Segunda, 19 Fevereiro 2024 10:22

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Danilo de Souza*

 

Em conversa informal virtual escrita (2023) com o ex-Magnífco Fundador, Professor Gabriel Novi Neves, ele foi preciso e direto: “O fazejamento surgiu, numa época que era possível fazer.”

 

Em método semelhante, pudemos ler do, também, ex-Magnífico, Professor Eduardo De lamonica Freire (2023): o "fazejamento"- citado por você- que construiu os primeiros passos da UFMT, foi seguro e rigorosamente, correto em direção à extraordinária missão de ser um inquestionável divisor de águas deste Estado e desta região "unisélvica" que, a partir de então, com este riquíssimo adubo, assumiu o papel de catalizador de um dos estados solução deste país.

 

Porque este "fazejamento" deu certo?  Porque, conduzido por Gabriel e Dorileo, líderes e gestores do bom senso (embora, na época, neófitos), qualificados pela Ética, pelo fundamental espírito de coletividade e respeito ao bem comum, dedicando a vida pessoal a esta desafiadora e honrosa missão. Importantíssima, para uma Nação. O Grupo (inclusive nós que chegamos um pouco depois, mas pertencente à mesma Escola de vida) que ambos conduziram, gozava dos mesmos predicados públicos descritos acima. Com esta fórmula de composição inquestionável, tinha que dar certo, não? Se pensarmos bem, o "fazejamento" só dá certo quando entregue à sábios qualificados com estes dotes.

 

Em reforço a estes argumentos experientes e convincentes, segundo Kelly Gianezini (2018), o contexto no qual foi assinado a Lei de criação da UFMT denota o caráter de urgência e a necessidade de oferta permanente da educação superior em Cuiabá, e revela a carência de um prévio e consistente planejamento.

 

Na citada ponderação, a autora se apoia em B. P. Dorileo (1977) que afirma: a ordem em 1972 era implantar a Universidade. Planejar? Quando e como? Fazer, foi a decisão. O desígnio histórico não permitiria o luxo do planejamento empapelado, encadernado, pintado, lubrificado.

 

As circunstâncias históricas revelam que a trajetória para a implantação da UFMT foi árdua e, conforme afirma o primeiro reitor, Dr. Gabriel Novis Neves, “há páginas inequívocas de tenacidade, de determinação da gente mato-grossense e principalmente da comunidade cuiabana que tanto lutou pela ideia de sua criação. Seu começo foi difícil como qualquer começo.” (DORILEO, 2005, apud, GIANEZINI, 2018).

 

Como em epígrafe, o futuro sempre esteve presente na UFMT, e não é demais lembrar do Projeto Aripuanã ou Projeto Humboldt, sob a iniciativa do Professor Paulo Lomba na década de 70, sintonizou esse projeto com as iniciativas da reunião de Estocolmo, em 1972, sobre a consonância Homem e Meio Ambiente.

 

Buscava-se naquela iniciativa a ocupação da Amazônia pelo Norte de Mato Grosso a partir da infraestrutura cultural e técnica formada pela UFMT, além de buscar sempre o balanceio entre ensino-pesquisa e pesquisa-ensino. 

 

Estamos aqui diante de um saudosismo produtivo e lá se foram 53 anos de nossa Universidade, e, muito foi feito e pensado nesses anos.

 

O pensar para fazer de hoje – Planejamento de Desenvolvimento Institucional - não há de perder a trieira delineada nesses poucos anos de existência para uma instituição de ensino superior complexa  e de magnitudes físicas, equipamentos e recursos humanos imensas, que requererá, sem dúvida, participação e gestão norteada pelo objetivo maior de melhorar e continuar desenvolvendo esta instituição em sintonia com os anseios da coletividade universitária voltadas às necessidades e desejos da sociedade mato-grossense, ofertando-a ensino, pesquisa, extensão e inovação.

 

Portanto, a expansão acompanhou o crescimento e desenvolvimento do estado, cuja fortaleza socioeconômica aponta para o interior, que se utiliza da tecnologia do século XXI para reduzir as distâncias dos “tempos de Humboldt”, produzir e concorrer no mercado nacional e internacional, em um mundo cada vez mais globalizado. (GIANEZINI, 2018).

 

Nossa UFMT precisa continuar aparecendo no cenário local, estadual, nacional e internacional, e às vezes, é preciso ser Aparecido nesta vida.

 

Texto Elaborado pelos apoiadores da Chapa 2.

 

*Danilo de Souza é professor da FAET/UFMT, pesquisador no NIEPE/FE/UFMT e no Instituto de Energia e Ambiente IEE/USP e apoiador da chapa 2 à Reitoria da UFMT.

 
 

 

Segunda, 19 Fevereiro 2024 10:16

 

 

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Por Marluce Souza e Silva*


Caros(as) Servidores (as) e estudantes da UFMT

Recentemente, o atual reitor – e candidato à reeleição – da UFMT, em entrevista ao PnbOnline, para se defender de críticas que vem recebendo de todos os candidatos à Reitoria da UFMT, depois de elencar alguns caminhos utilizados por sua administração para captar recursos complementares ao orçamento da Instituição, perguntou o que, nós, demais candidatos à reitoria, já fizemos até agora nesse mesmo sentido.

Antes de uma resposta que será adiante visualizada em tópicos possíveis, é preciso fazer lembrar ao senhor reitor que sua pergunta inicial para os demais candidatos, para manter a honestidade e o nível do debate, deveria ser no sentido de identificar a quais áreas do conhecimento pertencem os candidatos.

Por que essa pergunta precede em um debate franco, portanto, honesto?

Porque a minha área de atuação acadêmica na Universidade, bem como as áreas dos cursos que compõem o ICHS (Serviço Social, Ciências Sociais, Filosofia e Antropologia), do qual sou sua atual diretora, não são áreas de interesse do capital; logo, não é possível encontrar praticamente em canto algum quem queira financiar tais cursos, cheios de excelentes e fundamentais ideias e realizações para a dinâmica social e não, necessariamente, para a manutenção da lógica e dos interesses do capital.

Aliás, por conta exatamente desse lugar de ser e estar na vida acadêmica é que conseguimos compreender a importância de continuarmos, antes de tudo, na defesa intransigente de uma universidade realmente pública, gratuita, laica e socialmente referenciada.

E por nos apresentamos dessa forma é que nos colocamos como opção eleitoral para nossa comunidade. Em outras palavras, desejamos somar com os demais reitores das federais que venham a se identificar com esse mesmo projeto institucional.

Diante dessa concepção de universidade, sem descartar ou interromper eventuais projetos e programas já em andamento na UFMT, nossa luta diária será para garantir do governo federal a plena manutenção das universidades, pois elas são bens públicos, e assim devem ser mantidas.

Isso posto, mesmo que para dizer o óbvio, portanto, facilmente comprovável, acrescentamos ainda que durante essas décadas de trabalho na UFMT, primeiramente, como docente na graduação (Serviço Social) e na pós-graduação (Programa de Pós-Graduação em Política Social) do ICHS, e depois já na condição de diretora do mesmo Instituto, fizemos, da melhor forma possível, até mais do que nos cabia com as condições que nos eram dadas por sucessivas reitorias, como:

- orientar mais estudantes do que o PIA nos permite;

- realizar pesquisas que denunciam serviços terceirizados altamente onerosos que transferem à iniciativa privada mais de 20% do orçamento de custeio;

- defender intransigentemente a universidade do FUTURE-SE;

- defender a garantia dos 28% dos docentes;

- defender a segurança alimentar dos estudantes;

- defender a estrutura física dos blocos do ICHS, que são os mais antigos da UFMT.

Portanto, dentro de nossa competência e limitações institucionais, de forma absolutamente honesta, fizemos tudo o que foi possível fazer. A partir de agora, se formos eleitas, poderemos fazer muito mais.

 

*Profa. Dra. Marluce Souza e Silva, Departamento de Serviço Social da UFMT e candidata à Reitoria da UFMT pela Chapa 1. 

Quinta, 15 Fevereiro 2024 09:36

 

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  1. Fora violência!

A violência é uma força agressiva e presente em toda sociedade. Está nas famílias, no futebol, na imprensa, nas escolas, nos parlamentos, no carnaval, na política, nas novelas e filmes, etc. A pior violência é a que está introjetada na cabeça e no coração das pessoas.

  1. A sociedade que temos e a sociedade que queremos

A sociedade que temos é violenta, desigual, injusta e intolerável. A sociedade que queremos é saudável, fraterna, equilibrada, justa e respeitosa.

  1. É possível?

A sociedade que queremos PODE, DEVE E VAI SER CONQUISTADA. ”Para uma longa caminhada é importante dar o primeiro passo, dado o primeiro passo, já se tem meio caminho andado”. (MaoTsé-TungLíderchinês)

  1. Caminhos e ferramentas

Para a construção de uma sociedade igualitária e fraterna, já demos muitos passos etemos boas ferramentas.A humanidade já deu o primeiro passo: Os 10(dez) mandamentos de Deus. A marcha dialética da História, já tornou possível o que era impossível. Quem diria que, no século XVI, que uma princesa assinaria a Lei áurea no século XIX (VIVA ZUMBI DOS PALMARES). Já tivemos a teoria da libertação e seu grito dos “excluídos”. Tivemos o programa fome zero e as universidades estão ao alcance dos humildes. A Igreja do Rosário (Cuiabá-MT) está fazendo um bom trabalho comunitário (VIVA O FALECIDO PADRE JoséTencate).Para transformar o trabalho comunitário em trabalho social, basta ativar os aspectos “sócio-econômicos” (Cursinho para casais briguentos, esporte, lazer, música, etc). Para criar uma robusta força do bem é necessário retomar o estado LAICO. As Igrejas não podem ser transformadas em partidos políticos a serviço de políticos individualistas/negacionistas. Além da fé em Deus, devemos cultivar a fé no ser humano.



Cuiabá, 13/02/24

Professor Vicente M Ávila(Economia Política - UFMT aposentado)

Sexta, 09 Fevereiro 2024 16:39

 

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. em Ciências da Comunicação/USP

Professor de Literatura; aposentado da UFMT

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Desde que, há poucos dias, o IBGE divulgou o resultado do Censo de 2022, diversos de seus dados me chamaram a atenção. Para este artigo, destaco aqueles acerca do número de estabelecimentos religiosos, expostos, por alguns veículos da mídia, em quadro comparativo com os números de escolas e de postos de saúde existentes no país.

Conforme o referido censo, no Brasil, há mais de 579 mil templos ou outros tipos de estabelecimentos religiosos, contra 264 mil de ensino e 247 mil de saúde; ou seja, os templos religiosos superam em mais de 68 mil a soma das edificações de escolas e de postos de saúde. Se nessa comparação fossem inseridos os teatros, que também são templos da cultura de um povo, a surra que as artes tomariam poderia ser ainda maior.

E é justamente por meio da arte que tentarei pensar um pouco o que pode ter nos levado à essa realidade. Começo resgatando o poema “O Padre Passa na Rua”, de Carlos Drummond, inserido no livro Boitempo, de 1968; aliás, esta não é a primeira vez que faço uso desse texto, posto tê-lo como um dos discursos artísticos basilares para nos auxiliar na compreensão da “alma” de nosso povo.

Eis abaixo o poema, paradoxalmente, tão curto quanto abrangente:

Beijo a mão do padre// a mão de Deus// a mão do céu// beijo a mão do medo// de ir para o inferno// o perdão// de meus pecados passados e futuros// a garantia de salvação// quando o padre passa na rua// e meu destino passa com ele// negro// sinistro// irretratável// se eu não beijar a sua mão.

Para contextualizar o poema, trago pelo menos duas informações: 1ª) na década dos anos 60, a Igreja Católica era quase um monopólio religioso em nosso país;2ª) os padres – via de regras, de batina escura –ainda visitavam as casas dos paroquianos; logo, beijar suas mãos era o mínimo que se fazia diante do auto proclamado “representante de Deus”, ali, tão perto dos mortais, induzidos, desde o nascimento a terem medo de arder no fogo do inferno por conta de seus pecados.Desse panorama, predominantemente católico, Drummond,como poucos, soube captar essa nossa captura mental exercida desde a chegada da primeira caravela nos idos de 1500.

Hoje, os padres – como também os religiosos de inúmeras outras inscrições, que quebraram o monopólio da fé católica –continuam entrando nas residências de seus fiéis, mas pela TV e redes sociais. Alguns entram como pop star; outros surgem como versões deprimentes de palhaços, usando chapéus, calças arrochadas e outras excentricidades. Seja como for, essas “visitas” virtuais são ainda mais constantes e contundentes; por elas, continua-se a pregar a mesma ladainha ancestral, qual seja, o medo de ir para o inferno. Alguns, pregam mais sutilmente; outros berram e fazem gestos teatrais inusitados. Tudo muito deprimente e oportunista, pois vivemos ladeados de seres que ainda acreditam que a Terra é plana.

A outra manifestação artística que me auxilia nessas reflexões é a canção “Guerra Santa” de Gilberto Gil (In: Quanta/1997), composta por conta daquele bispo que, em 1995, chutou a imagem de Nossa Sra. Aparecida durante um dos programas "Palavra da Vida", da Record. Claro que a “evolução” daquela criatura só poderia ter desaguado em um desses seres que, hoje,são proclamados ou se auto proclamam de “terrivelmente cristãos”, mas que, na verdade, têm a essência humana duvidável; por vezes, até irreconhecível como tal.

Pois bem. Aqui, vale dizer que a canção de Gil, de forma sutil, dialoga com o poema acima. Isso pode ser percebido melhor nos dois primeiros versos da primeira estrofe: “...Ele diz que tem como abrir o portão do céu// ele promete a salvação...”

Nos versos que completam essa mesma estrofe, é dito que “ele (o bispo) chuta a imagem da santa// fica louco-pinel// mas não rasga dinheiro, não”. Neste momento, Gil começa a pontuar que a fé popular tem sido usada para o enriquecimento de pessoas e grupos ditos religiosos, que vão das “pequenas igrejas, grandes negócios” aos impérios salomônicos e semelhantes propriamente ditos.

Nas duas estrofes finais da canção, Gil condena a intolerância religiosa, dizendo:

Eu até compreendo os salvadores profissionais// sua feira de ilusões//
só que o bom barraqueiro que quer vender seu peixe em paz// deixa o outro vender limões// Um vende limões,//o outro vende o peixe que quer//
o nome de Deus pode ser Oxalá// Jeová, Tupã, Jesus, Maomé// Maomé, Jesus, Tupã, Jeová// Oxalá e tantos mais// sons diferentes, sim, para sonhos iguais
”.

Corretíssimo o nosso poeta da MPB! Mas, como é dito em outro poema drummondiano, por mais pedras que possam ter no meio do caminho de nossas existências, é lamentável que a saída para tanta gente seja a busca daquela “feira de ilusões”, aludida acima por Gil. Quem sabe um dia ainda venhamos a ter mais escolas, postos de saúde e teatros do que tantas “feiras de ilusões”?!

Quem sabe?!

Quinta, 08 Fevereiro 2024 11:19

 

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Juacy da Silva*

A opinião pública já está saturada com tantos discursos, a grande maioria extremamente demagógicos, tanto por parte de governantes nos três Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário) e nos três níveis de entes federativos (União, Estados e Municípios) e respectivas Empresas estatais, autarquias etc. Todos defendendo a democracia, o estado democrático de direito, o sistema republicano, a transparência pública, a ética na política, mas parece que esta ênfase é muito mais “da boca pra fora” do que uma defesa genuína da democracia como regime e sistema de governo derivado da vontade soberana do povo, longe das manipulações do “marketing” político e do caciquismo que ainda dominam a nossa vida política e partidária, enfim, nossas Instituições.

De forma semelhante também esses mesmos discursos fazem parte do dia-a-dia do mundo empresarial, que, de forma direta ou indireta, integram a chamada elite do/no poder ou o que também, as vezes, é dito “marajás da República”. Basta observarmos a composição dos respectivos poderes Legislativos e Executivo, compostos em sua grande maioria por homens brancos, empresários, deixando de fora as mulheres, negros, indígenas, pobres e trabalhadores, que representam a grande, imensa maioria do povo brasileiro. Tudo isso diante de um preceito constitucional (Constituição “cidadã”, de 1988) que “diz” “todo poder emana do povo....”.

Governantes eleitos, gestores públicos do alto escalão governamental, designados (nomeados) para funções importantes nas estruturas governamentais, por serem apoiadores ou seguidores dos integrantes da chamada classe política, acabam “misturando-se” com o mundo empresarial  e defendem, quase sempre, as mesmas pautas que atendem muito mais aos interesses corporativos da classe dominante (donos do capital), `as custas dos recursos carreados para os cofres públicos pelos contribuintes, consumidores, inclusive integrantes das classes média e dos trabalhadores das cidades e do campo, enquanto os subsídios, os “incentivos fiscais”, a sonegação consentida e apropriação indébita beneficiam os donos do poder e seus asseclas.

Todos sabemos que a definição das políticas públicas passa por um processo interativo entre os poderes e, em tese, deveriam atender aos interesses, as aspirações e `as necessidades das diversas camadas e setores da população, principalmente das grandes massas excluídas e que vivem ou sobrevivem na miséria, bem como também os chamados interesses e objetivos nacionais, que estão, teoricamente, pelo menos, acima dos interesses imediatos dos governantes de plantão.

Vivemos em um sistema republicano de governo e, também, teoricamente, em um “Estado Democrático, de Direito”, onde todos/todas as pessoas “deveriam ser iguais”, perante a Lei e também perante as políticas públicas, as estratégias, planos, programas e ações de governo.

Só que a realidade não é bem assim. Alguns setores e pessoas são “mais iguais” do que outros e outras, se assim não fosse, com certeza não teríamos grandes massas passando fome, vivendo na miséria, sendo discriminadas, excluídas, sendo vítimas de racismo estrutural, de diversas formas de preconceitos, vivendo e sobrevivendo em meio a uma violência generalizada, enquanto o PIB, a concentração de renda, de riqueza e de propriedade aumentam em ritmo muito maior do que o crescimento da população, mas com uma particularidade, os frutos desse crescimento econômico tem aumentado a concentração em “poucas mãos”.

É neste contexto que ocorrem as eleições, de dois em dois anos, alternando entre eleições municipais, como as que devem ocorrer em outubro deste ano de 2024 para prefeitos/prefeitas, vereadores/vereadoras, com as eleições gerais que foram realizadas em 2022 e novamente serão realizadas em 2026, quando são eleitos os “manda chuvas” da política nacional e estadual, onde quem manda realmente são os caciques políticos, verdadeiros donos dos partidos políticos, que mudam de lado ao bel prazer e segundo os interesses desses caciques, pouco importando as contradições ideológicas e alinhamentos anteriores e posteriores.

Um dos mais interessantes livros sobre a dinâmica política brasileira foi escrito por Victor Nunes Leal, intitulado “Coronelismo, Enxada e Voto – O município e o Regime Representativo no Brasil”, que, em primeira edição, foi publicado em Janeiro de 1949, retrata fielmente, com riqueza de dados e documentos históricos como “era” a dinâmica política e eleitoral, principalmente as eleições municipais e, também, as eleições gerais eram realizadas. Este livro pode ser “baixado” na internet gratuitamente, vale a pena ser lido para buscar alguns fios da meada da vida política e partidária atual.

O mandonismo dos latifundiários estava presente quando os mesmos, como chefões, chefes ou chefetes políticos, determinavam em quais candidatos seus empregados e moradores em suas terras deveriam votar, quando muitos analfabetos, semialfabetizados e atém mesmo “letrados”  ou até mesmo “eleitores” que já tinham morrido, deveriam obedecer `as ordens de seus patrões e senhores, como se o sistema escravocrata ainda não tivesse sido abolido há seis décadas, quando da publicação daquele livro.

Naquela época não existiam as urnas eletrônicas, tão criticadas pelo bolsonarismo, apenas cédulas ou o que eram chamados de “votos de papel”, mas com muita frequência havia roubo de urnas ou o “mapismo”, que acabavam mudando a “vontade” dos eleitores encabrestados pelos latifundiários, que também exerciam influência sobre a população urbana, principalmente nas pequenas e médias cidades, que eram as verdadeiras bases populacionais do Brasil de então.

Lá se vão 75 anos da publicação do Livro “Coronelismo, Enxada e Votos”, o Brasil mudou, com certeza, deixou de ser um país com imensa maioria da população analfabeta, rural e ou morando em pequenas vilas, cidades abandonadas, “perdidas” na imensidão deste país continental, que parece continuar um gigante “deitado eternamente em berço esplêndido”, aguardando sempre um futuro de bonança para todos que nunca chega.
Apenas para ilustrar em termos comparativos, em 1950 a população total do Brasil era de apenas 51,9 milhões e em 2022 chegou a 203,1 milhões, indicando um crescimento de 291,3%. A população rural em 1950 era de 33,2 milhões de habitantes ou 63,8% da população total e em 2022 era de apenas 12,0 milhões de pessoas ou 5,9% da população total. Isto demonstra que nesses 75 anos o Brasil deixou definitivamente de ser um país rural para se transformar em urbano, concentrando-se cada vez mais nas capitais e nas grandes regiões metropolitanas, teoricamente com mais liberdade para as pessoas, inclusive liberdade de escolhas políticas, mas isto nem sempre ocorre, como veremos logo mais.

Em 1950 o PIB brasileiro, que era medido em cruzeiros , mesmo tendo sido trocada a moeda inúmeras vezes, atualizado pelo nosso real, era de apenas 179,6 bilhões e em 2022 atingiu 10,1 trilhões, um crescimento de 56 vezes ou 5.600%.

O PIB per capita anual em 1950 era de (em termos de reais atualizados) 3.457,00 reais e em 2022 atingiu RS$53.365,00, indicando um crescimento de 15,4 vezes ou 1.540%, bem menos do que o crescimento do PIB, indicando que o Brasil mudou, mas a concentração de renda, riqueza e propriedade aumentou muito mais.

Esta realidade é indicada por alguns números recentes (2022/2023). O Brasil apesar de ser a 9ª Economia do Planeta, podendo chegar a 7ª dentro de mais alguns anos, em termos de renda per capita ocupamos 79ª posição; o atual Índice de Gini, que indica o nível de concentração de renda é de 52,9 e em 1950 era em torno de 60,0. Atualmente o Brasil tem  a maior concentração de renda entre as 10 maiores economias do planeta.

Em 1950, o analfabetismo era uma grande chaga social; na população de 15 anos e mais apenas 14,9 milhões de pessoas eram alfabetizadas e 15,4 milhões analfabetos, ou seja, o índice de analfabetismo era de 50,8% da população, tornando esta situação mais grave pelo fato de que as  crianças e adolescentes com menos de 15 anos, a grande maioria, principalmente na área rural, nas vilas e pequenas cidades não tinham acesso sequer `a chamada “escola primária”, alfabetização até as quatro primeiras séries.

Neste aspecto, combate ao analfabetismo avançamos bastante, mas o percentual de analfabetos na população brasileira com 15 anos e mais ainda é muito grande, quando comparados com os países do G-20, por exemplo. Segundo dados do IBGE do censo de 2022 o índice de analfabetismo ainda é de 5,6%. Todavia a diferença entre as Regiões Nordeste e Sul ainda é gritante, na primeira este índice é de 11,7% e na última apenas 2,9%.

Todavia continuamos a ostentar 33% de analfabetismo funcional e quase 100% de analfabetismo político, o que é um grande desafio nacional, inclusive para o fortalecimento da democracia (de verdade e não apenas conceitualmente).

Esses dados são importantes para compreendermos a dinâmica política-eleitoral, a configuração do poder, a definição das políticas públicas e como as elites dominantes, classe política irmanada com o empresariado, se instalam, apoderam-se das estruturas do poder para as utilizarem em proveito próprio, em detrimento dos interesses do povo.

Através da propaganda, do “marketing” político, dos conchavos, dos acertos nas cúpulas partidárias,  essas elites se apropriam também dos partidos políticos, que são as portas de entrada para a tomada do poder e suas estruturas, a  partir de onde o mandonismo local, estadual e nacional, o coronelismo moderno, tecnológico, o caciquismo continua sendo exercido.

As convenções partidárias cumprem apenas funções protocolares, para efeito das exigências da Legislação eleitoral e os requisitos do TSE, TRE, dos Juizados eleitorais locais, pois sobejamente sabemos que quem define candidatos para cargos majoritários são os “caciques políticos” ou as vezes apenas um “cacique”, seja o Presidente da República, geralmente o “cacique mór”,  um governador, um senador, um deputado estadual ou federal, um prefeito/prefeita, cabendo aos filiados quando das convenções apenas dizerem “amem”, “sim senhor”.

Diante disto a conclusão a que chegamos é que se não existe democracia partidária, mas sim um grande simulacro, como podemos esperar que a vida política e institucional do país tenha como primado a DEMOCRACIA?

A pergunta que sempre vem `a mente de quem consegue esmiuçar a dinâmica política brasileira é: Democracia, estado democrático de direito, regime republicando para quem? Para o povo, para as classes trabalhadores e média, os excluídos, os pobres? Ou para as elites dominantes de sempre, que em vários estados e municípios estão se tornando “familiocracias” em que esposas, esposos, filhos, filhos, parentes de integrantes da chamada classe política deixam como herança, além de muitos bens materiais também a garantia de que tais grupos continuarão abocanhando as estruturas do poder, pouco importa o número de partidos, seus programas ou suas ideologias?

Para finalizar gostaria de mencionar alguns fatos bem atuais que comprovam que quem manda nos partidos não são os filiados, mas sim seus donos, seus caciques. Coube ao Presidente Lula informar que estava “trazendo” de volta para o PT Marta Suplicy, a ex-senadora e ex-ministra de Dilma, para ser vice de Boulos (PSOL) na eleição da capital paulista, o maior colégio eleitoral do país, caberá `as convenções dos dois partidos apenas homologarem a chapa.

Em Cuiabá, podemos observar também este mandonismo em relação `a definição de candidatos a prefeito. O governador do Estado que já foi filiado ao antigo PPS (sucedâneo do partido comunista brasileiro), depois passou para o PSB (partido SOCIALISTA brasileiro) e atualmente é o “cacique mor” do União Brasil, sucedâneo do antigo ARENA/PDS/PFL, que teve suas origens no regime dos generais presidentes, pois bem caberá ao governador determinar quem será o candidato a prefeito de Cuiabá, “cozinhando” o atual presidente da Assembleia Legislativa e alguns outros deputados que o apoiam por um longo tempo.

Nesta mesma toada, segundo o Deputado Júlio Campos que ao lado de seu irmão Senador Jaime Campos, ambos ex-governadores e ex-prefeitos de Várzea Grande, caberá a eles definirem quem será o candidato a prefeito naquela cidade.

Outro exemplo do mandonismo da cúpula partidária está acontecendo no PT de Cuiabá, que, através de uma consulta “`as bases”,  definiu que o seu pré-candidato deveria ser o Deputado Estadual Lúdio Cabral, que trava uma luta interna ferrenha com a ex-deputada Rosa Neide.

Pois bem, segundo o Deputado Estadual Valdir Barranco, presidente estadual do PT, as tais prévias municipais que mobilizaram centenas de filiados não tem valor, são nulas e caberá à cúpula nacional do partido (PT) definir critérios e formas de escolha, o que, com certeza favorecerá a ex-deputada federal.

Esta forma de decidir quem será candidato a prefeito, a governador e a Presidente da República é uma realidade sempre atual que, ao invés de abrir espaços para a participação efetiva dos filiados e fortalecer a democracia interna dos partidos, apenas fortalece o caciquismo e o mandonismo, maculando profundamente tanto o conceito quanto `a prática da DEMOCRACIA.

Fala-se tanto em reformas, mas o que precisamos mesmo é de uma profunda reforma política e eleitoral para acabar com o caciquismo, com o oportunismo, com o personalismo, com a corrupção, com o abuso do poder econômico e com essas estruturas carcomidas que apenas facilitam a vida da cúpula partidária que sem nenhum pejo continua mamando nos fundos partidário e eleitoral, utilizando vários bilhões de reais em cada eleição, facilitando, inclusive o compadresco e a corrupção política e eleitoral.

Uma reforma desta natureza é apenas uma quimera , é como implorar que o vampiro cuide bem do banco de sangue ou que a raposa proteja o galinheiro!

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI – Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Terça, 06 Fevereiro 2024 09:37

 

 

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Por Juacy da Silva* e Priscilla Alyne Sumaio Soares**



“Quem não Luta por seus direitos não é digno/digna deles” (Rui Barbosa)



 

Conforme os termos da Lei 11.696, de 12 de Junho de 2008, o DIA NACIONAL DE LUTA DOS POVOS INDÍGENAS deve ser celebrado anualmente em 07 de Fevereiro.

“Nesta edição do Relatório Violência contra os Povos Indígenas do Brasil, expressamos nosso desejo e reforçamos o compromisso para que a Justiça seja feita para todos os povos indígenas, e que ninguém mais derrame seu sangue   pelo   que   é   de   direito.   Kiwxi   Presente!!!”.   Fonte:   Relatório. Violência   contra   os   Povos   Indígenas   no   Brasil   DADOS   DE   2017, publicado em Fevereiro de 2018. CIMI – Conselho Indigenista Missionário – CNBB.

A história dos povos indígenas no Brasil, desde o “descobrimento” até os  dias atuais, tem sido uma luta constante contra um processo intenso e contínuo   de   violência,   assassinatos   de   suas   lideranças,   massacres, destruição   de   suas   culturas,   invasão   de   seus   territórios,   preconceito, discriminação,   exclusão,   enfim,   uma   luta   árdua   contra   um   verdadeiro genocício a que foram e continuam sendo submetidos, pela ganância dos donos   do   capital   e   também   pela   omissão   e   conivência   de   nossos governantes, por mais de 520 anos. Quando os primeiros colonizadores aportaram no que hoje é o território brasileiro, segundo diversos estudos e pesquisas, a população indígena, representada por mais de mil etnias, povos distintos, com suas culturas, costumes, linguagens e territórios era de aproximadamente 8 milhões de pessoas ou segundo algumas estimativas poderia chegar a 10 milhões de pessoas,   dos   quais   em   torno   de   cinco   milhões   viviam   na   Amazônia, incluindo   o   que   posteriormente   passou   a   ser   a   área   de   colonização espanhola e atualmente o total da população indígena é de apenas 1,7 milhões de pessoas, conforme dados do Censo do IBGE de 2022, o que representa apenas 0,8% do total da população brasileira.

Desde   os   períodos   do   Brasil   Colônia,   Império   e   República,   os   povos indígenas foram e continuam sendo tratados tanto pelos governantes quanto pela população não indígena como um grupo humano que atrapalhava o progresso   e   o   “avanço”   da   civilização   rumo   ao   interior   do   Brasil.  

O preconceito, a discriminação, a violência, incluindo inúmeros massacres sempre foram as formas de dominar e exterminar aqueles povos. De acordo com artigo de Maria Fernanda Garcia, intitulado “Massacrada, população   indígena   representa   menos   de   0,5%   do   país”,   datado   de 24/04/2017, publicado no Observatório do Terceiro Setor, “Os índios que sobreviveram foram escravizados ou catequizados. As  doenças  trazidas pelo homem branco foram outra arma mortal. Sem imunidade para os vírus e bactérias que vieram junto com os colonizadores, os índios não resistiram às doenças até aquele momento desconhecidas pelos nativos. Durante a ditadura militar, mais de oito mil indígenas foram mortos por estarem no caminho das estradas idealizadas pelo Programa de Integração Nacional.

Os Waimiri-Atroari perderam 75% de sua população em menos de quinze anos. Os Panarás perderam 84%. O número de Parakanãs no Pará caiu pela metade. Sobraram apenas 10% dos Yanomamis do rio Ajarani. Até hoje indígenas são assassinados. Entre 2003 e 2015, 742 deles, principalmente lideranças, foram assassinados. Isso representa uma média de 57 por ano, ou um homicídio a cada seis dias”.

Ainda de acordo com os estudos de Alzira Alves de Abreu, “A catequese missionária não conseguira converter os índios, impedir as invasões de seus territórios,   nem   impedir   o   extermínio   de   inúmeras   tribos.   Muitas desapareceram pelo contágio de doenças transmitidas pelos invasores, ou pela   matança   promovida   por   matadores   profissionais,   os   chamados bugreiros, que eram contratados pelos especuladores de terras. A situação se agravou quando da abertura da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que atravessava  o   território  dos   índios   Kaingang,  no   estado  de   São  Paulo, desencadeando uma disputa armada entre esses índios e os trabalhadores da estrada de ferro. O mesmo ocorreu em Minas Gerais e no Espírito Santo, quando os índios Botocudos reagiram à invasão de suas terras por colonos.

Também no sul do Brasil, em Santa Catarina e Paraná houve lutas entre índios e colonos. Em 1908, durante o XVI Congresso de Americanistas, em Viena, Áustria, houve denúncias de que o Brasil estava massacrando os índios.   Essa   denúncia   levou   o   governo   federal   a   buscar   uma   ação   de proteção leiga e privativa do Estado às populações indígenas.”

Foi neste contexto histórico que surgiu o Serviço de Proteção dos Índios, instituído pelo Governo Federal através do Decreto 8.072, de 20 de Junho de 1910, subordinado ao Ministério da Agricultura e, posteriormente, ao Ministério da  Justiça,   tendo   sido  extinto em   1967,   durante  o Governo Militar/ditadura, quando da criação da FUNAI.

Em 1972 foi criado o CIMI Conselho Indigenista Missionário, organismo da Igreja Católica, vinculado `a CNBB, com o objetivo de lutar na defesa dos povos indígenas, garantindo a diversidade cultural destes, fortalecer a autonomia desses  povos e  o apoio  a projetos alternativos, pluriétnicos, populares e democráticos, contribuir para a formação e fortalecimento das lideranças e organizações representativas de tais povos.

Em 13 de Setembro de 2007, na 107ª Sessão Plenária da Assembléia Geral da   ONU,   foi   aprovada   a   Declaração   das   Nações   Unidas   sobre   os DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS, subscrita pela quase totalidade dos países, inclusive o Brasil.

Em   um   de   seus   considerandos   a   citada   Declaração   menciona   que “Preocupada com o fato de os povos indígenas terem sofrido injustiças históricas   como   resultado,   entre   outras   coisas,   da   colonização   e   da subtração de suas terras, territórios e recursos, o que lhes tem impedido de exercer, em especial, seu direito ao desenvolvimento, em conformidade com suas próprias necessidades e interesses”.

Em um de seus artigos a Declaração estabelece que “Os indígenas têm direito, a título coletivo ou individual, ao pleno desfrute de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais reconhecidos pela Carta das Nações Unidas,   a   Declaração   Universal   dos   Direitos   Humanos   e   o   direito internacional dos direitos humanos” e também que “Os povos indígenas não serão removidos à força de suas terras ou territórios. Nenhum traslado se  realizará  sem  o  consentimento  livre,  prévio  e  informado dos  povos indígenas interessados e sem um acordo prévio sobre uma indenização justa e eqüitativa e, sempre que possível, com a opção do regresso.” E, apenas para mencionar mais um desses inúmeros direitos que , conforme o artigo 26º “1. Os povos indígenas têm direito às terras, territórios e recursos que possuem e ocupam tradicionalmente ou que tenham de outra forma utilizado ou adquirido. 2. Os povos indígenas têm o direito de possuir, utilizar,   desenvolver   e   controlar   as   terras,   territórios   e   recursos   que possuem em razão da propriedade tradicional ou de outra forma tradicional de ocupação ou de utilização, assim como aqueles que de outra forma tenham adquirido. 3. Os Estados assegurarão reconhecimento e proteção jurídicos a essas terras, territórios e recursos. Tal reconhecimento respeitará adequadamente os costumes, as tradições e os regimes de posse da terra dos povos indígenas a que se refiram”.

Assim, a conquista, manutenção, a garantia e a efetivação desses direitos e dos   demais   reconhecidos   universalmente   é   que   alimentam   a   luta permanente dos povos indígenas no Brasil e nos demais países.

Em 2010 o CIMI apresentou um relatório que serviu de alerta quanto à gravidade da violência em curso no Brasil contra os povos indígenas, da mesma forma que em 2018, denunciando tanto a invasão de seus territórios por garimpeiros, madeireiros e grileiros, com sérios danos tanto ao meio ambiente quanto `a saúde e a vida de diversos povos, em todas as regiões, principalmente na Amazônia.

Um momento marcante na história desta luta e da resistência dos povos indígenas foi a criação da APIB – Articulação dos Povos Indígenas do Brasil,   no   Acampamento   Terra   Livre   (ATL), representando   a capacidade de mobilização dos povos indígenas, para tornar visível a real situação   de   violência   a   que   tais   povos   estavam   e   continuam   sendo submetidos, em total desrespeito aos direitos humanos em geral, quanto aos direitos   dos   povos   indígenas   já   então   consagrados   em   tratados internacionais, dos quais o Brasil faz parte e como forma de reivindicar que o Estado Brasileiro promova,  realmente,  a proteção e a  garantia de tais direitos em sua plenitude.

Segundo tem sido enfatizado desde então “A APIB é uma instância de referência nacional do movimento indígena do Brasil, criada de baixo pra cima. Ela aglutina nossas organizações regionais indígenas e nasceu com o propósito de fortalecer a união de nossos povos, a articulação entre as diferentes regiões e organizações indígenas do país, além de mobilizar os povos e organizações indígenas contra as ameaças e agressões aos direitos indígenas”
Foi   neste   contexto   histórico,   entre   muitas   contradições   políticas, econômicas, ideológicas que em 12 de junho de 2008, após o Congresso Nacional aprovar, o Presidente Lula, em seu segundo mandato, sancionou a Lei   11.696,   que   criou   o   DIA   NACIONAL   DE   LUTA   DOS   POVOS INDÍGENAS, como reconhecimento de que os povos indígenas também fazem   jus   tanto   `a   proteção   do   Estado,   não   de   forma   paternalista   e assistencialista   apenas,   mas,   fundamentalmente,   como   forma   de reconhecimento do  direito  `a diversidade  cultural , étnica e  linguística desses povos, que devem ser respeitados, como seres humanos que são, com dignidade intrínseca.

A maior luta dos povos indígenas na atualidade, além do reconhecimento ormal de seus direitos é a garantia de seus territórios, que deve ser atingida através   da   demarcação   de   tais   territórios,   nos   termos   da   Constituição, consoante ação recentemente julgada pelo Supremo Tribunal Federal em desfavor da tese do Marco Temporal.

Apesar   de   o   Supremo   Tribunal   Federal   já   ter   julgado   a   citada   ação, rejeitando a tese do Marco Temporal, garantindo os direitos indígenas, mesmo assim, a Bancada Ruralista, com apoio de aliados da mesma no Congresso Nacional, em retaliação `a decisão do STF, aprovou um projeto de Lei, que foi vetado parcialmente neste terceiro Governo Lula, criando um imbróglio jurídico. Tudo leva a crer que o STF tornará a derrubar tal tese contida nesta Lei .

Em meio a tudo isso, no final do Governo Bolsonaro, que promoveu um verdadeiro   desmonte   das   políticas   ambientais,   indigenistas   e   sociais, surgiram inúmeras denúncias da ação ilegal de garimpeiros, grileiros e madereiros ilegais na Amazônia, dando origem novamente a um verdadeiro genocídio   afetando   o   povo   Ianomami,   com   repercussão   extremamente negativa para a imagem do Brasil no exterior.

Coube ao Governo Lula, assumindo compromisso público de campanha, no início   de   seu   terceiro   mandato   como  Presidente  da  República,  criar  o Ministério dos Povos Indígenas e nomear como Ministra uma representante legítima dos referidos povos e também nomear para a direção da FUNAI, que ao longo de sua existência foi praticamente dirigida por militares da ativa ou da reserva, também uma mulher indígena.

Além   disso,   a   UNESCO   criou   uma   ação   para   valorizar   as   línguas indígenas, a Década das Línguas Indígenas, de 2022 a 2032, preocupada com a extinção constante dessas. Ações como essa tem conscientizado pessoas de fora do mundo acadêmico sobre a importância da valorização dos  saberes   e  identidades   que  se   perdem  juntamente   com  o   léxico  de línguas indígenas.

É neste contexto de uma verdadeira guerra, não apenas de “narrativas” como   alguns   a   definem,   mas   sim,   de   uma   luta   em   diversas   frentes, incluindo a política, a jurídica e também em foros internacionais que os povos   indígenas   brasileiros, irmanados a outros povos indígenas de diversos países,  continuam   lutando   e   resistindo , corajosamente,  a   todas   as formas de desrespeito e violência contra os seus direitos. A luta dos povos indígenas é, sem sombra de dúvida, UMA LUTA PELA VIDA.

Assim,   ao   celebrarmos   o   DIA   NACIONAL   DE   LUTA   DOS   POVOS INDÍGENAS, devemos reconhecer que esta luta não é apenas dos referidos povos,   mas   de   todas   as   pessoas   e   organizações   governamentais   e   não governamentais que defendem a vida, a diversidade cultural e étnica no Brasil, a democracia e um país sob o primado da justiça social, da justiça ambiental e da Justiça intergeracional.

Só existe democracia, estado democrático de direito, espírito republicano, solidariedade, fraternidade quando o Bem comum e a inclusão de todas as pessoas   e   grupos   nacionais   forem   reconhecidos   e   respeitados   em   sua dignidade como seres humanos, inclusive os povos indígenas.

*Juacy   da   Silva,   professor   fundador,   titular   e   aposentado   da Universidade Federal de Mato Grosso, Sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista   e   articulador   da   PEI   Pastoral   da   Ecologia   Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

**Priscila Alyne Sumaio Soares, graduada em Letras, Especialista em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Doutora em Linguística e Língua Portuguesa pela UNESP/FCLAr. Pesquisou a língua Juruna e a língua Terena de Sinais. Atualmente é professora do Curso de Letras Libras na UFMT, em Cuiabá. E-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Segunda, 05 Fevereiro 2024 09:25

 

 

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José Domingues de Godoi Filho*
 

“Em minha parede há uma escultura de madeira japonesa

Máscara de um demônio mau, coberta de esmalte dourado.

Compreensivo observo

As veias dilatadas da fronte, indicando

Como é cansativo ser mau.”

(A máscara do mal, Bertolt Brecht)

Guerra contra a vida é a herança que 2023 deixou para 2024. Pode-se avaliar que o mundo chegou a uma situação sem volta, com a sociedade humana contaminada pelo apartheid, a guetificação e o extermínio. Guerra contra a natureza, apesar das alterações climáticas, das COP, da transição energética global, das dimensões da exploração dos recursos naturais e da mercantilização da natureza em nome da “economia verde” e demais propostas de “greenwashing”.

A herança mais aterrorizadora é o genocídio, mostrado em tempo real, em Gaza, repetindo o que foi denunciado por Morin (1), em 2002, como“Israél-Palestine:leCâncer”: "Os judeus de Israel, descendentes das vítimas de um apartheid denominado ghetto, guetificam os palestinos. Os judeus que foram humilhados, desprezados, perseguidos, humilham, desprezam e perseguem os palestinos. Os judeus, que foram vítimas de uma ordem impiedosa, impõem sua ordem impiedosa aos palestinos. Os judeus, vítimas da desumanidade, mostram uma terrível desumanidade."

Na Faixa de Gaza está ocorrendo um dos piores crimes deste século, um genocídio generalizado (sem com isso isentar crimes cometidos pelo Hamas) que já atingiu, até o final de dezembro de 2023, cerca de 20 mil mortes na Palestina, das quais mais de 8600 crianças,310 profissionais de saúde, 35 funcionários da defesa civil ,97 jornalistas e, aproximadamente 2 milhões de pessoas deslocadas, segundo dados levantados pela BBC Verify(2) e considerados confiáveis pela OMS - Organização Mundial da Saúde.

Somam-se, escondidos ou pouco informados pela “grande mídia”,dentre outros, os massacres que ocorrem na África (Sudão e Sudão do Sul, Nigéria, Ruanda, Mali, Burundi, República Democrática do Congo e Angola); o apoio dado pelos Estados Unidos e seus aliados ao genocídio em Gaza; o financiamento do governo neonazista da Ucrânia para provocar a Rússia; as escaramuças com o  Hezbollah  na fronteira com o Líbano; os ataques dos Houthis do Iêmen contra navios militares americanos no Mar Vermelho;  os bombardeios no enclave separatista Nagorno-Karabakh , que significou o rompimento do cessar-fogo entre a Arménia e Azerbaijão complicando o complexo jogo de interesses geopolíticos no Cáucaso, além de colocar sob risco humanitário a população civil de Karabakh, controlada pelo Azerbaijão.

No final de 2023, ficou registrado o maior número de conflitos armados desde o final da Segunda Guerra Mundial. E, inquestionavelmente, como herança, também ficou evidenciada a farsa das potências ocidentais, especialmente dos Estados Unidos e seus aliados para atender os seus interesses e não o de construir a paz.

A hipocrisia e a fraudulência desses países, frente ao cenário de beligerância mundial, atingiram níveis sem precedentes de perda de credibilidade; comprometendo gravemente os princípios do direito internacional, o respeito aos direitos humanos e à ordem mundial.

No texto 1984, George Orwel, que merece ser reproduzido, retrata bem a conjuntura dos conflitos atuais e permite refletir sobre a necessidade de resistir e alterar a herança deixada pelo ano de 2023:

- “O poder reside em infligir dor e humilhação. O poder está em despedaçar os cérebros humanos e tornar a juntá-los da forma que se entender. Começas a distinguir que tipo de mundo estamos criando? É exatamente o contrário das utopias hedonísticas que os antigos reformadores imaginavam. Um mundo de medo, traição e tormento, um mundo que se tornará cada vez mais impiedoso, à medida que se refina. O progresso em nosso mundo será o progresso no sentido de maior dor. As velhas civilizações proclamavam-se fundadas no amor ou na justiça. A nossa funda-se no ódio. Em nosso mundo não haverá outras emoções além do medo, fúria, triunfo e auto degradação.

Destruiremos tudo mais – tudo......Não haverá amor, exceto amor ao Grande Irmão. Não haverá riso, exceto riso de vitória sobre o inimigo derrotado. Não haverá nem arte, nem literatura, nem ciência. Quando formos onipotentes, não teremos mais necessidade de ciência. Não haverá mais distinção entre beleza e feiura. Não haverá curiosidade, nem fruição do processo de vida......Se queres uma imagem do futuro, pensa numa bota pisando um rosto humano – para sempre.......” (3).

A parcialidade da “grande mídia”, inclusive no Brasil, extrapola a veiculação da notícia, se comportando de modo parcial e tendencioso aos interesses dos Estados Unidos e de seus aliados e asseclas. Assim, temos, entre nós, “um Grande Irmão que nos vigia, que vela por nós. Dia a dia, ao ligarmos a televisão (precursora das teletelas?), ao lermos os jornais, ao nos conectarmos com a internet, percebemos a ação de um invisível Ministério da Verdade que acaba por nos convencer de que Guerra é Paz, Liberdade é Escravidão e Ignorância é Força (4).

Huntington (5), no seu instigante “Choque das Civilizações”, apresentou uma premonitória “interpretação da evolução da política mundial depois da Guerra fria” que auxilia na compreensão da política mundial no século atual. Questionou, “se as melhorias no nível material de Civilização em todo mundo, foi acompanhada da melhora das dimensões moral e cultural de Civilização?” Analisando os anos 90, do século passado, indicou existirem muitos indícios   “da relevância do paradigma do ‘puro caos’ dos assuntos mundiais: uma quebra no mundo inteiro da lei e da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente em muitas partes do mundo, uma onda global de criminalidade, máfias transnacionais e cartéis de drogas, crescente número de viciados em drogas em muitas sociedades, um debilitamento generalizado da família, um declínio na confiança e na solidariedade social em muitos países, violência étnica, religiosa e civilizacional e a lei do revolver predominam em grande parte do mundo. Numa cidade atrás da outra – Moscou, Rio de Janeiro, Bangcoc, Xangai, Londres, Roma, Varsóvia, Tóquio, Johannesburgo, Délhi, Karachi, Cairo, Bogotá, Washington -, a criminalidade parece estar subindo vertiginosamente, e os elementos básicos da Civilização estão se esvanecendo”.

E concluiu: - “A ascensão das corporações transnacionais que produzem bens econômicos está cada vez mais sendo igualada pela ascensão de máfias criminosas transnacionais, cartéis de drogas e gangues terroristas que estão atacando violentamente a Civilização. A lei e a ordem são o primeiro pré-requisito da Civilização e em grande parte do mundo – na África, na América Latina, na antiga União Soviética, na Ásia Meridional, no Oriente Médio – elas parecem estar evaporando, estando sob séria ameaça na China, no Japão e no Ocidente. Numa base mundial parece, em muitos aspectos, estar cedendo diante da barbárie, gerando a imagem de um fenômeno sem precedente, uma idade das Trevas mundial, que se abate sobre a Humanidade”.

Os organizadores do Fórum Econômico de Davos-2024, implicitamente se alinharam às análises de Huntington, ao avaliarem que a herança de 2023 mostra a “fragilidade do estado de paz, segurança e cooperação globais”. Apontaram que “o aumento da divisão, o aumento da hostilidade e o aumento dos conflitos estão criando um cenário global desafiador. Que a humanidade está lidando com várias questões simultaneamente, incluindo como revigorar as economias, responder à ameaça das mudanças climáticas e garantir que a Inteligência Artificial seja usada como uma força para o bem. Os conflitos e a sua superação estão esgotando a energia humana, que, de outra forma, poderia ser canalizada para moldar um futuro mais otimista”.

O Fórum Econômico concordou que “a atual onda de pessimismo é sem precedentes”. E faz um alerta para a mídia global: - “o poder e a presença da mídia global e da tecnologia de comunicação hoje significam que cada desafio e retrocesso é amplificado, ampliando ainda a sensação de desgraça e melancolia.”

E conclui os organizadores do Fórum Econômico: - “é primordial reconstruir a confiança no nosso futuro. A questão é por onde começar, dadas as circunstâncias complexas de hoje.... Devemos primeiro identificar e abordar as causas profundas do nosso mal-estar. Estamos em um momento crucial da história, mas ainda apegamos a soluções ultrapassadas. Para complicar, estamos lidando com muitas questões simultaneamente, todas profundamente interconectadas e que se reforçam mutuamente. Não há solução rápida ou solução única. Trata-se de abordar todos os sintomas de forma holística.”

Resistir é preciso, para vencer a herança pessimista deixada ao final de 2023. E, Ortega y Gasset (6) pode auxiliar com suas reflexões:

- “É natural: a vida se fez ela mesma equívoca e são tempos de inautenticidade. Recorde-se que a origem da crise é precisamente haver-se o homem perdido porque perdeu contato consigo mesmo. Daí que pulule em tais épocas uma fauna humana sumamente equívoca e abundem os farsantes, os histriões; e, o que é mais doloroso, que não se possa estar certo de se um homem é ou não sincero. São tempos turvos”. Ao mesmo tempo assinala que: “Todo o extremismo fracassa inevitavelmente, porque consiste em excluir, em negar – menos um ponto – todo o resto da realidade vital. Mas esse resto, volta, volta sempre e impõe-se nos, queiramos ou não. A história de todo o extremismo é de uma monotonia verdadeiramente triste: consiste em ter de ir pactuando com tudo o que havia pretendido eliminar.... Qual é a perspectiva em que o homem sói viver?  Faz um momento, como em todos os momentos de todos os dias, inexoravelmente, encontraram-se os senhores com que tinham de fazer algo de fazer algo, porque isso é viver. Ante os senhores se abriam diversas possibilidades de fazer, portanto, de ser no futuro”.

Retomando 1984, de George Orwel, “é impossível fundar uma civilização sobre medo, ódio e crueldade. Nunca poderia durar...Não teria vitalidade. Desintegrar-se-ia. Suicidar-se-ia”.

Para não deixar que o cenário pessimista saia vencedor, que a resistência sobreviva e fortaleça a generosidade humana, uma provocação, a partir de uma das mais belas fábulas de Giono (7), para queodifícil caminho de “por onde começar” seja encontrado o mais breve possível: - “Quando considero que um único homem, reduzido a seus meros recursos físicos e morais, foi capaz de transformar um deserto em uma terra de Canaã, penso que, apesar de tudo, a condição humana é admirável. Mas quando faço a conta de quanta constância na grandeza de alma e de persistência na generosidade foram necessárias para obter esse resultado....”.

Resistir é imprescindível.

*José Domingues de Godoi Filho – Professor da UFMT/Faculdade de Geociências

Referências:
(1) Morin, E. Israel-Palestina:câncer. Disponível em
https://www.mundomultipolar.org/2018/11/israel-palestina-cancer.html . Acesso em: 30/01/2024
(2) Thomas, M. 20 mil mortos em Gaza: o que número de vítimas revela sobre o conflito. Disponível em:https://www.bbc.com/portuguese/articles/clmergn9gmro#:~:text=Grande%20n%C3%BAmero%20de%20mortos&text=%E2%80%9CDentro%20da%20s%C3%A9rie%20de%20guerras,matan%C3%A7a%20indiscriminada%E2%80%9D%2C%20afirma%20Spagat.&text=Podcast%20traz%20%C3%A1udios%20com%20reportagens%20selecionadas.&text=O%20n%C3%BAmero%20de%2020%20mil,milh%C3%B5es%20de%20habitantes%20de%20Gaza  - Acesso em: 20/01/2024.
(3) Orwel, G.1984. São Paulo: Ed. Nacional, 1984.
(4) More, T. Utopia, Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017.
(5) Huntington, S.P. O choque de civilizações e a recomposição da ordem mundial. Rio de Janeiro: Ed. Objetiva, 1997.
(¨6) Ortega y Gasset, J. Em torno a Galileu. Petrópolis:  Ed. Vozes,1989.
(7) Giono, J. O homem que plantava árvores. São Paulo: Ed. 34, 2018.


Quinta, 01 Fevereiro 2024 09:42

 

 

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JUACY DA SILVA*

Em 02 de Fevereiro é “comemorado”, “celebrado” em 172 países, O DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, sobre este tema precisamos refletir de forma mais crítica e profunda a cada ano. É importante destacar também que estamos em plena Década das Nações Unidas para a Restauração dos ecossistemas degradados, que vai de 2021 até 20230, e um desses ecossistemas que está em processo de degradação/destruição acelerada são as áreas úmidas.

Desde a aprovação da Convenção da ONU sobre as áreas úmidas em 1971, nesses últimos 53 anos foram destruídas, degradadas aproximadamente 35% de todas as áreas úmidas no mundo, a continuar este processo com certeza dentro de poucas décadas esses ecossistemas estarão extintos, com sérias consequências para o meio ambiente no planeta.

“As áreas úmidas têm a importância para os seres humanos porque elas fazem parte do ciclo da água – algo essencial para a manutenção da vida e da garantia da biodiversidade no planeta”.  Cátia Nunes da Cunha, professora, doutora (Ph. D) e pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em áreas úmidas, do Centro de Pesquisa do Pantanal (CPP), que são parceiros da Wetlands International Brasil e Mupan – Mulheres em Ação no Pantanal  e profunda conhecedora tanto do tema em geral quanto do Bioma Pantanal, em particular.

É ela (profa. Cátia) quem enfatiza a importância das áreas úmidas para a ecologia integral, tanto os aspectos socioambientais, quanto os econômicos e sociais, quando diz, em relação `a importância das áreas úmidas, que  “A torneira que você abre, o banho que toma, tudo entra no ciclo hidrológico e as áreas úmidas exercem um papel nisso. Elas são esponjas que absorvem a água da chuva, o que evita enxurradas e depois solta, por vias subterrâneas, alimenta os rios, os lençóis freáticos e que servem na captação de água às cidades, ao agronegócio. Não à toa que elas são frequentemente chamadas de “rins da terra”, pois auxiliam na regulação das águas e ainda ajudam a retardar os efeitos do aquecimento climático por serem capazes de absorver até 50 vezes mais carbono do que as florestas tropicais”.

Com certeza que foi esta ideia e preocupação com o futuro do planeta, antevendo a degradação dos biomas e ecossistemas que hoje estamos assistindo, a grande causa do aquecimento global e da mudança e crise climática que em 1971, ou seja, há 53 anos, antes mesmo da 1ª Conferência Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, que aconteceu em Estocolmo, Suécia, em 1972, que a ONU realizou a Conferência de que redundou na “Convenção de Ramsar” a convenção internacional sobre as áreas úmidas, em referência `a esta cidade do Irã, onde foi realizada a conferência, dado base para a criação do DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, a ser celebrada em 02 de Fevereiro, anualmente.

Desde 1977, quando foi estabelecido oficialmente pela ONU, o Dia Mundial das Áreas Úmidas, passou a celebrado na grande maioria, mais de 172 países que passaram a fazer parte da referida Convenção Internacional, inclusive o Brasil.

Em 2021, através de Resolução da Assembleia Geral da ONU, todos os países tem sido, INSISTENTEMENTE, convidados a realizarem ações que motivem as pessoas, instituições públicas e também não governamentais, inclusive o empresariado, a zelarem mais pelas áreas unidas e a despertarem a consciência ecológica, com destaque para a sustentabilidade e a mudanças de paradigmas no que concerne `as relações do ser humano com a natureza em geral e com as áreas úmidas em particular.

Para marcar e uniformizar as celebrações/comemorações e manter um mesmo foco a nível mundial, em cada ano o DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, tem um tema, em torno do qual devem girar essas ações.

No ano de 2015, quando alguns marcos ecológicos importantes aconteceram, como a publicação da Encíclica Laudato Si, pelo Papa Francisco; o estabelecimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, pela ONU, em substituição e ampliação dos Objetivos do Milênio, o tema escolhido foi “Áreas úmidas para o nosso futuro”; em 2019 “ Zonas (áreas) úmidas e mudança climática”; 2020 “Áreas úmidas e biodiversidade”; 2021 “A importância das áreas úmidas para o futuro urbano sustentável”; 2022 “Agir pelas áreas úmidas é agir  pela humanidade e pela natureza”; 2023 “ Restauração das áreas úmidas” e, neste ano de 2024, o tema é “As áreas úmidas e o bem estar humano”, com ênfase na questão da relação entre ecologia integral/meio ambiente e saúde humana.

No mundo existem milhares de áreas úmidas que, apesar de representarem apenas 6% da área terrestre do planeta, com 12,1 milhões de km2 ou seja, 1,21 bilhão de ha, abrigam e oferecem condições para a vida e reprodução de uma imensa biodiversidade, em torno de 40% de todas as espécies animais e vegetais, além de entre 650 e 700 milhões de habitantes dependerem das mesmas para a sua sobrevivência, incluindo como fontes de alimentação.

Cabe também destacar que as áreas úmidas prestam diversos “serviços ambientais”, para o equilíbrio e a vida no planeta, entre as quais podemos mencionar: 1) fornecimento de água para uso humano, animal, industrial e irrigação; 2) contribui para a filtragem e purificação da água e, assim, reduz a poluição dos mananciais; 3) contribui para a produção de alimentos; 4) ajuda a controlar as inundações; 5) ajuda a armazenar gases de efeito estufa e, indiretamente, contribui para combater a mudança/crise climática; 6) é importante para o equilíbrio ecológico e para a manutenção da biodiversidade; 7) contribui para a sustentabilidade e; 8) alimenta os aquíferos que são as grandes reservas de água subterrâneas.

O Brasil possui 27 áreas úmidas, com destaque para o Pantanal que abrange no Brasil os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além do Paraguai e da Bolívia, que é a maior área úmida do planeta, mas que, LAMENTAVELMENTE, está sendo degradado, destruído de uma forma acelerada há algumas décadas.

A degradação/destruição do Pantanal tem sido objeto de inúmeros estudos, pesquisas e reportagens especiais e, parece, tudo leva a crer que esta destruição aumenta a cada ano, tanto pelo desmatamento, pelas queimadas quanto pela poluição urbana, incluindo esgotos in natura e lixo urbano doméstico, industrial, hospitalar, rejeitos de agrotóxicos utilizados de forma sem controle, pesca predatória, assoreamento. Erosão, destruição de matas ciliares e também rejeitos de mercúrio oriundo de mineração e garimpos ilegais nas bacias e sub-baciais dos principais rios que “abastecem”/formam o Pantanal, como os Rios Paraguai, Cuiabá, Vermelho/São Lourenço, Itiquira, Rio Verde, Miranda, Taquari, Bonito e outros mais.

Além da poluição urbana e demais aspectos mencionados, o Pantanal também está fadado a “secar” e acabar como uma grande planície em processo de desertificação resultado da construção de mais de 133 barragens, para instalação das famigeradas PCHs (pequenas centrais hidroelétricas), em todos os Rios e seus afluentes já mencionados.

Oxalá, não apenas neste 02 de Fevereiro de 2024, quando estará sendo “comemorado”, “celebrado” mais um DIA MUNDIAL DAS ÁREAS ÚMIDAS, mas também ao longo de todos os dias e anos seguintes, possamos, não apenas refletir sobre toda esta degradação que está afetando a maior área úmida do planeta, mas também pressionar para que os organismos públicos, responsáveis pelas políticas econômicas e socioambientais implementem ações que mudem o rumo deste processo de destruição ambiental.

Finalizando, é importante que possamos entender uma exortação que o Papa Francisco, da mesma forma que cientistas, ambientalistas tem enfatizado de que, neste planeta, em nossa mãe natureza ou Casa Comum, tudo está interligado e que na origem de todos os problemas e desafios socioambientais, ecológicos está a ação humana, bastante irracional e criminosa, que prima pelo desrespeito ao equilíbrio que deve existir entre os sistemas produtivos, o consumo/consumismo e os limites da natureza. Enquanto isto não fizer parte do pensamento, das atitudes, ações e omissões tanto da população quanto dos organismos públicos e dos governantes, estaremos sempre “chorando em cima do leite derramado”.

Esta é uma herança maldita que as atuais gerações deverão ou irão deixar para as futuras gerações, deixando um planeta destruído e doente.

Ao longo de cada ano, inclusive deste 2024, temos vários momentos para refletirmos sobre importantes questões e desafios socioambientais e, em particular neste ano, quando estaremos elegendo prefeitos e vereadores de todos os municípios, é o momento de exigirmos dos mesmos, quando eleitos, independente dos partidos aos quais sejam filiados e das ideologias que defendam, que reflitam um pouco mais sobre tantos desafios socioambientais, inclusive a preservação e maiores cuidados com as áreas úmidas e transformem a choradeira em políticas e ações públicas que mudem o curso desta triste caminhada!

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista e articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Quarta, 31 Janeiro 2024 11:05

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Danilo de Souza*

 

 
O cimento, essencial na composição do concreto, destaca-se como o segundo recurso mais consumido no mundo, atrás apenas da água. Isso se deve em grande parte à sua durabilidade, versatilidade e fabricação com materiais baratos e prontamente disponíveis. Contudo, é importante notar que a produção desse produto tão fundamental para a construção civil tem uma característica menos favorável: o ciclo de vida completo do cimento e do concreto, desde a produção até a disposição final, é responsável por quase 10% das emissões globais de CO2 relacionadas à energia, sendo a maioria delas produzida a partir de cimento, que é o material de ligação que mantém o concreto. 

Destaca-se que, para cada tonelada de cimento produzida, em média, é emitida 0,6 tonelada de CO2, um fato que ressalta a relevância ambiental desse processo produtivo. 

Vale citar que a fabricação do cimento ocorre principalmente pelo método do forno a seco, que se desenvolve em quatro etapas principais: 

  1. Extração e preparação das matérias-primas: as matérias-primas, com destaque para o calcário e a argila, são inicialmente extraídas. Em seguida, esses materiais são submetidos a processos de trituração e moagem e são alimentados em grandes fornos cilíndricos rotativos. 
  2. Aquecimento e formação do clínquer: nesse estágio, o material é aquecido a uma temperatura aproximada de 1450 °C, utilizando uma mistura de combustíveis. Durante o aquecimento, ocorre a liberação de CO2 do carbonato de cálcio (CaCO3), um processo chave que leva à formação do clínquer, elemento central do cimento. Nesta se encontra a maior parte das emissões. 
  3. Resfriamento e moagem do clínquer: após a formação do clínquer, ele é resfriado e em seguida moído. Posteriormente, é misturado com gesso e calcário. Essa etapa é crucial para determinar as propriedades finais do cimento, como a resistência e o tempo de secagem. 
  4. Ensacamento e expedição: o cimento é ensacado e preparado para a expedição, concluindo o processo de produção e tornando o produto pronto para ser utilizado na construção civil.

     

  1. Na indústria do cimento, a geração de CO2 é um aspecto incontornável e significativo, dividindo-se em duas principais fontes: 60% das emissões oriundas de reações químicas e 40% do processo de aquecimento necessário para a produção de clínquer. Este último é um processo intensivo em termos de consumo de energia, envolvendo tanto a energia térmica, utilizada principalmente para aquecer os fornos rotativos, quanto a energia elétrica, necessária para operar máquinas, movimentar os fornos e os moinhos. O gasto mais substancial de energia, no entanto, advém da energia térmica durante a queima dos combustíveis, sublinhando a complexa relação entre a produção de cimento e o impacto ambiental decorrente, principalmente no que diz respeito às emissões de gases de efeito estufa e ao uso intensivo de recursos energéticos.


Importa lembrar que os fornos utilizados na produção de cimento atualmente são dependentes de combustíveis provenientes de fontes não renováveis, destacando-se o petróleo e o carvão. Entre os combustíveis mais comuns estão o coque de petróleo e a gasolina, além de gás natural e outros derivados do carvão mineral. O coque de petróleo, em particular, é o mais utilizado na indústria cimenteira como combustível dos fornos rotativos de clínquer. Esse material, de aparência granular, negro e brilhante, é composto majoritariamente por carbono (90 a 95%) e possui um teor significativo de enxofre (aproximadamente 5%). Sua ampla utilização se deve ao seu alto poder calorífico e ao custo relativamente baixo. Além desses combustíveis convencionais, a indústria também explora alternativas mais sustentáveis, como resíduos e rejeitos industriais, biomassa, carvão vegetal, pneus inservíveis e resíduos agrícolas para alimentar os fornos, buscando opções mais ecológicas e eficientes.


Em razão do crescente desafio de sustentabilidade na indústria do cimento, algumas alternativas estão sendo exploradas para mitigar as emissões de CO2. Isso se torna imperativo diante da previsão de aumento na produção de cimento e, consequentemente, das emissões globais de CO2. Para redirecionar esse cenário, o setor precisa de mudanças significativas no processo produtivo. Algumas delas incluem a alteração das plantas fabris para capturar o carbono emitido, a adoção exclusiva da via seca na produção, que demanda menos combustível, e o reaproveitamento de resíduos industriais e agrícolas no forno em vez de combustíveis fósseis. Além disso, a substituição parcial do cimento por outros materiais em construções e a reformulação do cimento para que libere menos CO2 são medidas fundamentais.



Nesse cenário, as fabricantes de cimento devem adotar essas práticas e estratégias para se alinhar com uma produção mais sustentável. A adoção desses novos modelos de material e a pressão exercida sobre o governo e as empresas para a criação de legislações sustentáveis são caminhos cruciais para mudar o atual panorama da indústria. Reconhecendo a importância do cimento na construção da sociedade moderna, é essencial não o vilanizar, mas buscar ativamente alternativas sustentáveis em larga escala para diminuir seus impactos ambientais e desenvolver soluções menos impactantes. 

*Danilo de Souza é professor na FAET/UFMT e pesquisador no NIEPE/FE/UFMT e no Instituto de Energia e Ambiente IEE/USP.

Segunda, 29 Janeiro 2024 15:15

 

 

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Juacy da Silva*

Neste 30 de Janeiro é celebrado o DIA MUNDIAL DA NÃO VIOLÊNCIA E DA CULTURA DA PAZ, em homenagem a um verdadeiro apóstolo da não violência que foi Gandhi, assassinado nesta data em 1948, com 78 anos, por um fanático hindu que não aceitava a ideia de que mulçumanos (maioria no Paquistão) pudessem conviver pacificamente em harmonia com hindus, quando ambos os países estavam lutando para libertarem-se do domínio colonialista e opressor do Reino Unido.

“Cada siglo posee su cuota de sangre y está manchado de vísceras y restos humanos en descomposición, cada latido del globo terráqueo ha sido silenciado por el sonido de las armas, el estallido de los gritos, el rugido de la venganza o el sonoro rugir de un cañón. Cada existencia ha pagado su derecho a mantenerse, cada individuo ha sido violento al menos una vez en su vida, sin importar si es capaz de aceptarlo. Esto último abre el debate sobre el estado latente de la violencia en la conducta humana. No hay forma de evadir el rasguño de la violencia, no existe un pasado que no la denuncie o un futuro en el que se asegure su inexistência”. In Homo Violentus: Aportes de la filosofía ante la violencia Héctor Sevilla Godínez (coordinador) Primera edición: septiembre de 2017 EDICIONES ACADÉMICAS FILOSOFÍA, Ciudad de Mexico (livro com 220 páginas que pode ser “baixado” na internet gratuitamente, uma coletânea de artigos super interessantes, atuais e oportunos, que merecem ser lidos e refletidos).

A história humana pode ser entendida ou observada a partir de vários “fios condutores”, como a evolução dos sistemas econômicos, as transformações do fator trabalho, a consolidação dos direitos e garantias individuais e coletivos, os avanços da ciência e da tecnologia; os papéis da cultura e das religiões, a organização e os papéis da família; o surgimento e transformações do Estado e tantos outros “fios condutores”.

Todavia e isto lamentavelmente, esta mesma história humana também tem um outro “fio condutor” que é a violência, que remonta `a origem e “evolução” da espécie humana, do chamado “homo sapiens”, que na verdade é o “homo violentus”, iniciando, segundo o relato bíblico e o mesmo se aplica `as demais religiões, quando ocorreu o primeiro “fratricidio”, em que Caim matou Abel; desde então a história humana não tem sido outra coisa do que um encadeado de violência, destruição, sofrimento e mortes.

Apesar desta triste e cruel realidade e a presença constante da violência como pano de fundo para a nossa existência individual e coletiva, nem por isso, devemos perder a esperança de que este “homo violentus” possa voltar, se é que em algum momento da história, assim tenha acontecido, a perceber muito mais a presença do “homo sapiens” que age racionalmente, se utilizar da violência como mecanismo de resolução de seus embates, suas disputas e conflitos nas mais variadas dimensões e aspectos.

Esta esperança é o que, também ao longo da história, tem nutrido pessoas e movimentos que tem tentado demonstrar que , nós humanos, que para as diversas religiões (apesar de muitas guerras e violência religiosa desde os primórdios históricos) temos ao lado mundano/profano e, de outro, também uma “essência divina”, como se diz, somos filhos e filhas de um mesmo pai, um Criador e, se isto é verdadeiro, também podemos viver em harmonia, em PAZ, construindo a “sociedade do bem viver”, a “terra sem males” ou a “civilização do amor”, em lugar de todas as formas de violência, inclusive esta bestialidade humana que são as guerras, que a cada dia utilizam de armas mais poderosos e mortíferas deixando sempre um rastro de destruição e morte.

Assim, a chamada “não violência”, como conceito pode ser entendido como a ausência, deliberada, do uso da violência individual ou coletiva na busca da resolução dos conflitos, pessoais, interpessoais, sociais, econômicos, religiosos, territoriais ou de qualquer outra natureza.

Assim entendida a “não violência” á também “a ausência do desejo de ferir ou matar, conforme prescrito na origem do conceito do sânscrito, que enfatiza que “ferir pessoas, animais ou o meio ambiente não é necessário para se conseguir vantagens. Refere-se a uma filosofia que prega a abstenção de qualquer tipo de violência, com base em princípios éticos, religiosos, morais e sociais.

Mahavira (599 a 527 antes da era cristão), foi quem introduziu o conceito da “não violência” em que era ensinado que, para se obter o nirvana, (céu ou paraíso para algumas outras religiões) era necessário e mandatório abster-se do uso da violência como prática individual ou coletiva.

Este conceito da “não violência” possui, também, elementos que alimentam os movimentos ativistas em defesa dos direitos humanos, contra injustiças, em favor de mudanças sociotransformadoras, cujos exemplos bastante expressivos são as lutas de Mahatma Gandhi, contra o colonialismo/ocupação da Índia pelo Império Britânico e de Martin Luther King Jr contra o racismo estrutural nos EUA, ambos assassinados pelo que pregavam por pessoas que alimentavam o ódio em seus corações, como ainda hoje acontece com tantos outros que cometem violência contra pessoas indefesas e inocentes.

Ao redor do mundo existem diversos outros exemplos da resistência de povos e grupos oprimidos que tem usado a prática da não violência, inclusive, da desobediência civil contra Leis injustas formuladas pelas elites dominantes e donos do poder, que geralmente também oprimem a população em benefício próprio.

Para melhor entendermos o significado e a importância da cultura da paz, tendo a não violência como seu instrumento fundamental, precisamos, primeiro entender o que realmente é a PAZ e por que precisamos busca-la sempre e por todas as maneiras.

Paz, não é uma atitude passiva, contemplativa, mas sim atitudes, comportamento e ação, substituindo a violência pelo diálogo, pela mediação e o respeito `a diversidade de pensamento, crenças e práticas na busca de resolução pacífica dos conflitos, em todos os níveis.

Assim, paz não é apenas a ausência de violência, de guerras e conflitos armados, mas também a busca constante pela harmonia e respeito mútuo nas relações interpessoais, sociais e políticas, onde os primados da justiça, da justiça social, da justiça ambiental e da justiça intergeracional sejam os nossos horizontes permanentes.

Neste sentido podemos afirmar, com toda a certeza, que a paz só existe quando os frutos do desenvolvimento científico e tecnológico e do crescimento econômico possam ser compartilhados, repartidos de forma equânime entre todos os habitantes que vivem em um mesmo território, ao invés de serem apropriados por uma minoria em detrimento dos direitos naturais das grandes massas que vivem na penúria, enfrentando fome, miséria, preconceitos, discriminação e exclusão social, econômica, cultural e política.

A injustiça em si mesma é uma forma de violência institucionalizada em diversas sociedades e países, talvez seja a maior causa e a origem das demais formas de violência, por isso, combater as injustiças é uma forma de reduzir os níveis de violência e de desrespeito `a dignidade e direitos das pessoas e buscar a paz.

Se entendermos que cultura é o modo de pensar, sentir e agir, tanto das pessoas quanto e, principalmente, dos grupos sociais, compreenderemos por que a violência permeia as nossas relações em sociedade e também a dinâmica das relações geopolíticas e estratégicas internacionais, onde a guerra tem sido uma constante na tentativa de equacionar conflitos, tendo fracassado redondamente, deixando apenas um rastro de destruição e morte.

Tanto no plano interno dos países quanto nas relações internacionais surgem inúmeras Leis, decretos e acordos buscando a resolução dos conflitos nesses níveis e, com uma enorme frequência tais “remédios” não tem surtido efeito. O fracasso dos ordenamentos jurídicos e dos sistemas judiciários tem sido constante e cada vez mais a violência ganha espaço em todos os países.

Existe um liame entre a “guerra” entre traficantes x milícias, a ação do novo cangaço, a violência presente no trânsito,  o aumento do poder do crime organizado e também as chamadas “guerras de libertação”, os genocídios, e o uso de armas de destruição em massa tanto as bombas atômicos que destruíram Hiroshima e Nagasaki, matando mais de 320 mil pessoas, a grande maioria pessoas inocentes, inclusive crianças, ate o que está acontecendo atualmente na guerra da Rússia contra a Ucrânia ou a guerra movida por Israel contra o Hamas, mas que na verdade já matou quase 30 mil pessoas, a grande maioria crianças, idosos e civis que acabam sendo as maiores vítimas.

Basta voltarmos nossos olhos e nossas observações para alguns dos episódios de violência institucionalizada, conflitos armados e guerras que ocorreram ao longo do século XX para podermos refletir porque devemos combater todas as formas de violência e estimularmos a não violência e ajudarmos a construir uma verdadeira cultura da paz, em todos os níveis que estiverem ao nosso alcance.

Apenas a título de reflexão, podemos observar o número de mortos em apenas algumas guerras e conflitos armados ou promovidos por governos contra a própria população, neste caso denominada de “democídio”, ao longo do Século 20 apenas. Cabendo observar também que para cada pessoa morta, vítima de algum tipo de violência, principalmente nos casos de conflitos armados/guerras, pelo ,menos mais quatro ou cinco pessoas acabam sendo feridas, boa parte tornando-se deficiente para o resto da vida.

Vejamos o número de mortes: I Guerra mundial 20 milhões; II Guerra Mundial 38 milhões; guerra da Coréia três milhões; homicídios 37 milhões; suicídio 75 milhões, só entre 2000 e 2019, neste século 21 foram mais de 15 milhões de suicídios; Guerra do Vietnan 38 milhões; Revolução chinesa 80 milhões; guerras de “libertação” e independência na África 75 milhões, destaque para Angola com mais de um milhão de mortos e na Argélia mais de 1,5 milhões de mortes; Guerrilhas e regimes ditatoriais apenas na América Latina, mais de 2,0 milhões; democídio, quando os governos dizimam a própria população/minorias, geralmente sobre regimes ditatoriais civis, militares, eclesiásticos, de direita ou de esquerda com sob Stalin na Rússia e Pol Pot no Cambodia, 175 milhões; fome provocada por conflitos armados ou guerras entre nações 128 milhões, total mais de 665 milhões de pessoas que perderam as vidas, vítimas inocentes e indefesas, de algum tipo de violência.

Se acrescentarmos  a esses números as mortes por violência no trânsito e também as decorrentes das ações do crime organizado que disputam territórios e exercem uma violência abrangente sobre as populações nos territórios pelo mesmo, inclusive violência psicológica, física e patrimonial como ocorrem nas favelas, morros e outras áreas periféricas tanto do Brasil quanto de inúmeros países do chamado “terceiro mundo”, como certeza podemos agregar mais alguns milhões de vítimas da violência.

O mesmo pode ser mencionado em relação `a violência familiar, violência contra a mulher, as crianças, idosos e deficientes, população afrodescendente e outras minorias. Só assim, podemos ter uma ideia aproximada do verdadeiro MAPA DA VIOLÊNCIA tanto no Brasil quanto no mundo todo, muito pior do que imaginamos.

Enquanto isso, por mais que governantes, inclusive das grandes potências teçam loas sobre ações de combate `a violência, também inúmeros países, principalmente os do G7 e também do G20 alimentam o complexo industrial militar, desenvolvem pesquisas usando recursos dos contribuintes para fabricarem armas de guerra mortíferas, cada vez mais letais, incluindo armas químicas, biológicas, nucleares e também as convencionais cada vez mais poderosas e destruidoras.

Anualmente os gastos dos dez maiores fabricantes de armas do mundo, com destaque para os EUA, China, Rússia, Reino Unido, Turquia, Iran, Franca e Alemanha, são superiores a dois trilhões de dólares, importância que seria suficiente para acabar com a fome, melhorar os índices de saúde, de educação, de cuidados com o meio ambiente, com habitação popular e infraestrutura urbana nos países subdesenvolvidos.

Investir na cultura da paz e na não violência, em políticas públicas que garantam a dignidade das pessoas, justiça e inclusão social, econômica e cultura são as únicas formas de realmente combatermos a violência em todos os níveis e lugares. Fomentando conflitos e guerras para vender armas jamais vai proporcionar a harmonia social e política.

Si vis pacem, para bellum”, traduzindo, Se queres a paz, prepara-te para a guerra. Esta era a ideologia militarista e expansionista que embasava as ações brutais do Império Romano há mais de dois mil anos e parece que continua norteando o pensamento, as atitudes e ações não apenas de pessoas, grupos sociais mas também de governos/governantes, que continuam cultuando as diversas formas de violência, inclusive também ajudando a promover o armamentismo, mais conflitos e mais guerras. Desta forma, a PAZ jamais será alcançada.

Precisamos mudar radicalmente este paradigma por outro em que possa ser dito “Se queres a paz, promova a Justiça, a equidade, a FRATERNIDADE, A AMIZADE SOCIAL, como está sendo desenvolvida pela Campanha da Fraternidade de 2024, como formas de garantir a dignidade das pessoas e da vida humana”, enfim, ajude a construir a CULTURA DA PAZ e a civilização do amor, onde o ódio, a injustiça e a violência sejam apenas lembranças de um passado que não deva acontecer jamais! Este deve ser o maior e melhor legado que podemos deixar para as futuras gerações!

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.