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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*

 

“Hoje vivemos em imensas cidades que se mostram modernas, orgulhosas e até vaidosas. Cidades – orgulhosas de sua revolução tecnológica e digital – que oferecem inumeráveis prazeres e bem-estar para uma minoria feliz..., porém negam o teto a milhares de vizinhos e irmãos nossos, inclusive crianças, e se lhes chama, elegantemente, 'pessoas em situação de rua'... Um sistema político-econômico, para seu desenvolvimento saudável, necessita garantir que a democracia não seja somente nominal, mas sim que possa se ver moldada em ações concretas que velam pela dignidade de todos os seus habitantes sob a lógica do bem comum, em um chamado à solidariedade e uma opção preferencial pelos pobres... Não há democracia com fome, nem desenvolvimento com pobreza, nem justiça na desigualdade.” — Papa Francisco, pronunciamento na Cúpula Pan-Americana de Juízes, em 04-06-2019, promovida pela Pontifícia Academia de Ciências Sociais, no Vaticano, em Roma.

Estamos, no Brasil inteiro, sob os holofotes da realização da 6ª Conferência Nacional das Cidades, que tem como tema central "Construindo a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano: caminhos para cidades inclusivas, democráticas, sustentáveis e com justiça social". O escopo da conferência abrange a discussão e o desenvolvimento de políticas públicas para o desenvolvimento urbano, com foco em áreas como habitação, mobilidade, saneamento, gestão estratégica e financiamento, além de questões relacionadas à diversidade ambiental e climática.

Esta Conferência das Cidades está sendo realizada em três etapas: as conferências municipais que já foram, estão ou serão realizadas até o final de julho; as conferências estaduais (nas capitais) até o final de setembro e, finalmente, a Conferência Nacional, em Brasília, no final de outubro próximo.

Há mais de 70 anos, a questão do desenvolvimento urbano vem sendo discutida no Brasil, principalmente a partir da década de 1960, quando o Brasil deixa de ser um país demograficamente rural para se transformar em um país urbano e industrial.

Ao longo dessas sete décadas, o crescimento rápido das cidades brasileiras ocorreu de uma maneira totalmente caótica, sem planejamento, sem investimentos em infraestrutura urbana compatível com os índices de concentração e crescimento populacional.

O resultado são as cidades que temos, na verdade duas ou três cidades em territórios compartimentados: uma, a cidade das periferias, onde moram as famílias pobres, excluídas e injustiçadas, sem infraestrutura, com baixa qualidade de vida; outra, a cidade para a chamada classe média, com alguns tipos de infraestrutura; e, finalmente, a cidade dos ricos, das camadas mais abastadas, dos donos do poder e dos barões da economia — verdadeiros “apartheids”, quase à semelhança das cidades da Idade Média, condomínios fechados, com muros altos, cercas elétricas, com vigilância eletrônica ou com guardas particulares armados, demonstrando que essas camadas privilegiadas temem as ameaças das chamadas “classes perigosas” que vivem nas favelas, nos cortiços, nas palafitas, dominadas também pela violência do crime organizado ou das milícias.

Diante do processo caótico do crescimento das cidades, ainda na década de 1960, ou seja, há sete décadas, surgiu um grande movimento de lutas sociais, no contexto das chamadas reformas de base, denominado de Movimento de e pela Reforma Urbana.

Este foi um movimento que visava transformar as cidades, promovendo o acesso de todos os cidadãos aos seus benefícios, como habitação, infraestrutura e serviços. Este movimento, impulsionado por segmentos progressistas da sociedade, propôs mudanças estruturais na questão fundiária e no uso e ocupação do solo, com o objetivo de democratizar o acesso à cidade e garantir direitos urbanos fundamentais para quem vive ou meramente sobrevive nas cidades.

No dia 01 de janeiro de 2003, início da primeira gestão de Lula, foi criado o Ministério das Cidades, com os objetivos de combater as desigualdades sociais, transformar as cidades em espaços mais humanizados e ampliar o acesso da população à moradia, saneamento, mobilidade urbana, incluindo transporte de massa moderno e decente.

Antes da chegada de Lula à Presidência, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o Congresso Nacional aprovou, quase que por unanimidade, e FHC sancionou o Estatuto da Cidade em 10 de julho de 2001, através da Lei Federal nº 10.257. Essa lei regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, estabelecendo diretrizes gerais para a política urbana no Brasil.

Essa lei passou a ser um marco fundamental e importante na definição e implementação da política nacional e, por extensão, das políticas estaduais e municipais de desenvolvimento urbano, com dimensões de sustentabilidade, modernidade, justiça social, justiça climática, inclusão social e econômica e segurança.

Além dessas dimensões, o Estatuto das Cidades criou diversos instrumentos jurídicos e urbanísticos para que as cidades pudessem — ou possam — ser espaços democráticos e participativos, envolvendo todos os atores e não apenas as elites na definição das cidades que queremos e merecemos, ou seja, CIDADES PARA TODOS E TODAS e não apenas para uma minoria, enquanto as grandes massas permanecem excluídas dos “benefícios” que uma cidade deve promover à sua população. Exemplos são o IPTU progressivo no tempo e a possibilidade de desapropriação de imóvel urbano pelas prefeituras com pagamento de títulos da dívida pública municipal, aprovados pelo Senado, e outras normas e regras para o bem viver no espaço urbano.

O desenvolvimento tanto urbano quanto rural, econômico e social no Brasil não prima pelo planejamento de curto, médio e, muito menos, de longo prazo. Uma das características desse processo, principalmente do “crescimento” populacional e físico (perímetro urbano e periurbano) das cidades, como já mencionado, ocorre à revelia dos governantes, principalmente integrantes dos poderes Executivo e Legislativo, que se mostram avessos à ideia e prática do planejamento, eternos improvisadores quando se trata das ações governamentais.

Isso é demonstrado através da crise fundiária urbana, que gera muita violência e conflitos; da falta de saneamento básico; das deficiências do sistema de transporte coletivo, frotas e sistemas totalmente obsoletos e de baixa qualidade; do estrangulamento da mobilidade urbana; da inexistência ou precariedade de calçadas, que limitam o deslocamento de pedestres, colocando vidas em risco; da falta ou precariedade de arborização urbana e periurbana, afetando o microclima urbano, principalmente nas áreas centrais; e da deterioração dos centros históricos, com perda da memória das cidades, como ocorre em Cuiabá e tantas outras cidades históricas no Brasil.

Todas essas dimensões, desafios e problemas deveriam ser equacionados no contexto dos Planos Diretores de Desenvolvimento Estratégico, tanto das cidades (dimensão urbana propriamente dita) quanto das áreas periurbanas e rurais dos municípios, principalmente das cidades com mais de 20 mil habitantes, onde os planos diretores, democráticos e participativos, são obrigatórios e deveriam balizar as ações das administrações municipais.

Lamentavelmente, tais planos, quando existem, como em Cuiabá, acabam sendo apenas documentos para enfeitar prateleiras de gabinetes, longe das realidades urbanas, principalmente das periferias urbanas.

Em todos os setores, e não apenas nas questões urbanas, existem dois problemas, desafios quase insuperáveis diante das práticas políticas clientelistas e corruptas existentes. O primeiro é a falta de continuidade de políticas, programas e ações governamentais; cada administração que assume, seja nos municípios, nos estados ou no governo federal, abandona quase tudo o que vinha sendo realizado e a prática é inventar novas obras, novos programas e novas ações, contribuindo para o desperdício, mau uso ou corrupção, em prejuízo dos interesses e necessidades do povo, principalmente dos pobres e excluídos.

Os exemplos são milhares e milhares de obras federais, estaduais e municipais paralisadas, praticamente em todos os municípios e cidades brasileiras, como o famoso Hospital Central de Cuiabá, paralisado por quase ou mais de 40 anos, o que não deixa de ser uma vergonha e um desperdício de recursos públicos diante das necessidades da população.

Outro problema é a falta de articulação das políticas públicas, inclusive da política de desenvolvimento urbano, entre as três esferas do poder público (governos federal, estaduais e municipais), a começar pela falta de coincidência de mandatos.

Presidente da República, Congresso Nacional, governadores de estado e DF e Assembleias Legislativas são eleitos 2 anos antes que prefeitos e vereadores. Assim, os instrumentos de planejamento como PPA – Plano Plurianual de Investimentos – e LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias – não coincidem.

Um terceiro problema que contribui para esse processo caótico de gestão pública é o desrespeito à autonomia dos municípios, tanto por parte dos governos estaduais quanto federal.

Finalmente, temos mais um problema, que é a gestão das regiões metropolitanas e das conurbações urbanas, que, em princípio, devem ter também seu planejamento integrado e harmônico, em setores vitais como mobilidade/transporte intermunicipal; questões de saneamento, principalmente a questão dos resíduos sólidos, esgotamento sanitário, os desafios da moradia popular e da regularização fundiária.

Neste aspecto, o problema se agrava, porquanto, na gestão metropolitana, além da autonomia de cada município da mesma, ainda existe a figura da presença de entes dos governos estaduais e, com frequência, também do governo federal.

Um exemplo concreto dessa balbúrdia política, administrativa e de gestão pública pode ser mencionado nas famosas obras da Copa de 2014, cujas obras — algumas delas como o VLT de Cuiabá e Várzea Grande — iniciadas em 2012, nunca concluídas, consumiram quase um bilhão de reais, pela má gestão e corrupção, e que até hoje, depois de trocarem de modal do VLT para BRT, representam uma grande cicatriz na paisagem do maior aglomerado urbano de Mato Grosso e da Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá.

Neste mesmo diapasão, em 01 de janeiro de 2019, início do governo Bolsonaro, os Ministérios das Cidades e da Integração Nacional foram extintos, dando lugar ao surgimento/criação do Ministério do Desenvolvimento Regional, e o Conselho Nacional das Cidades praticamente extinto e esvaziado.

Com a posse de Lula para mais um período governamental, o Ministério das Cidades foi recriado em 01 de janeiro de 2023 e o Conselho das Cidades recuperou suas atribuições, e as Conferências das Cidades e outras conferências setoriais, como mecanismo de participação popular e de outros segmentos, voltaram a acontecer.

É importante destacar que as Conferências das Cidades são um espaço de diálogo e participação de todos os segmentos que vivem e constroem as cidades — momento para que a população participe dos esforços de construção de cidades que ofereçam condições e qualidade de vida para todas as pessoas que nelas vivem, trabalham e sonham com um futuro melhor, digno e com justiça social.

Finalizando, é importante ressaltar que as Conferências das Cidades buscam incentivar a participação social e popular; um espaço de diálogo e debate dos principais problemas e desafios urbanos; debater e propor subsídios para a formulação e reformulação da política e do sistema nacional de desenvolvimento urbano, tanto na dimensão local quanto metropolitana, estadual e nacional.

Os principais problemas e desafios que não podem ficar de fora das Conferências das Cidades são: mobilidade urbana; habitação, principalmente moradias populares; regularização fundiária; sustentabilidade climática; arborização urbana (Planos Diretores de Arborização Urbana: municipais e metropolitanos, florestas urbanas e periurbanas); saneamento básico, principalmente as questões dos resíduos sólidos/lixo e esgotamento sanitário.

Além disso, é fundamental que, nas Conferências das Cidades, sejam também debatidas as questões da modernização da “máquina” administrativa, da gestão estratégica, da visão de médio e longo prazo e das fontes de financiamento, orçamentos; a questão da segurança pública, principalmente nos territórios periféricos, atualmente objeto do domínio do crime organizado, verdadeiro poder paralelo em inúmeras cidades e estados no Brasil.

Finalmente, é fundamental que as discussões levem em consideração a questão dos bolsões de pobreza, principalmente nas áreas/territórios periféricos, buscando construir mecanismos nas políticas públicas que promovam a inclusão social e econômica e a justiça social, ou seja, o bem comum.

Só assim estaremos construindo cidades como espaço em que todos tenham qualidade de vida e dignidade humana.

 

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, ex-secretário de Planejamento e Gestão, ex-ouvidor Geral/Ombudsman e ex-diretor Executivo do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Urbano da Prefeitura de Cuiaba. Atualmente, articulador da Pastoral da Ecologia Integral – Região Centro Oeste. E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.; Instagram @profjuacy

 

 

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Por Danilo de Souza*

  

 Se o domínio do fogo foi a primeira grande virada energética da história dos Sapiens, a segunda revolução não foi menos transformadora: trata-se do domínio da fotossíntese, ou, dito de outra forma, da invenção da agricultura. Nesse momento-chave da história dos Sapiens, esta espécie deixou de depender exclusivamente da coleta e da caça de alimentos silvestres e passou a produzir, armazenar e planejar sua energia alimentar. Dominar a fotossíntese significou submeter os ciclos naturais das plantas ao controle dos Sapiens, e com isso redefinir para sempre a forma como se relacionam com o tempo, o espaço e a natureza.


É importante destacar que a agricultura não surgiu como um evento isolado, mas como um conjunto de práticas que emergiram de forma independente em diferentes regiões do mundo entre 10 e 12 mil anos atrás, como na Crescente Fértil, no Sahel africano, na China, na Mesoamérica e nos Andes. Jared Diamond (2005), em seu clássico Guns, Germs and Steel, chama esse processo de “transição de caçadores-coletores para agricultores”, e argumenta que foi ela que estabeleceu as bases para o desenvolvimento de civilizações complexas, com escrita, hierarquia e tecnologia. O que está por trás dessa transição não é apenas a produção de comida, é a reorganização completa da matriz energética que possibilita a reprodução dos Sapiens e o seu avanço na biosfera.

 


 

 

Nesse cenário, ao cultivar grãos e raízes, ao domesticar plantas que transformam energia solar em biomassa comestível, os Sapiens criaram um novo ecossistema artificial, o campo agrícola, do qual passaram a depender. A energia, que antes era captada por forrageamento em áreas silvestres, passou a ser concentrada em áreas delimitadas, plantadas e protegidas. Esse domínio da fotossíntese trouxe como consequência direta o aumento da densidade populacional, a fixação no território, a criação de excedentes, e, posteriormente, a necessidade de desenvolvimento da estrutura atualmente chamada de Estado.


Como evidenciam Mazoyer e Roudart (2010), no livro intitulado História das Agriculturas no Mundo, esse processo foi, ao mesmo tempo, técnico e social. Não bastava plantar: era preciso desenvolver ferramentas, rotinas, conhecimentos empíricos sobre solo, clima e estações. Era necessário, sobretudo, criar regras de partilha, definir propriedade, inventar o imposto, instituir o calendário. O ciclo da planta tornou-se o ciclo da sociedade. A sazonalidade da energia fotossintética moldou, além do prato dos Sapiens, os seus mitos, suas religiões e suas guerras.


O solo, o arado, o grão e a colheita passaram a ser objetos de disputa. A revolução agrícola não democratizou o acesso à energia, ela criou, pelo contrário, novas desigualdades. Pimentel (2008), no livro Food, Energy and Society, alerta para o fato de que o cultivo intensivo e a monocultura alteraram drasticamente o balanço energético dos sistemas ecológicos. Cada caloria produzida passou a demandar trabalho humano, animal ou, mais tarde, combustível fóssil. A agricultura, que parecia libertar os Sapiens da escassez, passou a exigir sua servidão ao campo em um primeiro momento.
Essa mudança se reflete na própria fisiologia humana e na organização do trabalho. Populações agrícolas, como mostram os registros esqueléticos, apresentaram diminuição na estatura média, aumento de doenças ósseas e menor diversidade nutricional. A energia calórica passou a ser obtida em maior quantidade, mas com menor qualidade. O pão substituiu a carne, e o mingau, o fruto. Alimentar-se tornou-se uma rotina repetitiva, e trabalhar a terra, uma obrigação diária.


No entanto, o domínio da fotossíntese permitiu a multiplicação de pessoas por hectare, a formação de cidades, e a especialização do trabalho. Um grupo podia plantar, outro guerrear, outro rezar. A energia solar, capturada pelas folhas das plantas e acumulada em grãos e frutos, tornou-se a base invisível de todas as pirâmides sociais. A energia da fotossíntese, que até então era difusa na paisagem, foi domesticada e centralizada. A agricultura fez dos Sapiens, além de agricultores, também soldados, escravos e imperadores.


Jared Diamond (2005) argumenta que os continentes onde a agricultura surgiu de forma mais produtiva, com espécies domesticáveis ricas em proteínas e fácil armazenamento (como o trigo, a cevada, o arroz), foram os mesmos que originaram os impérios expansionistas. A vantagem energética derivada do domínio da fotossíntese não se limitou à nutrição, ela se traduziu em capacidade de sustentar exércitos, gerar excedentes e financiar inovação. Foi, portanto, uma vantagem geopolítica.


Mazoyer e Roudart (2010), por outro lado, ressaltam o papel da agricultura como vetor de desigualdade global. Enquanto algumas regiões intensificaram suas práticas, mecanizaram e acumularam capital, outras permaneceram presas a sistemas tradicionais com baixa produtividade. O domínio da fotossíntese, nesse sentido, é também a história do desequilíbrio energético entre povos, regiões e classes sociais. A monocultura exportadora, o latifúndio, a dependência alimentar, todos são legados dessa segunda revolução energética.


Pimentel (2008), com foco no balanço ecológico, chama atenção para os custos energéticos da agricultura moderna: erosão do solo, perda de biodiversidade, uso intensivo de fertilizantes e defensivos. A fotossíntese, embora gratuita e renovável, exige contexto ecológico estável. Ao desequilibrar o ciclo natural com práticas agrícolas agressivas, os humanos colocaram em risco justamente aquilo que pretendiam dominar: a capacidade das plantas de transformar luz solar em vida.


No plano simbólico, a agricultura moldou as cosmovisões humanas. Deuses da colheita, rituais de fertilidade, festas de plantio e colheita estão presentes em praticamente todas as culturas camponesas. A semente enterrada que renasce foi, por séculos, metáfora da própria existência humana. A energia solar internalizada na planta passou a ser vista como milagre, como bênção, como dádiva, e, também, como punição, quando falhava.


Do ponto de vista energético, o domínio da fotossíntese foi a segunda grande conversão da história dos Sapiens: da energia do fogo à energia do sol transformada em amido, fibra e proteína. Diferentemente da energia química do fogo, a energia da agricultura é mais lenta, mais cíclica, mais dependente do tempo. Mas é, ao mesmo tempo, mais produtiva em termos de densidade populacional, e mais estratégica em termos de poder.
Com o domínio da fotossíntese, os Sapiens tornaram-se dominantes de processos mais complexos de conversão de energia, não apenas consumidores. Deixamos de perseguir alimentos para fazer com que eles crescessem diante de nós.


Se a primeira revolução energética, o fogo, nos deu sobretudo a ampliação do cérebro, a segunda, a agricultura, nos deu a civilização.


OBS: Coluna publicada mensalmente na revista - "O Setor Elétrico".

*Danilo de Souza é professor na FAET/UFMT e pesquisador no NIEPE/FE/UFMT e no Instituto de Energia e Ambiente IEE/USP.

 

 

 

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Por Juacy da Silva*

Estamos chegando ao final de junho, mês dedicado à proteção e conservação da Natureza e da Ecologia Integral, o chamado Junho Verde, onde também tivemos a oportunidade de comemorar a Semana e o Dia Mundial do Meio Ambiente.

Metade deste ano de 2025 já se foi; temos ainda a outra metade para refletirmos e corrigirmos o que anda errado e planejarmos nossas ações para o restante deste ano e, no caso da política, já irmos pensando mais seriamente sobre as eleições gerais (para Presidente da República, renovação de dois terços do Senado, a Câmara Federal inteira; os governadores de Estado e as Assembleias Legislativas também).

Tendo em vista a “máxima” do Papa Francisco, na Encíclica Laudato Si’, de que “tudo está interligado, nesta Casa Comum”, o Planeta Terra, quando refletimos sobre a Ecologia Integral, não podemos esquecer que tudo o que acontece ou deixa de acontecer relacionado ao meio ambiente está umbilicalmente ligado às estruturas do Poder (Executivos, Legislativos e Judiciário e, também, claro, às questões geopolíticas e estratégicas globais, como sempre tem sido constatado quando da realização das COPs – Conferências do Clima, como a COP 30, que será realizada no final de novembro próximo em Belém).

Lamentavelmente, considerando todos os parâmetros relacionados com a proteção do planeta, dos ecossistemas e biomas, nacionais e internacionais, chegamos à triste conclusão de que a realidade socioambiental está a cada dia pior, e os poderosos, tanto dentro do Brasil quanto ao redor do mundo, ou seja, os grandes poluidores, que promovem desmatamento, queimadas, envenenam os solos, as águas e o ar com excesso de agrotóxicos, a mineração e garimpos que não respeitam os direitos da coletividade e provocam danos e crimes ambientais, os produtores de petróleo e outros combustíveis fósseis, enfim, os destruidores do planeta, colocam, sempre, seus interesses econômicos acima dos direitos e interesses dos povos.

Por isso, precisamos continuar insistindo sempre em relação à importância de um despertar coletivo ou o que é denominado de Consciência Ecológica, em que cada um dos três grandes agentes da destruição do planeta: a) a população em geral; b) o setor empresarial e, c) os poderes públicos assumam suas responsabilidades em relação a esta necessidade de bem cuidarmos do meio ambiente, para torná-lo saudável e, REALMENTE, sustentável.

No caso do Brasil, isto é um mandamento constitucional, conforme o artigo 225, que estabelece de maneira clara, cristalina e objetiva que “o meio ambiente ecologicamente equilibrado [é] categoria de bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Lamentavelmente, parece que este e tantos outros direitos contidos em nossa Constituição (Cidadã, como dizia Ulysses Guimarães) de 1988, continuam apenas “letra morta”, na maior parte dos Estados e Municípios brasileiros.

A ideia de separar, do contexto geral do calendário e datas comemorativas em geral, e “criar” um calendário ecológico e mais algumas datas importantes na dimensão socioambiental tem como objetivo divulgar alguns dias e momentos em que possamos voltar nossa atenção e refletirmos mais seriamente sobre aspectos singulares e importantes que, se realmente observados, poderão contribuir para este despertar coletivo. Enfim, pode ser a base para algo importante, inclusive enfatizado pelo Papa Francisco na Encíclica Laudato Si’, quando ele menciona a questão da necessidade de um Pacto Global pela Educação (ao lado da Economia de Francisco e Clara) e, mais importante ainda, a necessidade de um amplo programa de Educação Ambiental, em sua dimensão crítica, criadora, enfim, uma Educação Ambiental ou Ecológica, realmente, Libertadora.

Transcrevo, a seguir, o Calendário Ecológico relativo aos próximos três meses, julho, agosto e setembro, onde são mencionados dias importantes para serem observados e que podem servir de base para uma reflexão mais profunda sobre os rumos da Crise Climática, da destruição da biodiversidade, dos biomas e ecossistemas, da degradação das águas, principalmente dos oceanos, e o que podemos fazer para que possamos mudar o rumo deste cenário catastrófico, desta crise aguda e profunda que temos diante de nós, tão bem documentada e que consta de inúmeros estudos, pesquisas e alertas de milhares e milhares de cientistas mundo afora.

Lamentavelmente, esses alertas continuam amplamente ignorados. Ou mudamos a forma como a humanidade se relaciona com a natureza, se relaciona entre países, povos e culturas, ou seremos tragados por grandes tragédias ambientais e outras mais, como as guerras, os conflitos armados e as ações terroristas que apenas demonstram a irracionalidade e a bestialidade humana.

Segue o Calendário Ecológico relativo aos próximos três meses. Oxalá muitas pessoas possam ler e refletir sobre esses marcos significativos na luta ambientalista nacional e internacional. Oxalá nossos parlamentares e integrantes dos Poderes Executivo e Judiciário, nas três esferas de Governo (nacional, estaduais e municipais), possam incluir os desafios/problemas socioambientais nas peças orçamentárias (PPA, LDO e LOA), para que as políticas públicas sejam contempladas com recursos orçamentários e financeiros, a fim de que possamos cuidar melhor de nosso tão sofrido e agredido meio ambiente / ecologia integral.


JULHO
03 – Dia Internacional Sem Sacos Plásticos
03 – Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial
05 – Dia Internacional do Cooperativismo
12 – Dia do Engenheiro Florestal
13 – Dia do Engenheiro de Saneamento / Sanitarista
17 – Dia Mundial de Proteção das Florestas (ver também dias 21 de março e 21 de setembro)
26 – Dia Mundial de Proteção dos Manguezais

AGOSTO
08 – Dia Interamericano da Qualidade do Ar (ver também 07 de setembro – Dia Mundial do Ar Limpo – Combate à Poluição do Ar)
09 – Dia Internacional dos Povos Indígenas (ver também 19 de abril)
12 – Dia Nacional dos Direitos Humanos
14 – Dia do Controle da Poluição Industrial
19 – Dia de Luta da População em Situação de Rua
20 – Dia Mundial Contra os Mosquitos
21 – Dia Nacional da Habitação
28 – Dia Nacional do Voluntariado
29 – Dia Nacional de Combate ao Fumo

SETEMBRO
1º de setembro a 4 de outubro: Tempo da Criação
01 – Festa da Criação e momento de abertura do Tempo da Criação
01 – Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação
03 – Dia do Biólogo
05 – Dia da Amazônia
07 – Dia da Independência do Brasil
07 – Dia Mundial do Ar Limpo – Combate à Poluição do Ar (ver também 08 de agosto – Dia Interamericano da Qualidade do Ar)
10 – Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio
11 – Dia Nacional do Cerrado
13 – Dia do Engenheiro Agrônomo
16 – Dia Internacional de Luta para a Preservação da Camada de Ozônio
19 – Dia Mundial de Luta pela Limpeza das Águas (ver também 22 de março)
21 – Dia da Árvore (ver também 21 de março e 17 de julho)
22 – Dia Nacional em Defesa da Fauna
25 – Dia dos ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ONU)
22 – Dia Mundial Sem Carro (Combate à Poluição por Queima de Combustível Fóssil)
29 – Dia Internacional de Conscientização sobre Perda e Desperdício de Alimentos (Dia Internacional do Desperdício Zero – ver também 30 de março)
29 – Dia Mundial dos Rios

 

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integra Regiao Centro Oeste. E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.; Instagram @profjuacy

Quase uma semana após o depoimento de Bolsonaro no STF, e ainda há o que considerar sobre os termos “malucos” e “retórica”, ambos usados pelo ex-presidente para tentar se safar das acusações de crimes diversos. Começarei pela tal “retórica”.
            Antes, porém, registro a felicidade de ter podido ver dois brasileiros tão diferentes frente a frente no STF, em um momento tão importante de nossa história: um – de toga –  indagava sobre golpe; o outro – de terno social – respondia, fosse o que fosse, pois, conforme regras das “quatro linhas da Constituição”, nem era obrigado a isso. Jair não precisava produzir mais provas contra si, além das já produzidas durante seu mandato.
            Aquela cena no STF, aguardada por democratas realmente patriotas, só ocorreu porque estamos em um Estado Democrático de Direito, mesmo que imperfeito. Caso vivêssemos em uma ditadura, advinda de golpe, desejado e arquitetado por todos os réus do mesmo processo penal, consoante acusação da PGR, esse tipo de espaço legal não existiria. Logo, ao invés de transmissão pela TV daquele evento jurídico, motivado por desvios constitucionais, restar-nos-iam sombras e odores fétidos dos porões de prédios, como o do filme “Ainda Estou Aqui”, onde são praticadas torturas e mortes, sempre definidas ao sabor de interpretações e interesses de seres e agrupamentos inomináveis.
            Mas vamos à “retórica” de Bolsonaro, que, na verdade, é outra coisa. O ex-capitão, em seu depoimento, sempre que falou em “retórica”, possivelmente, o fez sem consciência histórico-linguístico-filosófica do termo. Durante seu governo, ao invés de exercer a “Retórica”, uma das heranças do pensamento de Aristóteles, que pressupunha ao orador uma intelectualidade desenvolvidíssima para seu exercício, Bolsanaro nunca passou dos limites de praticar a indevida verborragia, que, aliás, lhe é marca registrada desde sempre. Ao contrário da Retórica, na verborragia, cabe todo tipo de baixaria linguística: palavrões, mentiras, ameaças vis, disseminação de ódio, desrespeitos...
            A propósito, políticos verborrágicos – seres sempre desqualificados, da direita e/ou da esquerda – só se projetam por conta de seus iguais: eleitores pouco ou nada exigentes em termos de “logos”, que é uma das sustentações da Retórica em si; ou seja, aquilo que é “responsável por prover a conexão entre o discurso racional e a estrutura racional do mundo”, conforme anota Willyans Maciel, já no início de um trabalho acadêmico seu, sobre as primeiras reflexões do conceito exposto pelo pré-socrático Heráclito de Éfeso. Assim, sem a devida consciência, obviamente, Bolsonaro agrediu também a Retórica em sua longa lista de violências. 
            Para sustentar o que digo, bastaria transcrever qualquer um dos vários enunciados de Bolsonaro, ditos durante o próprio depoimento, tentando explicar suas “maluquices” linguísticas: palavras ao vento, desprovidas de verdades, como ele próprio afirmou; ou seja, pura “verborragia”, que, para o Michaelis On-line, é o “uso excessivo de palavras e de muita fluência para dizer coisas de pouco ou nenhum sentido ou importância”.
            Tudo muito pertinente a Bolsonaro, sempre verborrágico, e nunca retórico, como se imagina. E a verborragia, em seu interrogatório, como se fosse “defeito de fábrica” de um ventríloquo, fê-lo deixar as feições de leão para assumir as de um gatinho dengoso, de tão simpático que estava à frente de “Xandão”, vítima de sua insana verborragia.
            E foi essa metamorfose do leão para gatinho, ironizada em redes sociais adversas ao bolsonarismo, que o fez reincorporar uma prática que lhe é antiga: não carregar feridos, e, sim, salvar sua própria pele, quando se sente acuado. Para tentar limpar sua barra, o que deverá ser dificílimo, categorizou como “malucos” seus mais fiéis dentre os fiéis de seus seguidores: aqueles cabeças de papel que marcharam em frente a algum quartel.
            Dos “malucos”, rifados, sem dó, por Bolsonaro, o seu ex-ministro da Educação – Abranham Weintraub – foi um dos que ficaram tiriricas. Em rede social, Weintraub declarou ter sido “muito otário” por ter acreditado em Bolsonaro. Oh! Na verdade, aquela criatura deve, enfim, ter se percebido como o velho e real Tiririca, quando este, não sem dignidade, usava nariz de palhaço para ganhar a vida em programas chulos de auditório.
            Weintraub, confessando-se “muito otário”, o fez tarde demais, mas antes tarde... Outros “otários” – tipo raíz – do bolsonarismo jamais perceberão o quão bizarro e estéril foi o papel que fizeram em frente a quartéis, pois, para isso, teriam de ter a decência de buscar informações em fontes adequadas para não mais voltar a fazer o papel social de otários. Isso me parece difícil, posto terem sido convencidos (como em lavagem cerebral) de não mais se informarem pelo jornalismo profissional que, com todos os seus defeitos, será sempre mais confiável do que o ambiente abjeto e, tantas vezes, criminoso, vivido em várias bolhas das redes sociais.
            Para confirmar isso, digo que, caso não vivessem em bolhas, os “otários” abandonados saberiam que o golpe tramado – daí o crime – JAMAIS ocorreria. Para saber disso, bastava ter visto, p. ex, , a matéria da BBC News Brasil que publicou, em 28/09/22, a seguinte notícia: “Senado dos EUA aprova recomendação de romper relação com o Brasil em caso de golpe”. Outras mídias profissionais também deram a mesma notícia.
            Antes disso, enviados pelo então presidente Joe Biden, dos EUA, se reuniram com os chefes das Forças Armadas e deixaram claro que aquele país não apoiaria uma ruptura institucional no Brasil, conforme se pode conferir no link que segue: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2024/12/08/quem-evitou-golpe-em-2022-foram-os-eua-entrevista-antonio-lavareda.htm?cmpid=copiaecola).
            Daí, mesmo que provocadas por aventureiros golpistas, as Forças Armadas não tiveram unidade suficiente para entrar na canoa furada. Por ironia, parece que apenas e justamente o marinheiro não percebeu bem o tamanho do furo de seu barco para uma viagem de tanto risco. Outro “oh”!
            Depois dessas informações, que dificilmente circulariam nas bolhas bolsonaristas, que, sem pudor, cultivam apenas a mentira e o ódio, acreditar em golpe era mesmo uma coisa de “maluco”, como disse Bolsonaro... Enfim, uma verdade sua dita aos seus otários.

Prof. Roberto Boaventura da Silva Sá

 

Juacy da Silva*

"Fé encarnada" refere-se à fé que é vivida e praticada no mundo, em vez de ser apenas um conceito abstrato. É uma fé que se manifesta em ações concretas, responsabilidade social e em uma vida que busca a justiça e a promoção do bem-estar dos outros. Em vez de ser apenas uma crença, a fé encarnada é um chamado à ação, uma vida que demonstra a fé por meio de atos de amor, da solidariedade, do cuidado e do serviço.

Amigas e amigos, ao longo de cada ano, todos os anos, inclusive este ano em curso de 2025, existem vários “dias especiais”, dedicados a algum ou alguns aspectos importantes tanto para o movimento ambientalista quanto para a Pastoral da Ecologia Integral, enfim, cristãos e não cristãos e, também, para o futuro do planeta.

Em boa hora, já pela oitava vez, a CNBB tem escolhido como tema para a CAMPANHA DA FRATERNIDADE, ao longo das últimas seis décadas, algum aspecto importante relacionado com a ecologia/meio ambiente e, neste ano de 2025, o tema foi FRATERNIDADE E ECOLOGIA INTEGRAL.

Geralmente — e este ano não está sendo diferente — a ênfase quanto ao tema e lema da Campanha da Fraternidade praticamente se encerra na coleta especial e, no restante do ano e dos anos seguintes, praticamente as questões ambientais, ecológicas, desaparecem das preocupações da Igreja Católica, como também de todas as demais Igrejas Cristãs (evangélicas) e também das demais religiões não cristãs. Parece que tudo está otimamente bem com o nosso planeta. Assim pensam e agem os negacionistas ambientais ou ecológicos.

Parece que a crise climática, a destruição das florestas, as queimadas, a degradação dos solos, o uso abusivo de agrotóxicos que envenenam os alimentos e afetam a saúde humana, a destruição da biodiversidade, a questão do lixo/resíduos sólidos — principalmente o desafio mundial dos plásticos —, a degradação das águas, a poluição dos córregos, dos rios e dos oceanos, a destruição das nascentes, a poluição do ar, enfim, a falta de cuidado com a Casa Comum, nada disso faz parte de nossas práticas religiosas, que continuam alheias ao que acontece ao nosso redor.

Todas essas mazelas estão inseridas em um contexto em que o “marketing” empresarial, a propaganda e a mistificação das massas estimulam exageradamente o consumismo, o desperdício, a obsolescência dos bens produzidos por sistemas econômicos que se caracterizam, como sempre enfatizou o Papa Francisco, ao mencionar os paradigmas da Economia da Morte e que precisamos substituí-los por novos paradigmas de uma Economia da Vida, por meio da Economia de Francisco e Clara, baseada na solidariedade, no respeito pelo bem comum, em que tanto as atuais quanto as futuras gerações estejam incluídas.

Como cristãos (católicos e evangélicos) e também adeptos de outras religiões, filosofias e crenças, esquecemo-nos de que, para nós, a Ecologia Integral está assentada sobre três fundamentos importantes: a espiritualidade ecológica, as ações sociotransformadoras e a mobilização profética contra todas as formas egoístas e gananciosas de nos relacionarmos com a natureza, que é finita e tem seus direitos também.

Essa forma imediatista e meramente utilitarista de nos relacionarmos com a natureza acaba afetando a humanidade como um todo, como, por exemplo, na exploração e uso de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão), que são responsáveis por 75% das emissões de gases de efeito estufa, origem das mudanças e da crise climática que tanta destruição e morte têm provocado e continuam provocando no mundo.

Enquanto isso, um grupo minoritário continua se apropriando, de forma gananciosa, perdulária e simplesmente em busca de um lucro imediato — repito — continua explorando os chamados “recursos naturais”, que, em princípio, fazem parte do bem comum, para benefícios imediatos.

De forma semelhante, nessa apropriação do que deveria ser de todos, desrespeitam os direitos dos consumidores, o direito dos trabalhadores e também o direito das futuras gerações, como, de forma clara e cristalina, podemos ver no Art. 225: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Lamentavelmente, um dispositivo que pouco ou quase nada é cumprido. Apesar de ser um dispositivo constitucional, continua mera letra morta ou, como se diz, “apenas para inglês ver”.

Apenas para retornar à reflexão inicial, neste restante de junho (verde, pelo menos no slogan) e ao longo do mês de julho, temos alguns dias importantes no Calendário Ecológico, como podemos mencionar:

Restante de junho:

  • 17 – Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca

  • 17 – Dia do Gestor Ambiental

  • 30 – Dia Nacional do Fiscal Agropecuário

Julho:

  • 03 – Dia Internacional Sem Sacos Plásticos

  • 12 – Dia do Engenheiro Florestal

  • 13 – Dia do Engenheiro de Saneamento/Sanitarista

  • 17 – Dia Mundial de Proteção das Florestas (ver também dias 21 de março e 21 de setembro)

  • 26 – Dia Mundial de Proteção dos Manguezais

Do Calendário Ecológico constam mais de 75 dias que, ao longo de todos os anos, podemos voltar nossos pensamentos, reflexões e ações com o objetivo de melhor cuidado com o nosso planeta, nossa Casa Comum.

Oxalá possamos observar tanto essas datas/dias importantes sobre alguns aspectos significativos para a saúde do planeta e despertarmos a nossa consciência e agirmos para combater todas as formas de destruição e degradação dos biomas e dos ecossistemas. Só assim passaremos da repetição de meros slogans para ações e gestos concretos, considerando a máxima: “pensarmos globalmente (pois, afinal, como sempre nos exortava o Papa Francisco, tudo está interligado nesta Casa Comum) e agirmos localmente”, começando pela nossa realidade imediata, nossas vizinhanças, nossos bairros, nossas cidades/municípios, nossos estados e nosso país.

No momento em que o Congresso Nacional e vários estados propõem e/ou aprovam leis que facilitam a vida de quem promove a destruição do meio ambiente, é importante que nossas vozes sejam ouvidas, considerando que a omissão é um pecado — neste caso, pecado ecológico — e conivência com crimes ambientais; promovendo a mobilização profética, em um sinal de que continuaremos defendendo, de verdade, o nosso planeta, a nossa Casa Comum.

Este é o verdadeiro compromisso de cristãos e não cristãos, principalmente quando tanto enfatizamos o ecumenismo e o diálogo inter-religioso. Que tal colocarmos a defesa do meio ambiente, da Ecologia Integral, das obras da Criação como aspectos importantes para o planeta, em torno dos quais esta unidade ou união de esforços seja nosso ponto central? Orar, rezar é importante para todas as religiões, mas só isso não basta quando se trata de defender o meio ambiente — precisamos também agir, enquanto é tempo.

Essa é a dimensão de uma religiosidade e de uma fé engajada, comprometida com a justiça ambiental, com a justiça social e com a justiça intergeracional, bem distante de tantos “sepulcros caiados” que, longe de defender as obras da criação, acabam manipulando mentes e corações de milhões de pessoas incautas — e que tanto se multiplicam na atualidade.

 

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia integral Região Centro Oeste. E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.; Instagram @profjuacy 

 

JUACY DA SILVA*

 

O “episódio” da agressão verbal, verdadeiro machismo e misoginia contra a ministra Marina Silva, há poucos dias, quando de seu comparecimento à Comissão de Infraestrutura do Senado Federal, transmitido ao vivo por diversas emissoras de TV e outros meios de comunicação de massa, foi uma demonstração de que a direita e extrema direita estão mais unidas do que nunca, com um propósito claro e transparente: emparedar o governo Lula e enfraquecer o PT e demais partidos de esquerda, visando às eleições gerais de 2026.

De pouco ou quase nada tem surtido efeito o fato da engenharia política de Lula, oferecendo ministérios e inúmeros cargos e favores para partidos de centro, centro-direita, direita e também parte da extrema direita, como é o caso do Republicanos.

Em diversas votações importantes, tanto na Câmara Federal quanto no Senado, como no caso do Marco Temporal, do teto de gastos, do Orçamento Anual do Governo Federal, nas propostas ainda em tramitação no Congresso, como a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o caso do PIX e agora o decreto do IOF, além da pressão por uma CPI na Câmara ou uma CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) no Congresso Nacional sobre a roubalheira dos consignados do INSS, inúmeros parlamentares de partidos que têm ministros e supostamente fazem parte da base do governo Lula, como integrantes do MDB, PSD, PP, Republicanos, União Brasil, votaram e votam contra os interesses do governo, numa clara demonstração de que estão jogando pesado, como se diz, “jogo bruto” contra o governo.

No momento, este emparedamento, capitaneado pelo presidente da Câmara e, em menor grau, pelo presidente do Senado, ambos de partidos que integram o governo Lula, respectivamente, Republicanos e União Brasil, faz um verdadeiro cabo de guerra sobre a questão do aumento do IOF, forçando o governo Lula a voltar atrás e encontrar novas alternativas, provocando mais um desgaste do mesmo perante a opinião pública.

De forma explícita, diversos líderes do União Brasil já afirmaram claramente que não estarão com Lula em 2026, e o mesmo é de se esperar em relação ao PP, ao PSD e a boa parte do MDB.
As estratégias tanto da extrema direita quanto da direita (eufemisticamente denominada de centro-direita, que de centro tem pouco), na hora “h”, acabam pendendo para a direita e extrema direita, são claras.

Existe uma tentativa, principalmente da extrema direita nacional, de promover um descrédito de algumas instituições nacionais, principalmente o Poder Judiciário, mais especificamente o STF, e o sistema eleitoral — no caso, as urnas eletrônicas — tanto dentro do país quanto no contexto internacional. Isso pode afetar o país como um todo, desacreditando, inclusive, diversas autoridades em suas atribuições constitucionais e legais.

A estratégia política, partidária e eleitoral também está a cada dia mais clara, aparentando um certo “racha” onde os incautos imaginam que seria uma “briga” entre a extrema direita, capitaneada por Bolsonaro e seus seguidores, independentemente de o mesmo ser julgado, condenado e preso, colocando “uma pá de cal” em sua pretensão de retornar aos Palácios da Alvorada (e seu cercadinho) e ao Planalto, facilitando o surgimento de alguém que represente seus seguidores, que poderá ser o governador de SP ou até mesmo um de seus filhos ou, talvez, sua esposa.

Para iludir os eleitores, alguns outros governadores, como o de Goiás, ou o do Rio Grande do Sul, do Paraná, Minas Gerais ou outro estado qualquer, deverão se fantasiar de “direita”, mas sem cutucar muito o bolsonarismo, e juntas, essas duas forças — extrema direita e “centro-direita” ou direita propriamente dita — vão abiscoitar boa parte dos votos, talvez uns 35% ou pouco mais.

Aí vem a esquerda, com os partidos tradicionais e alguns “centristas” e “direitistas” fiéis a Lula, por terem sido contemplados com cargos ministeriais ou de segundo escalão, e ainda o risco de o PDT embarcar no “canto da sereia” de Ciro Gomes, que há tempos tem se bandeado para o lado bolsonarista, podendo retirar um “naco” do eleitorado da esquerda que anda meio triste com Lula.
Mesmo assim, Lula continua com seus “encantos” e pode também abocanhar entre 40% a 45% do eleitorado, e seguir para a disputa no segundo turno. Aí é que a coisa se complica, como dizem, “a porca torce o rabo”.

Dependendo de quem possa chegar ao segundo turno, vindo da direita ou da extrema direita, pode facilitar ou dificultar a vida da esquerda. Mesmo assim, há quem aposte que, novamente, Lula sairia vencedor com uma pequena margem, como aconteceu na última eleição.

A outra linha da estratégia da direita e da extrema direita é ampliar sua representatividade tanto na Câmara Federal, onde já domina amplamente, mas, fundamentalmente, no Senado da República, e aí, dominar totalmente o Congresso.

Se isso acontecer e Lula for reeleito, pior do que na atual gestão, estará “enleado” de forma complicadíssima junto ao Congresso Nacional e enfrentará uma oposição mais aguerrida e virulenta do que nesta legislatura, podendo correr o mesmo risco que abateu Dilma, de um “impeachment” por qualquer motivo que possa se imaginar. Portanto, a escolha do vice na chapa de Lula será importante para evitar o que aconteceu com Dilma.

Outra estratégia também bem clara da direita e extrema direita, aliadas ou “adversárias” na quase totalidade dos estados, mas tendo entre ambas um denominador comum, ou seja, terão sempre como adversário ou quase inimigo o PT e as esquerdas, serão as eleições majoritárias (duas vagas de senador, uma vaga de governador) e centenas de vagas nas Assembleias Legislativas.

Da mesma forma que nas eleições municipais, em que o avanço da direita e da extrema direita quase “varreu” o PT e demais partidos de esquerda em milhares de municípios e estados, como no Rio Grande do Sul, SP, MT etc., também este é o grande objetivo das forças conservadoras.

Assim, a direita e extrema direita poderão “rasgar” a Constituição Federal e as Constituições Estaduais e promover um verdadeiro retrocesso constitucional e legal, tanto em nível nacional quanto em nível estadual, impondo suas pautas conservadoras e que irão desmontar as estruturas e as diversas instituições públicas e alterar profundamente as políticas públicas, principalmente as que “favorecem” os pobres, excluídos, as diversas minorias, as leis ambientais, as leis trabalhistas, a previdência social, os organismos de controle, a militarização da política, das escolas — enfim, algo como já está acontecendo em vários países em que a direita e extrema direita, isoladas ou em alianças políticas e estratégicas, têm apontado nesta direção.

A grande meta das forças conservadoras é o “Estado mínimo” para os pobres e classe média baixa, que se tornaram mais pobres e miseráveis, e o “Estado máximo” para os ricos e os privilegiados.

Março do ano que vem será o momento de conferirmos este cenário e podermos novamente avaliar, com dados da realidade, qual o futuro que nos espera nas urnas em outubro e novembro de 2026. Quem viver, verá!

Aí surge a grande indagação: diante de um quadro/cenário como este, bem claro, qual ou quais as estratégias do PT e das esquerdas? Só existem dois caminhos que se entrelaçam: voltar às bases, voltar a conquistar a confiança dos movimentos populares, ganhar as ruas e avenidas neste país, mobilizar-se nas redes sociais; fortalecer tanto a frente de esquerda quanto uma frente mais ampla que a “esquerda tradicional”, ampliando o chamado “arco de alianças”; tentar “segurar alguns pedaços dos partidos de centro e de direita” contemplados com cargos e outros favores do atual governo (Lula) e, aí sim, o mais importante: construir um Projeto Nacional de Desenvolvimento que fortaleça a soberania nacional, o desenvolvimento científico e tecnológico, sustentável, solidário, justo, que empolgue tanto empresários, a classe média, as grandes massas, os pobres, oprimidos e injustiçados que ainda existem neste país e têm sido “encantados” pelas propostas da direita e extrema direita, como bem tem enfatizado Jessé de Souza quando fala dos “pobres de direita”, principalmente evangélicos e boa parte dos católicos.

Hoje, as igrejas e religiões são mais fortes, política e eleitoralmente, do que as mais de duas ou três dezenas de partidos — e é aí que mora o perigo para qualquer democracia!

Enquanto isso, no STF, tem início mais uma etapa que poderá condenar definitivamente e conduzir à prisão tanto Bolsonaro quanto vários outros réus, como aconteceu com a deputada Carla Zambelli, bolsonarista raiz e agora fugitiva e procurada pela Interpol.

Muita coisa ainda vai acontecer até outubro de 2026, ante as quais precisamos estar alertas!

 

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. ; Instagram @profjuacy

 

Por Juacy da Silva

 

“Muitos daqueles que detêm mais recursos e poder econômico ou político parecem concentrar-se, sobretudo, em mascarar os problemas ou ocultar os seus sintomas, procurando apenas reduzir alguns impactos negativos das mudanças climáticas. Mas muitos sintomas indicam que tais efeitos poderão ser cada vez piores, se continuarmos com os modelos atuais de produção e consumo.”
— Papa Francisco, 2015, Laudato Si’, 26.

 

Hoje, 05 de junho de 2025, é mais um Dia Mundial do Meio Ambiente, momento em que precisamos parar e refletir, de forma objetiva e crítica, sobre a situação ecológica, ambiental ou socioambiental que nos cerca — pouco importa a denominação que damos a essa triste realidade, seja local, municipal, estadual, nacional ou mundial.

O importante é reconhecermos, como sempre nos exortou e convocou o Papa Francisco, que “tudo está interligado nesta Casa Comum”. Essa é uma das mensagens centrais de suas encíclicas Laudato Si’, Fratelli Tutti e das exortações Querida Amazônia e Laudate Deum. Há apenas um planeta Terra. Se destruirmos esta Casa Comum, estaremos destruindo todas as formas de vida — inclusive a vida humana.

Mais ainda, precisamos refletir profundamente sobre o significado de suas palavras ao afirmar que, na raiz de todas as mazelas e da degradação ambiental, estão as ações humanas: irracionais, egoístas e imediatistas, que não se preocupam com os males que estamos causando à ecologia integral — tanto para as gerações atuais quanto, principalmente, para as futuras.

O Papa Francisco também nos adverte que, sem uma mudança profunda em nossos hábitos e em nosso estilo de vida — marcado pelo consumismo, pelo desperdício, pelo descarte — e em nossos sistemas produtivos, que não respeitam os trabalhadores, nem os consumidores, tampouco os direitos e limites da natureza, estaremos diante de uma tragédia anunciada. Um cenário de crise climática com consequências catastróficas para todos. E, como sempre, os mais pobres e excluídos serão os que mais sofrerão com a degradação socioambiental — com mais dor, mais fome, mais miséria e mais morte.

Por isso, ele insiste em afirmar: “Os gritos da Terra são também os gemidos e sofrimentos dos pobres.” E que, para reencontrarmos o caminho de volta às belezas do “Jardim do Éden”, à “Terra sem males”, ao “Bem Viver”, é preciso passar por uma verdadeira conversão integral, uma CONVERSÃO ECOLÓGICA — não apenas individual, mas comunitária.

Essa conversão só acontece quando decidimos trilhar o caminho da transformação individual e coletiva. Defender o meio ambiente e a ecologia integral significa construirmos um novo pacto econômico, político, social, religioso e cultural, no qual todos percebam que fazemos parte de uma única raça: a raça humana. E que não faz sentido continuar cultivando os paradigmas de uma economia da morte. Precisamos, urgentemente, começar por nossas realidades locais, expandindo para nossas cidades, estados, países, continentes — até alcançar o mundo inteiro.

É necessário substituir os paradigmas da Economia da Morte por novos paradigmas da Economia da Vida — como a economia solidária, a agroecologia, a economia criativa e a economia circular.

Para isso, ainda segundo o Papa Francisco, precisamos de um grande e verdadeiro Pacto Global pela Educação — crítica e libertadora — que inclua a educação ambiental ou educação ecológica nessa mesma perspectiva crítica e transformadora. Somente assim estaremos mais próximos de uma autêntica Revolução Ecológica.

Só então poderemos vencer o negacionismo ecológico e reverter a trajetória sem retorno na qual o mundo inteiro — inclusive nós, aqui e agora — já embarcou e insiste em permanecer.

O bem comum, a solidariedade, a parcimônia, o cuidado com o outro e com o planeta, e a certeza de que nos aproximamos de um “ponto de não retorno” em relação aos desastres ecológicos e catástrofes “naturais” — essas devem ser as “réguas” com que devemos medir os danos causados à natureza, à humanidade e às obras da Criação.

Este é o verdadeiro sentido de “celebrarmos” todos os anos — e todos os dias — o Dia Mundial do Meio Ambiente.

Abraços


Prof. Juacy da Silva
Cuiabá, 05 de junho de 2025

 



Juacy da Silva*

 

Pense bem, não espere que a última árvore seja destruida e as nascentes, rios, os córregos serem totalmente poluídos e degradados para começar a se preocupar com a natureza e com o planeta, aí será tarde demais; o tempo, o momento para agir e fazer a diferença é hoje, é agora. Lute por um mundo melhor, sustentável, justo e solidário.

A partir deste próximo domingo, 01 de Junho até sábado, 07 do mesmo mês, no mundo inteiro estará sendo comemorada a SEMANA DO MEIO AMBIENTE, com diversas programações que estimulam ações e reflexões sobre a necessidade imperiosa de cuidarmos bem da ECOLOGIA INTEGRAL, enfim, de nossa CASA COMUM.

O ponto alto dessas celebrações será na quinta feira, 05 de JUNHO, que é o DIA MUNDIAL DO MEIO AMBIENTE, instituído pela ONU – Organização das Nações UNIDAS por ocasião da primeira Conferência Mundial que tratou das questões do Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em Estocolmo, na Suécia, em 1972, ou seja, há 55 anos.

Nesse tempo, mais de meio século, a destruição dos biomas, dos ecossistemas, da biodiversidade, a desertificação, a poluição das águas, dos solos, do ar, o desmatamento, as queimadas, enfim, a destruição do planeta e a crise climática tem piorado sem precedentes na história humana, apesar de tantos tratados, conferências do clima e tantos outros acordos e compromissos internacionais.

A data, 5 de junho, foi escolhida para coincidir com o início daquela conferência. O objetivo principal do Dia Mundial do Meio Ambiente é despertar a consciência da população em geral, mas principalmente dos governantes, dos empresários, das lideranças políticas, religiosas e sociais, das organizações da sociedade civil sobre os problemas socioambientais, principalmente a grave crise climática, cujas origens já são sobejamente conhecidas e cujas consequências são e serão cada vez mais desastrosas, impondo muito sofrimento e morte ao redor do mundo, principalmente aos bilhões de pobres, excluídos e oprimidos, daí a importância da conservação, da preservação, da recuperação e uso sustentável dos recursos naturais.

O tema central das celebrações do Dia Mundial do Meio Ambiente em 2025 é o combate à poluição plástica e a promoção de ações coletivas para enfrentar esse desafio global, que segundo a ONU é um problema grave e foco importante para a proteção do planeta, além de diversos outros aspectos relacionados com a degradação ambiental, como a falta de arborização urbana, por exemplo.

Sem arborização e florestas urbanas não existem cidades sustentáveis, aprazíveis, este é um pensamento bastante verdadeiro e reflete a importância crucial da vegetação para o desenvolvimento urbano sustentável. A arborização das cidades e as florestas urbanas oferecem múltiplos benefícios socioambientais que contribuem para uma melhor qualidade de vida, para o meio ambiente e a economia.

Com toda certeza e inúmeros estudos e pesquisas tem demonstrado que as cidades que priorizam a arborização e as florestas urbanas são mais resilientes, saudáveis e sustentáveis, oferecendo condições melhores para se viver, mais aprazíveis, mais bonitas.

A arborização das cidades e as florestas urbanas são, além constarem da Legislação, incluindo dos planos diretores, repito, são essenciais para o desenvolvimento de cidades que garantam uma melhor qualidade de vida para as pessoas e a preservação do meio ambiente.

Afinal, como sempre tanto nos exortou e enfatizou o Papa Francisco, em se tratando da Ecologia Integral, ”tudo está interligado, nesta Casa Comum” e precisamos cuidar do planeta com um todo e não apenas destacando apenas alguns desses desafios particulares.

Nessas celebrações relativas ao Dia Mundial do Meio Ambiente precisamos falar também de justiça social, justiça ambiental, justiça climática e, mais do que nunca, de justiça intergeracional, afinal, precisamos nos perguntar: Que mundo, que planeta as gerações passadas e as gerações atuais irão deixar como herança para as futuras gerações?

Se nada ou pouco for feito para deter a concretização desta “tragédia anunciada", se a ganância, a busca de lucro a qualquer preço, o consumismo, o desperdício e a total falta de respeito pelos direitos e os limites da natureza não forem observados, com certeza dentro de uma, duas ou três décadas milhões de seres humanos e também boa ou a maior parte da biodiversidade não terão condições de sobreviverem neste planeta e irão desaparecer.

Para que o futuro do planeta seja garantido, precisamos urgentemente cuidar das nossas águas, de nossos solos; de nossas árvores, de nossas florestas, de nosso ar que está a cada dia mais poluído, de nosso clima que está aumentando a temperatura, provocando ondas de calor, derretimento das cordilheiras, das geleiras e tantos outros problemas.

Dados recentes da Organização Mundial da Saúde indicam que em 2020 dos mais de 56 milhões de mortes ocorridas no mundo, nada menos do que 13 milhões tiveram como causa de morte algum problema socioambiental.

Em 2021 em torno de 8,1 milhões de pessoas morreram por problemas de poluição do ar, principalmente nas cidades e áreas periféricas, isto é muito  grave e a arborizaçao urbana e as florestas urbanas bem que podem mitigar esse problema da poluição do ar.

As nossas cidades e Cuiabá não é diferente, enfrentam problemas graves e urgentes como a falta de saneamento básico, a falta de ARBORIZAÇÃO URBANA,  córregos e rios, outrora limpos e com muita vida, hoje são verdadeiros esgotos a céu aberto, milhões de famílias vivem em meio ao lixo, animais peçonhentos, urubús, porcos, cães e pessoas revirando os lixões em busca de alimentos e outras coisas para sobreviverem, essas são as cenas que ainda continuam “enfeitando” o panorama urbano, para tristeza e vergonha nossa.

Inúmeras doenças decorrentes da falta de cuidado com o meio ambiente, em diversos países, como a malária, a dengue, a zika, a chikungunya, além de doenças parasitárias intestinais e de pele já se tornaram endêmicas ou pandêmicas e causam dezenas de milhares de internações além de inúmeras mortes desnecessárias, como aconteceu com a pandemia da COVID-19, que sacrificou quase um milhão de vidas somente no Brasil e quase 15 milhões ao redor do mundo, muito mais do que diversos conflitos armados e guerras que tanto nos horrorizam.

Para celebrar este DIA MUNDIAL DO MEIO AMBIENTE, na próxima quinta feira, 05 de JUNHO, a Associação PROJETO CUIABÁ MAIS VERDE, em parceria com a CDL/MT (Câmara dos Dirigentes Lojistas) estará promovendo uma Mesa de Debate sobre o tema “ARBORIZAÇÃO URBANA: POR UMA CUIABÁ MAIS VERDE”, a ter lugar no salão de Reuniões daquela Entidade, na Avenida Getúlio Vargas 750, Centro – Cuiabá, às 18h. Mais informações pelo telefone 65 3615 1500.

Sem arborização urbana não existem cidades sutentáveis. As ondas de calor que a cada dia estão sendo mais constantes em Cuiabá só podem ser mitigadas com arborização de nossa cidade, que precisa voltar a ser, novamente, a Cuiabá, Cidade Verde!

A Prefeitura de Cuiabá precisa cumprir o que está contido no Plano Diretor de Desenvolvimento Estratégico de Cuiabá, aprovado pela Câmara Municipal e que se tornou na Lei Complementar 150, de 29 de Janeiro de 2007, ou seja, há 18 anos a eleboração do Plano Diretor de Arborização Urbana de nossa Capital passou a ser uma determinação legal, que nunca foi cumprida por diversos prefeitos que passaram pelo Palácio Alencastro.

Esta é a nossa luta atual, para que o atual prefeito encaminhe à Câmara Municipal o PDAU – Plano Diretor de Arborização Urbana de nossa Cuiabá, Cidade Verde de novo!

Venha refletir conosco sobre o futuro de nossa cidade, enfim, sobre a Cuiabá que temos e a Cuiabá que queremos e temos direito de tê-la!

Compareça, participe, compartilhe com seus contatos. A participação é aberta a todas as pessoas interessadas.

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, articulador da Pastoral da Ecologia Integral, membro do Conselho Fiscal da Associação Projeto Cuiabá Mais Verde . E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

 

Publicamos, abaixo, a pedido do professor Adriano Bueno Kurle, texto de autoria do professor João Carlos Salles.  

 

Por JOÃO CARLOS SALLES*

 

A Andifes alerta para o desmonte das universidades federais, mas sua linguagem protocolar e timidez política acabam por amenizar a gravidade da crise, enquanto o governo falha em priorizar a educação superior

1.

Uma nota da Andifes merece toda atenção. A associação tem peso histórico, está associada às políticas de transformação das universidades federais, sendo uma de suas vozes mais qualificadas, ao lado das representações nacionais de nossas categorias. Por isso mesmo, usando uma fórmula agora recorrente em seus documentos, cabe-nos manifestar “profunda preocupação” com o teor de seus textos mais recentes.

Com efeito, a Andifes não tem deixado de cumprir seu papel nem de apontar fatos deveras preocupantes, sobretudo no que se refere a reduções, contingenciamentos e bloqueios orçamentários. Entretanto, parece fazer de um tudo para não enunciar uma verdade elementar: a educação superior não é prioridade no atual governo.

Dirigindo-me a uma associação que muito prezo e a amigos dirigentes por quem tenho inclusive afeto pessoal, não posso deixar de apontar, mesmo sem estar em qualquer cargo e sendo apenas um professor com alguma experiência institucional e uma já extensa reflexão sobre a universidade pública: a Andifes, nota após nota, tem envolto os dados preocupantes que apresenta em expedientes retóricos que lhes diminuem a gravidade.

Com isso, não denuncia, mas sim lamenta; não critica, mas antes termina por desculpar. Suas notas, então, se autodestroem e acabam cumprindo um papel protocolar, que sabemos ser contrário à combatividade individual de cada membro da atual diretoria e estranho à história da associação.

Cabe reiterar. Sabemos bem o valor da Andifes e temos em alta conta cada um de seus dirigentes, mas parecem estar em descompasso com o agravamento da situação que, não obstante, denunciam. De modo algum podemos imaginar que tenham o temor de uma crítica ensejar alguma retaliação; bem mais provável é o temor (deveras errôneo!) de que a crítica a um governo progressista possa favorecer o retorno do recente obscurantismo.

Reagindo aos impactos do Decreto nº 12.448, de 30 de abril de 2025, que limita a execução orçamentária mensal a 1/18 do total autorizado para o exercício, a recente nota de 14 de maio da ANDIFES é clara.[i] Ela mostra que, de maneira objetiva, a situação das universidades federais agrava-se de forma inquietante e, cabe acrescentar, potencialmente devastadora, com impacto imediato e perverso sobre a assistência estudantil, atingindo assim os mais vulneráveis e comprometendo toda política de inclusão.

Por mais que desconfiemos dos interesses e conheçamos as leituras inquinadas da grande imprensa, as matérias dos jornais sobre a situação das universidades se multiplicam. Elas escancaram para a opinião pública um quadro sombrio em nossas instituições – quadro que, aliás, cada um de nós testemunha diretamente e, conquanto diverso distributivamente em nossas instituições, pode conjuntamente afetar a qualidade da educação pública superior, além de já comprometer a obrigação legal do Estado com seu financiamento. Com isso, a própria nação brasileira, enquanto projeto democrático, está sob ameaça.

A cautela da Andifes, embora equivocada, não é desprovida de razões. Não podemos esquecer que enfrentamos muito recentemente formas diversas de obscurantismo, em graus distintos, desde o período da educada mesóclise (quando ocorreram as conduções coercitivas de reitores) até o da mais deslavada ignorância (com ataque direto e explícito à ciência e às universidades). Certamente, qualquer o grau, lutaremos para que obscurantismos dessa ordem jamais retornem.

Por outro lado, é também um fato óbvio que a educação superior, antes atacada de modo até abjeto, não tem tido a devida e merecida prioridade no atual governo, que comete assim um grave erro – erro alimentado, por vezes, pela falsa narrativa de uma dicotomia entre a educação básica e a educação superior, quando, em verdade, a atenção à educação necessita envolver todos os níveis, conjugadamente.

2.

Estaríamos, então, com as mãos atadas, limitados a lamentar e expressar “profunda preocupação”, porque diante de uma tragédia? Ora, a noção de tragédia em algumas de suas acepções mais clássicas não pode ser aceita, à medida que poderia envolver uma espécie de rendição ao destino, uma contorção da história em direção a um evento cuja força se afiguraria inelutável.

Aceitar essa acepção para a situação trágica ora vivida implicaria permitir que a sociedade inteira se condene ela própria, renunciando assim ao projeto ainda adormecido de uma nação verdadeiramente democrática.

Não podemos aceitar tal condenação. Todavia, colocadas à míngua nossas instituições, as reações correm o risco de oscilar entre o patético e o ridículo. Notas continuam a ser e sempre serão importantes, e cumprem seu papel a Andifes e as reitorias quando as redigem. Não obstante, algumas podem servir até para entorpecer, porquanto timoratas, quando não lenientes. Além disso, certas ou erradas em sua forma e no seu momento, o tempo da reação exclusiva através de notas parece estar superado.

Qual efeito, afinal, podem ter agora notas institucionais, caso se limitem a um protesto – sobretudo quando já adiantam um quase pedido de desculpas pelo simples fato de existirem, nutrindo, quem sabe, a esperança de solucionarem nos bastidores um quadro de tamanha complexidade?

Essa falha parece clara na nota da Andifes, que, após apresentar a grave situação, pondera: “Reconhecemos que o Ministério da Educação tem mantido uma postura de diálogo aberto com as universidades e demonstrado sensibilidade às pautas da educação superior.”

Observação deveras redundante e inócua, agravada pelo agradecimento no mínimo protocolar a recomposições que já se mostraram insuficientes: “os cortes acumulados ao longo de vários anos continuam produzindo efeitos significativos, apesar de o MEC ter realizado algumas recomposições orçamentárias recentemente”.

A cortesia é um valor, não esqueçamos. A nota não pode ser condenada por ser cortês, mas sim por essa cortesia ganhar um significado contrário ao seu propósito. Em situação de profunda inquietação, o que é condição de possibilidade de diálogo pode tornar-se um expediente para afastar outros atores, a saber, a própria comunidade e os diversos movimentos sociais que podem ter interesse em uma nação cuja pauta principal envolva a formação qualificada de nossa gente, as ciências, as artes, as culturas.

Sobre serem redundantes, tais concessões parecem doravante insuficientes e sabem mais à etiqueta do que ao aprofundamento dos pontos. Soam como se a boa vontade do Ministério da Educação (da qual não duvidamos) ou a competência e a seriedade do atual Secretário da Educação Superior (bem conhecidas de todos nós) justificassem alguma contemporização com o difícil quadro orçamentário, quando sabemos que a aceitação dos atuais contingenciamentos pode comprometer os melhores projetos do próprio governo.

A tarefa da Andifes não é ficar em compasso de espera. Deve fazer, sim, a devida pressão na sociedade, facilitando inclusive a defesa, no interior do próprio governo, dos melhores interesses da educação por aqueles gestores que, por sua própria trajetória, são nossos aliados naturais.

É dever da Andifes enunciar sem meias palavras a necessária redefinição das prioridades nacionais. Sem essa mobilização, a gestão interna da crise nos ministérios mitigará quiçá o problema, mas condenar-se-á talvez a um fracasso, por mais tranquilo que seja agora o diálogo, por mais competentes e sensíveis que o sejam os gestores.

Medidas paliativas de liberação de recursos não podem estar no lugar da ação conjunta que visa a proteger o inteiro sistema das federais e a garantir, por exemplo, que os recursos sejam suficientes na LOA para ser rodada efetivamente a matriz Andifes. Por tudo isso, exatamente para valorizar a luta da Andifes e para favorecer a ação de quantos, no atual governo, compreendem a importância estratégica das universidades federais, devemos nos fixar na afirmação central da nota, que não só merece uma ênfase, como também solicita que dela sejam extraídas as medidas mais consequentes, com uma resposta dos governantes à altura da gravidade do problema:

As universidades federais necessitam de liberação urgente do orçamento para que os pagamentos mensais regulares não permaneçam comprometidos. Além disso, o orçamento aprovado pelo congresso para este ano é insuficiente para que as universidades possam honrar com seus compromissos.

Neste sentido, a recomposição dos cortes aprovados pelo Congresso na LOA 2025 e uma suplementação no orçamento deste ano são medidas igualmente urgentes e essenciais para assegurar o funcionamento das universidades federais. (“Nota da Andifes sobre situação do orçamento das universidades federais”).

3.

Enfatizada e sem rapapés, a mensagem é clara e ganha consonância com a enunciada urgência. Afinal de contas, em situação tão adversa para a educação, o próprio governo não pode mais se omitir, exatamente porque progressista e (assim esperamos!) decidido a honrar o movimento de expansão das universidades que outrora inaugurou.

Diante de ameaça tão grave, o governo deveria ser capaz de convocar a inteira sociedade brasileira, caso decidido a proteger projetos de longa duração e, todavia, considere não ter forças sozinho para redefinir os rumos da educação e as prioridades nacionais.

A própria Andifes tem autoridade e legitimidade para conclamar a academia e a sociedade para um profundo debate sobre a educação, oferecendo soluções inclusive políticas e não apenas caminhos tortuosos para adequar as universidades a demandas do mercado ou dos governos.

A capacidade de inovação, afinal de contas, que tem sido apresentada como um caminho por alguns, decerto faz parte do nosso dever perante a sociedade, mas não nos define nem nos justifica, como chegaram a propor os que elaboraram o Programa Institutos e Universidades Empreendedoras e Inovadoras – o malfadado “Future-se”.

Cabe à Andifes, portanto, provocar a discussão do financiamento público da educação, refinando então sua própria matriz de distribuição de recursos para as federais, de modo que sejam restabelecidas as condições de funcionamento adequado do sistema e trilhemos o caminho da afirmação das universidades e não de sua mera sobrevivência – em função da qual, uma vez tomada restritamente, pode ser quebrado o compromisso essencial e definidor das nossas instituições com o ensino, a pesquisa e a extensão.

Os reitores, por sua feita, enquanto precisam, sim, continuar sua luta diuturna por orçamento, não podem estar satisfeitos com o jogo da captação de emendas e outros recursos extraorçamentários, sendo ainda pior sua situação quando se julgam tão isolados e perdidos que acreditam ser sensato dirigir apelos desesperados à iniciativa privada – apelos que decerto não fariam, caso tivessem o sistema inteiro lutando a seu favor. Nos dois casos, reforça-se tão somente a ideia de um descompromisso do Estado com o financiamento público, nas condições previstas na Constituição Federal e na LDB.

Aqui um cuidado, vale lembrar. Se o sistema funciona, ninguém larga a mão de ninguém. E o sistema federal se define pela própria comensurabilidade de condições, pela qualidade comum a todas as instituições, enquanto universidades públicas, gratuitas e socialmente referenciadas.

Não é educado nem civilizado deixar qualquer das instituições em situação de desespero, e isso é tanto mais imperioso quando se trata da maior das nossas universidades federais. Neste caso específico, seu calvário vitimiza todo o sistema de forma bastante objetiva e agora a olhos vistos.

Juntamente com a Andifes e como representantes em conjunto de um sistema de universidades federais, os reitores têm, sim, o dever de lançar essa discussão no solo da universidade e para toda sociedade. E isso é, vale concordar, urgente – palavra que não temos o direito de usar em vão.

Portanto, nossos dirigentes deveriam recusar estarem envolvidos em uma busca desenfreada, fragmentada e competitiva por recursos extraorçamentários, assim como não é justo que paguem o preço político de se virem obrigados a tomar medidas severas de restrição de gastos – ao que tudo indica, necessárias.

É verdade que medidas de contenção já nos serviram até como uma forma de reação ao obscurantismo. Elas tiveram, então, o significado de uma afirmação institucional, com a mensagem de que resistiríamos às restrições absurdamente impostas e jamais deixaríamos a universidade parar. Agora, porém, mesmo sendo necessárias, não são suficientes e podem inclusive perder tal significado estratégico. Em suma, elas não substituem uma luta ainda mais decidida.

Parece, pois, chegado o momento de abrirmos franca e amplamente o debate, de nos dirigirmos ao parlamento e irmos às ruas, com todos os recursos de luta pertinentes, dentro e fora das universidades, em manifestação forte e decidida, na qual se afirme para toda sociedade e em conjunto com as forças progressistas a mensagem cristalina de que não podemos aceitar o sucateamento das universidades públicas, de que nunca seremos cúmplices de tamanho absurdo.

Viva o sistema federal de educação! Viva a Andifes!

*João Carlos Salles é professor titular do Departamento de Filosofia da Universidade Federal da Bahia. Ex-reitor da UFBA e ex-presidente da ANDIFES. Autor, entre outros livros, de Universidade pública e democracia (Boitempo). [https://amzn.to/4cRaTwT]

 

Nota


[i] https://www.andifes.org.br/2025/05/14/nota-da-andifes-sobre-situacao-do-orcamento-das-universidades-federais/

 

Publicado originalmente em: https://aterraeredonda.com.br/redefinir-as-prioridades-nacionais/  

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Danilo de Souza*



 

 

 

            Estamos dando início a uma nova série de textos nesta coluna dedicada às grandes revoluções energéticas que moldaram a história dos Sapiens. A cada edição, vamos explorar como o domínio de diferentes recursos/tecnologias de energia transformou a forma como vivemos, trabalhamos, comemos, nos locomovemos e organizamos a sociedade. Esta jornada começa com o fogo — a primeira grande ruptura energética — e seguirá por momentos decisivos como a agricultura, os ventos e as águas, o vapor, os combustíveis fósseis, a eletricidade, o átomo, as fontes renováveis e a digitalização da energia.
           O domínio do fogo marcou uma das transformações mais profundas na trajetória evolutiva dos Homo sapiens, e pode ter começado entre 1,9 e 1,8 milhão de anos atrás, com o ancestral que chamamos hoje de Homo erectus. Muito antes da agricultura ou das ferramentas metálicas, nossos ancestrais deram um salto adaptativo ao aprender a controlar uma fonte externa de energia: o fogo. Essa conquista, além de mudar radicalmente a relação com o ambiente, também teve efeitos duradouros sobre nossa biologia, cognição e organização social — configurando-se como a primeira grande revolução energética da humanidade.
           O primatólogo Richard Wrangham (2009), em Catching Fire: How Cooking Made Us Human, argumenta que o cozimento dos alimentos foi o fator determinante para o avanço do gênero Homo. Ao tornar os alimentos mais digestíveis – portanto, energeticamente mais eficientes, a cocção reduziu a necessidade de um sistema digestivo volumoso. Isso permitiu uma redistribuição de energia no corpo, favorecendo o crescimento do cérebro em detrimento do intestino.
           Esse “acordo biológico” entre digestão externa — feita pelo calor — e a expansão cerebral foi decisivo. Com menos esforço digestivo, o corpo pôde direcionar energia metabólica ao cérebro.  Alfred W. Crosby (2006), em seu texto “Children of the Sun: A History of Humanity's Unappeasable Appetite for Energy”, chega a essa mesma conclusão ao afirmar que, muito possivelmente, a cocção influenciou decisivamente a possibilidade de redução do trato intestinal e o aumento do cérebro.
           Os estudos de Wrangham e Crosby e respectivos grupos de pesquisa em Biologia Evolutiva Humana são corroborados pela neurocientista brasileira Suzana Herculano-Houzel (2017), em sua obra A Vantagem Humana, que reforça que cozinhar alimentos foi fundamental para sustentar o cérebro humano moderno, com seus 86 bilhões de neurônios. Ela evidencia que nenhum outro primata tem capacidade metabólica suficiente para alimentar um cérebro tão complexo sem a cocção. A digestão de alimentos crus requer tempo excessivo de mastigação e gasto energético elevado. Cozinhar tornou possível uma alimentação mais eficiente, permitindo que o cérebro crescesse sem sacrificar o resto do corpo.
           Vale destacar que a capacidade de simbolizar, raciocinar, lembrar e comunicar conferiu à nossa espécie o nome Homo sapiens — o humano de “saber”. Para sustentar esse cérebro altamente desenvolvido, que consome até 25% da nossa energia, o corpo humano evoluiu com adaptações notáveis: temos dentes pequenos e um trato gastrointestinal reduzido, em contraste com nossos parentes primatas. Enquanto os macacos possuem um sistema digestivo mais robusto, nós compensamos com um cérebro proporcionalmente muito maior — um claro reflexo das prioridades energéticas distintas entre as espécies.
           A transformação do corpo humano é um dos maiores testemunhos dessa evolução. A partir do Homo erectus, há cerca de 1,9 milhão de anos, observam-se mudanças anatômicas como mandíbulas mais finas, dentes menores e intestinos mais curtos. Essas alterações indicam uma adaptação clara a uma dieta composta por alimentos processados termicamente. O encurtamento do trato digestivo e a expansão cerebral são evidências diretas da reorganização fisiológica proporcionada pelo domínio do fogo. A Figura ilustra a evolução do cérebro: partindo do Homo habilis, com cerca de 600 cm³ de volume cerebral, passando pelo Homo erectus (~800 cm³), até chegar ao Homo sapiens, com volumes próximos de 1500 cm³, justamente após o domínio do fogo e o estabelecimento da cocção como prática central.

 

 

           

Convém salientar que a mudança no padrão alimentar e no metabolismo não teria sido possível sem a tecnologia do fogo. Coletar madeira, manter uma chama acesa durante dias, protegê-la da chuva e transmiti-la entre grupos exigiram capacidades cognitivas elevadas. Além disso, o fogo passou a representar mais do que calor ou cocção: ele assumiu valor simbólico, sendo associado à proteção, ao sagrado e à identidade coletiva. Em praticamente todas as culturas humanas conhecidas, a fogueira é um centro em torno do qual se reúnem histórias, decisões e memórias.
           Além dos ganhos fisiológicos, de fato, o fogo teve implicações sociais profundas. A cocção exigia planejamento, divisão de tarefas e convívio em torno da chama. Esses momentos de partilha podem ter sido o berço das primeiras estruturas sociais complexas, da linguagem e da cultura simbólica. O fogo permitiu aos hominídeos estenderem suas atividades para o período noturno, criando um novo espaço de tempo artificial — uma “noite iluminada” — que favoreceu o aprendizado coletivo e o fortalecimento de vínculos afetivos.
           Um dado curioso revelado por estudos contemporâneos é o tempo médio diário que um primata gastaria para se alimentar, caso dependesse somente de alimentos crus - até seis horas diárias dedicadas apenas à mastigação. Já os Sapiens, ao adotarem o cozimento, reduziram esse tempo para menos de uma hora em média. Com isso, nossos ancestrais ganharam tempo para aprender, ensinar, migrar e criar.
           Do ponto de vista energético, o fogo foi a primeira ferramenta humana de conversão de energia. Diferentemente das outras formas de vida, que dependem exclusivamente de fontes energéticas internas (como calorias oriundas de alimentos crus), os Sapiens passaram a ter graus de controle de uma reação exotérmica — a combustão — para modificar seu ambiente e seu próprio corpo. Trata-se do primeiro uso sistemático de energia exógena, que se tornaria o modelo para todas as revoluções energéticas seguintes: a do carvão, do petróleo, da eletricidade e digital. A utilização dessa força exógena marca outro ponto que simboliza a superação do Homem da contradição imposta pela Natureza, de acordo com “o conceito de tecnologia” de Alvaro Vieira Pinto (1977). Sob a ação ativa e consciente da espécie Homus, a natureza deixa de ser cada vez mais uma oposição à sobrevivência do Homem e passa a ser, inclusive, um fator favorecedor da sua sobrevivência. O domínio do fogo é, então, mais um degrau superado na escada humana de manipulação das leis da natureza ao seu favor.
           O impacto cultural e simbólico do fogo também foi explorado pela ficção. O filme francês “A Guerra do Fogo”, de 1981, dirigido por Jean-Jacques Annaud, dramatiza com intensidade a luta de grupos humanos primitivos para preservar e redescobrir o fogo após perdê-lo. Ambientado há 80 mil anos, a obra retrata a importância do fogo como tecnologia central à sobrevivência. Ainda, ilustra como o fogo era visto como um bem sagrado e estratégico, cuja perda colocava em risco a existência da comunidade.
           Assim sendo, o domínio do fogo foi uma revolução energética no sentido mais amplo do termo: uma transformação estrutural na forma como os seres humanos obtêm, distribuem e aplicam energia. Foi a partir do fogo que se tornou possível cozinhar, crescer cerebralmente, formar grupos estáveis e planejar o futuro. Essa energia controlada alterou o curso da evolução, criando um tipo de animal: o animal que cozinha, o animal que pensa, os Sapiens.

OBS: Coluna publicada mensalmente na revista - "O Setor Elétrico".

 


*Danilo de Souza é professor na FAET/UFMT e pesquisador no NIEPE/FE/UFMT e no Instituto de Energia e Ambiente IEE/USP.

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