Quarta, 14 Novembro 2018 16:28

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT

 

Hoje, tratarei da gestão do novo Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá (HPSMC). Fazendo parte das ações privatizantes, sempre embrulhados sob o manto da excelência, o que se aproxima é mais uma forma de deixar o SUS em coma.

A privatização tem sido a tônica da implantação de uma agenda neoliberal que não tem limites; que o digam as pastas da Seguridade Social, Saúde, Educação, Previdência e Assistência Social.

Após a aprovação da PEC 55 (a do teto dos gastos públicos), o aprofundamento dos processos de terceirização/privatização se acentua nas três esferas de governo: federal, estaduais e municipais.

A saúde – bem público e direito de todos – enfrenta, há muito, esse avanço que desmantela o SUS, deixando de atender quem mais precisa.

Em meio a esse desmonte, assistimos ao nascimento de empresas que, mesmo sendo criadas dentro das próprias administrações públicas, na essência, constituem-se como entes empresariais de direito privado. Nesse sentido, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), que aviltou a autonomia universitária na administração de seus hospitais, é o maior exemplo nefasto do modelo.

Pois bem. No último dia 09/11/2018, o Conselho Municipal de Saúde de Cuiabá reuniu-se, extraordinariamente, para apreciar e deliberar sobre a gestão do novo HPSMC. A única proposta existente foi apresentada por Huark Douglas Correia, secretário municipal de Saúde.

Na linha gerencial da EBSERH, o novo HPSMC seria administrado pela Empresa Cuiabana de Saúde. Na prática, a “alma” dessa empresa atenderia, antes de tudo e de todos, os interesses do mercado, com ênfase ao viés produtivista.

Mas, aqui, vale relembrar:

  1. a empresa acima referenciada já administra o Hospital Municipal São Benedito;
  2. como resultado de sua má gestão, já é ré de uma CPI na Câmara dos Vereadores;
  3. além da CPI, há um parecer da Procuradoria Geral da República, de 2016, assinada por Rodrigo Janot, considerando inconstitucional a lei 5.723/2013, que cria a Empresa Cuiabana de Saúde.

 

Mesmo assim, a Comissão de Controle e Avaliação do Conselho Municipal de Saúde concedeu parecer favorável à citada empresa, cabendo a ela gerir o novo HPSMC, que receberá, do erário, cerca de 100 milhões, provenientes do programa “Chave de Ouro”.

Diante do quadro, na tentativa de barrar a concessão, a representante do Conselho Regional de Psicologia (CRP), Vanessa C. Furtado, professora da Psicologia da UFMT, pediu vistas ao processo.

Embora tais pedidos sejam legais, devendo ser acatados sem quaisquer questionamentos, a presidência daquela reunião colocou em votação o referido pedido. Resultado: solicitação rejeitada por 10 votos a 1.

Os protestos do público presente foram imediatos. Vanessa Furtado repudiou a decisão, explicitando e condenando a arbitrariedade da votação; assim, reiterou seu pedido, apontando falta de substancialidade da matéria posta para aquela votação no pleno, uma vez que o Modelo de Gestão não fora ampla e efetivamente apresentado.

Diante da pressão do público presente, mas não sem agressões e ameaças (aliás, tudo devidamente filmado) o pedido de vistas foi concedido à conselheira Vanessa Furtado.

Infelizmente, os representantes da gestão municipal queriam garantir a apressada tramitação burocrática da gestão orçamentária do novo HPSMC. Para tanto, o processo democrático foi atropelado. Todavia, ele precisa ser sempre garantido dentro do Conselho, que nunca deve se atrelar a interesses que não sejam exclusivamente os do público.

É tudo o que espero do Conselho.  

 

 

Quarta, 14 Novembro 2018 16:25

 

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Por Aldi Nestor de Souza*

 

E assim, sem nenhum pudor, sem nenhum remorso, sem nenhum acanhamento, sem nenhum luto, a pobre escola mandou plantar, na parte mais visível de seu pórtico, uma imensa faixa, de letras decididas e compenetradas, com a seguinte informação: primeiro lugar no ideb.

Nenhuma dúvida: a escola mostrou-se decidida a descer ao mais profundo dos confins da lógica do mercado e do consumo e apresentou seu preço, do mesmo modo como o fazem a alcatra, o sabonete, o papel higiênico, a goma de mascar. E como se estivesse numa prateleira das mais comuns, grita: primeiro lugar no ideb!  É a pechincha final.

Despudorada, a escola agora, pelo menos por uns dias, anda com sorriso largo, de nariz imponente e pode entrar pela porta da frente, a exigir respeito, da secretaria que lhe impõe regras e rédeas e respira o ar árido da glória meritocrática, alcançada ao custo de uma subserviência enlatada, como se fosse puro.

Primeiro lugar no ideb! É o que esbraveja a faixa de medidas largas, ecoando para toda a comunidade à sua volta os louros por ter cumprido à risca a determinação do distante ministério que nem lhe reconhece o linguajar, nem os costumes, nem as medidas, nem a cor, nem as feições, nem a história.

Primeiro lugar no ideb foi a morte a que se reduziu a antiga e simpática escola, dona de saudosa história de eventos comunitários, de festas, de jogos, de quermesses. História essa que, aos poucos, anda se desfazendo e sendo trocada por treinamento rigoroso para atingir o tão propalado e degradante pódio.

Ocupada com o êxtase do exame e de suas consequências, nem percebe o mugido da educação à distância, que se aproxima a passos largos e que já ameaça trinta por cento da presença física,  na escola, de sua juventude mais verdejante. Também não lhe sobre tempo pra discutir a excrescência do silêncio, imposto pelo projeto que ameaça amordaçar a liberdade de cátedra de seus professores.

Não! O ideb parece ser o grande fim. Ocupar a primeira posição, e narcisisar-se com isso, é a meta. Cumprir a meta numérica, e apregoá-la ao alcance dos olhos dos míopes, é o que interessa. Disputar os parcos recursos do ministério, às custas do preço alcançado no exame, é o fim da educação.


O que essa pobre escola tem a dizer pro estudante que também  viu seu nome apregoado no alto da avenida, num outdoor flamejante, a anunciar “primeiro lugar em medicina na federal” ? Como vai orientar esse pobre jovem, também precificado e exposto ao mais visível e mortal dos relentos? Como pretende  fazer resistência ao violento comércio da educação?

Primeiro lugar no ideb! Comemora a escola, agora vencida pelas ordens dos organismos internacionais que colonizam o pensamento e escravizam pais, alunos e professores e os submetem ao vexame de atingir esse tão disputado lugar nenhum.

Nenhuma diferença existe entre ela, a primeira colocada, e a outra escola, do mesmo bairro, das mesmas condições, e que se deu mal no exame. Mas, ambas cegas, apenas desfilam suas alegria e dor na mesma intensidade, e não criticam, nem resistem, nem analisam os ditames do exame que as mortificam.

E nesse rito, as escolas, como um todo, vão se degenerando e se transformando num lugar inóspito, oco, vulgar, pragmático e triste. E, a galope, vão perdendo o sentido e nada tem a oferecer à humanidade que, ao vê-las, precifica-se também, perde a dignidade e entrega-se à gula dos mercadores ferozes e insaciáveis.

Agora rastejantes, as escolas se igualam as ervas daninhas, rentes ao chão, sem conseguir olhar nada muito alto, nada muito longe, nada muito belo, nada muito poético, nada muito artístico. Ficam ali, a danificar as frutíferas, as comestíveis, as medicinais, as livres. Sobrevivem como um incômodo, um incômodo que pode ser carpido a qualquer momento, sem nenhum grito de compaixão, sem nenhuma defesa.

Talvez as escolas sejam reflexo do que fazem os cursos de graduação das universidades, que seguem a mesma sina, também tem seus preços afixados nos pórticos e cumprem lá suas corridas na mesma direção, a direção do reinado das ervas daninhas.

Talvez as escolas, assim como as universidades, não tenham entendido direito sua função junto à sociedade. E igualam-se às empresas mais rudes, buscando metas que se medem com números vulgares e resultados entendíveis até aos pés de capim e as ervas cidreiras.

Talvez as escolas, assim como as universidades e as ervas daninhas, não tenham percebido o risco que estão correndo e não veem a roçadeira no braço do capinador a mirar-lhe o tronco e, de um só golpe, tirar-lhe a vida.  

Talvez as escolas, assim como as universidades, tenham se afeiçoado ao reino das ervas daninhas e acostumaram-se a ser de pouca serventia, numa existência de mato vadio, sombra pros rastejantes mais peçonhentos.
 

*Aldi Nestor de Souza

Professor do departamento de matemática - UFMT/Cuiabá

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Terça, 13 Novembro 2018 16:41

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Neste domingo, 11 de Novembro de 2018,  é o inicio da II JORNADA MUNDIAL DOS POBRES. Em todas as Igrejas Católicas ao redor do mundo, onde mais de 1,3 bilhões de pessoas fazem parte da fé católica, aproximadamente 17,7% da população mundial, milhões de fieis estarão ouvindo sermões  e orando em favor dos pobres.


Por iniciativa do PAPA FRANCISCO, começando hoje e concluindo no próximo domingo, 18 de NOVEMBRO, considerado o DIA MUNDIAL DOS POBRES, caberá a IGREJA não apenas voltar sua atenção e suas orações aos pobres, como fez Jesus, mas fundamentalmente dar um passo adiante no combate a pobreza, a fome e à miséria, através de atos concretos como a doação de alimentos, roupas e outros itens necessários a existência de uma vida digna.


A luta na defesa dos pobres e o combate à pobreza não estão circunscritas/os apenas em um dia ou uma semana, é obra e compromisso de  todos os dias, por parte de quem sonha com um mundo melhor, um Brasil melhor, onde a justiça social, a solidariedade, a fraternidade e a sustentabilidade sejam os verdadeiros pilares do desenvolvimento.


No Brasil, a JORNADA MUNDIAL DOS POBRES e as comemorações e ações no DIA MUNDIAL DOS POBRES, está a cargo da CÁRITAS BRASILEIRA, por delegação da CNBB. Seguindo sua metodologia e carisma a CÁRITAS destaca três tipos de CARIDADE: a assistencial, que visa atender situações de emergência, “dando pão a quem tem fome, água a quem tem sede, roupa a quem esta nu e casa a quem está sem habitação”, a seguir vem a CARIDADE PROMOCIONAL e , finalmente, A CARIDADE LIBERTADORA.


A Cáritas Brasileira assim destaca sua metodologia e a importância do combate a pobreza e exclusão social: Dar o peixe, ensinar a pescar, pescar juntos! Hoje, a Cáritas Brasileira, em conjunto com todos os seus agentes, conseguiu integrar essas três práticas: do assistencial e emergencial (dar o peixe), para o promocional (ensinar a pescar), para o projeto de Desenvolvimento Sustentável Solidário endógeno, isto é, de dentro para fora (pescar juntos).” 

Para a Cáritas Brasileira, para a CNBB, enfim, para a Igreja Católica e diversas outras igrejas/religiões, a caridade libertadora é o caminho mais efetivo e eficiente para combater a pobre, a miséria, a fome e a exclusão social e possibilitar a inclusão dos pobres e da questão da pobreza na agenda politica nacional e despertar/pressionar nossos governantes para a definição e implementação de politicas públicas que promovam não apenas o desenvolvimento do país de uma forma geral, mas também que os frutos desse desenvolvimento seja repartido de forma equitativa, justa e sustentável com toda a população e não através de uma enorme concentração de renda que gera pobreza e desigualdade.


Se e quando o “bolo”, o PIB cresce, todos tem direito a uma fatia mais justa e não da forma atual em que uns poucos barões da economia e os marajás da República se apropriam da maior parte deste bolo, relegando mais da metade da população a uma vida miserável que afronta a dignidade humana.


Ao finalizar esta reflexão destaco como a CÁRITAS BRASILEIRA se reporta a sua metodologia ao combate `a pobreza, fome e miséria. “A caridade libertadora só tem compromissos com a humanidade e com Deus, e alimenta a liberdade de doar a vida, como amor humano que revela o amor a Deus e o amor de Deus, em favor da libertação do próximo, seja cada pessoa, seja um povo, seja a humanidade. Libertação que é um processo e que alcança e mexe com todas as dimensões da existência. A caridade libertadora vê no pobre o explorado no seu trabalho e procura despertar o cristão para a solidariedade na luta pelos seus direitos.”


Oxalá, os católicos e adeptos de outras religiões que tem nos pobres a centralidade de suas crenças e ensinamentos, possam aproveitar esta semana dedicada aos pobres, não apenas para pequenas doações de dinheiro ou bens materiais, mas para também despertar a consciência dos fiéis e, principalmente, de governantes que se dizem cristãos, quanto à responsabilidade dos mesmos em ajudar nas transformações das estruturas sociais, econômicas e políticas iníquas que, em última análise, são as responsáveis pelo surgimento e perpetuação da violência, pobreza, da miséria, da fome e da exclusão social no Brasil e também nos demais país.


Este é o grande e único significado da II JORNADA MUNDIAL DOS POBRES e do DIA MUNDIAL DOS POBRES.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista e colaborador de diversos veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

Segunda, 12 Novembro 2018 10:27

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

A pobreza, principalmente a pobreza extrema, sinônimo de miséria, pode ser considerado com o maior atentado contra a dignidade humana, pois além de privar as pessoas de condições mínimas de existência, incluindo formas como a fome endêmica, a desnutrição que são responsáveis por mais de 800 milhões de pessoas que não tem o que comer ao redor do mundo, também rouba a esperança de uma vida decente para mais de 3,0 bilhões de pessoas em 2018, que são obrigadas não a viverem, mas meramente sobreviverem com uma renda pessoal de menos de US$1,90 dólares por dia, ou R$277,50 reais por mês, no caso do Brasil, onde mais de 9,9 milhões de pessoas estão nesta condição.


Durante a cúpula do milênio, realizada pela ONU no ano 2000; todos os 191 países que participaram da mesma firmaram um pacto para que até o ano de 2015 fossem alcançados os chamados OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO, que, ao final daquele ano foram substituídos pela AGENDA 2030, ou os OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.


No primeiro caso, em 2000 , foram definidos 8 grandes objetivos e em 2015, esses foram subsituídos por 17 novos objetivos e 169 metas, para que os países que se comprometeram com a AGENDA 2030 pudessem usar como balizadores para definirem politicas públicas e ações visando alcançar um nível de desenvolvimento mais inclusivo e menos excludente, como, lamentavelmente ainda hoje assistimos.


Na vigência dos OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO, o objetivo número um estabelecia como compromisso “Erradicar a pobreza e a fome”. Já na AGENDA 2030 foram estabelecidos três objetivos que, se realmente perseguidos e alcançados, poderão contribuir tanto para a eliminação da pobreza, mas também outros aspectos relacionados com a mesma.


O objetivo número um estabelece: “Erradicar a pobreza. Acabar com a pobreza em todas as suas formas e em todos os lugares”; o objetivo número dois estabelece: “Fome zero e agricultura sustentável. Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável”, já o objetivos numero dez estabelece: “reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles. Até o ano 2030, alcançar e sustentar o aumento da renda dos 40% mais pobres da população, de cada país, a uma taxa de crescimento maior do que a média nacional.


Diante deste tremendo desafio, o Papa Francisco, em 2016 fez um apelo e ao mesmo tempo tomou a decisão de criar a JORNADA MUNDIAL DOS POBRES e o  DIA MUNDIAL DO POBRE.  A primeira jornada ocorreu em 2017 e a segunda deverá acontecer neste ano , a começar no próximo domingo, 11 de novembro e concluir exatamente no domingo seguinte, 18 DE NOVEMBRO, o DIA MUNDIAL DO POBRE.


No Brasil existem mais de 9,9 milhões de pessoas que vivem ou melhor, sobrevivem, em condições de pobreza absoluta ou pobreza extrema e mais de 70 milhões que vivem na condição de pobreza, tendo em vista que além de desempregadas ou subempregadas, tais pessoas não dispõem de renda suficiente para terem uma vida digna, incluindo acesso a alimentação saudável, moradia digna, saneamento adequado, serviços de saúde, enfim, milhões de pessoas que vivem sem esperança de dias melhores para si ou para seus filhos/as e familiares, que fazem  parte dos mais de três bilhões de pessoas no mundo que sobrevivem com renda diária menor de que US$2,50 dólares ou no máximo 277,50 reais por mês.


Tanto a ONU e seus organismos especializados, quanto outras instituições internacionais e centros de pesquisas, incluindo universidades e diversas igrejas/religiões tem feito uma verdadeira cruzada para que o combate a fome, a pobreza e a redução das desigualdades sociais e econômicas  sejam banidas da face da terra, só assim teremos paz e justiça como primados humanos.


Em sua mensagem direcionada a II Jornada dos pobres, cujo tema é a citação do Salmo 34,7 “este pobre grita e o Senhor o escuta”, o Sumo Pontífice assim se expressa: “Este é o momento em que somos chamados a encontrar-nos com as diversas condições de sofrimento e marginalização em que vivem tantos irmãos e irmãs nossos/as que estamos habituados a designar pelo termo genérico de pobres”.


Oxalá, nesta semana dedicada pela Igreja Católica aos pobres, passamos parar por um momento e refletirmos com um pouco mais de amor, compaixão e nos indignarmos contra as injustiças, o egoísmo e formas discriminatórias que são os fatos geradores da pobreza, da miséria e da fome e, por extensão  seja , com certeza, a maior violência que continuamos assistindo passivamente.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista e colaborador de diversos veículos de comunicação. Twitter@profjuacy  Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

Quinta, 08 Novembro 2018 09:38

 

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Por Roberto de Barros Freire*
  
 

Há vários equívocos perigosos que estão rondando as escolas e o ensino de forma geral, e gravitando em torno de políticos despreparados e sem formação acadêmica. O primeiro deles advém da falsa premissa que as escolas devem corroborar as crenças paternas, defender e propagar as crenças e os valores dos pais. Para os pais que assim o desejam, o que é um direito constitucional, lembro que isso só é possível nas escolas confessionais, onde precisam matricular e pagar por sua prestação. Mas, mesmo essas escolas estão obrigadas a ministrar ensinamentos sobre tolerâncias com as demais religiões, minorias, diferenças, porque a LDB assim o exige.


Por sua vez, o ensino público é laico e sua função é exatamente fazer a criança ultrapassar as crenças paternas e adentrar no universo multirreligioso e multicultural da sociedade civil, colocar a criança em contato com o restante da sociedade que é composta por diversas crenças, até mesmo por ateus e agnósticos, assim como de religiões espíritas e umbandistas, budista, islâmica, judaica, enfim, pela complexa e diversificada variedade religiosa da humanidade. Se cada pai exigir que a escola pública eduque apenas na religião dos pais ou nos valores particulares, será preciso ter diversas escolas, até mesmo escolas ateias, o que não só é impossível, como contraproducente do ponto de vista pedagógico, pois o contato com a diversidade cultural engrandece os indivíduos, e formações unilaterais atrofiam a sensibilidade das pessoas.


A função da escola pública não é referendar as crenças paternas, mas mostrar que as mesmas são parte da realidade tão somente, e que pelo princípio de liberdade religiosa, o jovem pode até escolher uma religião diferente dos seus pais, ou mesmo não ter religião. É uma escola republicana e deve transformar esses cidadãos em republicanos, não em idólatras.


Outro equívoco perigoso e arcaico, rústico e reacionário, é considerar possível a existência de escolas sem partidos, ou que professores sejam obrigados a esconder suas posições políticas. Para começar, por vivermos numa democracia, todos têm direito de possuir posições políticas diferentes daquelas encarnadas pelos pais dos alunos. A função da escola é, novamente, socializar a criança, colocando-a em contato com as diversas posições políticas existente na sociedade, enfim, é um ente republicano e deve promover a democracia. Os diversos professores que os alunos tomam contato no decorrer da sua vida escolar, os farão passar por professores que professam as mais diversificadas posições políticas e ideológicas, até mesmo a dos seus pais, mas não sempre, o que é salutar e educativo. A ideia de uma escola sem partido é tomar partido de partidos que se escondem como se não tivessem ideologias, quando tem apenas outra ideologia, a ideologia de que não se deve ensinar ou mostrar outras ideologias, apenas uma, uma falsa neutralidade que toma partido de nazistas, fascistas, enfim, do que há de pior na política, o menos tolerante, o mais estreito. Espera-se que os professores manifestem repúdio por ditaduras, pelo nazismo, pelos fascismos, pois que os alunos devem se tornar republicanos e democratas, não autoritários e tiranos.


Num país onde o professor não tem autoridade nem reconhecimento público, todo pai, ainda que analfabeto, quer ensinar aos professores o que ensinar e como ensinar. Se sabem tanto, por que não educam em casa, e deixam as escolas para aqueles que querem ser antes um cidadão decente e tolerante, antes que um bárbaro repleto de preconceitos.


É preciso deixar as escolas na mão dos professores e não regida por políticos e advogados. Todos querem palpitar sobre educação, quando apenas professores recebem formação para tanto.
 

*Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Quarta, 07 Novembro 2018 14:45

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Passadas as eleições, enquanto a “mídia” e as forças conservadoras tentam direcionar a opinião pública para a questão da formação da equipe do futuro presidente, o novo formato da máquina administrativa federal; precisamos acompanhar mais de perto quais as propostas que devem, de fato, serem apresentadas `a população e quais os temas que deverão constar da agenda politica, econômica, social e cultural do novo governo a partir de 2019.


Em que pese que a justiça eleitoral exige que os candidatos aos cargos de Governador e de Presidente da República apresentem e registrem seus “planos de governo”, a maior parte desses planos não passa de meras cartas de intenção e não aprofundam os temas que realmente devem ser definidos como prioridade dos novos governos a partir do próximo ano, muitos candidatos escondem suas verdadeiras agendas e acabam apresentando verdadeiras bombas após tomarem posse, como foi o caso do confisco dos depósitos bancários feitos por Collor de Mello.


No caso de Bolsonaro, presidente eleito, ;parece que o mesmo pretende imitar o Presidente Trump, que todos os dias faz questão de informar `a opinião pública e seus seguidores o que está fazendo ou pretende fazer.


Parece o futuro presidente vai substituir o diálogo e debate muito salutares para a democracia, pelo monólogo e não demonstrou nada de concreto como vai se relacionar com o Congresso. Todos os dias o que vemos é uma solenidade do beija-mão de parlamentares, empresários e outras figuras e de vez em quando o futuro presidente pipoca uma mensagem para suas redes sociais.


Bolsonaro foi escolhido por mais de 57 milhões de eleitores, mas isto não lhe dá o direito de simplesmente decidir de cima para baixo questões que afetam a população brasileira como um todo, pois tanto seus eleitores quanto os 47 milhões que escolheram  Fernando Haddad quanto os quase 30 milhões que se abstiveram, votaram nulo ou em branco devem ser ouvidos também.


Afinal, todos, ricos e pobres, trabalhadores e empresários, brancos, negros, pardos, indígenas, mulheres, homens ou quem tem opções sexuais, religiosas ou ideológicas diferentes pagam impostos e tem o direito não apenas de votar, mas também de participar das discussões e ações, inclusive governamentais, que afetam seus destinos.


No último domingo esses mais de 57 milhões de brasileiros escolheram um Presidente da República, não um imperador, um déspota, um ditador ou dono do país. É fundamental que tanto as minorias quanto as oposições sejam respeitadas para que o convívio democrático seja observado e as liberdades de ir e vir, de manifestação pacífica, a liberdade de expressão, de cátedra, de religião, enfim, todas as liberdades civis e demais que constam da Constituição Federal, bem como todos os direitos e garantias individuais sejam respeitadas pelos novos donos do poder.


A titulo de combater a corrupção, o crime organizado e a violência, por exemplo, jamais dá direito aos governantes e as instituições de imporem mordaça à justiça, nem aos professores, nem aos jornalistas, ao Ministério Público, aos partidos políticos, enfim, tentar implantar um regime de terror como acontece em países que por décadas permanecem sob o tacão de ditadores militares, civis ou religiosos.


O momento deve ser de serenidade, mas também de coragem e vigilância e o futuro será construído através de ações tanto dos governantes quanto da população como um todo. Por isso a Constituição estabelece de forma clara que “todo poder emana do povo”, isto quer dizer que ao povo cabe o direito de constituir os governantes e a esses cabe obedecer a voz e a vontade do povo, que pelo trabalho e pelos impostos que paga, com muito sofrimento, mantém o Estado, a coisa pública, incluindo os salários e tantos privilégios que os marajás da República usufruem, as custas dos cofres públicos, enquanto mais da metade da população, mas de 130 milhões de pessoas levam uma vida miserável, longe de uma vida digna como merece, bem longe da vida nababesca dos donos do poder.


Há mais de 2.750 anos, quase oito séculos antes de Cristo, o Profeta Isaias denunciava governantes opressores e assim dizia: “Ai daqueles que fazem leis injustas, que escrevem decretos opressores para privar os pobres de seus direitos e da justiça os oprimidos do meu povo, fazendo das viúvas sua presa e roubando dos órfãos”.


Já que o Presidente Eleito se diz um homem de Deus e está sempre cercado de pastores e outros líderes religiosos, vamos aguardar as propostas que o futuro governo apresentará como caminho para que o Brasil possa se desenvolver com justiça social, sustentabilidade, equidade, solidariedade, redução da pobreza, da miséria, dos desníveis sociais, econômicos e regionais e de tantos problemas/desafios que afetam nossa gente.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, mestre em sociologia, colaborador e articulista de diversos veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

 

Segunda, 05 Novembro 2018 18:08

 

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Por Roberto de Barros Freire*
 

Aqueles, como eu, que estão perplexos com essa eleição, devem se dar conta, a esta altura, de que perdemos contato com a base da sociedade. As principais marcas da eleição deste ano foram a renovação e a repulsa à política tradicional. Medebistas, pesedebistas, assim como os petistas apostaram no caminho inverso: tentaram reciclar antigas lideranças e o governo Lula, e formaram uma tropa composta especialmente por veteranos que foram defenestrados da política através do voto. O congresso salvou a Dilma mesmo com o impeachment, mas o povo a repudiou. Voltaram para cena política, previsivelmente, os queixumes contra o impeachment de Dilma e a “prisão injusta” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O autoengano servindo à militância contribuiu para envenenar o ambiente político, enquanto a sigla manteve o culto a líderes flagrados em desmandos e se esquivava de reconhecer seus erros econômicos e políticos.


Os partidos que não expulsaram de suas fileiras os acusados, presos e condenados acabaram punidos pelo voto popular, que cansado de ver as mesmas caras sempre enroladas com a justiça, resolveram fazer justiça com as próprias mãos. Não à toa, MDB, PSDB e PT foram os três partidos que mais perderam governos e cargos eletivos. Foi uma rejeição à política considerada tradicional, e um voto no combate à corrupção e a maior punição à criminalidade, cujos partidos tradicionais não mais representavam esses antigos anseios. Isso que as urnas mostraram.


Na verdade, a elite intelectual não percebeu que os seres humanos querem respostas simples, certezas absolutas e a destruição de quem não pensam como eles. Falar para um público que não dá atenção aos professores, aos jornalistas, aos artistas e aos ativistas e que trata, com alguma razão, como uma elite progressista arrogante, revelou o desprezo com que elites políticas e culturais passaram a olhar para os eleitores. O povo fede, o povo é boçal, o povo não sabe o que quer e deve ser educado —ou ignorado, uma espécie de despotismo iluminado dos intelectuais. Enfim, a elite não percebeu a falta de confiança nos políticos e na política desde 2013, a crise econômica, o desgaste do longo governo do PT, a força da Lava Jato, o aumento da violência, além da reação a mudanças que afetaram os conceitos e valores tradicionais a respeito de família e gênero. Deu-se muita ênfase as questões de gênero ou meio ambiente, e se esqueceu das questões que mais aflige a maioria: a insegurança monetária ou jurídica. Não se percebeu que o povo considera a luta pelos direitos humanos como uma coisa para salvar bandido da cadeia. E não importa que isso não seja verdadeiro, o importante é como se sente. Como querer salvar os homossexuais, uma minoria, quando as crianças, uma maioria, estão ameaçadas? Como querer a igualdade de gênero quando todos se sentem excluídos dos direitos? Como querer salvar samambaias e taturanas, quando se assiste as pessoas serem mortas na porta de casa?


Não foi Bolsonaro quem inventou a intolerância e a violência no país, que remontam aos tempos do Brasil Colônia. Ele a catalisou, a projetou e a acentuou, e os brasileiros se projetaram nele. A lógica comumente difundida por setores da esquerda de "quem não está comigo, está contra mim" também não ajuda — é, também, intolerante. E o mundo cultural passou a representar a corrupção da inteligência, e a arte foi vista como uma ferramenta de doutrinação. Universidades, intelectuais, jornalistas e artistas passaram a ser vistos como defensores de minorias em detrimento da maioria, defensores de valores degenerados, defensores dos “pecados”.


É preciso encarar a realidade do conservadorismo nacional, que as bandeiras progressistas não são atraentes à grande maioria, que os brasileiros desconfiam da liberdade que acreditam que levam a licenciosidade, e que a força é o único recurso contra a violência. Devemos nos acostumar a conviver com a direita na arena política, que foi hegemonicamente dominada pela esquerda desde a redemocratização. O fato é que teremos que dialogar com uma direita que saiu às ruas e quer ser escutada, e se fazer prevalecer na arena política. Isso não é algo estranho à vida política, isso era apenas algo ausente até esse momento. A direita não quer mais se esconder ou se calar, e se expressou de forma rotunda.
 
*Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Quinta, 01 Novembro 2018 10:01

 

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Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.

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Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT
 

Desde o dia 28/10, entramos na pré-nova era nacional. Quando janeiro chegar, “novas” cartilhas, cheias de coisas que supúnhamos ultrapassadas, estarão a nossa espera. 

Sendo assim, como tudo que supúnhamos fosse importante para nossas vidas pessoais e nossas relações sociais não era tão abrangente e duradouro, como poderia ter sido, pantaneiramente falando, é bom não nos esquecermos: “em rio que tem piranha, jacaré nada de costas”.

Dito isto, a este artigo, exponho impressões sobre três discursos vindos a público, tão logo a vitória de Bolsonaro foi confirmada pelo TSE.

Começo com o pronunciamento de Dias Toffoli, presidente do STF, que lembrou ao presidente e ao vice-presidente vitoriosos: “uma vez eleitos, os senhores passam a ser os representantes da nação e não apenas dos seus eleitores...” Por isso, há de se “respeitar aqueles que não lograram êxito em se eleger e também a oposição política que se formará".

Toffoli pontuou outros itens, como “a pluralidade política, um dos fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito, que tutela a liberdade em suas diversas formas, dentre elas, a liberdade de expressão, de opinião e de consciência política, de crença e de culto, de identidades e de convivência harmoniosa entre diferentes formas de viver e conviver uns com os outros". Também por isso, insistiu na necessidade de situação e oposição se empenharem no sentido de superação do estágio de radicalismos vivido nos últimos meses.

No tocante à liberdade de imprensa, Toffoli foi enfático, destacando a importância de uma imprensa verdadeiramente livre de interferências.

O outro discurso destacado é o de Bolsonaro, feito por etapas. De início, algo próximo a cultos de agradecimento a Deus. Logo, muito coerente com a base de sua campanha política: a passagem bíblica Jo; 8: 32 (conhecereis a Verdade, e a verdade vos libertará). A política nossa de cada dia, ou seja, aquela que verdadeiramente nos regerá, podendo até nos escravizar, foi secundarizada.

Depois, e só após observações que já eram feitas pela mídia sobre as lacunas daquela primeira fala, Bolsonaro retornou para alguns complementos “esquecidos”. Assim, falou em pacificar o país, cumprindo a Constituição, recusando-se a qualquer tipo de preconceitos. Disse que respeitará as liberdades individuais e a liberdade de imprensa, desde que sem “fake news”, como teria, em sua opinião, feito a Folha de São Paulo algumas vezes nos últimos meses.

Se cumprirá o que foi dito, apenas o futuro dirá. Até lá, só há o império das palavras e os receios diante de inaceitáveis afirmações já enunciadas por ele próprio em discursos sobre negros, gays, ativistas dos movimentos sociais et alii. Em princípio, tudo assustador, mas nada que fosse desconhecido para alguém.

Da parte de Haddad, limitações suas se tornaram nítidas. Ex.: ele não foi capaz de ligar para o vencedor, como manda a etiqueta burguesa. Essas mesuras precisam ser cumpridas, não importa a circunstância.

Como extensão, em seu discurso, não citou o nome de Bolsonaro. Falou apenas para a própria militância. Assim, perdeu a chance de se mostrar como grande líder político, independentemente (e apesar) de Lula. Haddad precisava ter sido enfático na cobrança da defesa da democracia e de todas as liberdades. Não fazendo isso, foi insuficiente para a importância que o momento demandava de sua pessoa.

No dia seguinte, enviou mensagem por rede social a Bolsonaro, dizendo que o Brasil precisa, “neste momento, do melhor”.

O Trump dos trópicos, ironicamente, só tinha de concordar. 

Quarta, 31 Outubro 2018 10:45

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Parece que o Brasil entra em mais uma nova fase de sua história e, como em tantas outras, muitas coisas podem mudar, algumas para melhor e outras para pior, com certeza. Alguns dizem que as crises e os conflitos são parteiros da história, pois exigem que os países tenham a capacidade de se reinventarem.

Este é um novo momento em nossa história politica quando velhos caciques e raposas perderam as eleições, velhos esquemas se mostraram ineficientes e partidos, até então considerados “fortes” e donos da verdade quase desapareceram, como no caso do antigo e novamente MDB e o PSDB.

Quanto ao PT, surgido em pleno período de governos militares, fruto da luta sindical, depois de diversas tentativas chegou ao poder em 2003, após três derrotas consecutivas de LULA, seu líder maior e que nesta eleição teve que assistir de dentro de uma prisão a vitória da extrema direita através do voto de milhões de eleitores, mesmo que em percentual bem menor do que de suas duas vitórias e da primeira vitória de Dilma, sua sucessora, em 2010.

Mesmo sendo derrotado, para tristeza de seus algozes, o PT ainda demonstra um grande fôlego, um capital politico e eleitoral considerável que lhe garantiu vitórias importantes em todos os estados do nordeste, além de Tocantins e do Pará, onde Fernando Haddad foi o vencedor no segundo turno.

De uma figura de pouco brilho na Câmara Federal durante sete mandatos, integrante do chamado “baixo clero”, quase invisível para a opinião publica, tendo passado por diversos partidos, seu partido atual, um dos até poucos meses considerado nanico, o PSL, antes o PSC que não topou apostar da candidatura de Bolsonaro, demonstrou alguns aspectos e fatos novos na politica brasileira.

Primeiro, ficou a certeza de que tempo de TV e um monte de partidos tradicionais não pavimentam o caminho da vitória. Através de uma coligação considerada pífia o PSL, melhor dizendo, Bolsonaro conseguiu “desbundar” o MDB de Temer e Romero Jucá e o PSDB de Geraldo Alkmin que tinha quase todo o tempo do mundo de propaganda eleitoral no rádio e TV e como aliados diversos partidos  fisiológicos do chamada “centrão”, que já estiveram com Lula, com Dilma, com Temer e com certeza estarão com Bolsonaro.

A votação inexpressível de Alckmin em todos os estados, inclusive em São Paulo, onde ele próprio já exerceu o cargo de governador por quatro mandatos e o PSDB é “dono do pedaço” há mais de duas décadas não impediram que Bolsonaro o derrotasse no primeiro turno de forma vergonhosa.

Parece que o PSDB entrou dividido na disputa presidencial em 2018 e saiu não apenas derrotado mas estraçalhado, incluindo a derrota de alguns de seus caciques em diversos estados como Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás, Paraná e no nordeste inteiro.

Os tucanos que em 2014 elegeram 54 deputados federais viram a bancada cair para quase a metade nas eleições de 2018, quando conseguiram eleger apenas 34 deputados, passando da condição de terceira maior bancada há quatro anos para a nona, empatado com o DEM a partir de 2019.

A mesma sorte teve o MDB que caiu da segunda posição em 2014 quando elegeu 66 deputados federais para 34 na eleição deste ano. Pela ordem, os quatro partidos que mais perderam cadeiras na câmara federal nas eleições de 2018 foram: MDB 32; PSDB 25; o PTB 15 e o PT 13 e o único que realmente ganhou um espaço de grande destaque foi o PSL, partido de Bolsonaro, que  em 2014 elegeu apenas um deputado federal e nesta eleição passou `a condição de segundo maior partido na Câmara Federal, com 52 parlamentares e que com a sinuca de bico em que se encontram 14 partidos que elegeram 41 deputados mas não conseguiram superar a chamada clausula de barreira, poderá receber logo no inicio da legislatura mais de uma dezena de parlamentares eleitos por esses partidos e que desejam mesmo é estarem à sombra do poder, de onde pode jorrar leite e mel, sonho acalentado por políticos fisiológicos que agem como mariposas em relação à luz.

Diferente de Collor de Melo que também foi eleito por um partido na época com pouca expressão politica e eleitoral, não tendo formado uma base parlamentar  forte no Congresso e acabou sofrendo o “impeachment”, Bolsonaro, chega ao poder com uma base parlamentar, principalmente na Câmara Federal com força suficiente para, se não conseguir aprovar tudo o que deseja, pelo menos para ter espaço suficiente para navegar em céu de brigadeiro, se não meter os pés pelas mãos, com propostas que dividam não apenas o Congresso mas, principalmente, o país que entrou dividido e saiu dilacerado dessas eleições.

Em uma democracia, quem ganha  também deve respeitar quem perde e não tentar eliminar os adversários como se inimigos fossem, afinal, em uma democracia podemos estar divididos em termos de ideologias, ideias, propostas e modelos de desenvolvimento para o país, jamais em Guerra real, onde, o que conta é a destruição ou até a eliminação física do adversário. Quando isto acontece, estamos na ante sala de um regime totalitário em detrimento das instituições do estado democrático e de direito. Aí o caos substitui a ordem democrática e a pluralidade, como atualmente acontece na Venezuela, cujo ciclo de violência politica teve inicio com a chegada ao poder, via eleições, até então livres, de um coronel do exército que acabou dando auto golpes, destruindo os poderes judiciário e legislativo e perseguindo implacavelmente a oposição, deixando um país arrasado para seu sucessor que continua sua obra devastadora no país vizinho.

O Brasil continua dividido não apenas em termos políticos e eleitorais, mas também em termos econômico, racial, social, cultural e religioso, o momento deve ser de tentarmos colar os lados do que resta de um país sofrido em meio a tanta violência, corrupção e desagregação institucional. Se antes o mapa do Brasil era dividido entre azul e vermelho, a partir dos resultados dessas eleições continuará dividido entre verde e vermelho, onde o verde apenas ocupou o lugar do azul, com a debandada do centro rumo a direita e extrema direita.

Dias nebulosos e sombrios ainda rondam os céus de nosso país, quem viver verá!


*JUACY DA SILVA, professor universitário, mestre em sociologia, articulista e colaborador de diversos veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.Twitter@profjuacy  Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

 

Sexta, 26 Outubro 2018 14:54

 

 

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Por Aldi Nestor de Souza
 

Estou, nesse momento em que escrevo, dentro de uma sala hermeticamente fechada, uma sala que sequer tem portas. Só paredes, piso e teto reforçados. É uma sala sem ar, sem água, sem móveis, sem luz, sem decoração, sem nada. É uma sala distante de tudo, alheia a qualquer tipo de relação. Essa sala é o lugar onde vivem os antipetistas fundamentalistas.

Claro, esse tipo de sala é o mesmo onde vivem os fundamentalistas em geral, só escolhi os antipetistas devido ao calor da hora. É claro também que os petistas fundamentalistas vivem numa sala igual.

Pra eu entrar nessa sala, evidentemente, tive que optar por morrer primeiro, entendendo que só a morte poderia me proporcionar peripécias tais como atravessar paredes instransponíveis e achar que eu não tenho nada a ver com o que ocorre no mundo, com as mazelas da sociedade em geral.

Pois, pelo menos a meu juízo, é exatamente isso o que ocorre com os antipetistas fundamentalistas: a sensação de viverem num mundo à parte, num mundo sem relações, num mundo idealizado, num mundo hermético, num mundo só deles. E aqui estou falando de todos os antipetistas fundamentalistas. Todos: dos intelectuais aos hipopótamos.  

Uma característica bem visível de um antipetista fundamentalista é que ele não consegue falar, como um todo, dos governos petistas. E isso é compreensível, até bem natural, de quem se julga fora do processo, fora do embate, dentro de uma sala hermeticamente fechada.

Por exemplo, o combate à fome, o bolsa família, raramente entra na sessão de argumentos de um antipetista fundamentalista. E não entra por um motivo também evidente: não se pode falar contra, com desenvoltura, de um programa que tirou , segundo a ONU, pela primeira vez nos últimos 500 anos,  o país do mapa da fome. A fome é difícil de medir, ela é singular demais pra caber na pena ou na bile de um sujeito enfurecido e alheio às relações que determinam a vida em sociedade. A fome desconcerta qualquer argumento. A fome é a fome e ponto final.

Também não se fala do lado positivo da expansão de universidades e de institutos de ensino públicos nascidos ao relento e espalhados país afora. No lugar disso, como é óbvio, é muito mais confortável centrar força na precariedade da expansão.  

Aqui, na sala onde estou, fala-se aos gritos desses males. Nesse momento, por exemplo, uma pessoa não para de erguer os braços, de gesticular com ferocidade e de bradar as mais terríveis palavras de repúdio ao campus da Federal que brotou lá no meio da caatinga nordestina, lá onde só tinha pedra, xiquexique e gente, lá onde não tinha nada. Mas o brado é porque tá faltando alguns ingredientes pra um laboratório e grana pra se fazer aula de campo. Quase todo o resto tá funcionando, tem gente se formando, tem gente trabalhando, a cidadezinha de merda prosperou, o xiquexique floresceu, a pedra deu experimento. Mas nada disso vale, quando se vive numa sala hermeticamente fechada.

Mas a coisa preferida mesmo dos antipetistas fundamentalistas, pelo menos é a mais badalada aqui na sala e a grande geradora de ódio, é a execrável corrupção. A corrupção é sedutora demais, levanta até a moral dos velhinhos sem saúde. E a corrupção tem a vantagem de já vir pronta, não precisa explicação, o censo comum basta.

Mas a corrupção, inevitável no modo de produção capitalista, não faz nem cócegas nos problemas sérios do Brasil. Por exemplo, segundo a polícia federal, após mais de quatro anos de investigação, o famoso Petrolão, muso inspirador de jornalistas e articulistas de pena pesada, desviou 42 bilhões da Petrobrás. Uma fortuna, realmente. Inaceitável. Essa fortuna gerou uma infinidade de assustadoras manchetes de jornais e artigos de opinião, segundo os quais a empresa petroleira brasileira, em função disso, havia quebrado.

Perto da avalanche sobre o escândalo do Petrolão, a notícia de que cinco brasileiros, exatamente cinco, tem a mesma renda de metade da população mais pobre, virou apenas uma reles notinha de pé de pagina. Uma coisa que, de tão nanica, quase ninguém lembra mais.

Por outro lado, segundo o jornal correio brasiliense, de 19/05/2018, em uma semana de greve dos caminhoneiros, greve que ocorreu em maio, a Petrobrás teve um prejuízo de 118 bilhões de reais. Ou seja, quase três Petrolões em apenas uma semaninha e a empresa segue firme, vendendo normalmente seus pedaços de pré sal pro mercado internacional. Esse Prejuízo, no mundo das narrativas antipetistas, sequer foi comparado ao Petrolão.

Outra coisa que os antipetistas fundamentalistas não levam em conta é a simbologia, para a classe trabalhadora, do ex metalúrgico, aquele de dedo torado no torno. Aqui a coisa fica mais complicada. Falar desse ex metalúrgico é como tocar num ponto nevrálgico, de dor cortante.  Para os antipetistas fundamentalistas, o ex metalúrgico não é um ex metalúrgico, não é um ex retirante nordestino, que almoçava do marmitex da empresa e guardava a carne pra janta, não é um degustador de cachaça, não é um sujeito que engole plurais.

Não. Nenhum desses símbolos, símbolos estes que caracterizam a enorme maioria da classe trabalhadora brasileira, é levado em conta. Nenhum. Na briga de narrativas, para um antipetista fundamentalista, mesmo para aqueles que são trabalhadores, valem apenas as coisas óbvias: as “irrefutáveis”, as “apuradas” em investigações, as denunciadas pelos ex companheiros, as “julgadas” pela justiça, as que horrorizam o componente moral.

Por fim, um antipetista fundamentalista, de tão certo, parece capaz de se submeter à barbárie, de deixar fraquejar a democracia, de deixar fraquejar os direitos humanos, de não maneirar no julgamento nem na pena, mesmo diante da catástrofe, e de fazer crítica pesada, repetida e requentada, ao partido e ao ex metalúrgico, mesmo estando todos nós à beira do abismo e de uma tragédia bem maior, tragédia que poderá tirar, até dos mortos, o direito de pensar livremente e de opinar.
 

*Aldi Nestor de Souza
Professor do departamento de matemática. UFMT/Cuiabá.
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