamos no fundo do poço.

Para dimensionar essa profundidade, basta-nos olhar rapidamente algumas manchetes – apenas de 2017 – sobre o tema:

  1. “Em ranking da educação com 36 países, Brasil fica em penúltimo” (Veja);
  2. “OCDE: Brasil está entre os que menos gastam com ensino” (BBC);
  3. “Brasil cai em ranking mundial de educação em ciências, leitura e matemática” (G1);
  4. “Relatório da OCDE expõe contradições da educação no Brasil” (Carta Capital).

Desolador!

Aliás, dito assim, tudo ainda parece pouco. A queda no ranking em ciências, leitura e matemática é de gravidade sem precedentes. Paradoxalmente, nunca como dantes fomos tão ignorantes, mesmo dispondo de tecnologias impensáveis há bem pouco tempo.

Sobre essa gravidade haveria um rol extenso de exemplos. Ficarei com o tema da redação do Enem/2017. Por si, ele consegue dimensionar o grau da desinformação de nossos jovens; desinformação que poderia até ser confundida com deboche, mas não é; é real.

Na redação em pauta, foi solicitado que o candidato – potencialmente um pré-universitário – falasse sobre LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais); todavia, cerca de três milhões deles trataram de astrologia. Eles falaram de Libra, um dos signos do zodíaco. Faltou quem dissesse se tratar do plural da moeda da Inglaterra, mas, em tempos do império da ignorância, isso seria “informação” tipo privilegiada. 

Mas se a formalidade de nosso ensino se encontra em patamares tão rasteiros, condenando nossas novas gerações à estupidez suprema e bizarra, a educação informal, aquela produzida “pela vida”, é ainda pior.

Mas isso já não seria infortúnio demais?

Sim; e infortúnio para não usar termo mais forte. Isso ocorre porque as novas gerações convivem com adultos absolutamente despreparados e complexos, também para não usar termos piores contra nós, adultos.

As famílias, em constante processo de profundas alterações, parecem ter perdido a capacidade de estabelecer com a prole as noções de direitos e deveres. Tudo tem ficado muito fluido na educação familiar. Os limites, tão necessários para a formação da cidadania, foram atirados numa lixeira qualquer.

Assim, o que é ruim em casa fica pior no plano social. Adolescentes e jovens brasileiros que se prontificam informar-se “do mundo” percebem logo como os adultos, descaradamente, mentem, fazendo desserviço à construção do caráter dos mais novos. Essa postura é o reverso da Paideia dos gregos antigos.

Nesse terreno, a título de exemplo, insiro, dentre tantos, dois dos mais lastimáveis, em minha opinião:

No Rio, um ex-governador, atolado em falcatruas reveladas pela operação Calicute, não só nega acusações, como contesta delatores e ainda, em audiência, desafia um juiz de 1ª instância.

Por sua vez, um ex-presidente, mesmo vindo das camadas populares e do meio sindical, nega favorecimentos de um enriquecimento inexplicavelmente milionário. Com falsa tranquilidade, afirma nunca saber de nada, mesmo que tudo tivesse ocorrido ao seu lado.

E por aí vai.

Os exemplos já estão na perspectiva do sumidouro do espelho. Se não revirmos muita coisa em nosso país, teremos um futuro de nos emudecer, e nenhum signo do zodíaco poderá nos dar a menor esperança.

 

Segunda, 27 Novembro 2017 09:12

 

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Benedito Pedro Dorileo

                     

No inter-relacionamento humano do professor e o aluno ocorre, pedagogicamente, a feliz oportunidade do mútuo conhecimento, o contato direto em sala de aula. A máquina acenou e chegou tão revolucionária, que, em cursos superiores de excelência, o doutor trabalha via “online,” preenchendo a maior parte do tempo. É evidente termos, hoje, a oferta imediata de dados do computador através do satélite, conduzindo para a escola – na cidade e no campo – tudo;  a “internet” carrega bibliotecas e museus para o domicílio.  Facilitou sobremaneira.

Exercendo por longos anos o magistério com labor na sala ou na biblioteca; participei dos cursos de alfabetização, no ginásio (ensino fundamental) e médio. Tive discípulo talentoso e tacanho, deficientes vocal e visual.

Do estuante e belo convívio do passado, agora ocorre o lado doloroso: já anteciparam e partiram desta existência expressões inteligentes do antigo alunado, como o desembargador Wandyr Clait Duarte, engenheiro Rubens Paes de Barros Filho, empresários João Pedro Maiolino e Jamil Haddad, advogado Gonçalo de Almeida, professor Hercy da Costa Ribeiro, os médicos Kerginaldo e Edmar Conceição. Ainda o administrador de empresa Eduardo Augusto Palma, o economista José Augusto Rodrigues Palma.

Na época de tirocínio no Colégio Salesiano havia adoção do método educativo de Dom Bosco, compondo nos estudos a religião e a prática esportiva.  Ninguém se esquece do Oratório Festivo.

Moço, misturava-me com os jovens, na década de 1960, estudando a Língua Portuguesa, aprendendo mais no fervoroso entrevero estudantil. Reservávamos tempo para a leitura em voz alta e estudo de noções de oratória. Na época entusiasmava-me com a califasia e a calirritimia, faltava-me o equipamento eletrônico. De tamanha importância a califasia obtém a expressão oral distinta e perfeita: articular as vogais e as consoantes. Ler silabadamente entonando a voz. A consoante forte não pode ser esquecida, tampouco a tônica do vocábulo. Há defeitos como colocar vogais onde não existem: adevogado, abisoluto, subestantivo.

  Distanciamo-nos da prosódia lusitana: o brasileiro tem nas vogais, valor fonético indispensável: clar-dade= claridade. Ou: pes-soa= pessoa. Temos duas linguagens: a interior (mental) e a exterior (oral), pensamos para falar; uma leitura silenciosa antes do discurso. A aula de leitura em voz alta, elegendo momentaneamente um leitor, surtiu sempre relevante resultado. A prosódia era viva, com pontuação oral; a correção imediata com releitura do vacábulo ou da frase. O florilégio oferecia motivos de sinonímia, interpretação e análises morfológica e sintática. Na vida salesiana, rezávamos em sala de aula a Ave Maria, seguida da jaculatória quase sempre em Latim.

    Constrangedor, hoje, não saber o jovem ler em voz alta: dicção péssima e desconhecedor da pontuação. A nossa prosódia fundamenta-se na sintaxe. Conhece?

               – Professor (a): vamos retomar a leitura acompanhada, pois o ensino eficiente repousa na palavra; repousa também no talento do docente, capaz de sair da árida preleção para a atraente palestra e diálogo ou debate. A leitura em voz alta corrige as asperezas do discurso, os períodos mal equilibrados, oferecendo o senso exato dos movimentos da exposição, para evitar a monotonia e o defeito oposto, – a corriqueirice. A busca da naturalidade para adquirir hábito de grupos respiratórios, como: a rosa do meu jardim/ enfeita a vida/ difícil/ de ser vivida.

    Conheço colegas que desenvolveram um laboratório de leitura com bom proveito. Adiciono, por correlato, o hábito alimentar e a responsabilidade da escola.        Lembro-me do desfile cívico do Dia da Pátria. Meninos desfilavam e, fora de forma, assistiam às meninas em marcha. – Quanto perfume virginal, beleza, garbo, esbelteza! Hoje, pesadas e obesas. A merenda ou o lanche é o cachorro-quente, o enroladinho de salsicha. O Colégio, responsável pela programação deestudos, deve também ensinar o alimento adequado. A Universidade, através da extensão, obriga-se pelo curso de Nutrição constatar, denunciar, orientar. Espalham-se doenças digestivas e outras. Nada de frutas tropicais. Adolescentes partem ciosos para a gordura hidrogenada – a batata frita e o refrigerante. A qualquer hora por si ou com os pais realizam o tal “fast food”. Na espreita a patologia, e a família descontrolada corre em meio ao desvairo dos tempos atuais.

     Pais, educadores, governo, vamos dar ouvidos, lancemos os olhos sobre a juventude das redes sociais. E, acentuadamente, o que se vai tornando vício: a dependência exagerada do smartphone. A invigilância e a negligência na fase mais aguda da vida em adolescência estão fragilizando a saúde e os bons costumes. E sitiam-nos a dor e as consequências inevitáveis.

 

 

 

                                                               Benedito Pedro Dorileo é advogado

                                                                e foi reitor da UFMT

 

Sexta, 27 Outubro 2017 08:08

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Dentre tantas notícias produzidas no Brasil, uma tem sido recorrente na mídia: o endividamento de pouco mais de 50% dos acadêmicos que lançam mão do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) para estudar em faculdades privadas.

Em palavras mais explícitas: esse contingente de alunos que assinaram o Fies – em geral, trabalhadores jovens e de baixa renda, matriculados em empresas do ensino superior – encontra-se com seus nomes sujos na praça. Nada disso, porém, imprevisível.

Mesmo dizendo isso com “palavras mais explícitas”, ainda é preciso falar mais sobre esse quadro deprimente, que compõe parte significativa do panorama do nosso ensino superior.

Começo pela origem. Esse programa foi criado em 1976, sob o nome de Crédito Educativo. Em 1999, estando o país já imerso nas políticas privatizantes do neoliberalismo, o programa de financiamento foi remodelado durante o governo de FHC. No governo Lula, o programa foi rebatizado. Sua taxa de juros, ajustada de 6,5% para 3,4% a.a., abaixo da SELIC.

Em 2010, o prazo para sua quitação foi aumentado para até três vezes ao tempo do curso; ou seja, para uma graduação de cinco anos, o prazo passou a ser de 15 anos para a quitação.

Detalhe: durante o governo populista de Lula, os critérios para obtenção desse “benefício”, dito de inclusão, foram mínimos. Somente para o exercício de 2015, o governo federal – já no crítico segundo mandato de Dilma – implementou mudanças básicas nos critérios de concessão do financiamento em pauta.

Dentre outras alterações, passou-se a exigir a pontuação mínima de 450 pontos no EMEM. O aluno também não poderia mais zerar a redação. Até então, tudo valia; ou melhor, até o nada intelectual – produção histórica e sistêmica de sucessivos governos de todas as esferas da Federação – tinha valor e servia para ingresso na “faculdade”. Era a vitória do jovem brasileiro, pobre, geralmente, negro, dizia – e ainda está a dizer – o político mais astuto, por isso, o mais perigoso, de nossa contemporaneidade; aquele que se faz passar por “pai dos pobres” por conta de sua origem humilde.

Isso posto, significa dizer que, antes desses novos critérios, muita gente, próxima do analfabetismo real, ingressou em alguma empresa dita de ensino superior. Depois da mudança, o quadro de desmensurada mediocridade tornara-se menos agressivo, mas continuando grave.

Dessa constatação óbvia, uma questão escancara-se sob algumas perspectivas:

a)               um aluno praticamente analfabeto não tem a menor condições de avaliar a qualidade da faculdade em que ingressa. E via de regra, ele adentra, antes de tudo, em uma empresa; assim, ao invés de um acadêmico, o país financia um cliente;

b)              o que menos importa para tais espaços é a qualidade do ensino, bem simbólico, por isso, subjetivo. Nesse cenário, a importância real é a garantia da saúde da empresa.

Assim, o fingimento de um, em aprender, e de outro, em ensinar, estava silenciosamente pactuado. E a vida seguia seu curso.

E ainda segue. Todavia, agora com a consciência mais nítida de que há um endividamento e uma enganação. Tudo bem concreto. Como do primeiro já falei, resta dizer que a enganação vai se escancarando à medida que egressos de faculdades sem lastro acadêmico, em geral, sem o sonhado emprego, têm dois aprendizados:

  1. o de que foi enganado por governantes e por empresários do ensino superior;
  2. o de que uma dívida com o financiamento ficou ou ficará, ou em sua conta, ou na conta do erário; ou seja, na de todos nós.
Segunda, 11 Setembro 2017 14:25

 

Milhares de educadores da rede estadual do Rio Grande do Sul responderam aos incessantes ataques do governo do estado deflagrando greve por tempo indeterminado, a partir dessa terça-feira (5). A decisão foi tomada durante a assembleia geral do Sindicato dos Trabalhadores da Educação do RS (CPERS-Sindicato), realizada nessa manhã, em Porto Alegre, capital do estado. 

O retorno às escolas, assim como a recuperação dos dias parados, está condicionado, conforme aprovado na assembleia, ao fim do parcelamento dos salários e do 13º e a quitação dos juros que os educadores tiveram que pagar ao Banrisul devido aos 21 meses de salários parcelados pelo governo. No final do mês de agosto, os professores e demais servidores do estado receberam apenas R$ 350,00 como salário.

Durante a assembleia, professores e funcionários de escola aprovaram cobrar do governo uma reunião para exigir o cumprimento da Constituição em relação ao pagamento dos salários e 13º em dia e integralmente; a retirada dos projetos que atacam a categoria e que se encontram na Assembleia Legislativa e discussão das reivindicações da categoria.

Entre as diversas ações aprovadas na assembleia está a realização de ato público estadual, no dia 12, na Praça da Matriz, com pressão contra a votação do PL e das PECs estaduais que atacam os direitos dos servidores e pela pauta de reivindicações e acampamento, a partir desta data, com a participação no Dia Nacional de Lutas e Paralisação em Defesa dos Serviços Públicos e contra a Reforma da Previdência, marcado para quinta-feira (14).


Fonte: ANDES-SN* (com informações do CPERS-Sindicato)


 
Segunda, 24 Julho 2017 16:01

 

A série de cortes e contingenciamentos no orçamento do Ministério da Educação (MEC) para as Instituições Federais de Ensino (Ifes) tem ameaçado a continuidade das atividades acadêmicas de norte a sul do país. As Ifes sofrem desde 2015 com repetidas reduções nos valores repassados pela União para custeio e manutenção das instituições.

 

Os impactos no enxugamento dos recursos já são sentidos há um tempo pela comunidade acadêmica, com a precarização das condições de trabalho, de infraestrutura e também de permanência estudantil. Muitos reitores vêm, inclusive, se manifestando publicamente, afirmando que, depois de setembro, não haverá condições financeiras para manter as instituições funcionando.

 

De acordo com a Associação Nacional Dos Dirigentes Das Instituições Federais De Ensino Superior (Andifes), em 2017, o custeio das universidades federais foi reduzido em R$ 1,7 milhão, e os investimentos tiveram uma queda de R$ 40,1 milhões. Em comparação com o orçamento de 2016, levando em conta o Índice de Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o orçamento das universidades federais teve uma perda de 11,8% e o corte nos investimentos foi de 46,2%. Além disso, há o problema de que o governo não libera a totalidade dos recursos, já escassos. O limite liberado para custeio foi de 70%, enquanto apenas 40% foram liberados para investimentos.

 

Já de acordo com o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (CONIF), o orçamento e investimento da rede de Institutos Federais teve uma queda acentuada a partir de 2016. Em 2017 com o corte, os institutos receberam apenas R$ 291 milhões. De 2014 a 2017, o investimento por aluno caiu em 24% e a permanência estudantil também sofreu uma queda.

 

Segundo Rogério Marzola, coordenador geral da Fasubra, a partir da Emenda Constitucional 95/16 (antiga PEC 55/16), a previsão de orçamento para 2017, de acordo com a Lei Orçamentária Anual (LOA), seriam os gastos de 2016, mais os restos a pagar, “o que deveria gerar congelamento de salários, auxílios e concursos, punindo os trabalhadores com o corte orçamentário”, explicou.

 

Marzola denunciou a redução dos recursos nas universidades, “na LOA de 2017, o recurso foi subtraído em quase 7% a menos em relação a 2016. No âmbito do Ministério da Educação (MEC) isso significa R$ 4,3 bilhões, ou 12% de seu orçamento”, disse em audiência pública na Câmara dos Deputados.

 

Avaliação

 

Cláudio Ribeiro, 2º vice-presidente da Regional Rio de Janeiro e um dos coordenadores do Setor das Ifes do ANDES-SN, afirma que a redução no orçamento é um problema enfrentado há tempos, mas que se agrava principalmente após a aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), na medida em que se começa a diminuir o repasse de recursos para as instituições públicas, e, ao mesmo tempo, a se utilizar mais verbas públicas para financiamento das instituições privadas.

 

“Esse quadro piora com a aprovação da Emenda Constitucional 95, pois, a partir dessa da nova lei, o orçamento da educação, que foi calculado esse ano, servirá como referência para os próximos 19 anos”, ressalta o docente. O coordenador do Setor das Ifes lembra, ainda, que os cortes incidem, inicialmente, sobre os setores mais precarizados das instituições de ensino, por meio da demissão de terceirizados e de corte de bolsas estudantis.

 

Cláudio Ribeiro encerra citando a agenda de lutas e de mobilizações do Setor das Ifes, aprovada durante o 62º Conad, realizado no mês de julho em Niterói (RJ). A agenda é dividida por temas, e entre eles está a luta por orçamento. “Já temos um calendário de ações como resposta aos ataques que estamos sofrendo. No dia 11 de agosto, por exemplo, haverá uma grande manifestação em defesa da educação pública, organizada em conjunto com Fasubra e Sinasefe”, conclui o docente.

 

Exemplos de crise se espalham pelo país

 

Em informes dados durante a última reunião do Setor das Ifes do ANDES-SN, algumas seções sindicais relataram as dificuldades enfrentadas pelas suas instituições diante dos cortes e contingenciamentos. Segundo o relato dos docentes, a Universidade Federal do Acre (Ufac), por exemplo, tem orçamento apenas até setembro. Na Universidade Federal do Piauí (Ufpi), a reitoria afirmou que haverá grande impacto nas verbas de custeio, afetando contratação e manutenção dos terceirizados. A Ufpi recebeu nesse ano, até o momento, apenas 20% do orçamento capital e 60% dos recursos para custeio.

 

Na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), entre o exercício empenhado em 2016 e o exercício autorizado de 2017, houve uma redução no orçamento na ordem de 22,64% e, com o bloqueio de 15% para o exercício de 2017, essa redução atinge 34,24% do orçamento da instituição. Já na Universidade Federal do Rio Grande (Furg), houve demissão de 122 terceirizados nas áreas de limpeza, portaria, segurança e motorista; foram cortadas as saídas de campo, pois a universidade não teve condições de continuar o contrato com uma empresa de ônibus; não há mais novas vagas na Casa do Estudante; e, de acordo com a reitoria, sem novas verbas, não há condições de seguir as atividades acadêmicas até setembro.

  

Na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no mês de junho, a administração superior optou pelo desligamento de cerca de 25% dos contratos de trabalhadores terceirizados. Segundo o reitor da UFPel, Pedro Hallal, a medida foi necessária devido aos bloqueios de orçamento do Executivo. Até então, tinham sido liberados 60% do orçamento de custeio e 30% do orçamento de capital previstos para 2017. A expectativa é de que sejam liberados entre 85% e 90% do total de custeio até o fim do ano. Quanto à receita de capital, a reitoria teme que não haja liberação nem de 50%.

 

Na Universidade de Brasília (UnB) também houve, recentemente, demissão de terceirizados por falta de recursos. O orçamento da instituição sofreu corte de 45%, segundo informação do dirigente da Fasubra, Rogério Marzola. Ele disse ainda que na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por exemplo, em 30 meses foi subtraído cerca de R$ 150 milhões do financiamento e na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) ocorrem demissões desde abril por falta de recursos.

 

Na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), o discurso é o mesmo: após setembro, não há condições de funcionamento. Foi o que disse o pró-reitor de Planejamento e Administração (Proplad), Darizon Alves de Andrade, em reunião do Conselho Diretor (Condir). O pró-reitor informou que, em 2016, a UFU obteve cerca de R$ 30 milhões para a realização de investimentos. Em 2017, esta rubrica sofreu um duro corte, com redução de cerca de 50%, chegando a R$ 15,230 milhões. Como se não bastasse, o governo federal contingenciou 37% deste montante nos últimos meses, retirando mais R$ 5,644 milhões desta rubrica. Em suma, o orçamento real da UFU para investimentos para todo o segundo semestre de 2017 é de R$ 9,585 milhões. Andrade também informou que a UFU já executou 98,47% deste montante. Isso quer dizer que, para todo o segundo semestre do ano de 2017, a UFU contará com apenas R$ 239,7 mil para fazer todos os seus investimentos.

 

Fonte: ANDES-SN (com informações da Fasubra)

 

 

 

 

Terça, 20 Junho 2017 13:50

 

 

Profa Vanessa C. Furtado

Departamento de Psicologia - UFMT

 

 

Quando vislumbrei a carreira acadêmica como possibilidade de atuação, muitos foram os estereótipos que permearam minha escolha: a possibilidade de realizar pesquisas que pudesse efetivamente trazer melhorias à sociedade; o trabalho em conjunto de ensino-aprendizagem enquanto processo dialético de produção de conhecimento; a integração da comunidade e universidade e a disseminação do conhecimento produzido pela universidade com a finalidade de dar acesso universal a essa produção. Hoje, cara a cara com a realidade, reconheço quão ambiciosos eram esses estereótipos que se tornaram planos de atuação quando fui convocada para assumir o cargo de professora.

 

Das condições materiais efetivas para o exercício de minha profissão dois me são ainda mais árduos   e   áridos:   a   falta   constante   de   recursos   e   profissionais   suficientes   em   meu departamento e a burocratização de meu trabalho. Um implica diretamente no outro, comecemos pela situação da falta de condições de trabalho, ou seja, de recursos. Logo em meu primeiro ano nesta universidade, participava de um curso de formação para professoras quando ouvi, da então reitora, que não deveríamos deixar de trabalhar pelo simples fato da universidade não nos dar as condições necessárias, se o problema fosse falta de data-show, então que o comprássemos com nossos excelentes salários. Na época, embora ainda engatinhando na profissão, achei a declaração absurda e me recuso terminantemente, até hoje, a comprar um data-show para dar aulas! No entanto, não me recuso a comprar livros dos quais a universidade não dispõe, não me recuso a buscar programas que escaneiam trechos de textos para disponibilizar para as turmas as quais dou aula e assim evitar que fiquem sem o material necessário, não me recuso a sair de casa com meu carro percorrer os campos de estágios (que são obrigatórios na grade curricular), às custas de parte do meu salário para abastecer o veículo, não me recuso de atravessar um prédio inteiro para utilizar os sanitários que vivem interditados por falta de água ou algum outro problema, não me recuso fazer orientações extra “PIA” para não deixar os/as discentes sem orientação, não me recuso a trabalhar três turnos e ainda finais de semana para dar conta das atividades que me são impostas. Enfim, nesta conta, o valor do data-show até que não me sairia tão mais caro!

 

Ah mas não só de sala de aula vive uma professora! Então, preciso integrar ensino-pesquisa- extensão (repetimos isso quase que como um mantra). E, para alguém como eu, que compreende a função social da universidade pública, congregar as teorias com as práticas de minha profissão e militância por uma sociedade mais justa é posto, também, como dever. Sem esquecer, é claro, que no mundo acadêmico tanto vale quanto maior for seu Lattes, portanto: PUBLIQUE! Assim, em algum momento entre todas as reuniões agendadas, aulas a serem preparadas e ministradas, trabalhos a serem avaliados, é preciso tempo para preencher os intermináveis formulários (e como se os já existentes não bastassem, criam mais um tal de REA),  que  devem  ser  “selado,  registrado,  carimbado  (protocolado)/Avaliado,  rotulado  se quiser voar”! Ou seja, TORNEI-ME UMA INEFICIENTE BUROCRATA! Alimentando os fantasmas da fiscalização do trabalho público, pois o mito da funcionária pública que não faz nada é tantas vezes propagado quanto se deseja acabar com essa espécie de serviço neste país.

 

E para que nos serve O burocratismo em uma universidade pública, onde tudo precisa de carimbos, etiquetas e protocolos? Respondo: para nos retirar do trabalho que nos é mais essencial nesta instituição: a produção de conhecimento (e aqui, leia-se: pesquisa, extensão e preparo de aulas). Quanto tempo dispomos do nosso dia-a-dia de trabalho para montar processos, carimbar folhas, levar ao local de registro, levar ao local de destino? Em meu caso, pelo menos, um turno do meu dia é ocupado por essa função, quando necessito montar um processo  para  legitimar  qualquer  ação  extra  sala  de  aula,  como  um  simples  projeto  de extensão que atenda as necessidades da comunidade matogrossense. Não são raras as vezes que eu penso em não realizar tais atividades, apenas para evitar todo esse ciclo de processos intermináveis. E não porque eu me ache incapaz de fazê-lo, mas por falta de tempo dentro daquela rotina já descrita acima.

 

Agora, o que mais me espanta e indigna é a naturalização desse processo burocrático, que atravanca os caminhos da produção e disseminação do conhecimento produzido em nossa universidade. Também não são raros os relatos de colegas que solicitam a estudantes que as auxilie nesse processo de preenchimento de formulários, usualmente atribui-se essa atividade a quem recebe bolsa, afinal precisa trabalhar. A naturalização dessa atividade é tamanha que, esquecemos que estudantes também recebem bolsa para pesquisar.

 

Para se ter ideia, apenas hoje, para correção de atividades em meu REA gastei cerca de 34 minutos (contados no relógio por pura birra) de um tempo que estava disponibilizando para preparar minhas aulas da semana. Ou seja, mais 34 minutos porque já havia gasto vários outros, em pleno feriado, preenchendo o tal do relatório com todas as atividades realizadas no semestre. E tome mais fiscalização! Como se não bastassem os imperativos do currículo lattes, do PIA, diário de classe, mais um REA. Pra meu espanto, só que não, as atividades registradas nesse  novo  relatório  ultrapassaram  as 40  horas  de trabalho  às  quais  deveria  me  dedicar exclusivamente.

 

Por um lado, achei ótimo ter uma forma de registro de atividades que chegam perto de demonstrar a realidade da atividade docente, por outro “que vantagem Maria leva?”. Estas horas-extras servirão para efeito de banco de horas ou adicional salarial? Não estranhem a pergunta,  pois  é  retórica,  contudo  necessária,  uma  vez  que,  são  estas  as  opções,  em instituições privadas, que se contrapõem ao conteúdo do e-mail que recebemos no início deste semestre, sob orientação da pró-reitoria de graduação, informando a necessidade de darmos aulas nos dias marcados, de justificarmos nossas faltas e planejarmos as reposições, caso contrário, nosso PONTO seria CORTADO! O que de fato não é um problema; entendo que faz parte de nossa obrigação enquanto funcionárias públicas, bem como, do compromisso que assumimos com discentes que necessitam das horas da disciplina para se formar. No entanto, estou tratando a questão por sua essência e não pela aparência, ou seja, muitos mecanismos se criam para regular e fiscalizar nossa atividade, porém, poucos para efetivarmos o trabalho que compreende ensino, pesquisa e extensão “aoommmmmmmm”

 

E desta forma, chegamos a meu último questionamento: a que se presta esse burocratismo fiscalizador? Qual a sua essência?

 

Pois bem, aprendi no movimento da luta anti-manicomial que, não adianta abrir as portas dos manicômios e sair das instituições manicomiais se o manicômio não sair de dentro da gente,

 

ou seja, a lógica que nos é ensinada de que a pessoa considerada “louca” é incapaz e deve ser tutelada e, de preferência, privada do convívio social se mantém. Enfrentamos, nesse âmbito, uma verdadeira resistência de se libertar da lógica manicomial “do passado” e assumir o novo modelo de  tratamento.  Transpondo essa  ideia para  nossa discussão  sobre  a  universidade pública, fizemos o contrário, paulatinamente estamos cedendo à nova lógica: a privatista, com resistências cada vez menores a cada nova leva de docentes que ingressam na universidade. O que vai deixando a “velha” lógica do trabalho docente de universidades públicas com ares de ultrapassada. Já sou capaz de vislumbrar as marchas para Brasília onde estaremos clamando por direitos tais quais os que tem os trabalhadores e trabalhadoras com regime de trabalho regido  pela  CLT  (e  sabe-se  lá  quanto  tempo esses direitos  durarão)  e  o  faremos  com as aspirações de que horas-extras e/ou banco de horas são grandes conquistas da luta para o funcionalismo público, para a carreira docente e venderemos alegre e servilmente nossa saúde ao   trabalho.   Quanto   mais   o   burocratismo   nos   retira   dos   espaços   de   produção   de conhecimento, mais privatizamos nossa sala de aula, nossa profissão e a universidade pública brasileira. “Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão” (Aldous Huxley).

 

E o que mais representa a lógica privatista do sistema se não a produção e metas? E o que mais representa essa lógica, hoje, na universidade pública do que a ilusão de que quanto mais se vale maior é o seu formulário de atividades docentes inócuas ao conhecimento, seja ele o Lattes, o REA ou quantos outros quisermos criarmos.

Terça, 04 Abril 2017 19:08

 

Governo federal apresentou cortes de R$ 42,1 bilhões no orçamento aprovado

 

O governo federal anunciou, na sexta-feira (31), um corte de R$ 42,1 bilhões no orçamento aprovado para o ano de 2017. O Ministério da Educação (MEC) teve um dos maiores cortes: R$ 4,3 bilhões, o que representa uma diminuição de 12% no montante anteriormente definido em R$ 35,74 bilhões.

 

O Ministério da Defesa perdeu R$ 5,75 bilhões, o Ministério das Cidades teve corte de R$ 4,17 bilhões, o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil de R$ 5,13 bilhões, e o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário perdeu R$ 2,25 bilhões. Houve cortes menores em outras pastas – a única que escapou do ajuste foi a de Saúde.

 

Cláudio Ribeiro, 2º vice-presidente da Regional Rio de Janeiro e um dos coordenadores do Setor das Instituições Federais de Ensino (Setor das Ifes) do ANDES-SN, critica a medida de Michel Temer, ressaltando que a educação sofre, há anos, com sucessivos cortes de orçamento. “Todo ano esses cortes vêm ocorrendo, mas, nesse ano, a situação deve se agravar por conta da aprovação da Emenda Constitucional (EC) 95. Ao contrário do que o governo alardeou ano passado, não havia garantia de aumento de investimento na educação, e esses cortes demonstram isso”, afirma.

 

“A política de ajuste fiscal, que coloca a contabilidade financeira acima dos direitos sociais promove esses cortes orçamentários. A gravidade é maior agora, porque, além dos cortes acumulados de anos anteriores, o orçamento executado desse ano servirá de referência para os próximos anos”, completa Cláudio.

 

O docente ressalta que, com os sucessivos cortes, a manutenção das atividades de ensino, pesquisa e extensão nas universidades federais fica ainda mais difícil. “Em 2017 já está acontecendo um grande contingenciamento de verbas nas universidades federais. As instituições já não estão recebendo o 1/12 mensal completo ao qual teriam direito pelo orçamento. Não se consegue honrar compromisso de pagamento de serviços terceirizados, de bolsas estudantis, etc. Estamos vivendo um estrangulamento do orçamento das universidades, o que impede a manutenção de oferta de educação de qualidade”, avalia.

 

Por fim, Cláudio Ribeiro alerta a categoria sobre a possibilidade de, com os cortes, o governo federal apresentar a terceirização como solução aos problemas financeiros da educação. “Com a terceirização colocada em pauta, e agora aprovada, a leitura desses cortes tem de ser feita de maneira mais ampla. A terceirização afetará a categoria docente, e, com tantos cortes, o governo em breve poderá apresentá-la como uma solução mágica para a manutenção das universidades, o que significará o fim do caráter público das universidades”, conclui o coordenador do Setor das Ifes do ANDES-SN.

 

Aumenta repasse de dinheiro público para faculdade de Gilmar Mendes

 

O Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), do qual o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes é sócio, é uma das instituições privadas que não sofre com os cortes orçamentários da educação. Entre 2014 e 2016, o IDP viu um aumento dos repasses do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) ao seu caixa em 1,7%. O ministro, entretanto, não se vê moralmente impedido de julgar ações relacionadas ao Fies e ao repasse de dinheiro público a faculdades privadas.

 

 Fonte: ANDES-SN