Sexta, 08 Outubro 2021 17:32

 Agricultor Marciano com parte da sua produção agroecológica

 

Embora o Agronegócio insista em afirmar que é tec, é pop, é tudo, no período em que o Brasil comemora a Semana da Agroecologia, que teve início no dia 03/10, há que se dizer: já está mais do que evidente que é preciso encontrar outras formas de produção agrícola. Aliás, um setor que cultiva commodities para exportação e não alimentos para matar a fome, só é um bom negócio para os latifundiários, porque empobrece o solo, o meio ambiente, as relações de trabalho e a sociedade como um todo, a partir das isenções fiscais que deixam de render valores expressivos aos cofres públicos – cerca de R$ 6,2 bilhões anualmente.   

 

O ensino superior, produtor de conhecimento, ciência e tecnologia, dentro das universidades - especialmente as públicas - é um dos encarregados de desmistificar a lógica desse tipo de produção, inserido no imaginário social com ajuda dos recursos midiáticos, apenas por interesses econômicos. Deve ser por isso que o Governo Federal, cúmplice da iniciativa privada, acaba de anunciar a “realocação” de 92% dos recursos destinados à Ciência para outras áreas.

 

Enquanto isso, as universidades se esforçam para devolver à sociedade um pouco do que ela investe na ciência. Em Sinop, por exemplo, o Projeto Gaia Rede de Cooperação para Sustentabilidade, desenvolvido no campus da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), tem plantado a semente da Agroecologia desde agosto de 2019. O público alvo são os trabalhadores terceirizados do campus, comunidades em risco de vulnerabilidade socioeconômica, pessoas da terceira idade, agricultores urbanos, periurbanos e rurais, assentados da reforma agrária, além de acadêmicos e estudantes da UFMT, Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), Escola Técnica de Sinop e comunidade em geral.

 

De acordo com a coordenadora, Rafaella Felipe, o principal objetivo do Projeto Gaia é a justamente a disseminação da Agroecologia. “O Projeto Gaia – Rede de Cooperação para a Sustentabilidade, inserido no contexto do Ensino, da Extensão e da Pesquisa, tem como objetivo estabelecer e fortalecer uma Rede de Produção e Comercialização de alimentos produzidos em transição agroecológica no âmbito da agricultura familiar rural e periurbana na região norte de Mato Grosso. A Agroecologia é uma ciência que integra conhecimento de diversas áreas, além de agregar também saberes populares e tradicionais, de comunidades indígenas e camponesas. Dessa forma, ela contribui para a consolidação em curto, médio e longo prazo de alguns dos objetivos de desenvolvimento sustentável, reduzindo as desigualdades”, explica a docente, que atua no Instituto de Ciências Naturais, Humanas e Sociais.

 

“Por meio da Agroecologia é possível trabalhar com ecossistemas livres de agrotóxicos como os inseticidas, o que favorece de forma impactante não apenas a produção vegetal, como também a produção animal como a meliponiculrura [produção de abelhas sem ferrão]. Em dez, das doze propriedades que receberão, ou já receberam os Sistemas Agroflorestais, serão instaladas caixas racionais de abelhas nativas sem ferrão. A professora Carmen Wobeto, especialista nesta área, atuará na formação de acadêmicos e produtores e trabalhará junto aos agricultores toda a cadeia de produção, com o controle de qualidade e comercialização do mel. Assim, além da produção vegetal agroecológica diversificada, estes agricultores terão outra fonte de renda, tão importante e valorizada não apenas em nossa região, mas também nacional e internacionalmente. É de grande importância compreender também os importantes e essenciais serviços ecossistêmicos que a meliponicultora trará para estas unidades de produção, entre elas, a polinização, que é essencial para produção de alimentos e para a manutenção das populações selvagens de plantas”, acrescenta a professora.

 

 Planejamento e formação para autonomia dos agricultores é um dos objetivos do Projeto 

 

Além de fomentar a meliponicultura e a produção de mel de abelhas nativa, o Projeto Gaia também tem como objetivos selecionar as propriedades em que poderão ser implantados os Sistemas Agroflorestais, como Unidades de Aprendizagem, com posterior levantamento da produção e comercialização dos produtos (cadastro socioeconômico) e mapeamento de uso e ocupação do solo, organizando um banco de dados geocodificados das propriedades mapeadas; promover e fortalecer a produção de frutas, hortaliças, raízes e tubérculos, grãos e plantas alimentícias não convencionais em transição agroecológica e dos produtos beneficiados pelos agricultores; propiciar a melhoria do processo de gestão para comercialização dos gêneros agroecológicos produzidos nas unidades atendidas pelo Projeto; e prestar atendimentos de base ecológica nas áreas de horticultura, fruticultura, fitopatologia e entomologia aos produtores e das comunidades público-alvo do Projeto.  

 

De acordo com Rafaella Felipe, o projeto destaca-se pela multi, inter e transdisciplinaridade, aspectos relevantes para a Agroecologia que, por princípio, abarca as dimensões ambiental, ética, cultural, financeira, técnico produtiva e política. “De forma aplicada, trabalhamos com a Agroecologia, junto a 12 propriedades de agricultores familiares, através da implantação de Sistemas Agroflorestais, com cultivos diversos, atuando em toda a cadeia de produção, deste o plantio, manejo agroecológico, gestão, sensibilização dos consumidores e comercialização dos alimentos produzidos e processados nas unidades produtivas. Outro grande diferencial do Projeto Gaia á a assistência técnica com foco na saúde do solo - solo saudável, planta saudável, ser humano saudável -, com técnicas que focam na manutenção da saúde desse solo e, consequentemente, na prevenção de doenças e pragas. Também tentamos contribuir com a autonomia dos agricultores, através das oficinas práticas de produção de bioinsumos, peletização [revestimento com biofertilizante e pó de rocha] de sementes, e dos demais manejos ecológicos, como cobertura de solo, adubação verde, melhor utilização dos recursos hídricos, consórcios de plantas entre outros”, destaca.

 

Visitas escolares às Unidades de Aprendizagem, promovidas por educadores da Escola Estadual Rural Florestan Fernandes 

 

Nesse sentido, uma grande parceira do Projeto Gaia é a Cooperativa dos Produtores Agropecuários da Região  Norte do Estado de Mato Grosso (Coopervia), localizada no Assentamento 12 de Outubro, em Cláudia, MT. Os agricultores da Coopevia foram os primeiros a implantarem a produção agroecológica, há quase dez anos, e foram a grande inspiração para o início do Projeto Gaia. 

 

Em tempo de pandemia, alerta a docente, é ainda mais urgente que a universidade aumente seus esforços para contribuir efetivamente como a redução das negativas consequências da pandemia para a população em risco de vulnerabilidade social, devido à redução da renda familiar, redução do consumo de alimentos saudáveis e maior exposição a doenças e transtornos psicossociais, sobretudo para os agricultores familiares, afetados drasticamente com a redução da comercialização de alimentos e diversas consequências de ordem material e psicossocial.

 

 

 

Por isso, além do trabalho presencial, como o plantio, manejo e a colheita dos alimentos, realizado sempre com respeito às medidas de segurança preconizadas pelos órgãos de saúde, o Projeto também mantém diálogo por meio das mídias virtuais, para planejamento, levantamento de demandas, estudo e avaliação das atividades (clique aqui para conhecer a página no Instagram - @ProjetoGaia2019).

 

Os cultivos são diversos: frutas, hortaliças, raízes, tubérculos, grãos, plantas condimentares, medicinais e plantas alimentícias não convencionais, comercializados até então na Feira Agroecológica do Cantasol. “O Cantasol é um outro Projeto de Extensão, organizado por professores da UNEMAT, que há oito anos auxilia na comercialização de produtos agroecológicos em Sinop, produzidos pelos cooperados da Coopervia. Estamos em fase de organização da Feira Agroecológica do Projeto Gaia, que receberá a produção das 12 propriedades e produção de demais agricultores em transição  que atendam os quesitos de transição agroecológica. Os produtos comercializados são todos produzidos nas hortas, quintais e nos Sistemas Agroflorestais dos agricultores beneficiados e também, os processados na agroindústria como pães, bolos, doces, compotas, macarrão, tortas, bolachas, biscoitos e produtos do extrativismo, como castanha-do-brasil”, concluiu Rafaella Felipe.

 

A professora lembra, ainda que o Projeto tem apoio do REM MT (REDD Early Movers Mato Grosso), uma premiação dos governos da Alemanha e do Reino Unido, por meio do Banco Alemão de Desenvolvimento (KFW), ao Estado do Mato Grosso, pelos resultados na redução do desmatamento nos últimos anos (2006-2015). O Programa REM MT beneficia aqueles que contribuem com ações de conservação da floresta, como os agricultores familiares, as comunidades tradicionais e os povos indígenas, e fomenta iniciativas que estimulam a agricultura de baixo carbono e a redução do desmatamento, a fim de reduzir emissões de CO² no planeta, é coordenado pelo Governo do Estado de Mato Grosso, por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA), e tem como gestor financeiro o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO) - saiba mais aqui.

 

Mais informações sobre o Projeto Sustenntabilidade Gaia você também encontra em: UFMT SIEx - Gaia - Rede de Cooperação para a sustentabilidade - Enfrentamento à COVID-19

 

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind

Imagens: Equipe Gaia

Segunda, 27 Setembro 2021 10:47

Diante do aprofundamento das ações e políticas de precarização da universidade pública, a Associação dos Docentes da Universidade Federal de Mato Grosso – Seção Sindical do ANDES Sindicato Nacional (Adufmat-Ssind) inicia mais uma campanha para defender a instituição. Intitulada “Em defesa da UFMT”, a proposta é munir a comunidade acadêmica com materiais diversos que favoreçam reflexões e posicionamentos com relações a questões internas.

A primeira discussão será sobre a normatização dos registros de encargos docentes, que neste momento passa por mais uma fase importante. Em 2010, a Resolução 158 do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) da UFMT determinou, em seu artigo 3º: “caberá ao Colegiado da Unidade Acadêmica definir os critérios e aprovar a distribuição das atividades de ensino entre os docentes conforme a organização administrativa de cada unidade e obedecendo aos seguintes requisitos: I - No regime de tempo parcial (20 horas semanais), no mínimo de 08 horas-aulas semanais; II - No regime de tempo integral (40 horas semanais ou Dedicação Exclusiva).

Devido à crescente necessidade contratação de novos docentes para partilhar das atividades de ensino, pesquisa e extensão - indissociáveis na universidade pública -, os registros de encargos docentes, feitos especialmente no Plano Individual de Atividades (PIA), na maioria das vezes, acabada ultrapassando a jornada estabelecida em contrato, que na UFMT são de 20 ou 40h semanais. Alguns docentes registram apenas as horas previstas em seu contrato, mas reclamam que deixam de contemplar outras atividades importantes; outros registram a maior parte e acabam ultrapassando as horas contratadas.

Assim, o debate que sempre precisou ser feito na universidade foi retomado em 2016 pela Reitoria, não pela identificação da necessidade de contratação de mais docentes, mas para atender uma exigência de órgão externo, visando impedir que os professores registrassem mais do que as 20h ou 40h previstas em contrato. A Adufmat-Ssind apresentou uma contraproposta à minuta elaborada pelo Consepe, à época, e as discussões até avançaram, especialmente no primeiro semestre de 2017, já com a presença do atual reitor à frente do Conselho. No entanto, de forma inexplicável, o debate foi retirado da pauta em junho do mesmo ano, quando a então reitora Myrian Serra retornou de licença saúde, sendo retomado apenas no final de 2019. Além disso, novas resoluções foram aprovadas pelo próprio Conselho em anos posteriores – a maioria, a pedido da Reitoria -, causando conflitos e inseguranças aos diretores e coordenadores responsáveis pela homologação desses registros.

“O fato é que, se é um risco de responsabilização pessoal homologar PIAS com horas a mais, não considerar o trabalho realizado é igualmente injusto e não é só isso. Não homologar PIAs com carga horária superior às horas contratadas auxilia a instituição a produzir provas falsas sobre sua realidade, justificando posteriormente a não realização de concursos, a redução de recursos destinados e, consequentemente, precarizando ainda mais a universidade, que já está sofrendo há anos exatamente com a redução de investimentos”.

Após algumas manifestações de diretores de institutos, já este ano, sobre os desacordos das resoluções Consepe a respeito dos registros de encargos docentes, a Reitoria da UFMT, alinhada às políticas dos governos neoliberais que sucateiam os serviços públicos, tenta aprovar, no Conselho Universitário (Consuni), uma resolução que estabeleceria o registro híbrido - carga horária prevista em contrato e o excedente em pontos -, alegando se tratar meramente de uma questão administrativa.

Além de não se tratar apenas de questão administrativa, a Adufmat-Ssind alerta sobre o fato de o Consuni não ser o espaço legal e legítimo para discutir e deliberar sobre o tema. Inclusive, o sindicato conseguiu recentemente uma liminar para suspender o debate no Consuni, para que seja feito da maneira apropriada no espaço historicamente utilizado para isso (leia mais aqui).

No primeiro vídeo da campanha “Em Defesa da UFMT”, o professor do Departamento de Filosofia, Breno Santos, membro do Consepe, pauta o debate sobre essa discussão. Assista a seguir:

Para saber mais leia também a CARTA ABERTA AOS DIRIGENTES DE INSTITUTOS, FACULDADES, DEPARTAMENTOS E CURSOS DA UFMT (clique aqui).

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind

Terça, 21 Julho 2020 10:34

 

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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Leonardo Santos, Prof, do Dpto. de Serviço Social da UFMT, Militante da Corrente Sindical Unidade Classista
 

 

Absolutamente condenável é uma “educação popular sob incumbência do Estado”. Uma coisa é estabelecer, por uma lei geral, os recursos das escolas públicas, a qualificação do pessoal docente, os currículos etc. [...], outra muito diferente é conferir ao Estado o papel de educador do povo! O Governo e a igreja devem antes ser excluídos de qualquer influência sobre a Escola. [...] é o Estado que, ao contrário, necessita receber do povo uma educação muito rigorosa. (MARX, 2012, p. 46)

 

         Dentre tantos dramas, quem defende o caráter público e gratuito das universidades brasileiras tem de lidar com um pensamento endogenista e autocentrado profundamente arraigado nas comunidades universitárias. Por exemplo, diante do drama do atual contexto pandêmico em que vivemos, temos a insistência dos órgãos de direção das universidades em se manter debatendo ensino remoto e consultas sobre processos eleitorais de reitorias... As universidades brasileiras têm demonstrado um rico potencial – na pesquisa e na extensão – de serem linha de frente no enfrentamento desse difícil momento, mas na maioria dos casos suas direções não cumprem o papel de organização dessas iniciativas, seguem fingindo uma volta à normalidade que não coaduna com a realidade e, pior ainda, aproveitam o momento para deferir golpes de sucateamento e privatização, seguindo à risca a linha do Governo Federal.

            A universidade e a educação são um direito social, e como qualquer direito são frutos de interesses contraditórios, alguns antagônicos. Por um lado, é nítido que a universidade e a educação pública em geral não existiriam como as conhecemos sem uma longa história de lutas da classe trabalhadora, permeada de vitórias que fizeram com que o Estado garantisse escolas e universidades públicas. Por outro lado, a educação e as universidades públicas são construídas no intuito de garantir a formação e a qualificação de mão de obra para o capital, e qualquer observação mais atenta entende que nossas escolas e universidades têm uma assustadora centralidade na manutenção da exploração capitalista e das opressões a ela vinculadas, sendo espaços importantes de naturalização dessa sociedade, cumprindo o papel de aparelho privado de hegemonia (COUTINHO, 1994).

            Assim, se o capitalismo transformou as universidades europeias e criou as estadunidenses no século XIX para servir aos seus interesses, as lutas sociais foram indispensáveis para moldá-las de lá para cá, tornando-as mais democráticas, acessíveis e ampliando sua função social a partir das necessidades concretas das classes trabalhadoras. Vale ressaltar o quanto é fundamental para o modelo de universidade que temos hoje a Reforma Universitária de Córdoba, em 1918. A partir da luta se estabeleceu naquela universidade argentina acesso universal e um direcionamento político visando enfrentar as expressões da questão social no país. E não nos parece casual que tais demandas tenham vindo das sociedades latino-americanas. É a partir desse exemplo que nasce a Extensão como pilar da nossa compreensão de universidade. Em suma: entender as escolas e universidades como aparelhos privados de hegemonia não invalida a luta em defesa destas, principalmente calcada em uma educação e uma universidade que possa ir além da reprodução da mão de obra, da “formação para o mercado de trabalho”.

            O destino das escolas e universidades públicas sempre esteve visceralmente ligado à correlação de forças nas lutas de classes. Pensemos que a Reforma de Córdoba nasce na esteira das revoluções mexicana e russa; pensemos que as revoltas mundiais de estudantes em 1968 estava profundamente ligada à crise que se avizinhava e estiveram em muitos lugares unidas às greves operárias; ou ainda, pensemos que no Brasil, após o golpe de 1964 e o desmantelamento das principais organizações partidárias, sindicais e populares, foi o Movimento Estudantil que tomou a dianteira da luta contra a Ditadura. Ainda é válido mencionar que o teor de modernização conservadora da reforma universitária brasileira de 1968 está intimamente relacionado com o contexto de Ditadura e a necessidade de conter o Movimento Estudantil da época.

            Assim, pensando na atual correlação de forças, vemos o quão problemático pode ser o futuro de nossas universidades. A partir de 1968-1973 o capital entra em uma crise estrutural (MÉSZÁROS, 2010) sem precedentes. Como resposta ela engendra um conjunto de medidas que restaura seu poder de classe (HARVEY, 2014) a partir do trinômio neoliberalismo, reestruturação produtiva e mundialização do capital com hegemonia do capital financeiro. Isso significa o fim do padrão fordista e keynesiano do capitalismo global (BEHRING, 2003). No âmbito da educação e das universidades, houve a partir daí um ataque brutal ao seu caráter público e gratuito, um redimensionamento das suas funções, com a defesa agora de uma relação mais direta com o “mercado”, além de uma mudança no perfil dos seus formandos, visando um profissional “polivalente”, mais tecnicista, voltado mais diretamente para os interesses da reestruturação produtiva.

            Se ainda temos escolas e universidade públicas e principalmente gratuitas, isso se dá por conta das lutas travadas por estudantes, professores, técnico-administrativos e demais movimentos que entendem sua importância. No Brasil, políticas como o FIES e o PROUNI nos mostram qual o caráter do Ensino superior defendido pelo grande capital. Mesmo no interior das universidades públicas temos um forte processo de privatização, ancorado na precarização dos cursos e serviços que não são “privatizáveis”.

            Levando-se em consideração que esse processo já tem em torno de 50 anos, não se pode dizer que ele seja necessariamente uma novidade. Contudo, estamos entrando em uma nova e assustadora fase desse mesmo modelo, com a crise capitalista de 2008-2009, o grande capital começou a operar o que entendemos como um novo ciclo de dominação burguesa, um ultraliberalismo que vai acirrar a retirada de direitos, a destruição de políticas sociais e a entrega de riquezas nacionais para “acalmar o mercado”. Para isso se utiliza de toda sorte de iniciativas, mas principalmente do advento de golpes estatais e governos de extrema-direita com tendências fascistas. São levadas à última instância as características privatistas, antidemocráticas e tecnocratas do Estado neoliberal. O Brasil tem sido laboratório para boa parte dessas medidas que se tornam tendência mundial na última década. No âmbito das universidades, que em nenhum momento deixaram de ser atacadas, agora surge uma proposta de golpe final, através do Projeto Future-se.

            Nunca deixamos de resistir. A bandeira de uma universidade pública, gratuita, de qualidade, presencial, laica e “socialmente referenciada” foi construída ao longo das últimas décadas por diversos movimentos, militantes e entidades. E nunca é demais insistir que é graças a esses movimentos que continuamos de pé até hoje. Contudo, dia-a-dia, o capital descortina o seu caráter de barbárie. As possibilidades de luta no interior da ordem, se sempre foram limitadas, principalmente em um país dependente e subdesenvolvido como o Brasil (FERNANDES, 2005), agora se tornam praticamente inexistentes. Uma grande unidade ultraliberal ataca a universidade brasileira, que tem no Bolsonarismo a sua expressão mais nefasta, mas que tem apoio em outros setores, como o “Centrão” do Congresso Nacional e por vezes na “esquerda da ordem” (SAMPAIO JUNIOR, 2014). A Universidade do capital começa a aparecer sem máscaras e sem qualquer concessão democrática ou igualitarista. Ela é socialmente referenciada na sociedade do capital em crise, na barbárie (IASI, 2011)

            O que nos resta, afinal? Nos resta entender que a sorte da universidade brasileira está intrinsecamente ligada à sorte da sociedade brasileira, e que a construção de uma universidade que atenda aos interesses da maioria da população – ou seja, trabalhadores e trabalhadoras, do campo e da cidade, dos povos originários, sujeitos LGBT, das periferias, dos assentamentos e acampamentos, negros e negras, desempregados e jovens – só se dará com a retomada da força e da organização da maioria dessa população, das massas trabalhadoras. Assim, entendemos que mais do que pautas de reformas da educação e da universidade que temos, nos interessa reconstruir uma universidade a partir dos interesses do povo trabalhador, construir uma Educação Popular e uma Universidade Popular, que se neguem a coexistir com os interesses do “mercado”, que se posicionem na luta de classes, contra a barbarização da vida em andamento e pela socialização do conhecimento, da filosofia, das ciências, das artes e da riqueza material e imaterial socialmente produzida. Assim, os projetos de Educação e Universidade Popular são mais uma trincheira na luta contra hegemônica pelo Poder Popular na perspectiva da emancipação humana, são uma trincheira na luta por uma outra sociedade, onde uma outra educação e universidade possam se concretizar.

            Marx e Engels, no seu essencial A ideologia alemã, ao falar do comunismo, nos dizem que

"O comunismo não é para nós um estado de coisas que deva ser estabelecido, um ideal pelo qual a realidade terá de se regular. Chamamos comunismo ao movimento real que supera o atual estado de coisas.” (2009, p. 52)

 
            Assim, também a Universidade Popular não é um ideal de universidade para um futuro distante, chamamos Universidade Popular ao movimento real que se contrapõe à Universidade do Capital, ao movimento que constrói no hoje as bases da necessária construção de uma educação e universidade para além do Capital. E é de suma importância que nesse movimento, sem hegemonismo e sem autoproclamação, tenha espaço para todas as experiências já existentes e que caminham no mesmo sentido, por vezes isoladas, atomizadas.

            Nos debates que temos feito em torno da pauta de uma Universidade Popular, sempre aparecem questionamentos sobre o utopismo dessa proposta, sobre a necessidade de centrarmos nossa luta contra os ataques do momento, e sobre não idealizarmos um projeto que não tem viabilidade na atualidade. Bem, isso nos parece uma falsa contraposição que nos coloca em uma situação defensiva e desarmada. As experiências históricas no capitalismo nos mostram que é justamente quando as classes trabalhadoras têm organização e projeto próprio, que conseguimos conquistas de direitos. É justamente quando apontamos para a ruptura com a ordem que pressionamos por conquistas dentro da ordem.

            Bem nos disse, há mais de cem anos, Rosa Luxemburgo,

[...] não é a sorte do movimento socialista que está ligado à democracia burguesa, mas, ao contrário, a do desenvolvimento democrático que está ligada ao movimento socialista. [...] a democracia não vai sendo viável na medida em que a classe operária renuncia à sua luta emancipadora, mas, ao contrário, na medida em que o movimento socialista vai fortalecendo-se bastante para lutar contra as consequências reacionárias da política mundial e da deserção burguesa. [...] os que desejarem o reforçamento da democracia devem desejar igualmente o reforçamento, e não o enfraquecimento, do movimento socialista, e que, renunciando aos esforços socialistas, renuncia-se tanto ao movimento operário quanto à própria democracia. (2015, p.97-98)

 
            O século que se passou não desmentiu sua análise. A defesa da atual universidade e educação pública existentes passa não por deixar de lado um projeto de universidade alternativo, pelo contrário, só resistiremos a partir de um projeto de Educação e Universidade Popular!

            É nessa perspectiva que se tem construído nos últimos anos o Movimento por uma Universidade Popular – MUP e o Movimento por uma Educação Popular – MEP. Que já contaram com um Seminário nacional em 2011 e um Encontro nacional em 2014. Atualmente, além de organizados no Movimento Estudantil de todos os Estados brasileiros, o MUP e o MEP se apresentam no interior do movimento docente, seja no ANDES ou no SINASEFE. É apenas o começo, a construção de uma educação e Universidade popular demanda um movimento massivo e muito organizado! E é por isso que neste ano, mesmo com todas as dificuldades acirradas pela crise sanitária, tem sido realizadas Plenárias conjuntas em todos os Estados. Vamos também, no próximo sábado, dia 25 de julho, participar da Plenária do MUP e do MEP em Mato Grosso!

A plenária será online e as inscrições são feitas pelo link abaixo.

https://forms.gle/cVg4ypHLffjmMHbc8

Nos vemos lá!

 
 
REFERÊNCIAS
 
BEHRING, Elaine Rossetti. Brasil em Contrareforma: desestruturação do Estado e perda de direitos. São Paulo: Cortez, 2003.
 
Coutinho, Carlos Nelson. Marxismo e política: a dualidade de poderes e outros ensaios. São Paulo: Cortez, 1994.
 
FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5 ed. São Paulo: Globo, 2005.
 
HARVEY, David. O neoliberalismo: história e implicações. 5 ed. São Paulo: Edições Loyola, 2014.
 
IASI, Mauro Luis. Movimento por uma Universidade Popular. Blog da Boitempo, São Paulo, 14 de set. de 2011. Disponível em: https://blogdaboitempo.com.br/2011/09/14/movimento-por-uma-universidade-popula/. Acesso em: 19 de jul de 2020.
 
LUXEMBURGO, Rosa. Reforma ou revolução? 3 ed. São Paulo: Expressão Popular, 2015.
 
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. 1 ed. São Paulo: Expressão Popular, 2009.
 
MARX, Karl. Crítica do Programa de Gotha. São Paulo: Boitempo, 2012.
 
MÉSZÁROS, István. Atualidade histórica da ofensiva socialista: uma alternativa radical ao sistema parlamentar. São Paulo: Boitempo, 2010.
 
SAMPAIO JUNIOR, Plínio de Arruda. (Org.). Jornadas de junho: a revolta popular em debate. São Paulo: Instituto Caio Prado Jr., 2014.
 
 
Leonardo Santos
Assistente social, CRESS 3ª Região - Nº 6420

Terça, 16 Junho 2020 22:45

 

Nessa quarta-feira, A Adufmat-Ssind convida a todos para o debate "Autonomia Universitária", que será realizado nessa quarta-feira, 17/06, às 19h30, por meio de Live, na página oficial da Adufmat-Ssind. Os convidados são os professores da UFMT Sirlei Silveira (Departamento de Sociologia e Ciência Política) e José Domingues de Godoi Filho (Faculdade de Geologia da UFMT).

 

Participe! Link direto para a página daAdufmat-Ssind no facebook: https://www.facebook.com/ADUFMAT-SSIND-211669182221828

Sexta, 22 Maio 2020 18:04

 

A Associação dos Docentes (Adufmat-Ssind), o Sindicato dos Técnico-administrativos (Sintuf-MT) e o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) convidam todos os pré-candidatos à Reitoria da instituição para um debate na próxima quinta-feira, 28/05, às 19h, em live na página oficial da Adufmat-Ssind no Facebook.   

 

A conversa intitulada “Consulta Eleitoral em Tempos de Pandemia” pretende explorar as concepções de universidade e ideias que os candidatos devem apresentar no pleito, que estava previsto para este ano. A pandemia evidencia o protagonismo e as responsabilidades da universidade pública e gratuita, demonstrando que esse é o momento ideal para o início dos debates.

 

Os pré-candidatos dispostos a dialogar com a comunidade devem confirmar presença até às 18h da terça-feira, 26/05, preenchendo os dados necessários no seguinte formulário: https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSdSDCDWeL6YFvm767gAxtM1umwkN80vQRm037iUIfcWTwybYA/viewform?usp=sf_link .

 

Às 19h do mesmo dia haverá uma reunião com os inscritos para combinar as regras do debate.   

 

 

 

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind

Quarta, 04 Março 2020 10:36

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Tomás de A.S. Boaventura*

  

Uma educação pública e de qualidade, em seus mais diversos níveis, mantida apenas com recursos públicos, é o caminho necessário para construção de uma sociedade mais igualitária, com oportunidade para todos, num País que se quer livre, democrático e desenvolvido. Isto se torna mais premente ainda quando olhamos a complexidade e os desafios do Mundo atual.

Um dos pilares destes pressupostos é a defesa intransigente do caráter público e gratuito, da autonomia plena, da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, voltada para as demandas da maioria da população, das Universidades Públicas Brasileiras. Princípios estes formulados e preservados pelo ANDES SN desde sua fundação.

Não é por acaso que este programa fundante do nosso Sindicato tem sido, constantemente, atacado pelos governos, liberais ou neo-liberais, desde os anos 1980 e aprofundados agora, de 2016 para cá,  de forma  acelerada e, autoritariamente, avassaladora.

As interferências na democracia interna ferindo de forma direta suas autonomias,  a aplicação irrestrita do congelamento por vinte anos de investimentos públicos, o programa Future-se, já rechaçado na UFMT, são alguns exemplos imediatos das medidas privatizantes e de desmonte das IFES tomadas pelo governo de extrema-direita e proto-fascista atual. Resta evidente que as restrições orçamentárias, acompanhadas de inaceitáveis contingenciamentos durante suas consecuções, fazem parte desta política que inviabiliza e tende a destruir as Instituições Públicas de Ensino Superior tal qual defendemos e necessárias à população brasileira, em especial a mais carente.

Neste contexto insere-se, como inevitável, a valorização do seu Corpo Docente e a resposta, agora e urgente, às medidas que afetam, diretamente e de forma imediata, a vida pessoal (adoecimento e uma situação econômico-financeira insustentável) e a Carreira dos Professores das Universidades Públicas em suas mais diversas esferas.

Entre tantos ataques,  ressaltamos a agudização dos mais recentes : * o congelamento dos salários e proventos por mais de 5 anos, como a indecente e inconstitucional quebra da paridade entre o que recebem os docentes da ativa e os aposentados  * o aumento da alíquota  da contribuição previdenciária de 11% para 14% (com a excrescência jurídica de cobrar esta contribuição aos aposentados); * o corte das verbas/bolsas de projetos de pesquisa e programas de pós-graduação; * a recusa do Judiciário Federal em nos devolver os  28% em nossos salários e proventos (R.Decisão já transitada em julgado); * as investidas contra a democracia interna nas Instituições, em afronta à determinação constitucional que garante sua Autonomia, como no Future-se, e na nomeação pelo governo de Reitores, desobedecendo a classificação das listas tríplices e até fora das mesmas, impondo verdadeiros Interventores; * a proibição de concursos públicos e a contratação em massa, em bases precarizadas,  de professores temporários; * ou como vem assinalado na propalada (contra) Reforma Administrativa : quebra da estabilidade do Servidor Público e a redução dos seus atuais vencimentos em até 25%.

Por estas questões centrais, entre outras, o 39° Congresso do ANDES SN/ Fevereiro 2020/SP., decidiu apontar para suas Seções Sindicais mobilizações e um enfrentamento direto desta caótica situação, inclusive com Greve a partir de março, nas Instituições Públicas de Ensino Superior em todo o País.

Assim, deve a ADUFMATss. deve convocar, neste momento, toda a Sociedade de Mato Grosso, assim como toda a Comunidade Acadêmica da UFMT, para defender e lutar pela Universidade Pública e Gratuita, Autônoma e Laica, e voltada para as necessidades da maioria da População. 

À Luta já com a Decisão em AG da data do início da GREVE !!!,  e Ditadura Nunca Mais !!!

 

*Tomás de A.S. Boaventura - Professor aposentado do Departamento de História.

  

Quinta, 16 Janeiro 2020 12:09

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Artigo enviado pelo Prof. Juacy da Silva "A universidade em busca de um novo tempo”, fonte: Caderno IHU ideias ISSN 1679-0316 (impresso) • ISSN 2448-0304 (online) Ano 17 • nº 290 • vol. 17 • 2019, de  Pedro Gilberto Gomes, Instituto Humanitas Unisinos.

Terça, 10 Dezembro 2019 10:06

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Para os mato-grossenses, 2019 é daqueles anos marcantes: Cuiabá, sua capital, completa 300 anos; sua universidade federal (a UFMT), 49.

Dito assim, tudo poderia ficar apenas no calor dos aplausos. Todavia, a UFMT tem buscado marcar este momento com homenagens valorizadoras da identidade do “povo cuiabano”. Assim, destaco um título já concedido e uma demanda ainda em curso na Instituição.

Em meados de novembro, o Conselho Superior da UFMT outorgou o título de Dra. “Honoris Causa” a Domingas Leonor da Silva. Hoje, dia 10/12, no Teatro Universitário, ocorre a cerimônia pública da homenagem.

No início dos anos 90, recém-chegado em Cuiabá, durante viagens a diversas cidades de MT para o compartilhamento de saberes acadêmicos e populares com trabalhadores da educação, conheci a Domingas, que simplesmente me ensinou a amar esta terra, esse povo, essa cultura.

Mas quem é Domingas?

Uma cuiabana de descendência indígena que, provavelmente num dia de sol, nascera em 1954, na Comunidade de São Gonçalo Beira Rio. Desde cedo, absorvera os saberes herdados de seus pais e avós.

Nas palavras do prof. Fernando Tadeu, relator do processo de outorga, “os saberes da Sra. Domingas Leonor sobre o modo de viver do ribeirinho, os segredos da arte em cerâmica, da culinária regional e a manifestação disso tudo em poesia garantem a preservação, transformando em arquivo vivo uma fonte de oralidade das mais preciosas”.

Em 1993, Domingas fundou o “Flor Ribeirinha”, o grupo de dança que já fez franceses, alemães, belgas, chineses e turcos assistirem ao siriri e ao cururu, duas das maiores expressões culturais de MT. Na Turquia, o grupo foi campeão mundial do Festival Internacional de Arte e Cultura.

Que honra ter podido participar também desse momento! A Dra. Domingas Leonor, agora mais do que nunca ao nosso lado, só nos enriquece, nos enche de orgulho.

Por outra sorte, o primeiro título de “Notório Saber” que já poderia ter sido concedido na UFMT, ainda se arrasta nos meandros da burocracia, que, aliás, pode estar escondendo ações (ou omissões) indevidas.

Explico: desde 2016, o professor Abel Santos Anjos Filho vem pleiteando o título de Dr. Notório Saber. Infeliz e imprudentemente, há quem lhe indique o percurso convencional para a obtenção do título de doutor.

Aqui, advirto para a possibilidade de preconceitos diante da solicitação desse colega. O convencional é para os convencionais, que são muitos. A notoriedade é para os notórios, que são poucos. Simples assim. As produções acadêmicas e artísticas do professor Abel se encaixam na notoriedade. Ademais, seu pleito é legal.

Abel pertence ao grupo dos primeiros colegas que tive no Instituto de Linguagens. De cara, passei admirá-lo como artista buscando valorizar a arte e a cultura populares de MT. Logo depois, a respeitar também sua trajetória acadêmica, pois foi ele o primeiro a levar os signos mais representativos de nossa cultura regional ao exterior.

E seu percurso artístico/acadêmico tem sido profícuo. Até o momento, são quatro livros publicados, além de diversas composições de obras musicais eruditas, sacras e populares. Do conjunto, destaco a “Sinfonia Pantaneira”, primeira obra, no mundo, para viola de cocho e orquestra.

Em 1995, Abel foi escolhido como um dos personagens do Programa “Gente que faz”, da Rede Globo/BamerindusAssim, produziu e compôs arranjos musicais de 26 CD’s sobre a cultura regional, com destaque às manifestações do cururu e siriri.

Na condição de palestrante, em 1996, foi recebido pelas universidades portuguesas do Porto, Aveiro e Évora. Em Paris, apresentou-se a um grupo de Etnomusicólogos da Sorbonne.

Lá mesmo, um ano depois, no “Musée de L’Homme”, mas na condição de concertista, realizou um concerto-palestra na abertura da temporada de Primavera de Paris. Ao final, em nome de todos nós, presentou o museu com um exemplar da viola de cocho; faltava esse instrumento naquele espaço. Não falta mais.

Na sequência, recebeu uma bolsa de investigação científica pela Fundação Calouste Gulbenkian de Lisboa, o que lhe possibilitou realizar pesquisas sobre a viola de cocho em território europeu. Isso se encontra documentado no Livro/CD “Uma Melodia Histórica”, de 2002.

Portanto, após o importante “honoris causa” a Domingas Leonor, a UFMT, infelizmente, fechará 2019 com o débito do “Notório Saber” ao professor Abel.

Espero que a dívida seja reparada em 2020, estando sua importante presença na centralidade das comemorações dos 50 anos da Instituição. Assim, gostaria de vê-lo aplaudido não somente porque poderá abrilhantar – como tem feito há décadas – mais uma cerimônia da UFMT, mas porque todos os presentes terão reconhecido seu notório e notável saber.

Em tempo: o ex-reitor Paulo Speller, na cerimônia do dia 10, recebeu o título de Emérito da UFMT.

 

Quinta, 16 Maio 2019 19:41

 

Nos últimos dias, a Adufmat-Ssind ampliou a dinâmica de discussão sobre os ataques à universidade pública e gratuita. Já foram realizados debates no Instituto de Educação – IE (no dia 10/05), e na Faculdade de Arquitetura, Engenharia e Tecnologia - FAET (no dia 13/05). Na agenda do sindicato há outros encontros marcados para os dias 20, 24 e 30/05, nos auditórios do Batatão, do ICHS/IGHD e do CCBS III, respectivamente (veja o calendário abaixo).

 

A ideia é que diferentes convidados dialoguem com a comunidade acadêmica sobre os motivos dos ataques históricos à educação, agravados nos últimos anos e declaradamente mortais no governo Bolsonaro. Sim, a universidade pública e gratuita está seriamente ameaçada e pode acabar.  

 

Mas quais sãos os motivos desses ataques e como podemos enfrentá-los?

 

As análises abordam várias perspectivas, mas convergem no sentido de que o projeto neoliberal para os serviços públicos é o mesmo, independente do nome que represente o governo: acabar com os direitos sociais garantidos pelos serviços públicos.

 

O que está sendo projetado é um modelo de educação voltado, por um lado, para o mercado, atendendo a demanda capitalista de formação tecnicista e barata e, por outro lado, por anseios típicos dos regimes fascistas, limitando a capacidade de reflexão da população e, consequentemente, de reação às propostas apresentadas.   

 

No IE (10/05), a professora Alair Silveira afirmou que mesmo com todas as inegáveis contradições, a universidade pública ainda pode ser considerada o templo da diversidade, do contraditório e do conhecimento. É um espaço onde se discute as ideias, totalmente o oposto da escola militarizada que o governo Bolsonaro considera ideal, pois não admite qualquer abertura para discordância. “A lógica da formação militar é bastante simples: um manda, outro obedece”, pontuou a docente. A universidade é, obviamente, uma ameaça a esse modelo controlador, e é por isso que se faz tão importante para a população.

 

Silveira, que é cientista política, apresentou dados de uma pesquisa ainda em andamento, que teve início em 2016, e que indica uma série de fatores que asfixiam a universidade, tanto interna quanto externamente. Cortes de recursos, criminalização dos movimentos sociais e perseguição aos docentes, apologia à ignorância, privatizações, entre outros fatores fazem parte da lista.   

 

A professora Lélica Lacerda destacou que, enquanto os serviços públicos são atacados por meio dos cortes e manipulações de informação que visam desqualificar o que é público, os bancos continuam a receber quase metade de toda a arrecadação da União com a Dívida Pública. Realizar a auditoria dessa dívida, como prevê a constituição, seria uma das formas de estabilizar a economia se, de fato, o governo se importasse com a população. “Nosso principal desafio é mostrar para as pessoas que a gente tem perspectiva, sim. Nós somos um país rico, mas essa riqueza precisa ir para o povo e não para os bancos”, disse a diretora de Imprensa da Adufmat-Ssind. No entanto, o projeto é claramente voltado para a concentração de renda nas mãos de poucos.

 

 

 

Na mesa do dia 13/05, na FAET, o professor Dorival Gonçalves apontou para o mesmo sentido, ao dizer que o governo quer acabar não apenas com a universidade, mas com a educação pública como um todo, porque as escolas militares trabalham numa outra perspectiva de formação. “A militarização das escolas visa moldar comportamentos, não educar”, afirmou.

 

Além disso, o docente relacionou a disputa pelo conhecimento à preservação da hegemonia econômica do capital, considerando que o Brasil é uma das dez potências mundiais, com ampla capacidade de crescimento, e as pesquisas realizadas nas universidades podem ser utilizadas como ferramentas para exploração das riquezas. “Não existe no mundo um país capitalista com esse número de universidades públicas federais [são 63 no Brasil], ainda mais com um potencial econômico como o nosso. No entanto, quem é que está apresentando uma das principais reações a esse governo? Então, não é só um novo mercado. Aqui ainda é um espaço do pensar, ainda há intelectuais que de uma forma ou outra estão ligados aos fenômenos sociais”, argumentou Gonçalves.

 

Os diretores da Adufmat-Ssind, Djeison Benetti e Aldi Nestor, destacaram o caráter alienador do sistema capitalista em todas as suas formas, seja no trabalho em que as pessoas realizam, mas não se reconhecem, ou na formação que capacita, mas não humaniza.  

 

A mesa avaliou ainda que a violência das ações e declarações do governo evidencia sua fragilidade. Assim, a organização dos movimentos sociais e populares será capaz de derrotar as políticas desse projeto de sociedade que tem como objetivo o empobrecimento total da população.     

 

Esses são os motivos reais pelos quais o governo ataca a Educação e as universidades públicas, que Bolsonaro tenta esconder nas entrelinhas de frases como “a universidade está tomada pela ideologia de esquerda”, “os estudantes têm de se interessar menos por política”, “os jovens brasileiros têm ‘tara’ por formação superior”, ou ainda os manifestantes são “militantes idiotas e imbecis úteis”, “não têm nada na cabeça, não sabem quanto é sete vezes oito”.

 

A Adufmat-Ssind convida todos os interessados para contribuir com essas reflexões nas próximas mesas, organizadas conforme a agenda abaixo:

 

 

 

 

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind

 

Quinta, 24 Maio 2018 19:17

 

Nessa quarta-feira, 23/05, a Adufmat-Ssind recebeu a presidente do ANDES Sindicato Nacional, Eblin Farage, e a professora Qelli Rocha, membro do Grupo de Trabalho de Políticas de Classe para questões Étnico-raciais, Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS) da Adufmat-Ssind para debater os cortes orçamentários e a resistência em defesa da educação pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada.

 

A professora Qelli Rocha iniciou a discussão com uma análise política das crises inerentes ao sistema capitalista, que evidenciam as disputas entre aqueles que pretendem manter a lógica da desigualdade e os que pensam nos reais interesses da população. “Faz parte da crise a resposta ao sistema, visando readequá-lo para que se perpetue”, disse a docente.

 

Segundo a professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Mato Grosso, nesses períodos, os ataques às instituições públicas, como as universidades, aparecem de forma bem definida, como um projeto privatista e puramente mercadológico. O congelamento dos recursos públicos por 20 anos, a partir da Emenda Constitucional 95/16, o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei 13.243/2016), a desvinculação das receitas obrigatórias da união, assim como outros contingenciamentos que inviabilizam as políticas de assistência estudantil, entre outros, evidenciam essa construção.

 

Da mesma forma, a ideologia conservadora, representadas por projetos como o Escola Sem Partido, aparecem como propostas políticas para minar concepções críticas, assegurando a imposição de medidas que, na realidade, prejudicam ainda mais a população – como as contrarreformas Trabalhista e da Previdência. “A Escola Sem Partido, na verdade, significa cada vez mais partido. A educação já é doutrinária”, afirmou a professora.        

 

Em sua análise, o desempenho dos governos petistas e sua proposta de conciliação de classe aparece como um ciclo que teve início na década de 1970, e se encerrou, de forma trágica para os trabalhadores, com as jornadas de junho de 2013. “O processo de conciliação se dissolveu em 2013, com a população em massa nas ruas, mas de maneira desorganizada. A burguesia percebeu isso e agiu. Para nós, permanece a necessidade de reorganização da classe trabalhadora”, concluiu Rocha.  

 

A presidente do ANDES-SN, Eblin Farage, lembrou que a categoria denuncia há anos a gestação do projeto de serviço público neoliberal que está se materializando atualmente. “Nós identificamos o caos e desejamos soluções imediatas, mas esse cenário é fruto de um processo progressivo que destrói o conceito de público estatal e universal, e põe no lugar serviços terceirizados e tudo o que for possível comercializar”, explicou a professora da Universidade Federal Fluminense.

 

O aumento do bandejão no Restaurante Universitário, cortes das bolsas e de recursos no geral, percebidos de maneira imediata, no cotidiano, são, portanto, reflexos de um projeto de universidade. As ações parecem isoladas, mas fazem parte de um mesmo pacote.   

 

De acordo com Farage, o modelo de universidade pública e gratuita brasileiro é um dos poucos no mundo, e só tem resistido por meio da luta organizada de trabalhadores e estudantes. “Em outros países da América Latina e da Europa até há universidade pública, mas não gratuita. Elas cobram mensalidades dos alunos. Em Portugal não há nenhuma universidade pública gratuita, e nenhum professor dessas universidades é servidor público”, afirmou a docente.

 

Os ataques às carreiras públicas também aparecem como indicadores do modelo público neoliberal. “As reformas previdenciárias dos governos Lula e Dilma são exemplos do desmonte das carreiras públicas. No meu departamento todos os professores exercem as mesmas atividades, no entanto, após 30 anos de trabalho, alguns vão se aposentar integralmente, outros com salário mitigado, calculado nos últimos vencimentos, e outros com o teto previdenciário, que pode representar 1/3 do salário atual. Essa é uma forma fazer as pessoas pensarem se realmente vale a pena ser servidor”, pontuou a presidente.

 

A abertura para terceirização da área meio, feita pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, e a autorização do governo Michel Temer de terceirização da área fim nos serviços públicos também caracterizam desmontes. A primeira pode ser percebida nos últimos anos a partir da redução dos cargos dos técnicos administrativos, substituídos por trabalhadores terceirizados, com relações de trabalho extremamente precárias. A segunda e mais recente representa o mesmo processo, agora para os professores.

 

Nesse bojo, aparece entre as propostas do governo a Reforma do Serviço Público, que deverá ser apresentada logo após as eleições, seguida da Reforma da Previdência. A ideia é criar uma carreira única de servidor, conhecida como “carreirão”, que consiste, entre outras coisas, na redução dos vencimentos. “Nessa proposta de carreirão, um professor titular, por exemplo, teria um salário de cerca de cinco mil reais a menos”, afirmou a presidente do ANDES.        

 

Resistência: a universidade pública e gratuita é um bem público

 

As duas convidadas da Adufmat-Ssind concordaram que a única alternativa dos trabalhadores para evitar o avanço dessa lógica destrutiva dos serviços públicos é a reorganização coletiva. Nesse sentido, as greves, que outrora trouxeram todos os direitos, agora são o instrumento que os mantém. Além disso, os momentos de greve são efetivos para reflexão dos trabalhadores acerca do seu trabalho e da conjuntura política que incidem sobre o cotidiano, por vezes ignorada.

 

“Nós temos alguns desafios pela frente. O primeiro é mostrar para a população que atacar os serviços públicos e os servidores é o mesmo que atacar direitos. A universidade é antes de tudo um bem público. O segundo desafio é construir a organização efetiva de docentes, estudantes e técnicos. O terceiro, ampliar os espaços de organização coletiva para além da universidade, dialogando com outras categorias”, afirmou a presidente do ANDES-SN.

 

Por fim, as convidadas encerraram suas participações destacando a importância de compreender a história para analisar e pautar as ações diante da conjuntura, no sentido de que as realidades locais são extensões das realidades nacionais e internacional.

 

 

Luana Soutos

Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind