Sexta, 17 Fevereiro 2023 10:48

RELATÓRIO 41º CONGRESSO ANDES-SN: SOBRE VERÕES E ANDORINHAS SINDICAIS - Alair Silveira

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Alair Silveira
Profa. Depto. Sociologia e Ciência Política
Profa. PPGPS/ICHS
Membro MERQO/CNPq
Membro GTPFS/ADUFMAT/ANDES-SN
 

 

            De longínquos tempos, ensina o ditado popular que uma andorinha não faz verão.O ANDES-SN, apesar dos seus mais de 40 anos, parece ter regredido quanto à compreensão das consequências da solidão sindical. Afinal, no 41º Congresso Nacional, realizado em Rio Branco/AC, entre os dias 06 e 10 de fevereiro/2023, ratificou decisão do 14º CONAD Extraordinário; isto é, deliberou pela desfiliação da CSP-Conlutas. Placar de 262 votos favoráveis, 167 contrários e 07 abstenções.
            Mais do que um balanço da atuação da CSP durante o período em que o ANDES-SN esteve filiado à Central, os delegados do 41º Congresso nortearam suas críticas sob uma contraditória argumentação que oscila entre declarações sobre uma experiência que [supostamente] se esgotou, acusações de erros sobre política nacional e internacional, e rechaços quanto ao radicalismoisolacionismo e hegemonismo.
            Como o GTPFS foi pródigo na recuperação da história, das disputas políticas em torno da CSP e nos esclarecimentos quanto aos instrumentos de luta dos trabalhadores ao longo da Série Organização e Filiação Sindical, além da análise que publiquei recentemente no Espaço Aberto n. 01/2023 (02/02/2023), irei me ater somente aos episódios evidenciados no 41º Congresso.
            Primeiramente, há que se registrar a profunda contradição entre a acusação de isolacionismo da Central e a decisão congressual, na medida em que o ANDES-SN, a partir da saída da CSP, torna-se um sindicato bastante sui generisa) aprova uma longa e abrangente pauta de reivindicações, mas, ao mesmo tempo, delibera por manter-se sem vínculo a qualquerCentral durante tempo indeterminado;b) reclama do hegemonismo do PSTU, mas, ao mesmo tempo, reflete as disputas partidárias organizadas dentro do Sindicato; c) declara acúmulo de discussões sobre o assunto e, ao mesmo tempo, aprova a desfiliação para fazer a discussão com a based) reafirma seu compromisso e solidariedade de classe, mas, ao mesmo tempo, reclama da organização popular e sindical da classe dentro da Central; e) denuncia a estrutura organizativa da CSP, mas, ao mesmo tempo, também foi protagonista do seu Estatuto e tem assento na Coordenação Geral; f) rechaça a política nacional e internacional aprovada em Congresso da Conlutas, mas, ao mesmo tempo, é criterioso quanto ao cumprimento dos ritos e deliberações congressuais do próprio ANDES-SN; g) defende a democracia, mas, ao mesmo tempo, evidencia dificuldades em conviver com o resultado das decisões com as quais têm diferenças; h)proclama a luta das ruas, mas, ao mesmo tempo, demostra particular preferência pelas lutas institucionais; enfim...
            Não bastasse o isolamento organizacional objetivo a partir dessa decisão congressual - enquanto discute amadurece os rumos do Sindicato -, o ANDES-SN também aprofundou determinadas práticas e tendências que remetem a uma espécie de refundação: 1)o recurso da ADUFMAT (aprovado em Assembleia) contra a expulsão de Reginaldo Araújo sequer foi para discussão em Plenária, apesar de pedido de esclarecimento à Mesa da Plenária (alertando para a gravidade e ineditismo do processo);2) as manifestações pautadas pelo identitarismo tomaram proporções impressionantes, numa avalanche que desconsidera princípios básicos do classismo e da democracia.
            Em ritmo acelerado, o ANDES-SN tem se transformado em um Sindicato intolerante, retoricamente classista, objetivamente discriminador e politicamente persecutório. De maneira sintética, esse Congresso se transformou na síntese dos três ‘T’: Terrível, Triste e Trágico.
            Para sustentar minha análise (para além do que já expus em diversas oportunidades), registro quatro ocasiões deploráveis: (a) no Tema I (Conjuntura), um companheiro de longa data (e luta) iniciou sua intervenção pedindo desculpas àquelas/es que, de alguma forma, tivesse ofendido no 40º Congresso[1]. Apesar da intervenção ter iniciado com o pedido de desculpas, algumas mulheres se levantaram e viraram as costas, em clara manifestação de repúdio. Na sequência, inúmeras mulheres e homens seguiram-nas, em profundo desrespeito ao companheiro, desconsiderando não somente o direito de expor seu ponto de vista, mas expondo sua profunda intolerância para com o contraditório e a divergência.
            Qual o fundamento da hostilidade? “Assediador”. Por que? Porque exigiu retratação de uma “mulher”. Não por acaso, a mesma mulher que no 65º CONAD foi denunciada, publicamente, por assédio a outra companheira. Essa denúncia, entretanto, não prosperou.
            Na abertura de outro turno de atividades, homens fizeram uma manifestação, empunhando cartazes contra o machismo e o assédio. Para essa manifestação também não faltaram mulheres reclamando o lugar de fala...
            Sob algumas circunstâncias, o ANDES parece ajustar-se mais ao nome de OLHES, dada a intensidade com que olhares hostis e/ou constrangidos se expressam contra aqueles/as que julgam “inimigos” da pauta de luta contra as opressões.
            Triste, Trágico, Terrível! Vamos nos esfacelando aos poucos...
            Assim foi, inclusive, quando da informação, em Plenária, sobre(b) supressão do TR da ADUFMAT. Embora a expulsão seja inédita na história do ANDES-SN e o processo que redundou em punição tenha sido eivado de problemas (especialmente pelos procedimentos e elucidação dos fatos), a exclusão do companheiro Reginaldo Araújo foi ratificada sem qualquer discussão! Mesmo assim, euforia e palavras de ordem contra machistas e assediadores foram entoadas na Plenária. Puxadas, inclusive, por companheiras que atuam na própria Seção Sindical que aprovou Recurso em Assembleia Geral.
            Mas, as tragédias não encerraram aí: outros dois episódios lamentáveis compõem esse Relatório. No último dia, (c) outro sindicalizado experimentou a revolta de muitos, após usar uma expressão inadequada e infeliz, típica do seu tempo histórico. Objeto de muitas manifestações furiosas e emocionadas, o professor precisou se comprometer em usar seu tempo para retratação (exigência da Mesa) para poder fazer uso da palavra. Inaugurando uma prática inadmissível sob qualquer ótica democrática (em que a Mesa arbitra a concessão da palavra mediante censura prévia), o docente não apenas pediu desculpas pela expressão infeliz, mas, também, esclareceu que ele próprio é homossexual. Seu questionamento tinha por objetivo, tão somente, discutir a recomendação para composição de chapas, nas Seções Sindicais, observando representação de gênero, raça, LBGTQIAP+ etc.
            Desta forma, um dos primeiros organizadores do Movimento Gay na Bahia (muitos anos atrás) foi – mais uma vez – julgado sem qualquer diálogo, tolerância ou respeito às trajetórias políticas pessoais. Trata-se da consolidação de uma prática sindical que interdita a fala divergente, é intolerante com aquele que pensa e/ou manifesta-se fora dos padrões linguísticos estabelecidos pelos movimentos militantes, desconhece a história e a dedicação sindical dos companheiros e, por fim, tem um senso persecutório inacreditável.
            Nesse processo de descolamento da história e de presunção de inovação pelo engajamento pessoal, o ANDES-SN vai cindindo-se e, por óbvio, se fragilizando e se desconhecendo. Mais grave ainda: vai perdendo a capacidade de se reconhecer como categoria que compõe uma classe heterogênea, cujos inimigos não estão na classe, mas fora dela.
            Para coroar esses eventos terríveis, trágicos e tristes, próximo do encerramento do 41º Congresso, (d) uma professora denunciou ter sido assediada por um homem. Esse homem, no caso, era um estudante indígena da UFAC. Descontrolado, esse estudante provocou situações graves e constrangedoras.
            O impressionante, contudo, foi a reação de uma diretora bastante atuante nas causas identitárias contra opressões. Diferentemente das posturas habituais para com quaisquer denúncias e intervenções, a Diretora não apenas defendeu uma posição educativa e não punitivaem razão do estudante ser indígena, senão que sugeriu que aqueles que o retiraram do ambiente buscavam uma espécielixamento, classificando a demanda por chamar a Polícia como uma atitude escravagista. Mais uma vez, repetiu-se a lógica dos dois pesos e duas medidas.
            No mais, o 41º Congresso Nacional do ANDES-SN aprovou uma extensão pauta de lutas, majoritariamente reiterou expectativas no Governo Lula e, por fim, apresentou as quatro chapas em disputa para as eleições à Direção Nacional, que ocorrerão na primeira quinzena de maio/2023.

 

[1] No 40º Congresso, em POA, DilenoDustan foi encaminhado para Comissão de Ética ao exigir retratação da ex-dirigenteEblinFarage (após intervenção desta, que foi considerada por ele desrespeitosa para com companheiros/as sobre a pandemia).

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