Quarta, 10 Abril 2024 17:21

DIA NACIONAL DO SOLO 2024 - Juacy da Silva

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Juacy da Silva*

Na próxima semana, entre 15 e 22 de Abril, teremos quatro dias especiais para o movimento ambientalista brasileiro e mundial. Esses, da mesma forma que diversos outros ao longo do ano, são oportunidades para refletirmos com mais seriedade e de forma crítica o que estamos fazendo com o Planeta, com a mãe terra, com a nossa Casa Comum.

Assim, devemos refletir e “celebrar” em 15 de Abril o DIA NACIONAL DO SOLO, 17 de Abril o DIA NACIONAL DE LUTA PELA REFORMA AGRÁRIA; 19 de Abril o DIA DOS POVOS INDÍGENAS e em 22 de Abril, o DIA DA TERRA.

Tudo isso e muito mais, nos remetem para o maior desafio que é a CRISE CLIMÁTICA, que, a persistir, estará inviabilizando a vida no planeta, todas as formas de vida, inclusive a vida humana.

É neste contexto que precisamos refletir em relação `as exortações do Papa Francisco, principalmente quando ele diz e escreve que “As mudanças climáticas são um problema global, com graves implicações  ambientais, sociais, econômicas, distributivas e políticas, constituindo atualmente um dos principais desafios para a humanidade”. Fonte: Papa Francisco, Encíclica Laudato Si, 25. (2015).

Desde 1989 , anualmente em 15 de Abril “comemora-se” o DIA NACIONAL DO SOLO. Esta data foi instituída em homenagem a Hugh Hammond Bennett (1881 – 1960), pioneiro americano nos estudos e pesquisas sobre a importância da conservação dos solos, como condição necessária tanto para a saúde do planeta quanto para a produção e produtividade da agricultura e da pecuária e demais setores da economia, tanto capitalista quanto outros “modelos”, todos praticando verdadeira rapinagem contra a natureza.

Da mesma forma que a camada de ozônio protege o planeta terra da destruição provocada pelos raios ultravioletas, também a vegetação (florestas) protege o solo, que pode ser comparada à pele humana em sua função de proteção do corpo humano.

Assim, na volúpia da produção de matérias primas, alimentação e recursos minerais a ganância humana e a busca de lucro que não respeita a natureza e nem os limites do planeta, assistimos um processo intenso de degradação do solo, cujas consequências recaem sobre todas as formas de vida no planeta, principalmente a vida humana.

Costuma-se dizer que a chamada “expansão das fronteiras agrícolas e econômicas”, em todos os países, principalmente na América Latina, na África e na Ásia, respondendo `as necessidades e a mudança de estilo de vida no mundo todo, onde o consumismo, o desperdício, a obsolescência, enfim, a chamada economia do descarte, a economia da morte estão deixando um rastro de destruição das florestas, da biodiversidade vegetal e animal, com repercussões tanto no solo quanto nas águas, incluído a degradação dos mares e oceanos. Por isso é que o Papa Francisco tem-nos exortado com a mudança de paradigma, substuindo a economia da morte pela economia da vida, o que ele chama de “realmar” a economia e encantar a política.

A humanidade, nesta volúpia consumista e de desperdício está “matando a galinha dos ovos de ouro”. Neste sentido, tanto pesquisadores quanto cientistas e também líderes religiosos, com destaque para o Papa Francisco, tem alertado sobre esta corrida maluca rumo ao “amargedom”, estamos deixando uma “herança maldita” em termos ecológicos para as próximas gerações.

Por isso, o líder mundial da Igreja Católica, não titubeia ao afirmar que na origem do processo de degradação ecológica, da destruição das obras da criação, de todas as formas de vida na “Casa Comum”, estão as ações (irracionais) humanas, com seus paradigmas econômicos e tecnocráticos, os quais devem ser substituídos urgentemente, se queremos salvar o nosso planeta.

É neste contexto de que “tudo esta interligado, nesta Casa Comum”, que a degradação do solo precisa ser analisado, entendido e também alteradas as formas como são produzidos todos os bens e matérias primas que tem origem na natureza, inclusive a produção de alimentos e de matérias primas para a indústria, pois, praticamente todos esses “recursos naturais” são finitos e não renováveis, se destruirmos tudo em poucas décadas, as próximas gerações serão extremamente prejudicadas. Ai se aplicam os princípios da JUSTIÇA INTERGERACIONAL e também da JUSTIÇA SOCIAL.

Conforme relatório, relativamente recente, da ONU de 2016, com certeza que o panorama atual é muito pior do que há oito anos,  nada menos do que 33% dos solos do planeta estavam degradados pela erosão, assoreamento, salinização, compactação, acidificação, e ou contaminação por lixo urbano, resíduos químicos, industriais e agrotóxicos.

Diversos estudos de organismos nacionais e internacionais, que gozam de credibilidade científica vem alertando governantes, empresários, produtores e a população em geral sobre a gravidade deste processo.

“O planeta perde 33 mil hectares de terra fértil (solos) por dia, ou seja, mais de 12 milhões de hectares por ano, de 30 a 35 vezes mais do que a proporção histórica de décadas e séculos anteriores.

Estudos científicos calculam que a superfície terrestre em condições de seca (solos áridos) passou de 10% para 15%  no começo dos anos de 1970, para mais de 30% no início de 2.000, e que esses números continuarão crescendo”. Fonte: artigo de Baher Kamal Do IPS, traduzido pelo Envolverde 25 de agosto de 2016 , reportagem publicada em Brasil de Fato.

Na América Latina, por exemplo, 50% dos solos estão degradados. No mundo, somente a erosão, sem mencionar as demais formas de degradação dos solos já apontadas anteriormente, é responsável pela destruição/degradação de 25 a 40 bilhões de toneladas de solos por ano, que são carreados para os cursos d’água (rios, córregos), mares e oceanos.

Para se ter uma ideia do volume dos solos degradados por erosão por ano, isto equivale `a capacidade de 702 milhões de caminhões bi-trem, com sete eixos, que podem transportar 57 toneladas cada um. O comprimento de um bri-trem de sete eixos é de 30 metros.

Assim, se colocados em fila, esses 702 milhões de caminhões equivalem a 2,1 milhões de km ou seja, 52,6 voltas ao redor da terra  ou 2,7 vezes a distância de ida e volta a lua. Imaginemos em duas ou três décadas o que esta destruição de solos férteis representa em termos de degradação do planeta e o impacto que isto está tendo ou terá em termos de produção de alimentos e de outras matérias primas, considerando que o planeta tem um limite?

No Brasil, segundo diversas fontes a extensão das áreas com solos degradados, somente no que concerne `as pastagens variam de 30 milhões de ha a 95,5 milhões de ha, em graus variados, para um total de 159 milhões de ha utilizados com pastagens.

Se aliarmos as demais áreas degradadas pela agricultura, mineração, garimpo ilegal, expansão urbana, o total de áreas degradadas no Brasil ultrapassam a 150 milhões de ha. Em seu “esforço” de enfrentar este desafio, o Governo Federal tem uma meta para ser atingida até 2030, com a “recuperação” de 12 milhões de ha, menos da metade do que é degradado em apenas uma década.

Entre 2001 e 2021 a expansão das fronteiras agrícolas e econômicas no Brasil teve um aumento de 33% em relação ao total da área até então ocupada, com desmatamento e queimadas, que contribuem para a degradação do solo.

Existe um círculo vicioso neste processo de degradação e destruição do planeta. Tendo em vista o crescimento populacional, de forma mais intensa o crescimento urbano, o aumento da renda per capita mundial, aliados ao consumismo e ao desperdício, percebe-se claramente uma pressão sobre a natureza, tanto em relação à necessidade de produção de alimentos, quanto os demais bens e serviços para atender tais demandas.

Assim, existe um “incentivo” à ocupação de novas áreas, tendo como consequência o desmatamento e as queimadas, que estão na base da degradação dos solos, principalmente em áreas que, pela sua natureza não comportam esses processos produtivos, como na Amazônia e no Centro Oeste do Brasil e de inúmeras outras regiões na África, América Latina e Ásia.

Este processo acarreta, não apenas a perda de solos/terras férteis, mas também tem outros impactos como degradação das nascentes, afetando as diversas bacias hidrográficas, como, por exemplo, no Brasil, as Bacias dos rios da Amazônia, Bacia do Paraná/Paraguai, do São Francisco, do Parnaíba etc.

Da mesma forma, este processo afeta o regime de chuvas, aumentando o período de seca e também chuvas torrenciais, que por sua vez afetam a produção agropecuária pelo aumento da desertificação.

Outra consequência deste processo é o aumento da temperatura média das regiões que passam por processo intenso de degradação ambiental, principalmente dos solos, tornando inférteis tais áreas, cujos custos de “recuperação” são exorbitantes.

Entre 2018 e 2020, durante parte dos governos Temer e Bolsonaro foram desmatados 12,9 milhões de ha, e apenas durante os quatro anos do Governo Bolsonaro, estima-se que foram desmatados e ou afetados por queimadas nada menos do que 16 milhões de ha. Boa parte desta área contribuiu para o aumento da área degradada no Brasil, principalmente na Amazônia, no Centro Oeste e Nordeste, com destaque para a região denominada de MATOPIBA, que também passa por um processo bem intenso de degradação dos solos.

Enfim, precisamos buscar um ponto de equilíbrio entre os sistemas produtivos, a busca por lucro imediato, o respeito pela natureza e o equilíbrio dos biomas e dos ecossistemas. Sem isso, estamos apressando o agravamento da crise socioambiental e condenados a destruir o nosso planeta.

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy 

 

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