Quinta, 18 Agosto 2016 09:18

 

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Diante da excelência do conteúdo, dos recursos tecnológicos e da variedade de linguagens vistos na abertura da Olimpíada/Rio, falarei da educação oferecida às novas gerações. 

 

Começo pelo artigo “A arte que pode(ria) nos salvar”, de Pasquale Neto (Folha de S.Paulo: 12/08). Dentre suas considerações, reproduzo quase literalmente uma preocupação sua, mas também minha: quantos brasileiros – letrados ou iletrados – tinham preparo para entender aquelas reflexões sobre nossa história?

 

A indagação de Pasquale vem após a seguinte observação de uma das cenas:

 

O subir e descer dos prédios com as pessoas a acompanhar esse subir e descer e a pular de um prédio a outro foi ‘explicado’ pela canção ‘Construção’ (de Chico Buarque), cuja letra ‘explica’, metalinguisticamente, o que envolve a construção de um edifício e de um texto, e, sobretudo, o que vive (e não vive) quem constrói esse edifício”, ou seja, um anônimo operário.

 

Na sequência desse paradoxo de nossa realidade, Pasquale indaga “o que faz a escola em relação a isso?”.  

 

De minha parte, quando estudo textos geniais com acadêmicos de Letras, o faço tão feliz quanto angustiado. Feliz por lhes mostrar tais belezas, que nos ajudam na edificação de nossa humanidade. Angustiado por saber da exclusão, por parte da maioria esmagadora, de quase tudo o que é genial e esteticamente belo, o que só aprofunda a ruína do ser humano contemporâneo atirado no mais profundo vazio existencial.

 

Tais sentimentos meus são constantes, mas eles explodem quando apresento dois poemas musicados de Chico César: “A Rosa Impúrpura do Caicó” e “Paraíba, meu amor”.

 

Na conclusão de tais aulas, questiono: dos mais de 200 milhões de brasileiros, quantos podem desfrutar textos assim? Ir no embalo de uma música, p. ex., é pouco; tão pouco que até os antigos animais circenses faziam isso a troco de alimento. À lá Macunaíma, de Mário de Andrade, “dandavam pra ganhar vintém”. 

 

Faço tais questionamentos com os textos citados porque repertórios culturais associativos do tipo são cada vez mais raros no ensino formal. A curiosidade pelo novo e pelo belo está em baixa. E olhem que não são poucos os estudantes que já dispõem de tecnologias para navegar como quiser! Outro paradoxo.

 

Mas voltando aos dois poemas citados. Em ambos, há diálogo com Stéphane Mallarmé, poeta francês do séc. 19. Entre paradoxos, antíteses e neologismos, inclusive com ricos e inusitados estrangeirismos, de forma mais explícita, no primeiro dos textos, já é dito no início:

 

Ah, Caicó arcaico// Em meu peito catolaico// Tudo é descrença e fé// Ah, Caicó arcaico// Meu cashcouer mallarmaico// Tudo rejeita e quer...”.

 

No segundo, Chico César “mergulha” no poema “Un coup de des” (Um lance de dados) do mesmo francês. De lá, para falar da saudade de sua Paraíba, vejam o que é feito:

 

Paraíba meu amor// Eu estava de saída// Mas eu vou ficar// Não quero chorar// O choro da despedida// O acaso da minha vida// Um dado não abolirá// Pois seguirás bem dentro de mim// Como um são joão sem fim...”

 

Os versos sublinhados são de Mallarmé. Extasiante! Mas quantos brasileiros esmeram seus repertórios pelo percurso escolar? Quantos entenderam, p. ex., a paradoxal força do verso “O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera”, de “A flor e náusea”, de Drummond, declamado na abertura da Olimpíada?

 

Definitivamente, a escola precisa educar para arte de ser humano. Do contrário, será longo o império das fezes, dos maus poemas, das alucinações e de muita espera.

 

Quarta, 10 Agosto 2016 17:32

 

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Levados pelo clima dos jogos olímpicos, corremos o risco de acreditarno hiperbólico sloganda Globo “Somos todos olímpicos”.

 

A propósito, em momentos de competições das quais nosso país participa, como anfitrião ou visitante, a mania de um gigantismo nacional tem sidoimposição recorrente na mídia.Contudo, em nada crescemos por conta de uma empolgação quase sempre sem lastro.

 

A quem duvidar dos exageros, diante de um telejornal, em tempos normais, basta contarsuas notícias positivas. Faça o mesmo com as negativasqueapresentam brasileiros desesperados por conta da calamidade da saúde pública, cada vez mais distante do aceitável. Ea violência urbana? Seusnúmeros superam países em guerra.

 

Infelizmente, a tranquilidade do Olimpo não é aqui.Manuel Bandeira – contrariando o nacionalismo do poeta Gonçalves Dias – entendeu bem isso; assim, determinou-se a ir “embora pra Pasárgada”.Mesmo do alto, os braços abertos do nosso Cristo Redentor são curtos demais para uma terra tão cheia de contrastes, como já mostrara Roger Bastides.

 

O gigantismo que não se sustenta nunca foi tão bem traduzidocomo em quase tudo o que envolveu a realização da Copa/2014. De grandioso mesmosóos superfaturamentos de quase todas as obras, incluindo asnão concluídas. Tais exageros em nada são positivos a ninguém, muito menos ao Estado que precisa dar dignidade de existência atodos.

 

Mas, em meio a exageros, não é um deles dizer que a cerimônia de abertura das Olímpiadas/Riofoi temática e esteticamente bem resolvidapelo grupo de artistas – cineastas, principalmente – que idealizou e deu vida ao tema; e tudo com muita tecnologia. Na medida, um show de bom gosto.

 

Só para lembrar, a Grécia antiga, berço da primeira maratona, coroava com louros não só os vencedores esportivos; corava também seus artistas. Sem contar o cultivo das reflexões filosóficas que remontam tempos pré-socráticos. Heráclito de Éfeso, observador por excelência do movimento das águas de um rio, que o diga.

 

Aqui, se não posso literalmente coroar os artistas que abrilhantaram a abertura, faço destaques do que vi pela TV.No limite, tudo contemplado: nosso dolorido percurso histórico ea abrangente luta por igualdade de direitos. Nesse sentindo, a pluralidade de nossos ritmos foi coerente.O mundo ainda viu um recado: cuidar do planeta.

 

Bem antes, surpreendentemente, acompanhado por um conjunto de cordas, a afinada voz de Paulinho da Viola (en)cantou o Hino Nacional. Marcos Valle ofereceu-nos o “Samba de verão”.

 

Lembrar da“Garota de Ipanema”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, na voz de Daniel Jobim, foi emocionante. Como bonito foi ver Gisele Bündchen desfilar sobre projeções que formavam obras de Niemeyer, sempre inspirado pelas linhas curvas.

 

Num caldeirão musical, o que falar de Elza Soares interpretandoCanto de Ossanha”, de Baden e Vinicius? Do “Rap da Felicidade”, hino das favelas, apresentado porLudmilla? O quadro foi fechado com as rappers MCSoffia, de apenas 12 anos, e KarolConka, queapresentaram Toquem os Tambores”, com versos sobre empoderamento feminino e contra o racismo.

 

Igualmente maravilhoso foi ver Wilson das Neves e o garotinho Thawan sambando numa bela união de gerações longínquas. Caetano, Gil, e acompanhados por Anitta, Ben Jor, as escolas de sambas... Tudo valeu a pena.

 

No desfecho, “A flor e a náusea” de Drummond – declamado por Fernanda Montenegro e Judi Dench – expôs um paradoxo de nosso tempo. Tudo muito digno de louros e medalha de ouro. 

Quinta, 04 Agosto 2016 13:51

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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A quem possa desconhecer, a “Síndrome de Pollyanna” baseia-se na história da personagem Pollyanna, do romance homônimo de Eleanor H. Porter. Já no parto, a garota fica órfã de mãe. Aos 11 anos, de pai. Daí em diante, passa a ser “cuidada” por uma tia tão rica quanto megera, que lhe impõe castigos e humilhações, a começar pelo quarto, que ficava no sótão da mansão. Pouco antes de morrer, o pai pede que a filha exercite sempre o “Jogo do Contente”: procurar extrair algo de bom e positivo em tudo, mesmo nas coisas mais desagradáveis.

 

Pois bem. Não para si, como ocorre na síndrome em pauta, mas para o outro, Michel Temer, no último dia 30/07, no Rio, durante uma inauguração de linha do metrô, querendo elogiar a recuperação de um câncer por parte do governador daquele estado, Luiz Fernando Pezão, disse o seguinte:

 

Quero registrar a alegria de reencontrar o Pezão. Eu até dizia a ele: que interessante Pezão, há coisas que parecem maléficas e que vêm para o bem. Porque vou até tomar a liberdade de um comentário pessoal. Você está melhor do que antes, está mais bonito. Então eu acho que (o câncer) acabou sendo uma coisa útil para o Pezão”.

 

Em momentos tais, a “seleta” plateia – sempre paga para aplaudir a idiotice que for dita – aplaudiu e achou graça da observação infeliz de Temer. Infeliz porque com doença não se brinca. Com o câncer, menos ainda. Ele é traiçoeiro. Depois da constatação de um, a pessoa se torna auto vigilante ininterrupta. A qualquer sinal estranho em seu corpo, um novo temor de um novo tumor aflora; e apavora.

 

Fiquei estarrecido com Temer. Na esteira de seus antecessores, como diz tolices também. Jamais o câncer é uma coisa maléfica que vem para o bem. Jamais é útil, a quem quer que seja. Falo como um aprendiz – não na carne, mas no sangue – desse novo conhecimento que eu não queria. Também luto para controlar um linfoma, ainda que de zona marginal esplênico. Mas é câncer. Era melhor não lhe ter.

 

Ao tê-lo, minha rotina foi modificada: consultórios; secretárias; médicos; laboratórios; exames; hospitais; clínicas; enfermeiros; psicólogos; nutricionistas; farmacêuticos; remédios na hora certa; infusões; efeitos colaterais, dos previsíveis aos imprevisíveis. Sem falar do susto e da angústia dos familiares e dos que te querem bem.

 

Além disso tudo, a consciência de que uma indústria faminta se apodera de todos os que vivenciam a doença. Para um grupo seleto de brasileiros, cerca 30% da população, os planos de saúde reinam. Todos ficam à mercê de seus tempos para liberações de tudo; e nem tudo é liberado. Em muitos casos, até porque nem precisaria mesmo. Particularmente, no desespero, paguei – e tinha de ser à vista – dois mil e quinhentos reais por um procedimento tão dolorido quanto desnecessário. Vivi essa triste experiência com a primeira médica que me atendeu. Por insistência dos familiares e amigos, livrei-me de outros e novos “erros” seus. 

 

Mas pior do que isso é saber que, de nosso povo, 70% dependem do atendimento do SUS, a cada dia mais sucateado, em prol do setor privado da saúde, ou da caridade alheia, que financia bons hospitais especializados. O resultado é previsível: para um doente de câncer nas brenhas dos sertões ou nas abandonadas periferias das grandes cidades, a morte da maioria, sem a menor assistência, é sentença anunciada.

 

Para essas cruzes anônimas, Temer jamais poderá dizer o que disse a Pezão. Aos desvalidos, o “Jogo do Contente” não tem a menor graça. Não lhes é útil.

 

Quarta, 27 Julho 2016 11:21

 

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Contrariando os manuais de redação, inseri uma pontuação no título deste artigo. Já de início foi necessário interrogar. Ademais, a paráfrase que faço do título do filme “Quem tem medo de Virginia Woolf?” – que já havia lançado mão do mesmo intertexto de “Quem tem medo do lobo mau?” – exigiu essa transgressão. Ela teve origem em uma “Carta Aberta” que uma docente da UFMT dirigiu a seus pares de Instituto recentemente.

 

Por meio da “Carta”, a docente pede voto para compor os quadros do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFMT.

 

O resultado foi duplamente positivo. Primeiro: a Instituição ganha em qualidade no referido Conselho. Segundo: a docente foi firme ao expor o conteúdo de sua atuação. Já no primeiro parágrafo, diz:

 

A universidade pública, de qualidade, gratuita, laica e socialmente referenciada tem experimentado dias muito difíceis, marcados por um persistente processo de desmonte, cujo alcance engloba muito mais do que cortes orçamentários, sucateamento das condições de trabalho e estudo, precarização e terceirização”.

 

Na sequência, começa a tocar nas centralidades que estão estrangulando nosso ensino superior público. Para isso, afirma:

 

A universidade pública tem sido aviltada, também, no processo de frouxidão acadêmica que compromete a própria história que a transformou para referência para o tripé ensino, pesquisa e extensão. Ela tem sido objeto de inúmeras iniciativas políticas e institucionais que convergem para a destruição de seu caráter público, laico e socialmente referenciado, não apenas direcionando-o para os interesses do mercado, mas colocando-a ao seu serviço”.

 

Depois, vai ao âmago da destruição das relações que envolvem o ensino-aprendizagem, dizendo:

 

“...O interesse público, o compromisso social e a responsabilidade coletiva têm sido substituídos por grades curriculares cada vez mais orientadas pela lógica mercantil e de consumidor. Para isso, disciplinas das áreas de ciências humanas e sociais têm sido suprimidas de muitos cursos com perfil cada vez, exclusivamente, técnicos”.

 

Verdade incontestável que precisa ser combatida, mas, antes, deve ser compreendida em sua abrangência. Detalhe: essa compreensão incomoda o status quo.

 

De duas décadas para cá, mas mais acentuadamente nos últimos anos, tem sido recorrente assistirmos na mídia a apresentação de matérias jornalísticas, entrevistas, quando não em anúncios publicitários, ataques a um suposto “excesso de disciplinas teóricas” nas grades curriculares do ensino brasileiro de todos os níveis.

 

Em contrapartida, a imposição do caráter técnico, amparado pela lógica do prático, tem ganhado espaço nobre nesse debate; ou melhor, nesse embate social, político e econômico, pois não é outra a questão que está por trás disso tudo.

 

Assim, os atacantes das disciplinas teóricas, aderentes a determinações/exemplos impostos por organismos internacionais, escoram-se em um suposto descolamento do ensino com a realidade. Usam os avanços tecnológicos existentes para sustentar essa farsa.

 

Se acreditarmos na farsa, acatamos essa lógica; logo, jogamos cada vez mais os estudantes pobres para os espaços da mão de obra barata, invariavelmente, desqualificada.

 

Pensar, desde o tempo colonial, continua sendo perigo aos interesses das elites. As teorias não fazem outra coisa a não ser ajudar na construção do pensamento lógico, sempre sustentado como resposta de uma realidade social.

 

Defender as disciplinas teóricas nas grades curriculares continua sendo questão de opção de classe social. Simples assim.

Quarta, 20 Julho 2016 17:45

 

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Registram os dicionários que “mediocridade” é a característica dos que se situam entre a abundância e a pobreza; dos que não possuem valor, talento, mérito; dos que são apequenados de ideias e ações. Deveríamos fugir sempre dela, embora essa fuga seja difícil. A “Deusa Mediocridade” insiste em se nos apresentar. Por isso, no Brasil, tudo vai se esvaindo na mesma nuvem de poeira produzida pelo império dos medíocres.

Hoje, para tratar outra vez desse tema, lanço mão do Discurso de Autoridade. Faço-o por meio de Jarbas Vasconcelos: um pernambucano que está há mais de 40 anos na política. Encontrei Vasconcelos no programa de Fernando Gabeira (“Centrão” domina discussões na Câmara), apresentado há pouco pela Globonews.

De início, Gabeira diz o seguinte sobre o “centrão”: “No passado havia um grupo de deputados que ficava no fundo do plenário, num lugar meio escuro. Eram chamados do baixo clero...”.

Depois, o apresentador explica que essa identificação – que faz analogia com a hierarquia da Igreja Católica – pressupunha a existência dos cardeais. Em seguida, diz: “essa realidade mudou”. Aponta como início da mudança a chegada de Severino Cavalcanti à presidência da Câmara Federal.

Após a ascensão de Severino, o baixo clero começou a ocupar as poltronas do meio e as da frente daquela casa; começou a dar as cartas. Estava formado o nosso “centrão” político. O ápice do baixo clero foi encarnado pelo inominável Eduardo Cunha. Seu substituto – a bizarra sombra de Waldir Maranhão – pode ter dado início ao declínio do baixo clero, mas isso ainda longe do fim.

Enquanto essa queda não ocorrer de fato, quem continua a decidir os rumos políticos de nosso país é exatamente essa massa de deputados, para os quais tudo se move conforme seus interesses individuais.

Pois bem. Assim que Gabeira, em seu programa, dá voz a Vasconcelos, o deputado diz que o nível da Câmara é o pior que já conheceu desde os anos 70, quando ali chegou pela primeira vez.

Vasconcelos está no terceiro mandato. Para ele, a mediocridade da Câmara – que tem 513 deputados – chega a tal ponto que, “para reunir de 12 a 15 pessoas para trocar ideias sobre a conjuntura do momento é a coisa mais difícil do mundo”.

Em sua opinião, o estágio de degeneração se evidencia pelos seguintes fatores: “o pouco interesse da população. Soma-se a isso, a eleição, que se tornou corporativa, econômica... Cada um dos que chegam aqui, chega com uma história de interesses e objetivos pessoais: ou de roubar, ou de fazer negócios, ou de ficar aqui apenas para compor um quadro de mediocridades”.

Dentro desse quadro, acaba de ser eleito à presidência daquela casa o deputado Rodrigo Maia, filho do político César Maia. A respeito de seu filho, César disse que Rodrigo “claramente fala ao médio clero, com expectativa e capacidade de ascensão”.

É verdade. Seu primeiro discurso já como presidente empossado da Câmara dos Deputados foi a prova de uma fala de médio para médios; ou seja, de medíocre para medíocres. Faltando-lhe um discurso preparado, do pouco que disse, talvez o mais significativo foi que o filho caçula seja um botafoguense. A que ponto se desceu!

Mas o que é ruim...

E tende a ficar pior mesmo, pois as tais “medidas necessárias para tirarem o Brasil da paralisia”, tão exigidas pela mídia, tendem a ser votadas. A da Previdência é uma delas. O trabalhador pagará por tudo mais uma vez; agora, com um “Congresso destravado”.

Que nos preparemos. Os medíocres continuarão a dar as cartas.

Quarta, 13 Julho 2016 11:06

 

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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No ápice da história de Portugal, ou seja, na saída da Idade Média para a Idade Moderna, a poesia portuguesa – tributária da primogênita “Cantiga da Ribeirinha” e demais cantigas trovadorescas, bem como dos audaciosos autos de Gil Vicente – navegou por “mares nunca dantes navegados”. Como poucos conseguiriam alhures, o poeta Luís Vaz de Camões cantou os grandiosos feitos de seu povo em Os Lusíadas, sua obra épica.

 

E sem preguiça, seu labor poético seguiu os cânones clássicos, herdados dos gregos e dos romanos. Nos 8.816 versos, dispostos em 1.102 estrofes, configuradas no esquema fixo das rimas (AB AB AB CC), inseridas em dez cantos, o poeta exalta Vasco da Gama, que liderara a descoberta do caminho marítimo para a Índia.

 

Junto com esse fio condutor, Camões descreve outros episódios da história de seu país. E exceto na parte final do Canto IV, no qual dá voz ao “Velho de Restelo”, que condena aquela empreitada portuguesa, ele, Camões, glorifica seu povo o tempo inteiro.

 

Já dentro do século XX, os portugueses ainda seriam brindados com outro poeta genial: Fernando Pessoa, que se desdobra em diversos heterônimos, como Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro. Um ser ímpar na literatura universal. 

 

Entre Camões e Pessoa, é mister lembrarmos ainda de, pelo menos, um romancista do século XIX: Eça de Queirós. Depois de Pessoa, seria imperdoável não mencionarmos a tão saudável quanto vital irreverência literária de José Saramago. As considerações desse ateu convicto sobre a cultura judaico-cristã são perturbadoras e insuperáveis. Muitas vezes sua prosa também mergulha fundo na poesia.

 

Portanto, o povo português, pelo menos no que diz respeito à produção literária, não tem do que reclamar. E, agora, também não têm do que reclamar quanto ao desempenho de sua seleção de futebol, que se tornou a mais nova campeã da Europa. 

 

Mas mais importante do que falar da vitória da seleção lusa de futebol é falar das cenas de comemoração do título. E dentre tais, há um destaque: aquela cena em que um garotinho português consola um choroso jovem francês que assistiu à derrota de sua seleção. Aquilo se aproximou, no plano das imagens reais, da construção de um lindo poema, pois a cena foi absolutamente lírica, imprevisível e plurissignificativa; foi uma puríssima manifestação da subjetividade humana, essencial para a concretização de um grande poema.

 

A preocupação e o respeito daquele pequenino lusitano com a dor do adversário, ainda que aquela dor pudesse ser nada perante as reais dores vividas na decante e cada vez mais excludente Europa, lhe fez proporcionar ao mundo inteiro – tão carente de humanidade – um gesto absolutamente humano e, por isso, verdadeiramente poético.

Depois disso, já nas ruas de Lisboa, em outro gesto significativo para este trágico momento político-econômico-social pelo qual passa a Europa, o ídolo mor dos lusitanos, Cristiano Ronaldo, não se esqueceu de oferecer aquele título também aos imigrantes que vivem em Portugal, dentre os quais, alguns fazem parte da seleção portuguesa. Logo, o atleta também foi poético, e daqueles que não perdem a oportunidade para expressar sua vertente mais engajada.

 

Quem diria! A Eurocopa 2016, que no início assistiu a tantas cenas de selvageria entre diferentes torcidas, fazendo-nos relembrar dos velhos digladiadores de priscas eras, acabou mergulhada em cenas poéticas, humanas, enfim; por isso, sempre necessárias para a construção de um futuro melhor para todos os povos.

Quarta, 22 Junho 2016 15:22

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Dedico este artigo à memória de Cazuza, um confesso filho da burguesia, a George Israel e a Ezequiel Neves. Juntos, eles cantaram o fedor dessa classe social, consolidada na França nos marcos de 1789. Para os três, “Enquanto houver burguesia/ Não vai haver poesia”.

 

Não mesmo. Nem sequer a genuína arte, incluindo a fotografia, como, p. ex., a mostra “Cinco Elementos do Cerrado” de Tchélo Figueiredo, que teve suas fotos censuradas por um bispo evangélico e seguidores, além da “recomendação” da Polícia Militar ao Shopping Goiabeiras (Cuiabá) para que as fotos fossem retiradas de um de seus corredores. A mostra – que exibia o nu artístico de mulheres em cenários típicos do cerrado – foi considerada inadequada para ser exibida em um shopping.

 

Excetuando alguns artigos que condenaram a censura, muitos leitores aplaudiram-na. E o fizeram dizendo que pelos shoppings transitam todo tipo de gente, principalmente a “família tradicional”: pai, mãe, filhos.

 

Aliás, as crianças foram os grandes escudos dessa grotesca e perigosa censura. Parece ter havido entre muitos leitores o acordo de que as “crianças não têm capacidade de entender aquilo”.

 

O “aquilo” trata-se do nu artístico; por isso, as crianças deveriam ser poupadas de ver as fotos. Em nome da pureza dos infantes, os adultos, repletos do cinismo burguês, acataram a censura. E quem acata uma censura está aberto a aceitar outras tantas que possam vir.

 

Diante de tudo, fiquei pensando o quão asfixiante é a nossa cultura; essa cultura que já nos coloca no mundo como corresponsáveis por pecados alheios. Consoante a Bíblia, Adão e Eva, ao desobedecerem seu Deus, de imediato, sentiram pudor de suas genitálias. Por isso, cobriram-nas com folhas. 

 

A imagem daquele arquetípico pudor, que em nada é salutar à mente humana, fica explícita na “Carta” que Caminha, em 1500, endereçara a Dom Manuel, rei de Portugal, sobre as pessoas aqui encontradas:

 

“(...) Em geral (os indígenas) são bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Não fazem o menor caso de cobrir ou mostrar suas vergonhas, e nisso são tão inocentes como quando mostram o rosto...”

 

Para os portugueses, as genitálias eram também chamadas de “vergonhas”. Para os indígenas, elas não passavam de uma parte a mais do corpo humano, do qual tudo tem função natural.

 

Que inveja tenho das culturas consideradas bárbaras por nós, civilizados e cristianizados. São tão naturais! Tão sadias! A nudez para esses povos é, ou pelo menos era antes de conhecerem nossa religião oficial, algo natural. Talvez por isso que, dentre os diferentes povos indígenas antes de quaisquer contaminações culturais, não tenhamos muitas informações – quiçá nem as tenhamos – sobre práticas do estupro, p. ex., algo típico de mentes doentias de sociedades como a nossa e congêneres.

 

É pena que os adultos comecem a desnaturalizar nossas crianças assim que elas nascem. É lamentável que os já adultos, com suas malícias à flor da pele, pensem que as crianças sejam ou possam vir a ser iguais a eles. E infelizmente serão mesmo. Se encarássemos a nudez com naturalidade desde a tenra idade, certamente não colheríamos tantos distúrbios incontornáveis.

 

Termino este artigo dizendo que a única cena que eu não gostaria de que as crianças vissem ou ficassem sabendo é que, naquele mesmo shopping, um dia, um trabalhador foi torturado, assassinado e jogado em um daqueles carrinhos que passam de loja em loja recolhendo o lixo que a burguesia produz.

 

Isso, sim, é inadequado. Ou não é?

Quarta, 15 Junho 2016 15:16

 

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Hoje, falo de nudez. Embora isso seja originariamente natural entre os animais, inclusive os “racionais”, falsos moralistas – que abundam por todos os lados – fingem dela correr desde que Eva mordeu a maçã tão malsã. De lá para cá, para alguns tipos humanos, parece que toda nudez deve ser mesmo castigada; e no bojo desses castigos também estão as censuras ao nu artístico.

 

O motivo deste artigo nasceu da leitura que fiz da opinião de um bispo evangélico em Cuiabá – “Chega do politicamente correto” – sobre uma exposição de fotografias de Tchélo Figueiredo.

 

Após ter lido o tal artigo – repleto de preconceitos e equívocos conceituais – e visto a exposição, fiquei por entender o título do texto do bispo. Não há na proposta da exposição nenhuma sugestão sobre o “politicamente correto”. Também não entendi a adesão que a “equipe de marketing” (do Shopping Goiabeiras, o local da exposição) teria feito, na opinião do bispo, “ao marxismo cultural”. Sem sentido. “Papagaíces” de censores desinformados.  

 

Em contrapartida, o título que o artista dá ao seu trabalho – “Cinco Elementos do Cerrado” – estabelece diálogo lógico com o conjunto fotográfico. O cerrado exposto por Tchélo ora se materializa em cenários campestres/aquáticos, ora se desnuda no meio de avenidas do centro da capital de Mato Grosso, a tórrida Cuiabá.

 

O resultado é o inesperado. Tudo muito bem pensado e bem dirigido pelo artista, até para que o público visse e apreciasse, mas incrivelmente nem tudo enxergasse das nuas modelos/personagens. Nada é pornográfico, como afirma o bispo.

 

Assim, a cada foto, uma delicada surpresa. Em uma, vê-se a modelo (à lá tela viva) com o corpo pintado por outro artista mato-grossense (Adir Sodré). Em outra, uma mulher deitada sobre cajus, sensualmente, mordendo-os. Em algumas, a mulher “passeia” sobre verdejantes campos de soja, a verdadeira rainha do agronegócio. Em outras ainda, as modelos se fazem confundir com peixes, pássaros e/ou retorcidas árvores, bem típicas do cerrado. Nestes casos, a confusão se dá pelo amálgama dos chifres de bois, também retorcidos, postos sobre as cabeças das modelos/personagens.

 

Nas fotos em que os cenários são pontos urbanos subjaz a possibilidade de uma lembrança: no escaldante asfalto, a vegetação do cerrado um dia existiu tão nua quanto as despidas modelos/personagens que agora – entre signos da urbe – por ali desfilam, quase sempre com sombrinhas a protegê-las do sol.

 

Em que pese toda essa “poesia visual”, a mostra de Tchélo – que deveria ficar no citado shopping até o dia 20/06, conforme o Portal G1 Centro América (14/06) – teria sido retirada “por orientação da Polícia Militar”, que teria recebido denúncias de clientes do estabelecimento.

 

Inaceitável.

 

Mais inaceitável é saber que atos de censura não se restringem à arte. Vivemos perigoso momento de retrocesso no Brasil. Precisamos lutar conta o casamento da ignorância com o rancor. A luta é de todos os querem uma sociedade livre de preconceitos, além do predomínio da liberdade de expressão.

 

Em tempo: a OAB-MT acolheu a mostra em sua sede a partir do dia 23. Conforme a entidade, a acolhida se deu por conta da “exaltação à cultura mato-grossense” que a mostra faz, bem como pela “defesa da liberdade intelectual e artística asseguradas na Constituição Federal pelo direito de liberdade de expressão". A partir de 14/08, a exposição estará no Palácio da Instrução, em Cuiabá.

 

E contra a instrução, não há quem possa. Todos à mostra. Vale a pena vê-la ou revê-la.

Quarta, 08 Junho 2016 11:14

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Depois de alguns dias de escolas ocupadas também em Mato Grosso, e após ter lido alguns artigos sobre esse problema, entro na polêmica. 

 

Dos artigos, selecionei três deles: o primeiro (TEXTO A – “Por que ocupamos escolas?”) é assinado pelo presidente da AME (Associação Mato-grossense dos Estudantes Secundaristas); o TEXTO B (“Por que não ocupar?”) é de um “professor e consultor legislativo do Núcleo Social da Assembleia Legislativa de Mato Grosso”; o TEXTO C (“Ocupação das escolas”) é de um “empresário e escritor de Cuiabá”.

 

O artigo do estudante, de chofre, declara que a AME está seguindo orientações da “Primavera Secundarista”, ou seja, uma “ação nacional desenvolvida pela UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), em defesa da Educação Pública, Gratuita e de Qualidade, através de ocupações de escolas”.

 

No mesmo artigo, é dito que em MT “a defesa da educação passa pela luta para barrar o processo de ‘terceirização’ (privatização disfarçada) das Escolas Estaduais e dos Centros de Formação e Aperfeiçoamento Profissional (CEFAPROs), através das chamadas Parcerias Público-Privadas”.

 

Os estudantes exigem ainda “o fim da corrupção na Secretaria de Educação”. Por isso, querem a instalação de uma CPI na SEDUC.

 

Pois bem. Mesmo sabendo de problemas que os movimentos estudantis vivenciam, na condição de professor, além de cidadão que busca cultivar a consciência crítica, jamais eu me oporia a essa corajosa atitude dos estudantes. 

 

Mais do que ocupar escolas, privatizar a educação é inadmissível. Como diz um leitor, “toda vez que os governos terceirizam, privatizam, ou fazem PPP's, dão a si mesmos um Atestado de Incompetência Gerencial”. Inadmissível também é a corrupção no país.     

 

Todavia, nada disso é consensual. Os referidos textos B e C são exemplos de dissenso. Sem dó nem piedade, o professor e o escritor condenam as ocupações das escolas em MT. Sem se preocuparem com uma postura pedagógica, ambos agridem o discente articulista e descaracterizam a luta estudantil. Os dois, por meio de seus discursos, tentam intimidar os jovens que estão dispostos a ver um país diferente desta derrota que estamos deixando a eles.

 

No processo de desqualificação do outro, o professor humilha o presidente da AME, apontando insistentemente seus “erros crassos de português”. Todavia, em um insuficiente resumo, mesmo supondo esclarecer seus leitores, o professor apresenta “um breve histórico sobre a evolução do Estado, da Revolução Francesa (1789) até nossos dias”. Ao cabo, fica a certeza de ser ele – o professor – alguém que absorveu a lógica das privatizações, o que contraria a essência da luta estudantil.

 

Mas se o professor não consegue valorizar a luta do outro, o dito escritor, por sua vez, achincalha os estudantes. Faz denúncias vazias e toscas, como soe acontecer toda vez que adultos preconceituosos veem jovens reunidos. Pior: afirma que “Os adolescentes não tem (sic.) condições de  avaliar se o estado deve ou não admitir parcerias privadas na  manutenção das escolas”.

 

Claro que os adolescentes podem ter essa condição. Basta que tenham pela frente escritores qualificados e professores que, além de ensinarem seus conteúdos, estejam dispostos a vê-los como cidadãos críticos. Isso cabe à escola, sim. Isso é dever do professor, sim. E no espaço do exercício da expressão crítica, toda forma de resistência tem valor.

 

Espero que as autoridades sejam capazes de dialogar com a juventude, que está ensinando a luta a muitos macacos velhos.   

Terça, 31 Maio 2016 09:06

 

Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Desde a semana passada, a mídia tem reservado espaço privilegiado a um conjunto de crimes que teriam ocorrido no Rio de Janeiro, onde uma adolescente teria sido estuprada por três dezenas de rapazes. Além desse “batalhão”, ao que tudo indica, na cena do crime, havia ainda pelo menos mais uma garota, de quem nada ou quase se falou até agora. Detalhe: o denunciado estupro só veio a público por conta da exposição do caso em redes sociais. Não fosse isso, o ato em si não estaria sendo motivo de conhecimento e tampouco de comoção geral; talvez, nem mesmo ganhasse um simples boletim de ocorrência. 

 

É claro que a essência dessa trágica narrativa contemporânea, que envolve jovens de um país sem eira nem beira, contém mais meandros do que podemos supor. E como tudo sobre isso é e parece que continuará sendo nebuloso, não farei nenhuma ilação sobre o fato. Espero, como cidadão, apenas, não antes sem lamentar, que o Estado tenha competência e responsabilidade para dar a resposta honesta, ainda que pontual, que o caso requer.

 

Sendo assim, apenas direi que agentes do novo (e velho, ou velhaco) governo federal, de pronto se fizeram ver publicamente em entrevistas, nas quais já condenaram os supostos agressores do ato, bem como, e aí sim, inequívoca e acertadamente, a exposição do ato em si via internet.

 

Ao fazer isso, tais agentes ajudaram a mídia a virar ainda mais seus holofotes e microfones para outro lado da tragédia nacional. Uma tragédia que tem raízes pelo menos na desestruturação familiar (fruto de um sistema socioeconômico perverso e desumano), em nossa educação falida, e na oferta de lixos culturais às novas gerações. Seja como for, nessa virada de foco, o governo Temer, de quem se deve mesmo temer sempre, ganhou alguns minutos por dia na mídia para respirar.

 

Todavia, como o ar que respiram e produzem é bem poluído, nenhum caso, por mais chocante que possa ser, consegue superar os crimes da vida política brasileira. Engrossando a avalanche de denúncias já exibidas até este momento na operação Lava-Jato, agora estão vindo a público infindas gravações que Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, obteve junto a “ícones” nacionais, como Renan Calheiros, Sarney et alii.

 

E em meio a essas novas denúncias, novos ataques à justiça e à mídia estão sendo expostos. Desses ataques, destaco os que vieram de Fabiano Silveira, ironicamente, o novo ministro da Transparência.

 

Ao dar ênfase a esses ataques vindos de um importante agente do governo Temer, mais uma vez chamo a atenção para que todos devemos ter no sentido da defesa intransigente da atuação da justiça, com ênfase ao trabalho do juiz Sérgio Moro, que descontando descuidos pontuais, tem sido o maior símbolo de renovação de nossa velhaca justiça.

 

Da mesma forma, não sem entender e/ou desprezar manipulações editoriais, é preciso que defendamos – também de forma intransigente – a atuação da mídia nacional, que deve ser absolutamente livre de quaisquer tipos de censura. Temo que, aos poucos, aceitando passivamente a uma crítica aqui outra acolá, possamos dar cobertura a interesses que não sejam a de uma mídia soberanamente livre.

 

No mais, concluo que no Brasil há vários tipos de estupro. Além dos que se inserem no plano denotativo, que devem ser repudiados e banidos de nosso cotidiano neste conturbado e, paradoxalmente, atrasado século XXI, há os que se escondem no plano figurado. Em casos tais, a lista é infinda, infelizmente. E todos precisam ser superados, e logo.