Sexta, 26 Outubro 2018 11:36

 

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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.

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Wescley Pinheiro

Professor do Departamento de Serviço Social da UFMT

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        Não há como não se afetar com os elementos presentes na conjuntura. Não existe ninguém satisfeito com as coisas como estão e, seja qual for a posição política diante do quadro atual, é inegável que o agravamento das questões atravessam nossas relações pessoais, atinge nossas emoções e causam sofrimento. Isso ocorre de diferentes formas e níveis e por distintas motivações. Nesse sentido, com o processo de recrudescimento do conservadorismo e ascensão do protofascismo, legitimado pelas parcas estruturas democráticas, temos a tônica de algo tão doloroso quanto real: a hipertrofia da violência vivida no cotidiano.

        Esse fenômeno tira do armário todos os preconceitos, vilipendia qualquer concessão civilizatória, vomita tudo de desumano que se encontrava aparentemente domesticado em nossas relações e, sem necessidade de lógica e coerência, os espaços da singularidade e das particularidades são tomados de assalto por todas as formas de opressões historicamente determinadas. Dos púlpitos das cátedras ou das catedrais, dos bancos ou das bancadas, das piadas infames ao relativismo das desigualdades impera a explosão de violações travestidas de neutralidade, boa vontade ou explicitamente agressivas. Entre a patologização da questão social, a normalização da exploração e das opressões, a medicalização da vida e a moralização da barbárie caminha nosso processo de individuação entre relacionamentos abusivos, práticas intolerantes e relações adoecedoras no desencaixe dos espaços comuns.

        Com isso as violências morais, simbólicas e psicológicas cravam as possibilidades mais severas por via de instituições tão caras ao nosso tempo histórico. Por tudo aquilo que colocamos no texto “O ovo da serpente foi chocado: protofascismo brasileiro e novos desafios frente ao obscurantismo contemporâneo” cresce a necessidade da busca pelos culpados nos espaços cotidianos diante daquilo que nos desumaniza.

        Para aprofundarmos o entendimento de como um projeto autoritário ganha força nos setores populares e de como isso faz com que fortaleça opressões históricas é preciso compreender a estrutura da hegemonia e sua retroalimentação ideológica para além da política formal, perpassando a mídia, a religião, a ciência, além dos diversos aparelhos ideológicos, instituições e ambientes importantes para a propagação e reprodução da cultura, inclusive o lócus de socialização primária. Quando aquilo que chamamos de “esquerda”, por diversas razões, perdeu espaço, abriu mão ou se equivocou na construção da contra-hegemonia, com táticas reformistas e/ou reproduzindo práticas de estranhamento no trato nas relações particulares, o vácuo possibilitou a ampliação avanço protofascista.

        Quando a crise do capital degrada a condição de vida das pessoas, o Estado busca tomar as rédeas para administrar a possibilidade das taxas de lucro de modo mais agressivo e a moral aparece como instrumento mistificador da realidade, engabelando possíveis resistências diante das questões essenciais e dirigindo olhares para a superfície. Por isso, as relações subjetivas, os espaços cotidianos de trabalho, assim como a família, os lugares coletivos onde buscamos fortalecer o espírito, as relações de amizade, entre outros afetos surgem com toda a violência possível, materializando em nossas vidas aquilo que se projeta, se propaga e se consolida no fascismo contemporâneo.

        A negação dos elementos que fundamentam a realidade frente aos fragmentos da cotidianidade se alastram na constituição individual em tempos de acirramento das contradições de classe. O sofrimento subjetivo busca o pensamento mágico, particularismos e esquivas diante do real. Nesse sentido, tanto conservadores quanto muitos daqueles que buscam desconstruí-lo desenvolvem suas manifestações de mistificação.

        No entanto, mesmo nos meandros da fantasia a realidade existe. Ela é inexorável, objetiva, concreta, complexa, cheia de determinações, se expressando no cotidiano irremediavelmente heterogêneo, imediato, fragmentado, insuprimível. A realidade se esconde e se revela sorrateira, surge com vendas em nossos olhos, nos permitindo conhecê-la parcialmente por nossas experiências. Ela se manifesta caleidoscópica, cumprindo suas armadilhas de sugerir-se inteira a partir das vivências particulares.

        Entre um ser humano inteiro e o inteiramente humano vamos dançando o baile entre nosso cotidiano e a realidade. Permanecemos passeando pelo que nos salta aos olhos, comumente sem conseguir ultrapassar o alcance da nossa visão, ainda com esforço, mesmo que pintemos esse espetáculo com os sentidos que queremos. A tarefa não é simples, sobretudo num tempo de confusão, onde o ar é pesado, as falas são duras e os laços frígidos.

        Buscando atalhos há quem acredite não haver o real, embora ele esteja lá, há quem acredite que o real é apenas aquilo que vive, ou ainda que é possível somente por ali conhecer todas as mediações que o constituem. Há também quem molde um real amplo para o seu particular, quem mergulhe nas buscas profundas, mas se afogue em seu próprio ar. O tempo da barbárie também é o tempo da vaidade e da ultrageneralização.

        Diante desses desafios tudo tende a ser reduzido ao binômio causa-consequência ou à falácia da impossibilidade. Criam-se mitos para dar sentido às percepções, referendam-se crenças nas mudanças singulares ou nas respostas microscópicas ou ainda naquelas que são supostamente amplas. Por outro lado, se confunde universalidade com totalidade, jogam as apostas nas mudanças de sentido e significado, blefam na dinâmica da imediaticidade rivalizando, fulanizando, umbiguizando as coisas.

        Nesse jogo, nessa dança, nesses olhares, a busca pela trajetória mais difícil tem sucumbido, perdido ressonância, vivido um descompasso. O temor é que não haja mais tempo nem espaço para se aprofundar. Que seja realmente o espetáculo do maniqueísmo, da dieta da consciência aparentemente radical, temperada com hedonismo ou individualismo, com moralismo ou fatalismo, com as tintas e cores moribundas e verossímeis, mas perecíveis. O temor subjetivo é que seja isso tudo nosso espectro do tão pouco.

        O desespero e o desamparo constitui sujeitos armados de metralhadoras giratórias, vociferando o não-diálogo, ampliando o irracionalismo e abstraindo que aquilo que aparece como fórmula mágica para a resolução de problemas políticos viola seus comuns. Para quem sofre com as opressões e com a possibilidade direta de perda de direitos, aquilo que é aparentemente uma opinião divergente é, na verdade, pura reprodução de desigualdade, risco iminente.

        A violência física e simbólica, aparente nos números oficiais, obscurecida nas percentagens oficiosas e tão relativizadas em tempos sombrios atinge cada vez mais os setores que sempre estiveram às margens das mínimas garantias da emancipação política do Estado democrático de direito. Mais que atiradores de elite, o medo social, aliado ao moralismo e catalisado pelo fundamentalismo religioso se funde à seletividade do judiciário e a criminalização midiática para multiplicar atiradores da elite. Com as desculpas fundamentadas e capilarizadas, sem o devido contraponto estabelecido, essa forma de violência funde com ferro e fogo nas marcas da sociabilidade cotidiana da classe trabalhadora brasileira para garantir um cotidiano paramilitar. O baile de máscaras entoa o canto da serpente fascista para multiplicar ódios, rancores e afogar qualquer luta emancipatória.

        Entre os eleitores de Bolsonaro existem os que organizadamente militam pela potencialização dos preconceitos e da discriminação, no entanto, há também os que são tomados pelo saudosismo mistificador, que se veste com o moralismo reacionário para acalentar uma suposta reestruturação da sociedade, deslocando tudo isso da política e fingindo que isso trará atenuantes às expressões da questão social.         Essa direção ganha contornos absurdos para um país que nunca efetivou a laicidade do Estado, não amadureceu a democracia e não enfrentou sua tradição autoritária, patriarcal, racista e machista. Os sujeitos querem resoluções imediatas, buscam um discurso seguro, absorvem a tragédia e a farsa bonapartista pela sua carência de projeto coletivo e qualquer simbologia que dê uma direção que pareça diferente do vento que nos carrega, ainda que seja apenas um sopro mais forte para o caos, é uma aposta a se fazer.

        Para esses sujeitos, há uma abstração do cotidiano, o moralismo é percebido como mero discurso, com materialização distante de seus comuns, algo no campo das ideias e, ainda que sejam capazes de refletir sobre discursos violentos, preferem fechar os olhos para o óbvio e apostar que o discurso de ódio seja exagero, efeito colateral de uma proposta de ordem e progresso. Assim, submersos nas turvas águas das fake news, de discursos de pastores inescrupulosos e de bravatas de asseclas da econometria, abstraem que amigos/as, filhos/as, tios/as que pensam diferente ou que simplesmente existam, sejam nordestinos/as, negros/as, LGBT´s, mulheres estarão sofrendo ainda mais riscos dentro do protofascismo legitimado.

        Quando o moralismo e a violência simbólica não são somente abstrações que potencializam o aumento das estatísticas, mas aparecem entre nós, nos grupos de whatsapp, nas reuniões de família, nas relações mais prosaicas, ainda que saibamos as razões, criamos a expectativa, pela famosa empatia, de um processo mínimo de identificação e sensibilidade. Desejamos a compreensão, ainda que limitada, de que a ferida aberta e cutucada por tudo aquilo que virou moda possa ser entendida como a propagação de uma ideologia capaz de estruturar coisas que farão sangrar seus semelhantes. O sofrimento se amplia quando percebemos que isso tende a não ocorrer.

        O (des)afeto dentro desses grupos, por sua própria estrutura conservadora, acaba por cavar buracos ainda mais profundos, desavergonham os preconceitos, retiram laços, enchem os espaços de perversidade diante do diferente. O tempo do protofascismo se constitui também pelo mascaramento da realidade e desmascaramento de violências entre as pessoas próximas, onde o ódio ou a indiferença crescem ao som da trilha sonora da crueldade, do relativismo, do desdém oriundo dos discursos de autoridade que consideram tudo coitadismo.

        No livro os “Sofrimentos do Homem Burguês”, Leandro Konder reflete sobre nós, aqueles do tipo humano da sociedade burguesa, seres ontologicamente sociais, que transcendem e potencializam sua individualidade por via da coletividade, que criam possibilidade pela diversidade através da nossa capacidade de fazer história, mas que, numa sociedade fundada na apropriação das coisas e das pessoas, buscamos (e não encontramos) essa essência em coletividades estranhadas, em relações alienadas e alienantes e, assim, o autor reflete como nossos arranjos e relações familiares e toda sua carga histórica são passíveis de naturalização de opressões, como nossas religiões mistificam o mundo concreto, normalizam o hegemônico e moralizam a diferença, como a mídia rebaixa tudo em mercadoria, como a história é vista apenas como passado e não como possibilidade concreta de construirmos o presente e o futuro.

        Numa reprodução hegemônica do discurso de que democracia é a ditadura da maioria e não a convivência da diversidade de pensamento, onde os valores moralistas circulam sempre nas práticas políticas, onde público e privado sempre se confundiram, onde combater privilégios e a intolerância foi e é visto como ataque aos direitos, numa sociedade absolutamente perversa e que amorteceu possibilidades amplas de construções coletivas com sentido, o cotidiano, espaço privilegiado de naturalização daquilo que é construído socialmente, apura seu caráter mistificador, imediatista, heterogêneo, capaz de negar qualquer lógica, racionalidade e elementos da realidade.

        Assim, o descolamento do real é característica do nosso tempo. Não importa se o sujeito que diz que “odeia o pecado, mas ama o pecador” defende líderes políticos que potencializam crimes de ódio, se defende a vida e, ao mesmo tempo, a tortura, se estuda para concursos públicos e milita para o fim dos mesmos, se sonha com educação para seus filhos e aprofunda a desconstrução dela como direito, se é contra a corrupção e a mentira, mas desconsidera as práticas corruptas de seus mitos diante da necessidade de vencer o inimigo. Não importa o real, as evidências e tudo aquilo que aponta a direção que estamos seguindo, a ideia de que é preciso mudar, ainda que para pior, constitui o sadomasoquismo social do “sofrimento do homem burguês” e negar a realidade faz parte disso.

        Tudo aquilo que produziu a possibilidade real de hegemonia do protofascismo constituiu também subjetividades dilaceradas, visões opacas diante do outro, relações ainda mais coisificadas. O discurso pautado no mito de dois extremos quando, na realidade, só há um, aquele da violência sob todas as formas, amplia no cotidiano as atitudes de poder e desvalor sobre as pessoas tidas como “não-normais” e, portanto, compreendidas como menos humanas. A apatia ou a agressividade diante do caos cotidiano, ação desmedida, desenfreada, sem projeto coletivo ou sobreposta de pura reprodução das opressões atinge em cheio nossas subjetividades.

        A insensibilidade diante do fato que poderemos perder o emprego ou nunca ter um, que poderemos ser “varridos”, agredidos, violentados, presos ou mortos nos afeta quando vem como discurso personificado por aqueles que nos conhecem e sabem que não somos uma caricatura. A desumanização é ainda mais devastadora quando vem daqueles que nutrimos afetos, que construímos projetos ou histórias e que, ainda assim, não são capazes de perceber que o discurso que reproduzem afeta a vida concreta daqueles que dizem amar. A profusão de um sentimento reificado se constitui mútuo, mas a decepção e o sofrimento aparecerão muito mais do lado de quem é coisificado.

        Diante de rupturas particulares em relações tão caras, diante de posicionamentos tão duros e irresponsáveis com aquele/as que dizem nutrir afeto, num tempo histórico onde nossa emoção é estranhada e o irracionalismo toma de conta atingimos a agudização do individualismo. Ele vem fantasiado de preocupação com o futuro, de conversão religiosa, de afeto familiar, de amizade, mas sempre traz na mão o punhal das opressões e a bainha do preconceito.

        Precisamos reinventar coletivos com sentido, necessitamos construir tanto a resistência objetiva quanto a subjetiva. Elas caminharão juntas. Até as coisas se revelarem, até conseguirmos suspender o cotidiano, até demonstrarmos todas as determinações que nos levaram ao protofascismo muito sofrimento se aprofundará. Nenhum espaço de nossa vida pode ser desprezado na luta contra reprodução da exploração, da violência e das opressões. Construir formas de disputa no campo dos valores, apreendendo a vida concreta e a cultura dos setores populares para um projeto emancipatório é fundamental. Para isso precisaremos pleitear novos valores em todos os âmbitos de socialização e também exercitar formas de autocuidado.

        Os espaços onde nos encontramos, onde socializamos nossas angustias, medos e vontades, onde apreendemos que essas experiências são constituídas historicamente, onde desnaturalizamos as coisas e mostrando possibilidades para outra sociabilidade, onde potencializamos as respostas coletivas podem nos fortalecer enquanto indivíduos e nos ajudar na construção de relações mais profundas.

        Na exacerbação da forma mais grave da sociabilidade capitalista a reprodução do protofascismo exigirá de nós a necessária construção coletiva, a paciência histórica e o exercício da lucidez. Entre as estratégias e as táticas, entre as reuniões e os atos, entre sofrimentos, desapontamentos e desafetos, entre a necessária resistência e a vida cotidiana haverão ainda mais desafios. O exercício de diálogo, de enxergar as pessoas, de construir relações para visibilizar nossa humanidade nos outros será também rebeldia em tempos de cólera. O desafio é enorme pois não haverá relações com sentido numa sociedade sem sentido.

 

Quinta, 25 Outubro 2018 09:34

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Domingo (28/10), longe das opções singelas entre “Ou Isto ou Aquilo”, inseridas em um “poema infantil” de Cecília Meireles, os brasileiros elegerão o novo presidente; em princípio, para quatro anos. “Em princípio”, pois é certo o futuro incerto.

Dos mais recentes discursos e acontecimentos sabidos, destaco o vídeo em que Eduardo Bolsonaro – filho do “capitão” Jair – admite estarmos caminhando a um “estado de exceção”. Para ele, o STF poderia, a qualquer momento, ser fechado “por um simples cabo e um soldado”, sem sequer precisar “de jipe”.

Estarrecedora declaração.

Pior: o estarrecimento deve ser redimensionado, pois esse filho de Bolsonaro teve a maior votação que um deputado já pode ter em nossa história republicana.

Feito o registro daquela aberração, seguida de inaceitáveis desculpas, tanto do pai, quanto do filho, a realidade é que tais criaturas – em nome da Tradição, Família e Propriedade, tendo “Deus acima de todos”, é que, conforme as últimas pesquisas – deverão conduzir os rumos de nosso país.

Céus! A que ponto descemos!

Mas, agora que a “Inês já é morta”, melhor do que o desespero, seria didático para todos nós, defensores da democracia, entendermos os motivos pelos quais a esse ponto chegamos; afinal, é indiscutível que manifestações conservadoras e protofacistas possam surgir do nada.

Logo, se tal situação não vem do nada, por que a maioria de nosso povo está dando aval a um candidato com os mais profundos vínculos com o militarismo? Como faremos para sobreviver ao que poderá vir?

Partindo das indagações acima, é possível que leitores possam avaliar que antes de pensar sobre isso, o ideal seria, em nome de salvar o regime democrático, fechar os olhos e tapar o nariz para a história recentíssima do país e acatar a chantagem do “voto crítico” em Haddad.

Infelizmente, divergindo de amigos tão caros, não reflexiono em cima de cadáveres. Repito, hoje, a “Inês já é morta”. E foi “morta” – antes de outras quaisquer – pelas ações do PT, que insistiu em errar, deixando-nos num beco sem saídas, a não ser voltar a seus próprios subterrâneos políticos, ainda que a volta seja estratégica e momentânea, dado o esforço que isso exige de tantos, inclusive de filhos pródigos do Partido. 

Mas a propósito: quem “mata Inês” pode salvar a democracia?

Convenhamos. A derrota do PT era previsão dada. Sem Lula, o Partido perderia o segundo turno, fosse a quem fosse. Bolsonaro, idem, desde que não disputasse com o PT. Portanto, se todos sabiam disso, tínhamos saídas, mas todas foram inviabilizadas pelo PT. Agora, a reversão desse quadro seria enorme surpresa.

Por que?

Porque “nunca antes na história...” o “antipetismo” foi tão forte. Por isso, não leu os rumos que a rua foi tomando quem não quis. E quem não quis, apostou no escuro.

Agora, imersos ao desespero, seria interessante desvendar os porquês de não terem lido as evidências.

Arrisco a dizer que muito do estrago feito à nossa democracia se deu por conta dos caprichos do “comandante” preso, que apostou em si até o limite. Depois, acreditou que passaria sua herança política a alguém. Não fosse isso, nossa democracia não correria o risco que corre; não da forma como corre. Ninguém seria obrigado a se juntar a uma “organização criminosa” travestida de partido.

Por fim, antes que o futuro sombrio chegue de fato, é prudente, desde agora, a quem puder, “já ir” pensando em saídas, pois, para nós, o sinal poderá se fechar de repente, não mais do que de repente.

Que tristeza.

Quarta, 24 Outubro 2018 17:46

 

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Por Vicente Machado Ávila
  

Deixem o povo votar, exercer seu livre arbítrio. É assim que quer o Papa Francisco.

Não transforme sua Igreja em um palco de RINGUE

Preguem o amor, a paz e a democracia. É assim que queria o pastor Martin Luther KING.

Deixem o povo votar, livremente escolher, caminhar, rezar e sonhar.

É assim que queria a Madre Teresa de Calcutá.

Deixem o povo votar, livremente sem raiva e sem medo.

Não faça da sua missão uma ferramenta do voto de cabresto.


Professor Vicente Ávila
Colaboradoras
Professoras Enelinda Escala e Acadêmica de Direito Silvia Melo

 

Terça, 23 Outubro 2018 15:28

 

A conjuntura política na qual o Brasil está inserido tem deixado boa parte da população inquieta e preocupada com o aumento da violência, muito relacionada ao processo eleitoral. Os ataques são direcionados a manifestações de ideias divergentes, e já resultaram em agressões físicas e até homicídios. Por esse motivo, a Adufmat-Seção Sindical do ANDES-SN convocou todos os interessados para o debate “Tempos Sombrios, Tempos de Intolerância”, realizado na última sexta-feira, 19/10, que mobilizou dezenas de pessoas ansiosas para entender os motivos de tanta brutalidade.       

 

A mediadora da mesa, professora Lélica Lacerda, recepcionou os presentes afirmando que o encontro teve como objetivo o debate, mas também o fortalecimento dos laços e a organização dos trabalhadores na defesa dos direitos sociais e liberdades democráticas. “É importante ver esse auditório tão cheio, perceber que os anseios de todos nós, de alguma forma, nos une nesse momento”, disse a docente, apresentando a proposta de movimentos sociais mais próximos ao sindicato de construir uma Rede de Apoio às Vítimas do Fascismo, discutida mais detalhadamente ao final no evento.   

 

 

O professor Cândido Moreira Rodrigues, do Instituto de Geografia, História e Documentação da Universidade Federal de Mato Grosso (IGHD/UFMT), convidado para explanar sobre a Ressurgência do Fascismo no Início do Século XXI, iniciou sua apresentação afirmando que tudo o que acontece atualmente no país já foi visto antes, e que historicamente as relações de intolerância emergem em momentos de fragilidade da democracia burguesa. “Uma democracia em que os cidadãos não exercitam seus direitos com frequência estará periodicamente sujeita ao desgaste. O fascismo ganha fôlego nos momentos em que o Liberalismo não atende mais as demandas da sociedade, a partir das décadas de 1920 e 1930”, disse o historiador.

 

Analisando os casos de ascensão do fascismo especialmente na Europa, o palestrante pontuou entre os elementos característicos desse movimento a proteção exacerbada da identidade nacional e aversão ao estrangeiro, retórica da ameaça comunista, a criação de movimentos sociais de extrema direita e enraizamento desses movimentos nos espaços de representação, a chegada ao poder – que nem sempre decorre de golpe, mas também pela via eleitoral, como Hitler, na Alemanha – e o próprio exercício do poder.

 

“Esse espaço representativo é preenchido quando os conservadores de centro cedem parte do seu poder à extrema direita, a partir de negociações que envolvam determinados interesses”, revelou o pesquisador. Ao mesmo tempo, entre a população, aumenta a desconfiança nos governos e nas instituições e nessas esferas representativas, os direitos e liberdades passam a ser relativizados, assim como os valores da razão se desgastam.

 

“Eu trouxe todo esse material para dizer a vocês que talvez não estejamos diante de um problema brasileiro, nem passageiro. Talvez o capitalismo esteja se deslocando da democracia ideal”, finalizou Rodrigues.

 

 

 

Em seguida, a cientista política, Alair Silveira, segunda debatedora da noite, iniciou sua análise, afirmando que as condições objetivas da atual conjuntura estão dadas e são captadas pelos movimentos organizados de trabalhadores, mas as subjetivas ainda escapam. “À exemplo de Gramsci, nós precisamos questionar a fundo por que, se o nosso projeto é o mais generoso, nós não conseguimos tocar as mentes o os corações das pessoas”, disse a professora do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS) da UFMT.

 

A docente criticou a ausência de memória brasileira sobre os horrores da ditadura militar, muitas vezes abafada pelo que ficou conhecido como “milagre econômico”. Silveira também alertou para o processo de desmonte da Constituição de 1988, a partir da implementação do projeto Neoliberal, por Fernando Collor de Mello. Junto a reestruturação produtiva, a queda do Muro de Berlim e a consolidação da cultura pós-moderna, esses elementos provocaram, aos poucos, a desmobilização da população que lutou pela abertura política nos anos anteriores.  

 

Para Silveira, as manifestações de 2013, no entanto, indicaram insatisfação da população justamente com o desmonte dos direitos sociais. “Vocês se lembram que os manifestantes erguiam cartazes reivindicando educação e saúde padrão Fifa? Eles sabiam o que não queriam, mas não exatamente o que queriam. Sem saber, disseram não ao Neoliberalismo”, afirmou.

 

Ao mesmo tempo, a convulsão social registrada em 2013 já lançava embriões da intolerância, com o repúdio aos partidos políticos e manifestações xenofóbicas contra estrangeiros que participavam, por exemplo, do Programa Mais Médicos. Esses sentimentos foram capitaneados por grupos políticos que conseguiram formar as legislaturas mais conservadoras da história do país em 2014 e 2018, e poderá eleger, também no pleito de 2018, um presidente da República com as mesmas características.

 

“Esse processo de desestabilização está bastante presente na América Latina, de modo geral, com os mesmos fundamentos, e a mesma estrutura, envolvendo sempre questões de fundo moral”, acrescentou a docente.

 

As universidades, segundo a pesquisadora, contribuíram com esse processo e foram afetadas igualmente por ele. “Tudo isso foi construído socialmente, inclusive dentro da universidade, no processo de formação do imaginário social. Mas de 2016 a 2018, além do contingenciamento econômico, as instituições de ensino superior sofreram também ataques políticos, interna e externamente. Eu fiz um levantamento e já registrei dezenas de processos administrativos e até pedidos de demissões com justificativas absurdas, como improdutividade, utilização de referencial teórico marxista, e até por participação em publicações ou lançamentos de livros. Um desrespeito absoluto às particularidades do trabalho do professor e pesquisador”, denunciou a palestrante.

 

Por fim, a professora retomou o questionamento inicial, de Antonio Gramsci. “Nós já estamos vivenciando um período duro, que provavelmente será ratificado pelas urnas. As condições objetivas estão dadas, mas estamos atrás com relação às subjetivas. A questão que nos desafia é como construir um canal para disputar a hegemonia, no sentido de que os trabalhadores identifiquem o projeto que realmente os representa, e assuma esse projeto como seu”, provocou a convidada.  

 

Rede de Apoio às Vítimas do Fascismo

 

Como anunciado de início, ainda diante da plateia lotada, o professor Aldi Nestor apresentou a proposta de movimentos sociais para formação de uma Rede de Apoio às Vítimas do Fascismo. Na ocasião, alguns dos casos já registrados em Cuiabá e Mato Grosso foram relatados pelo docente.

 

Além de acolher as vítimas, a Rede será responsável por orientar juridicamente, exercer pressão sob o Poder Público exigindo providências, e formar comunicadores para denunciar e dialogar com a população em geral.

 

 

 

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind  

 

Terça, 23 Outubro 2018 15:28

 

A conjuntura política na qual o Brasil está inserido tem deixado boa parte da população inquieta e preocupada com o aumento da violência, muito relacionada ao processo eleitoral. Os ataques são direcionados a manifestações de ideias divergentes, e já resultaram em agressões físicas e até homicídios. Por esse motivo, a Adufmat-Seção Sindical do ANDES-SN convocou todos os interessados para o debate “Tempos Sombrios, Tempos de Intolerância”, realizado na última sexta-feira, 19/10, que mobilizou dezenas de pessoas ansiosas para entender os motivos de tanta brutalidade.       

 

A mediadora da mesa, professora Lélica Lacerda, recepcionou os presentes afirmando que o encontro teve como objetivo o debate, mas também o fortalecimento dos laços e a organização dos trabalhadores na defesa dos direitos sociais e liberdades democráticas. “É importante ver esse auditório tão cheio, perceber que os anseios de todos nós, de alguma forma, nos une nesse momento”, disse a docente, apresentando a proposta de movimentos sociais mais próximos ao sindicato de construir uma Rede de Apoio às Vítimas do Fascismo, discutida mais detalhadamente ao final no evento.   

 

 

O professor Cândido Moreira Rodrigues, do Instituto de Geografia, História e Documentação da Universidade Federal de Mato Grosso (IGHD/UFMT), convidado para explanar sobre a Ressurgência do Fascismo no Início do Século XXI, iniciou sua apresentação afirmando que tudo o que acontece atualmente no país já foi visto antes, e que historicamente as relações de intolerância emergem em momentos de fragilidade da democracia burguesa. “Uma democracia em que os cidadãos não exercitam seus direitos com frequência estará periodicamente sujeita ao desgaste. O fascismo ganha fôlego nos momentos em que o Liberalismo não atende mais as demandas da sociedade, a partir das décadas de 1920 e 1930”, disse o historiador.

 

Analisando os casos de ascensão do fascismo especialmente na Europa, o palestrante pontuou entre os elementos característicos desse movimento a proteção exacerbada da identidade nacional e aversão ao estrangeiro, retórica da ameaça comunista, a criação de movimentos sociais de extrema direita e enraizamento desses movimentos nos espaços de representação, a chegada ao poder – que nem sempre decorre de golpe, mas também pela via eleitoral, como Hitler, na Alemanha – e o próprio exercício do poder.

 

“Esse espaço representativo é preenchido quando os conservadores de centro cedem parte do seu poder à extrema direita, a partir de negociações que envolvam determinados interesses”, revelou o pesquisador. Ao mesmo tempo, entre a população, aumenta a desconfiança nos governos e nas instituições e nessas esferas representativas, os direitos e liberdades passam a ser relativizados, assim como os valores da razão se desgastam.

 

“Eu trouxe todo esse material para dizer a vocês que talvez não estejamos diante de um problema brasileiro, nem passageiro. Talvez o capitalismo esteja se deslocando da democracia ideal”, finalizou Rodrigues.

 

Em seguida, a cientista política, Alair Silveira, segunda debatedora da noite, iniciou sua análise, afirmando que as condições objetivas da atual conjuntura estão dadas e são captadas pelos movimentos organizados de trabalhadores, mas as subjetivas ainda escapam. “À exemplo de Gramsci, nós precisamos questionar a fundo por que, se o nosso projeto é o mais generoso, nós não conseguimos tocar as mentes o os corações das pessoas”, disse a professora do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS) da UFMT.

 

A docente criticou a ausência de memória brasileira sobre os horrores da ditadura militar, muitas vezes abafada pelo que ficou conhecido como “milagre econômico”. Silveira também alertou para o processo de desmonte da Constituição de 1988, a partir da implementação do projeto Neoliberal, por Fernando Collor de Mello. Junto a reestruturação produtiva, a queda do Muro de Berlim e a consolidação da cultura pós-moderna, esses elementos provocaram, aos poucos, a desmobilização da população que lutou pela abertura política nos anos anteriores.  

 

Para Silveira, as manifestações de 2013, no entanto, indicaram insatisfação da população justamente com o desmonte dos direitos sociais. “Vocês se lembram que os manifestantes erguiam cartazes reivindicando educação e saúde padrão Fifa? Eles sabiam o que não queriam, mas não exatamente o que queriam. Sem saber, disseram não ao Neoliberalismo”, afirmou.

 

Ao mesmo tempo, a convulsão social registrada em 2013 já lançava embriões da intolerância, com o repúdio aos partidos políticos e manifestações xenofóbicas contra estrangeiros que participavam, por exemplo, do Programa Mais Médicos. Esses sentimentos foram capitaneados por grupos políticos que conseguiram formar as legislaturas mais conservadoras da história do país em 2014 e 2018, e poderá eleger, também no pleito de 2018, um presidente da República com as mesmas características.

 

“Esse processo de desestabilização está bastante presente na América Latina, de modo geral, com os mesmos fundamentos, e a mesma estrutura, envolvendo sempre questões de fundo moral”, acrescentou a docente.

 

As universidades, segundo a pesquisadora, contribuíram com esse processo e foram afetadas igualmente por ele. “Tudo isso foi construído socialmente, inclusive dentro da universidade, no processo de formação do imaginário social. Mas de 2016 a 2018, além do contingenciamento econômico, as instituições de ensino superior sofreram também ataques políticos, interna e externamente. Eu fiz um levantamento e já registrei dezenas de processos administrativos e até pedidos de demissões com justificativas absurdas, como improdutividade, utilização de referencial teórico marxista, e até por participação em publicações ou lançamentos de livros. Um desrespeito absoluto às particularidades do trabalho do professor e pesquisador”, denunciou a palestrante.

 

Por fim, a professora retomou o questionamento inicial, de Antonio Gramsci. “Nós já estamos vivenciando um período duro, que provavelmente será ratificado pelas urnas. As condições objetivas estão dadas, mas estamos atrás com relação às subjetivas. A questão que nos desafia é como construir um canal para disputar a hegemonia, no sentido de que os trabalhadores identifiquem o projeto que realmente os representa, e assuma esse projeto como seu”, provocou a convidada.  

 

Rede de Apoio às Vítimas do Fascismo

 

Como anunciado de início, ainda diante da plateia lotada, o professor Aldi Nestor apresentou a proposta de movimentos sociais para formação de uma Rede de Apoio às Vítimas do Fascismo. Na ocasião, alguns dos casos já registrados em Cuiabá e Mato Grosso foram relatados pelo docente.

 

Além de acolher as vítimas, a Rede será responsável por orientar juridicamente, exercer pressão sob o Poder Público exigindo providências, e formar comunicadores para denunciar e dialogar com a população em geral.

 

 

 

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind  

 

Terça, 23 Outubro 2018 10:51

 

 

            Vivemos tempos sombrios, cuja memória nos remete aos anos de chumbo, quando proibir era o verbo mais usado. Tempos em que ao invés do embate político, havia a tortura nos porões. Tempos em o direito de divergir era calado pelo medo, e que o espaço da liberdade pública (imprescindível à política) inexistia. Tempos em que a liberdade de aprender e ensinar se limitava à disciplina de Moral e Cívica. Tempos em que as universidades viram seus livros confiscados e/ou queimados, e seus professores, estudantes e técnicos perseguidos. Tempos em que a força das armas impunha-se à força dos argumentos.

Tempos em que a ADUFMAT, fundada em 05/12/1978, presenciou sua Primeira Diretoria sofrer intervenção, quando seus diretores foram destituídos dos cargos, e uma Junta Governativa assumiu a partir de 20/11/1979. Tempos de demissão e de afastamento de docentes de seus cargos e de suas atividades. 

Esses tempos que esperávamos ter superado em meados da década de 1980, apresentam-se, agora, como alternativa eleitoral representativa do “novo” e do “diferente”. Um discurso cuja novidade está construída sobre os mais antigos discursos de ódio a todos aqueles que ousem ser e/ou pensar diferente. Como ‘novo’ somente o prefixo que antecede sua definição. Lamentavelmente, esse discurso neofacista tem inspirados as mais terríveis manifestações de ódio racista, LGBTfóbico, xenófobo, que avançam de ataques verbais a ataques físicos contra aqueles que assumem posições diferentes.

Diante desse quadro, cujas perspectivas remetem ao passado de chumbo que deve ser totalmente rechaçado, a Diretoria da ADUFMAT-S.Sind. do ANDES/SN vem a público manifestar-se integralmente em defesa da democracia, dos direitos humanos e sociais e da solidariedade social.

 

                                               Cuiabá/MT, 23 de outubro de 2018.

 

                                           ADUFMAT de Luta: Autônoma e Democrática

                                     Gestão 2017-2019

Terça, 23 Outubro 2018 08:45

 

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Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Roberto de Barros Freire*
 

A vitória de Bolsonaro é quase certa. Só não ocorrerá caso haja algo inusitado que condene o candidato, mas mesmo isso é muito difícil de acontecer, pois mesmo as coisas que desabonariam um candidato (ameaçar ex-esposa de morte, roubá-la, ou ter funcionários fantasmas no parlamento para trabalhar na sua casa de praia, ou dizeres racistas e ditatoriais que desabonam a maioria das pessoas) não colam no candidato. E devido ao desabono da imprensa iniciada e levada adiante por décadas pelo PT, fez com que jornais e televisões não sejam considerados confiáveis pelos bolsonaristas ou por grande parte das pessoas. Bolsonaristas acham que a imprensa está a favor do PT e os petistas acham que a imprensa está contrária a eles, e todos lançam suspeitas sobre a imprensa. Sem dúvida, Bolsonaro conta com a incompetência petista para se eleger.


A confiança do PT na força de Lula foi a única coisa que apresentaram nas eleições. Não se percebeu, desde 2013, a necessidade de se refundar o partido. Foi o antes inexpressivo Jair Bolsonaro quem conseguiu surfar a onda da revolta popular contra o sistema. Impulsionado pelas redes sociais, ele alavancou sua retórica incendiária para energizar cidadãos indignados com a promessa democrática frustrada. Sem partido e sem máquina, ficou livre para fazer um compromisso estridente com a mudança.


Criou um discurso por “lei e ordem”, que se fundamenta no pensamento que “segurança pública é assunto de polícia” e que percorre diferentes classes econômicas (com seus consequentes reflexos políticos), mas que estabelece um sentido convergente de eliminação do outro, seja pela morte, seja pelo depósito de vidas em presídios com precárias condições de vida, ao arrepio do Estado de Direito.


Muita gente no Brasil está cansada, por exemplo, de ser levada a pensar que debates ao redor do fenômeno “trans” sejam a pauta mais importante em termos de direitos humanos. Antes de tudo, a gente comum (que normalmente é casada e a mulher manda em casa, a fim de que a janta seja servida todos os dias) cansou de sentir que sua percepção de mundo é absurda, errada, reacionária, monstruosa, idiota ou cheia de ódio.


Para a maioria do eleitorado, como se depreende pelos 58% a 42% do Datafolha, ou do 59% a 41% do Ibope, o PT não oferece sonho, uma perspectiva de melhora que seja e nem sequer é um mal menor. Os 58%/59% preferem arriscar-se no desconhecido, no novo, mesmo que o novo tenha cara de velho, gosto de passado e cheiro de bolor.


O partido de Lula tem agora o ainda mais raro privilégio de renascer pela segunda vez. Só que desta vez vai sobreviver apenas se se mostrar maior do que é, se abrir mão de concentrar poder. Só renascerá se se apresentar como mero ponto de confluência de uma reconstrução institucional. Para isso, tem de convencer de que está à altura da gravidade do momento. Tem de dar garantias de que vai recolocar as instituições em novo e positivo patamar de funcionamento. Tem de convencer de que estará acima de seu próprio partido. Tem que provar que Haddad não é um fantoche de Lula.


Ou seja, será preciso uma autocrítica digna do nome e gestos políticos que demonstrem sua convicção pela democracia. Antes de tudo deve condenar o governo Dilma pela incompetência ao invés de ficar criticando a oposição pela sua derrocada. É preciso expulsar todos os condenados pela justiça do interior do partido, pois não há prova maior de apego à democracia do que se submeter às suas instituições. O PT até o momento só se contrapõe ao judiciário e ao ministério público, e mantém em seus quadros elementos já condenados, se contrapondo a lei. Um partido que não exclui dos seus quadros aqueles que a sociedade através de suas instituições condenaram, se contrapõe ao judiciário e se coloca acima das leis. A submissão à lei é prova de democracia, a contraposição é prova de tirania.


O chamamento a todos os democratas afirmando que o PT não tem restrição, dizendo que se as pessoas tiverem noção do que está em jogo no Brasil e defenderem a democracia, tem que estar nessa caminhada petista é de uma profunda petulância e arrogância. A causa democrática não precisa do toque do PT, é justo o contrário. A ideia segundo a qual o programa do PT precisa apenas de ajustes é suicida. A Haddad não restará a estratégia, agora muito tardia, de se desfazer do peso e do lastro indesejável dos exclusivismos petistas, que repeliram parte do eleitorado mais centrista e ameaçam derrubar precocemente o balão murcho de sua candidatura. O PT usou bastante essa arma, um traço que se agravou à medida que o partido passava por seu conhecido declínio ético ("nós contra eles", liberais rotulados de fascistas, campanha de desmoralização da imprensa etc.).


O fato é que o PT minou várias instituições democráticas, por exemplo, afirmando sempre para não se acreditar em nada que a mídia tradicional diga. Precisa aprender a criticar e a se autocriticar — algo exógeno à personalidade brasileira, que prefere rodeios condescendentes ou tons agressivos, delegando culpas aos outros.


O PT esperava que apoios de segundo turno se dessem pela lei da gravidade. Não entende de física, nem de política. O PT achava todo mundo que não fosse petista um canalha, golpista. A violência na política não está apenas no lado fascista, mas está do lado do populismo. Agora quer que todos se unam por ele, como? Não esqueçamos também que o mea-culpa do petismo demorou tanto que está se tornando desnecessário. Quando se insulta a direita liberal e/ou conservadora chamando-a de fascista, as pessoas não vão mais confiar nas eleições, vão questionar sua legitimidade.


É preciso um gesto aos demais partidos, cedendo lugar e poder aos partidos de centro e de direita, e não apenas cargos secundários aos partidos esquerdistas que se satisfazem com porcaria. É preciso incorporar políticas do PSDB, do MDB, da Rede, do PDT, mais do que apenas solicitar apoio. Terá grandeza para tanto? Duvido........

 
*Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Segunda, 22 Outubro 2018 16:25

 

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     O Brasil vive atualmente o acirramento da luta de classes, fruto do esgotamento das políticas de conciliação de classes, tempos de financeirização, de reestruturação produtiva e do neoliberalismo que são fenômenos de uma problemática determinante: a crise estrutural do capital. Dada esta conjuntura, não é surpresa que vivemos períodos de grandes retrocessos e conflitos políticos. Exemplos como golpe em Honduras em junho de 2009, a destituição de Fernando Lugo no Paraguai, a eleição do empresário Donald Trump nos Estados Unidos, o golpe de 2016 contra a Presidenta Dilma Rousseff, as consequências das privatizações no Chile, implementadas desde a ditadura militar há 45 anos e o esgotamento da democracia representativa são expressões das contradições oriundas do capitalismo.

       Diante da barbárie em curso, produzida pela crise do capital, do ajuste neoliberal que, no caso brasileiro, assume contornos mais graves com a ascensão do fascismo a ser legitimado nas urnas, o Serviço Social da UFMT, em assembleia realizada no dia 18 de outubro de 2018, às 10h nas dependências do ICHS, com a participação de professores, estudantes (graduação e pós-graduação em Política Social e Residência Multiprofissional) e profissionais vem a público expressar sua posição em favor da democracia, da defesa intransigente dos direitos humanos e sociais, o que diante do cenário atual não há como hesitar.

     A candidatura de Jair Bolsonaro e General Mourão representa tudo de mais retrógrado e conservador. Em 2012, Bolsonaro foi o único parlamentar que votou contra a Lei que estendia os direitos trabalhistas às empregadas domésticas; votou a favor do Impeachment fazendo reverência ao torturador Ustra; votou a favor da reforma trabalhista; declarou publicamente que os trabalhadores brasileiros terão que decidir entre “mais empregos ou mais direitos”; tem defendido a eliminação do 13° salário; afirma que os indígenas e quilombolas não terão “um centímetro de terra”; fez declarações abertamente racistas, lgbtfóbicas e machistas; defende a terceirização irrestrita e privatização de espaços e serviços públicos; bem como defende o desmonte do ensino superior público.

     O Projeto Ético Político do Serviço Social  que assenta-se na liberdade como seu valor central exige compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais, vinculando-se a um projeto societário de construção de uma nova ordem social, sem exploração/dominação de classe, etnia e gênero. Nesse sentido, assume a defesa da candidatura Haddad -13 por se apresentar como alternativa ao enfrentamento da barbárie em curso. Nos encontramos atualmente em um cenário muito semelhante ao de 1964, em que precisamos marcar posição e transformar o medo em ousadia tomando as ruas em defesa da democracia.


Em defesa das liberdades democráticas e contra a barbárie, Haddad  sim!!!

 
Esse é tempo de partido
Tempo de homens partidos.
Carlos Drummond de Andrade
 
 

Segunda, 22 Outubro 2018 09:17

 

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Encaminhado ao Espaço Aberto a pedido do Prof. Aldi Nestor de Souza
 

Neste momento de disputa política, o PET conexões: diferentes saberes e fazeres na UFMT vem a público manifestar a defesa incondicional da democracia; dos direitos humanos; dos direitos da classe trabalhadora e da universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada.

Aproveitamos a ocasião para manifestar nosso mais absoluto repúdio a qualquer forma de violência, levada a cabo por razões de intolerância e desrespeito à vida humana, e também a qualquer flerte  com formas totalitárias.

Entendemos também que não há espaço pra neutralidade em uma situação política, na qual a vida e os valores da dignidade humana estão colocados em disputa na sociedade.

Por essas razões o PET conexões: diferentes saberes e fazeres na UFMT se posiciona:

- Contra o autoritarismo e a violência política na vida cotidiana;

- Contra a criminalização dos movimentos populares e sociais;

- Pela imediata revogação da Emenda constitucional 95 ( PEC do teto dos gastos públicos);

- Pelo direito e respeito à diferença;

- Pelo reconhecimento dos direitos das mulheres, dos negros, dos quilombolas, dos indígenas e dos pobres em situação de vulnerabilidade social;

- Pelo reconhecimento do direito à livre orientação sexual e de gênero.

 
Cuiabá, MT, 18/10/2018

Segunda, 22 Outubro 2018 09:01

 

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Wescley Pinheiro
Professor do Departamento de Serviço Social da UFMT

 

É chegada a hora do eclipse da potência e do ato. O ovo foi chocado e a serpente está solta, sua pele não é mais a mesma e seu rastejar não precisa exatamente das estruturas corriqueiras. O veneno explode no cotidiano e se naturaliza na histórica repressão e no aprofundamento do estado penal-policial. Seu veneno vem de diversas formas, poderá ser mais forte a depender do sufrágio mas ele já é bebido por aí.

Ébrios de todo o ódio possível, o/a trabalhador/a objetifica a vida, coisifica relações, enxerga coisa em outro/a trabalhador/a, enxerga objeto no diferente, normaliza a desumanização e ataca a superfície diante da degradação da vida que somente sobrevive. Sem referências coletivas, sucumbido numa política que parou no moralismo e separou-se da realidade concreta ele perdeu a crença nos instrumentos de sua classe e a fé na sua própria humanidade, aposta tudo no nada, no discurso vazio de conteúdo, mas assertivo na forma. A cobra sabe gritar. A serpente sabe mentir, sabe acalentar desesperos e temperá-los com as desigualdades mais diversas que alimentamos por aí. A serpente se alimenta de medo.

O seu veneno e o seu rastejar perfuram pessoas, potencializam históricas opressões, dilapidam a racionalidade e cresce da inoperância da aparente oposição cibernética, performática, identitária. Enquanto o saudosismo reacionário romantiza os anos de chumbo, obscurece suas contradições, relativiza sua concretude, a abstração da maior parcela supostamente contra-hegemônica romantiza a resistência, fantasiando estratégias e táticas de um outro tempo ou mistificando sua política numa bolha culturalista, obscurecendo suas ações para um autoritarismo muito mais complexo! A cobra trocou de pele.
 
Para sabermos o que fazer é necessário saber onde estamos e para onde iremos nesse barco à deriva no mar de raiva e incoerência. Para sabermos o que fazer é importante entender como chegamos aqui, como alimentamos essa serpente e como seus ovos foram espalhados e chocados por aí. As difíceis perguntas respondidas com respostas simplistas tendem aos desvios. É fundamental questionarmos o óbvio: como uma importante parcela de nossa classe pode espontaneamente abrir mão da democracia e, pelo caminho “democrático”, defender a desestruturação das mínimas conquistas que atingiu?
 
É preciso nos perguntarmos mais: a conjuntura atual demonstra o esgotamento da emancipação política ou somente desvenda seus limites? Seria o Estado penal-policial o amadurecimento do estado capitalista? A violência que nos atinge e que parece nos perseguir em sua radicalização num futuro próximo se dará pelos mecanismos formais ou estamos pintando o inimigo olhando para o passado e não para o presente? Muitas perguntas e poucas respostas materiais. No entanto, há caminhos para entendermos tudo isso.
 
Compreendermos as raízes históricas do nosso país, sua modernização conservadora, seu processo de revolução burguesa pelo alto e o desenvolvimento dependente e combinado com o imperialismo é o primeiro passo. Refletirmos sobre nossa história recente e como reproduzimos nossa estrutura não sendo capazes de acertarmos as contas com a última ditadura que aqui se colocou, também é importante. Por fim, é fundamental perceber como potencializamos o avanço do conservadorismo ao perdermos a capacidade da disputa de hegemonia, fazendo algo que partisse da vida concreta dos sujeitos de nossa classe e que não caísse no pragmatismo do status quo.
 
Perpetua-se na imagem estereotipada do Brasil elementos curiosos de uma formação repleta de contradições. Seja em importantes episódios de sua história, na própria conjuntura atual ou mesmo nos valores culturais, a simbiose de diferentes setores sociais em suas negociações políticas, a permanência de pensamentos arcaicos sob roupagens modernas e, por fim, elementos do cotidiano de brasileiras e brasileiros explicitam o limiar de uma constituição social peculiar.
 
Os conhecidos sinais de cordialidade e alegria do povo brasileiro vêm acompanhados pela naturalização de contradições e incoerências: a propagada característica de um povo pacífico, oculta processos de autoritarismo das elites ante levantes populares, o famoso “jeitinho brasileiro” explicita estratégias de sobrevivência ante as desigualdades sociais e, ao mesmo tempo, a reprodução delas com a banalização do patrimonialismo e de tradições antidemocráticas.
 
O país do carnaval e da fé, do sagrado e do profano, do povo trabalhador e do mito da malandragem disfarça, em seus estereótipos, as cisões que se construíram a partir da processualidade histórica de uma nação formada como colônia de exploração, calcada na escravidão dos povos africanos, na matança dos povos originários, no desenvolvimento rural a partir da monocultura, na industrialização precária e atrasada, no desenvolvimento regional irregular e desproporcional, na construção da cultura com fortes elementos do patriarcado, do machismo e do racismo.
 
Essa estrutura fundamentará a questão social no Brasil perpetuando uma dimensão de classe muito mais complexa. É essa lógica que moralizará a questão social e irá patologizar comportamentos contra-hegemônicos, justificará o encarceramento e o extermínio de uma parcela da classe trabalhadora, objetificará corpos, naturalizará violências e mercantilizará tanto os sujeitos historicamente oprimidos como buscará capitular e mercantilizar suas resistências coletivas e individuais.
 
No entanto, o autoritarismo burguês não é somente uma particularidade brasileira ou latino-americana. Na crise estrutural do capital a tendência de universalização das práticas fascistizantes se asseveram. A ideia de uma característica antidemocrática como exceção da sociedade capitalista reproduz a visão dualista entre democracia x ditadura, coerção x consenso, quando, na verdade, dentro da história, o processo elástico da emancipação política conflui num processo de unidade de contrários, de continuidade na descontinuidade e no processo de pressão de classe que esbarra em limites estruturais desta sociedade. A dimensão autoritária da burguesia faz parte do seu amadurecimento político oriundo de sua consolidação com seus projeto de sociedade e sua hegemonia política.
 
O que se apresentou como novo imperialismo foi na verdade a manifestação atual dos mesmos fundamentos que determinaram o modelo imperialista de todo o modo capitalista enquanto totalidade, que não se furtou de abarcar as particularidades para explorar ainda mais parcelas da classe trabalhadora, a partir de questões de gênero, raça/etnia, cultural, política e geográfica arregimentando a acumulação dos países centrais e a possibilidade de reprodução do capital.
 
O fascismo clássico, radicalização do poder do estado burguês como alternativa violenta, explícita e evidente às crises do capital da época foi articulado por uma necessidade histórica que perdeu hegemonia frente ao keynesianismo-fordismo, mas que nunca morreu enquanto possibilidade, muito menos sufocou seus elementos ideológicos e, por fim, não impossibilitou que o autoritarismo e a agressividade com os oprimidos permanecesse nos países democráticos no pós-guerra.
 
O fascismo contemporâneo revela nuances importantes que manifestam a agudização do papel do estado para o capitalismo destrutivo, que consolida a minimização para os direitos e políticas sociais e a maximalização para a repressão à resistência coletiva e estruturação do lucro do capital, seja pelo financiamento direto com o fundo público, seja como base estruturada para ampliação da mais valia absoluta e relativa. Ovo da serpente multiplica formas clássicas, mas também convive com as novas características do capital.
 
Há outros elementos importantes. A diluição das práticas autoritárias vão para além da estrutura formal do Estado. O binômio força-consenso se faz presente no cotidiano. O veneno se espalha na violência autorizada contra a diferença e a divergência. Não precisamos de um golpe clássico para que ela ocorra. A trágica forma limitada da democracia representativa e as distorções potencializadas pela mídia, pelo fundamentalismo religioso e pelo mercado já carregam de bandeja uma consciência coletiva reificada que legitima o autoritarismo. As forças armadas não precisam de Ato Institucional, podem marchar por aí para combater o tráfico de drogas, o crime organizado e, sem quebrar a institucionalidade, fazer uso da lei anti-terrorismo que foi aprovada dentro dos trâmites do estado democrático de direito.
 
E fica pior. A serpente do fascismo não tem seu principal exército no estado, o para-militarismo é e será a tônica principal! O problema maior não é “o guarda da esquina”, mas o vizinho, o colega de trabalho, o desconhecido que te olha na rua. A autorização da violência potencializará milícias, autorizadas pelo clima construído, pela inoperância e permissividade dos homens de toga, pela potência incoerente, mas imponente da grande parcela dos pastores inescrupulosos e do sensacionalismo midiático com sede de dinheiro, poder e ódio.
 
O agravamento da repressão virá com o armamento desmedido da lógica obscura, abjeta e objetificada de uma elite historicamente autoritária, de uma classe média rancorosa, e, de modo informal ou ilícito, de uma parcela da classe trabalhadora despolitizada, que reproduz o desencanto com a coletividade e se encontra em coletivos alienantes e alienados, que servirão de ponta de lança do capital, do genocídio da juventude negra, do feminicídio, da LGBTfobia, da xenofobia interna e externa e da morte quem buscar defender as liberdades democráticas, falseada pelo moralismo como defesa do comunismo ou como exclusividade da esquerda.
 
Contra a serpente não há para onde correr. Não há exílio. O levante autoritário é internacional. A particularidade brasileira é perversa, no entanto, o crescimento da barbárie é evidente e incendeia na “guerra ao terror”, na tragédia dos refugiados, na potencialidade da xenofobia e na divisão despolitizada de uma classe trabalhadora que vê o capital mundializado, o alto desenvolvimento das forças produtivas, a constituição de novas formas de exploração, mas que naturaliza tudo isso e quando as coisas se agravam e, no seu cotidiano, só enxergam inimigos tão próximos quanto falsos.
 
Quando naturalizamos o possibilismo, quando fingimos que a saída eleitoral é a única possível, quando perpetuamos a lógica do fim da história, quando abandonamos o trabalho de base, deixamos de disputar os espaços da cultura do povo, quando apontando somente reparos e não uma lógica emancipatória, deixamos espaço para o fascismo tomar de conta, aparecer como o encanto da sua serpente dizendo que remediará os problemas da contradição capital-trabalho pela força.
 
Quando o reformismo tardio e requentado apontou sua institucionalização forjada nas regras do jogo das elites e saiu das periferias, voltando somente com as políticas sociais do Banco Mundial, consolidou um artifício que não se sustentaria por muito tempo diante da crise iminente. Quando a lógica da política pós-moderna abstraiu a vida das pessoas e ofereceu apenas o campeonato das opressões e a caricatura de disputas privilégios, sem pensar a lógica interseccional e consubstancializada, perdeu força diante da potência moralista de nossas raízes históricas. Quando os coletivos autônomos e classistas sucumbiram em pequenos focos de resistência, distantes também da vida cotidiana, dos aparelhos ideológicos, da cultura e das bases populares, deixamos lacunas ocupadas por aqueles que tem fórmulas mágicas, discurso fácil e o vazio que cabe toda forma de opressão.
 
Enquanto se jogava para debaixo do tapete às contradições do “pacto social”, da “conciliação”, da coalização com sujeitos individuais e coletivos representantes do capital, se abandonava a capacidade de organização, de formação e de aprofundamento de uma cultura contra-hegemônica nos setores populares e se caçava de forma cruel e efetiva qualquer crítica séria.
 
Achar que as diversas expressões conservadoras e protofascistas surgem do nada, voltam de modo anacrônico ou por meio de devaneios faz parte de uma lógica que quer continuar crendo no jogo marcado da estrutura social vigente. Não estamos voltando para a idade média, isso é capitalismo, isso é decadência ideológica da burguesia, isso é a reprodução social buscando saídas dentro de uma crise estrutural e as caricaturas expressas em Temer´s, Bolsonaros, Dórias e afins são assustadoramente do nosso tempo, o tempo da barbárie. Não nos esqueçamos que o combate aos golpistas, aos fascistas, aos autoritários que estão no poder ou que almejam o poder passará necessariamente por quebrar a lógica atual e isso não se fará com atalhos.
 
Quando potência e ato se unem na língua da serpente a violência se exacerba e as possibilidades mais irracionalistas se consolidam. Explicitar a responsabilidade de cada força política que age em nossa sociedade para que tenhamos chegado até esse ponto é importante, colocar nossos desafios, idem. Isso não se remete em sermos irresponsáveis, abrindo mão de uma unidade imediata com todos os setores democráticos do país, sejam eles liberais e/ou reformistas. Não há como se abster: na agudez do tempo histórico não podemos titubear na tarefa frente as eleições presidenciais. Barrar a legitimação do fascismo é fundamental e qualquer posição abstrata, seja ela sectária ou moralista é perder o chão da história.
 
No plano mediato precisaremos conquistar corações e mentes frente ao (desen)canto da serpente, nos posicionando nos nossos espaços coletivos, ampliando as estratégias e táticas de autocuidado, endurecendo sem perder a ternura, cultivando lucidez frente a barbárie e reaprendendo à disputa de consciências.
 
A serpente está viva. Para além da tragédia das urnas ela continuará rastejando e o que temos pela frente serão anos de ascensão da violência. Enquanto transformam os instrumentos de luta da classe trabalhadora (sindicatos, partidos, etc) em palanques para promoções privadas, espalha-se ainda mais o seu veneno: o recrudescimento do conservadorismo e os riscos da instauração de um governo autoritário militarizado e também paramilitar.
 
Precisamos frear o fascismo nas urnas e esgotá-lo nas ruas. A regressão de direitos exige dos sujeitos coletivos comprometidos com a emancipação humana uma visão certeira, madura e estrategicamente firme dos limites da emancipação política, sem reducionismos e sectarismos, mas sem cair na condescendência minimalista e naturalizadora da reprodução do binômio exploração-opressão.
 
A serpente rastejará por dentro e por fora do estado. O veneno será bebido por todos os lugares. Aquilo que já era regra contra a classe trabalhadora empobrecida, negra, moradora da periferia e que também se expressava publicamente contra os setores autônomos, combativos e organizados contra o desmonte dos direitos hoje galopa de modo evidente, mais profundo, violento e apressado para dilapidar tudo e todos.
Qualquer alternativa que não busque o difícil, tortuoso, complexo e fundamental caminho para uma ruptura com a essência disso tudo será apenas a perpetuação do mesmo. Um dia chega o vendaval e a poeira sob o tapete vem para os nossos olhos. A serpente tem medo da verdade e seus ovos apodrecem com a força coletiva, por isso não há outro caminho que não seja o da luta emancipatória.