Quinta, 10 Maio 2018 13:10

 

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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Depois do artigo “Longevidade da razão cínica”, publicado no dia 03/05/18, no qual trato do cinismo de artistas e intelectuais, que parecem ter deliberado pelo cultivo de um tipo de amnésia seletiva, além de uma conveniente cegueira, decidi expor minha oposição ao movimento que pede a liberdade de Lula. Por isso, na contramão do “Lula Livre”, lanço o trocadilho “Livre de Lula”.

Começo por uma leitura da música “Lula livre”, um sambinha de última qualidade, recheado de bizarros clichês, composto por Claudinho Guimarães, e cantado por Beth Carvalho, intérprete de tantos sambas de excelência. Que triste ver essa bamba cair, agora, não mais nos sambas de “cartolas”, “noéis” e outros menestréis, mas na panfletagem chula em prol de uma “Ideia” perversa e obsecada por corrupção. 

Pois bem. Do texto em análise, no plano formal, nada mais há de relevante do que um conjunto de rimas, se não pobres, nada nobres; no entanto, todas óbvias. Só por isso, o texto/panfleto já está condenado à miséria artística. A arte sempre pede um quê de imprevisibilidade. Ali não há nada disso. Nenhuma metáfora.

Na linha dos interdiscursivos, identifico algo próximo da excrescência musical “Pra frente, Brasil”, produzida durante a ditadura militar por Dom e Ravel. Daquilo, destaco:

...Todos juntos, vamos, pra frente Brasil... De repente é aquela corrente pra frente, parece que todo o Brasil deu a mão. Todos ligados na mesma emoção. Tudo é um só coração (...)”.

Agora, vejam os infelizes versos de Claudinho Guimarães para Beth Carvalho cantar em defesa da liberdade de Lula:

Pro Brasil andar pra frente// vamos caminhar// Seja elo da corrente...// Ele (Lula) andando livre no país// Ele une o país// Semeando amor...”.

De ambos os textos, há coincidências literais de três palavras/expressões-chaves: “pra frente (Brasil)”; “vamos”; “corrente”.

Fora dessas coincidências, mas na mesma lógica semântico-discursiva, destaco, do texto “Lula livre”, o verso “Ele une o país”, que se aproxima de “...todos juntos...”, da composição dos anos 70.

Por essa de “Lula livre” com “Pra frente, Brasil”, um signo da ditadura que se apropriara do sucesso da Seleção de Futebol no México, para ludibriar nosso povo, politicamente, muito sonolento, nem eu esperava. Em suma, são dois textos miseravelmente panfletários. Ambos mentirosos. Cada qual em seu tempo, ambos perigosos.

Mas por que “há perigo na esquina” (ops.), ou seja, na música/panfleto “Lula livre”?

Porque, por trás desse movimento – que, ao contrário do que diz o panfleto de Guimarães, Lula só desune o país – há uma prática preocupante de desmoralização do judiciário, que é falível, mas não a ponto de ter cometido qualquer perseguição política.

Nesse sentido, o ministro Gilmar Mendes lembrou, em entrevista (EFE: 04/05/18), que, dos onze ministros do STF, oito são indicados do PT. Disse mais:

O que ocorreu foi que, quando assumiu o PT, que tinha uma pequena base parlamentar, buscou apoio de outros partidos aos quais propôs como contrapartida a distribuição de recursos".

Mendes referiu-se, primeiro, ao esquema do Mensalão; depois, o Petrolão: um “produto” tipo exportação. Que o digam alguns países africanos, latinos e caribenhos.

Enfim, hoje, no Brasil, não há nenhum perseguido político que precisasse ser libertado. Contra todos os políticos e empresários já tornados réus, há fatos e fartas provas.

Contra fatos, só a amnésia, a cegueira e/ou o cinismo político; ou seja, perigosos chamarizes que podem chamar o que não se deseja...

 

Terça, 08 Maio 2018 13:53

 

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Material divulgado a pedido dos professores Waldir Bertúlio e Tomás Boaventura

**Disponível para download, em PDF, no arquivo anexo abaixo.

 

Quinta, 03 Maio 2018 11:27

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Estamos em pleno outono, a caminho do inverno, ou seja, quando a temperatura no hemisfério sul esfria de forma continua. Enquanto isto, a temperatura politica brasileira esquenta de forma rápida, alimentada por conflitos de interesses, novas denúncias de corrupção envolvendo gente graúda, incluindo muitas autoridades que gozam de impunidade para seus mal feitos, graças ao famigerado “foro especial” ou em linguagem técnica “foro por prerrogativa de função”, crise econômica que persiste, desemprego que ainda é o flagelo de mais de 13,2 milhões de desempregados, além de outros 15,5 milhões de subempregados, descrença generalizada da população em relação aos políticos e demais autoridades em todos os níveis e assim por diante.


Além desses fatos, ainda podemos assistir ao vivo os debates no STF e constatar que a mais alta corte de justiça do pais esta rachada ao meio, principalmente quando se trata de definir questões que afetam autoridades com foro privilegiado. Costuma-se dizer que generais, altos dignitários religiosos, políticos e integrantes do poder judiciário e também membros do ministério público mais se parecem com semideuses, donos da verdade absoluta, esquecendo-se de que tanto as políticas quanto as ações de governo, nos três poderes, são custeadas pelo suado dinheiro do contribuinte, incluindo metade da população que vive ou sobrevive quase vegetando com um salário de fome ou graças a algumas migalhas que caem dos orçamentos públicos, enquanto os marajás da República continuam com seus altos salários e demais mordomias.


Outros fatos que estão aquecendo a temperatura política e social no Brasil nos últimos meses podem ser destacados: a condenação e prisão do ex-presidente Lula, que, apesar de preso, ainda é o candidato da preferência do povo/eleitores brasileiros; a condenação e com certeza prisão do ex-governador e ex-senador mineiro, Eduardo Azeredo, envolvido em corrupção no chamada mensalão Tucano, apesar de que muita gente, por algum tempo, ter acreditado que todos os partidos, menos o PSDB, flertavam ou ainda flertam com a corrupção.


Neste aspecto outro fato neste clima politico quente foi a decisão do STF tornando réu o outrora cacique do PSDB, Senador Aécio Neves, que também, tudo leva a crer, pelo andar da carruagem, também irá parar atrás das grades, a menos que o STF mude sua postura e decisões e dê uma “forcinha” para que condenados em segunda instância possam recorrer das sentenças em liberdade, garantindo uma certa impunidade graças à morosidade como os investigados com foro privilegiado gozam junto aos tribunais superiores, tudo isto, com algumas exceções, é claro, como aconteceu com o ex-senador Deocídio do Amaral.


Contra algumas posturas consideradas dúbias ou contraditórias do STF e outros tribunais superiores, parece que esta havendo um certo “mal estar” por parte da cúpula militar, principalmente no Exército, envolvendo alguns generais de pijama e também parte dos generais do Alto Comando, incluindo o próprio Comandante do Exército, com pronunciamentos considerados duros e muito críticos em relação ao momento atual.


Fazendo coro com tudo isso, a candidatura do Deputado e ex-capitão do Exército, Jair Bolsonaro, bastante conhecido por suas posições radicais, seus discursos inflamados, está bem consolidada e , a menos que surja um fato novo, tende a chegar ao segundo turno das eleições presidenciais deste ano, se é que vamos mesmo ter eleições em outubro próximo.


Há poucos dias, o Senador Requião, do PMDB/PR divulgou um pronunciamento pelas redes sociais, alertando o país, autoridades e instituições sobre a gravidade do momento que estamos vivendo, incluindo os atentados a bala contra a caravana de Lula no Sul do país e contra o acampamento dos simpatizantes do ex-presidente em Curitiba. Segundo Requião estamos vivendo um clima muito tenso que pode desembocar em conflitos violentos no país, exigindo ou dando margem para uma intervenção militar, não como a que ocorre no Rio, mas como um golpe militar e a quebra da “normalidade democrática” e o rompimento dos liames que sustentam um estado democrático de direito.


Enfim, parece que estamos mais próximos de um enfrentamento generalizado entre grupos de interesses conflitantes que podem levar o país ladeira abaixo, com sérias repercussões na economia e nas instituições. Muita gente vê uma certa semelhança com o final de 1963 e os idos de março e o restante da estória e história que bem conhecemos.


Costuma-se dizer que é fácil perceber quando os tanques, veículos blindados e militares saem das casernas, difícil é prever ou antever quando voltarão, novamente, aos quartéis. Este filme tem sido visto e revisto em alguns países, como no Egito, por exemplo e não custa colocar “as barbas de molho”.

 


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista e colaborador de diversas veículos de comunicação social. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

Quarta, 02 Maio 2018 14:02

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. em Jornalismo/USP; prof. de Literatura/UFMT

 

Envolto ao clima do 1º de maio, reflito sobre os recentes acontecimentos que envolveram o PT e sua militância. Até agora, eu nada publicara sobre a prisão de Lula. Meu silêncio, ainda que não fizesse parte de razões cínicas, não escapava da covardia acadêmica, algo nada nobre.

 

Mas, afinal, de que “razão cínica” quero falar?

 

Respondo, usando parte das considerações que César Benjamin – um dos fundadores do PT – fez publicar no artigo “O triunfo da razão cínica” (Revista Caros Amigos, n. 80; nov/2003).

 

Há quinze anos, César deixava o PT. De seus motivos, destaco:

 

  1. “O PT está morrendo... suas posições históricas - sobre previdência, transgênicos, política econômica, FMI ou qualquer outro assunto - estão sempre prontas a ser sacrificadas no balcão em que se fazem as negociações...”;
  2. “Os que construíram o PT e não se corromperam nele não têm mais lugar... É tênue a separação entre política e negócios. Candidatos a deputado, até ontem assalariados, falam em levantar 10 ou 20 milhões para suas campanhas, sabe-se lá de que forma... Não há mais pudor...”;
  3. A crise do PT é a mais profunda da esquerda... A cooptação do PT pelo sistema de poder é a mais vergonhosa de todas, pois vem desassociada de qualquer ganho real para a base social que ele deveria representarLula aceitou ser o algoz dessa base...”;
  4. No lugar da verdade, marketing, dissimulação e engodo, uma enorme operação de deseducação política. No lugar de uma ação coletiva, um líder que... começa a se considerar semideus (“Eu sou uma ideia”, já disse Lula). No lugar de um projeto, espertezas... No lugar de diálogo, ameaças, chantagens, nomeações, demissões. No lugar da luta de ideias, movimentos sempre nas sombras. É o triunfo da razão cínica”
  5. “Aos pobres, Lula pede infinita paciência, enquanto atende com presteza... os financiadores de campanhas...”.

 

O artigo de César foi ignorado.

 

Não tardou, e, em 2005, explodiu o escândalo do Mensalão do PT. Mesmo diante de fatos, os cínicos, incluindo intelectuais, saíram dizendo que aquilo não passava de artimanhas das elites.

 

Não eram. Eram conchavos do PT com agentes das elites. Resultado: líderes do Partido foram condenados e presos. Dali em diante, o PT passou a promover uma divisão social, perguntando: e os outros (corruptos do PSDB et alii)?

 

Sua preocupação (a do “nós”) com os “outros” foi bem maior do que a ética devida. Na sequência, mais sofisticado e perverso, nova bomba: o Petrolão, ou seja, corrupção tipo outra camada do mesmo bolo podre.

 

Tanta falta de ética não isentaria, ad aeternum, Lula, hoje, devidamente preso. Outros petistas e líderes de outros partidos, igualmente corruptos, deverão ter direito aos mesmos metros quadrados. É necessário. Nossa democracia não pode sofrer golpe nesse processo em curso; aliás, seria o único até agora.

 

E é justamente em cima da palavra “golpe” que a razão cínica se revitaliza, tornando-se longeva. Que apeados do poder e apartados das tetas do Estado chorem, é normal. Senhores feudais e absolutistas também já derramaram lágrimas. Agora, é demais que intelectuais e artistas, que se enganaram um dia, queiram continuar se enganando.

 

Qual é o problema de – à lá Cazuza – reconhecer que nossos heróis morreram todos? Intelectuais também erram. Todavia, se insistirem em erros, há ditados populares que machucam, mas definem bem a postura.

 

Enfim, o cinismo de artistas e intelectuais me preocupa. Isso ajuda a consolidar a mentira de que Lula seja preso político. Não é.

 

Simples (e complicado) assim.

 

Sexta, 27 Abril 2018 20:40

 

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 Por Roberto de Barros Freire*
 

Aqui no Brasil se costuma se apropriar de expressões estrangeiras sem se atentar para o seu significado ou sentido. Ou, pior ainda, sem sequer saber do que se trata, ou mesmo se as expressões estão certas. Um caso emblemático é a expressão que está na boca de todos, repetida a exaustão na atualidade: fake news.


Tenho para mim que o problema não é de um dilema entre a verdade e a falsidade, como a máxima em inglês sugere, mas antes entre mentira e verdade. No primeiro caso temos um problema de conhecimento ou epistemológico, a pessoa não conhece a verdade e repete o que ouviu falar ou aprendeu erroneamente. Quando a humanidade afirmava que a Terra era o centro do universo não estava mentindo, apenas tinha um conhecimento falso sobre o universo. No segundo caso, temos um problema ético, a pessoa sabe a verdade, mas enuncia uma mentira, o que leva os demais a pensamentos falsos.


Todos nós podemos ter pensamentos falsos quando estamos presos a ignorâncias, a superstições do passado, ou medos absurdos por desconhecer o mundo ou a realidade. Isso, no entanto, não é um problema de caráter, mas de ignorância; não é algo a ser punido ou reprimido, mas esclarecido, pois a pessoa já foi punida pela ignorância de não saber a verdade e ficar enunciando falsidades. Outra coisa muito diferente é quando alguém lança notícias mentirosas, afirmações deliberadamente falsas para que as pessoas tenham visões errôneas e deturpadas de algum acontecimento ou pessoa.


O que se assiste no mundo não é um acúmulo de notícias falsas, mas antes notícias mentirosas que os incautos e precipitados espalham pelas redes sociais, falseando ocorrências e pessoas com intuito nítido de prejudicar, bagunçar ou deturpar a realidade. Ainda que o autor da mentira quase sempre passe despercebido ou desconhecido, o fato é que a maior parte das pessoas crédulas e tolas espalham pelos quatro cantos do mundo as informações mentirosas. Os mentirosos com certeza merecem algum tipo de punição, mas eles são parte do problema. Tão sério quanto são as massas de pessoas ignorantes a repicar e repetir qualquer porcaria que recebe pelas redes sociais. Quanto mais estúpido e absurdo os enunciados, mais acreditam e disseminam para suas redes de contato.


Na verdade, a falta de compromisso com a verdade começa com as massas da população, que por vezes acredita falsamente que querem ajudar o mundo, quando é parte importante do caos de notícias atuais, onde nada parece confiável. Sem se aterem se é verdade, sem pensarem a respeito, apenas encaminham o que recebem, sem critério ou crítica, sem se certificar se é sequer razoável ou plausível. Se os mentirosos são ruins, as pessoas que divulgam suas notícias contribuem em muito para que a maldade se amplie.


Ora, o fato é que o problema está se tornando bem sério na atualidade, porque os meios de comunicação são mais rápidos e a abrange quase a humanidade inteira. E depois de lançada uma calúnia, uma mentira, só com muita dificuldade se consegue provar a inocência, e ainda assim se tem desconfiança do acusado. Há casos de pessoas linchadas que eram inocentes, só porque alguém falou que era culpada, e um enorme número de tolos acreditarem.


Creio que as pessoas deveriam pensar mais antes de lançarem para frente tudo que ouvem ou leem, e antes de querem fazer justiça, que busquem ser justas, que verifiquem as informações, que consultem pessoas mais sábias ou de melhor senso. Não é porque algum parente ou conhecido falou que é verdade, pois que esses podem se enganar, tanto quanto qualquer um, até mesmos os sábios. Logo, antes de tomar partido contra ou a favor, verificar a autenticidade e veracidade do fato ou ocorrido. Que cada um procure não espalhar mais mentiras do que aquelas que ouvimos dos políticos.
 

*Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Quinta, 26 Abril 2018 10:25

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Os artigos 196 até 200 da Constituição Federal estabelece as bases e princípios relativos à saúde dos brasileiros, os quais deveriam ser cumpridos fielmente, mas na verdade boa parte do que ali consta não passa de boas intenções dos legisladores constituintes ou letra morta para “inglês ver”, como se diz quando normas constitucionais são simplesmente ignoradas.


No próximo dia 05 de outubro de 2018, vamos comemorar 30 anos da promulgação da Constituição Federal, que até 04 de outubro do ano passado (2017) já foi emendada ou remendada, alguns dizem, nada menos do que 97 vezes.


Para muitos estudiosos a Constituição Federal brasileira foi um avanço em termos de cidadania e para outros um conjunto de ideais apropriados para países capitalistas avançados ou até mesmo países socialistas. Outros estudiosos dizem que nossos constituintes pensaram que o Brasil estaria prestes a se tornar um regime parlamentarista e por ai vamos tentando ampliar  ou reduzir direitos, gerando muitas contradições e grandes polêmicas.


Por exemplo, o artigo 196 da Constituição Federal estabelece taxativamente que “ A saúde é direito de todos e dever do estado….” e o artigo 198, também estabelece as normas, princípios e diretrizes de como a saúde publica deveria ser organizada para que , de fato, atendesse aos princípios da universalidade, da equidade, da integralidade, da descentralização, da humanização, da participação da sociedade em sua gestão e sua autonomia.

Enfim, nossos constituintes imaginaram que a saúde brasileira deveria ser para todos, sem distinção de classe, cor, território ou condição econômica e social. Para quem lê a Constituição Federal e as Leis que criaram e organizaram o SUS, é algo maravilhoso, que contrasta com o descaso  como a população pobre, os excluídos são tratados.


Imaginemos uma mulher que viva no Amapá, onde só existe um mamógrafo para o estado todo e que esteja estragado, como poderá esta mulher realizar exames preventivos de câncer de mama? Imaginemos milhões de pessoas que a cada dia, por este Brasil imenso precisa acordar de madrugada ou passar a noite toda para tentar agendar uma consulta médica ou centenas de milhares de usuários só SUS que estão na fila virtual, invisível há dois, três ou cinco anos para agendar ou conseguir um exame de media ou alta complexidade ou uma cirurgia. Basta assistirmos os noticiários da TV, rádio, lermos as manchetes dos jornais ou da mídia virtual e a conclusão é a mesma: o atendimento dispensado à população pobre no Brasil é uma vergonha, um acinte, um desrespeito `as normas constitucionais, legais e à dignidade da pessoa humana.


Segundo dados recentes, do final novembro de 2017, do IBGE, pouco mais da metade da população brasileira, vive ou sobrevive com menos de um salário mínimo, enquanto a camada do topo da pirâmide econômica e social, 1% da população, recebe em media R$27 mil reais por mês e alguns marajás da República, nos três poderes chegam a ganhar mais de R$50 ou R$100 mil, incluindo uma minoria, nos ê poderes, que recebe auxílio moradia de mais de R$3 mil mensais e até ameaçam  fazer greve para manterem este e outros privilégios. Para esses, tanto o poder legislativo, quanto executivo e judiciário tem planos e serviços especiais de saúde, tudo custeado pelos cofres públicos.


Entre 2007 e 2014, o número de pessoas que tinham planos de saúde saiu de 39,3 milhões e atingiu 50,4 milhões, mas em decorrência da crise econômica, do desemprego e da inadimplência generalizada que se abateram sobre a classe média, entre 2014 e 2017 mais de 3 milhões de segurados perderam seus planos de saúde e tiverem que voltar ao SUS, que a cada dia está mais sucateado, seja pela corrupção que tomou conta da administração pública seja devido ao corte de recursos destinados a saúde e outras áreas, devido à aprovação do teto dos gastos públicos e da redução do tamanho do estado, sempre em detrimento da população pobre e excluída, pois os grandes grupos econômicos e os marajás da República continuam com seus privilégios, mordomias e outras benesses garantidos e até mesmo ampliados.


Para finalizar, devemos também levar rem consideração que até final de novembro de 2017 o numero total de aposentados e pensionistas pelo INSS era de 34 milhões de pessoas, dessas, 2/3 ou seja, 22,7 milhões desse total recebiam apenas um salário mínimo.


Enquanto os marajás da República, integrantes dos três poderes tem salario médio acima de R$20 mil, R$30 mil ou até mais, além de diversas privilégios e benesses, tudo custeados pelo Tesouro ou seja, dinheiro de uma pesada carga tributária que pesa mais sobre o consume e os pobres, nossos governantes imaginam que quem ganha salário mínimo pode ter saúde e educação de qualidade ou que possa, com um salário desses, ter uma vida digna.


A pergunta que se pode fazer é como uma pessoa, recebendo no máximo um  salário mínimo, de fome, pode sustentar a si e sua família, incluindo alimentação, saúde, transporte, habitação, vestuário, lazer e educação. Podemos dizer, sem sombra de duvida, que saúde, educação, moradia e alimentação de qualidade são privilégios para poucos no Brasil. O grande paradoxo é que continuamos assistindo a cada dois anos, os pobres elegendo governantes que pouco ou nada fazem para mudar esta triste e vergonhosa realidade, pois continuam sempre defendendo os privilegiados e seus interesses, esquecendo-se do povo que sofre e continua marginalizado.
 
JUACY DA SILVA, professor universitáio, titurlar e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulistas e colaborador de diversas veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com

Quinta, 26 Abril 2018 09:45

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT
 

 

Na antiguidade, o romano Terêncio – dramaturgo e poeta – dissera um enunciado lapidar: “Eu sou homem, e nada do que é humano me é estranho”.

No início do século XX, o russo Mikhail Bakhtin – filósofo da linguagem – apontara-nos que nenhum signo verbal se realiza fora de um contexto social.

Sendo assim, o enunciado de Terêncio – para o bem ou mal – tinha alvo mirado. Do nada, aquele romano “das antigas” não teria dito aquilo.

De minha parte, tenho relutado em aceitar a frase terenciana, principalmente quando sua seta está mirada para o que há de pouco nobre nas realizações do humano, que não são poucas e tampouco suaves; custa-me crer em muitas coisas das que fico sabendo. Deliberadamente, evito saber de muitas coisas.

Todavia, nem sempre essa disposição fica incólume, pois, assim como Terêncio, sou um ser da espécie humana; logo, bakhitiniamente falando, um ser eminentemente social.

Por essa destinação, uma vez que não sou árvore, pedra ou outra coisa qualquer, dias atrás, fui informado da existência de Jojo Todyinho, uma “artista” até então desconhecida por mim.

Pois bem. A referida “artista” conseguiu me chocar, não pelos gigantescos seios, que parecem ser sua marca artística, mas por sua ascensão meteórica; num estalar de dedos, eis que começaram a surgir convites para shows, com altos cachês, participação em programas de TV, entrevistas e matérias jornalísticas; até artigos de opinião, como este, por exemplo.

Resumindo: isso tudo, somado a outros meios de divulgação, resultou em Jojo Todyinho:  “artista” de projeção, que, paradoxal e obviamente, não tem peso artístico algum. Sua “obra” solo é entretenimento chulo a mentes vazias; por isso mesmo, naturalmente, agiganta-se; é quase imbatível. Contudo, pouca coisa se poderá criar depois de sua presença no mercado das futilidades, vendidas, aos desatentos, como manifestação artístico-popular da periferia. 

Para provar que não há arte em seu trabalho, destaco alguns “versos” produzidos por essa funkeira, de 21 anos, que saiu da internet para ocupar espaços antes impensáveis:

Que tiro foi esse?// Que tiro foi esse que tá um arraso?!// Que tiro foi esse, viado?// Que tiro foi esse que tá um arraso?!// Samba na cara da inimiga// Vai, samba// Desfila com as amigas...// Quer causar, a gente causa// Quer sambar, a gente pisa!// Quem olha o nosso bonde, pira// Quer causar, a gente causa...”

A transcrição acima é um exemplar, longe de ser único, do baixíssimo patamar cultural e educacional em que já chegou nosso país. Temo pelo dia em que só nos restará o bizarro, pois sua naturalização é humanamente espantosa.

Mais do que nunca, precisamos de políticas públicas para as verdadeiras manifestações culturais. Contudo, teremos de ter discernimento entre o que de fato é manifestação cultural de nosso povo e o que não passa de produto mercadológico; afinal, em sociedades capitalistas, sobretudo, e sobre todas, nada do que é humano pode espantar alguém.  

P.S.: já findado o artigo, fiquei sabendo, pelo UOL, que Todyinho acabara de lançar outro hit: "Vou Com Tudo". Nele, a “artista” enfrenta uma amiga falsa e ordena: “Tira a mão das minhas gavetas, bebê”.

Conforme explicações suas, esse bordão pode ser traduzido por: “Você está levando a pessoa no ‘blindão’ e a pessoa fica de sacanagem”.

Detalhe: a funkeira, apoiando-o nos volumosos seios, assinou um contrato com a Universal Music para o lançamento desse e dos próximos singles.

Trauma foverever.

Um país culturalmente rico não merecia tamanha indigência.

Quarta, 25 Abril 2018 09:10

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RELATÓRIO POLÍTICO

ATIVIDADE DO GTPFS EM RIO BRANCO

 

Nome do Participante:

ALAIR SILVEIRA

Nome do Evento:

REUNIÃO GTPFS NACIONAL E IV ETAPA CURSO DE POLÍTICA E FORMAÇÃO SINDICAL

Cargo/Função (Delegado, Observador, Diretor, Assessor etc):

REPRESENTANTE GTPFS

Instância Deliberativa (AG, Reunião Diretoria, GT etc):

GTPFS

Cidade/UF:

RIO BRANCO/AC

Local:

ADUFAC

Período Evento:

05 A 07 DE ABRIL/2018

Data Saída:

04/ABRIL/2018

Data Retorno:

09/ABRIL/2018*

 

RELATÓRIO REUNIÃO GTPFS

    A Reunião do GTPFS, no dia 05/04, contou com a presença 08 professores, sendo dois desses da Diretoria Nacional.

   Nos informes gerais, foi feito um rápido relato sobre a situação atual das seções sindicais da ADUCG, ADUERN, ADUFPA, ADUFPR, ADUFPel e ADUFMAT.

   Solicitei à Coordenação da Mesa, a inclusão da Análise de Conjuntura como segundo ponto de pauta, assim como defendi a necessidade que esse seja um ponto de pauta permanente, posto que as decisões de ação devem ser decorrentes da análise da correlação de forças e do quadro mais geral.  Ambas as propostas foram aprovadas e, na sequência foi feita uma boa análise de conjuntura, com destaque para o alcance dos ataques aos direitos e, principalmente, o crescimento da intolerância social e das manifestações militares.

   Outro ponto que entendo necessário registrar foi a crítica feita ao GTPFS Nacional, tanto com relação à falta de regularidade para as reuniões nacionais, assim como para a impressão de que o GT se tornou uma extensão do GTPCEDS, tendo em vista a o conteúdos dos cursos de política e formação sindical, dedicados à discussão sobre LGBT, Mulheres, Indígenas, Quilombolas etc. Especialmente em face aos enormes ataques que agridem o conjunto da classe trabalhadores.

   Como exemplo foi feita referência aos impactos que a Contrarreforma Trabalhista, os desdobramentos já observados com relação à Justiça do Trabalho, assim como as ofensivas contra a autonomia da Universidade e a perseguição ideológica aos professores.

   Observei, nesse sentido, que o GTPFS está absorvendo a lógica da especificidade como ‘substituição’ ao classismo, cuja forma mais explícita é a disposição que muitos companheiros têm para participar de questões e atividades específicas, e o desaparecimento das atividades de classe, especialmente as Assembleias do Sindicato.

   Essas críticas foram debatidas e ratificadas, com relatos sobre essas experiências nas seções sindicais.

   Merece registro, ainda, a discussão qualificada que envolveu as definições necessárias ao funcionamento da Comissão Nacional responsável pelo acolhimento das denúncias de perseguição política.

   Sobre a criação de um Fundo para apoio às entidades sem contribuição suficiente, foi analisada a injustiça para com aquelas que contribuem corretamente, posto que muitas seções estão inadimplentes e/ou repassam valores inferiores ao ANDES/SN e/ou sequer repassam recursos à CSP-Conlutas.

 

Principais encaminhamentos Reunião:

 

  1. Inclusão da Análise de Conjuntura como ponto de pauta permanente;
  2. b.      Organizar Cursos de Formação Sindical: 1) Trabalho Docente: Perfil, Precarização e Trabalho (im)produtivo; 2) Contrarreforma Trabalhista e seus impactos;
 

 

REUNIÃO IV ETAPA CURSO DE POLÍTICA E FORMAÇÃO SINDICAL

 

  O Curso dedicado aos Quilombos e à luta dos quilombolas foi desenvolvido de uma forma muito agradável, com as professoras responsáveis interagindo integralmente com os participantes. Essa ‘abertura’ permitiu questionamentos e considerações que extrapolaram a especificidade dessas lutas, extrapolando os limites das próprias e, dessa maneira, possibilitando o aprendizado dessas experiências para o cotidiano de outros embates.

   Uma outra característica importante dessa Etapa foi a interação entre todos os participantes (incluindo-se as professoras) em todos as oportunidades, dentro e fora do ambiente do Curso.

    Em uma dessas ocasiões, todos os participantes construíram, em conjunto, um poema que ficou como a ‘marca’ desse Evento.

   Por fim, as professoras apresentaram um questionamento para que os grupos respondessem: “Organização e lutas quilombolas: Como as universidades e os movimentos sociais (sindical e outros) podem contribuir?” Dentre as várias sugestões de estreitamento das relações entre Universidade e Movimentos Sociais, incluindo-se aí maior visibilidade à produção já disponível e à oferta de oficinas, foi questionada a perspectiva contida na própria pergunta, que de maneira inadvertida pressupõe uma relação ‘elitizada’ sobre os movimentos sociais como um todo, na medida em que a Universidade aparece como aquela que “oferece”, “concede” e não como uma igual que troca experiências e aprendizados, a partir de ofícios e vivências diferenciadas.

   Ao final, um elenco de sugestões foi proposto, inclusive uma eventual parceria para o consumo de alimentos saudáveis pelos restaurantes universitários.

 

 

 

RELATÓRIO POLÍTICO

ATIVIDADE EM SINOP

Nome do Participante:

ALAIR SILVEIRA

Nome do Evento:

DEBATE SOBRE CONJUNTURA E ELEIÇÕES 2018

Cargo/Função (Delegado, Observador, Diretor, Assessor etc):

PALESTRANTE

Instância Deliberativa (AG, Reunião Diretoria, GT etc):

REPRESENTAÇÃO LOCAL SINOP

Cidade/UF:

SINOP/MT

Local:

AUDITÓRIO ADUFMAT SINOP

Período Evento:

12 DE ABRIL/2018

Data Saída:

12/ABRIL/2018

Data Retorno:

13/ABRIL/2018

 

RELATÓRIO

    A atividade teve uma participação de aproximadamente 60 pessoas e foi bastante interessante.

    Dada a atualidade do tema, houve, também, uma participação da plateia com a apresentação de muitos questionamentos, permitindo uma boa interação.

   Além da Palestra, no dia 13 de abril/18, foi concedida uma entrevista relativamente longa na Rádio 93,3. A apresentação da entrevista, segundo o radialista responsável, seria divulgada a partir de sábado (14/04/2018).

   As repercussões da Palestra e da Entrevista serão melhor avaliadas por aqueles que a assistiram.

 

 

 

 

 

 

 

Sexta, 20 Abril 2018 15:21

 

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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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 Por Roberto de Barros Freire

 

O que há de comum entre Michel Temer, Aécio Neves e Lula, além, é claro, de serem investigados pela justiça brasileira, sendo um deles já condenado? Usam os mesmos argumentos para se defenderem das acusações que lhe são imputadas. Os três acusam o ministério público de perseguição política contra suas candidaturas. Dizem que há uma conspiração contra eles e suas pretensões políticas. Que há um complô na justiça para afastá-los da vida pública, que tramam ardilosamente contra a verdade, que só eles conhecem.


Aliás, tal argumento é o que mais se encontra entre nossos presidiários. Se perguntarem aos presos, quase todos se dizem inocentes, que foram condenados injustamente, que são homens honestos e bons, mas que foram privados de suas liberdades por equívocos da polícia, da procuradoria ou mesmo da justiça. É o argumento típico de bandidos, que por mais que se encontrem indícios e provas de suas culpas, alegam sua inocência. Acreditam que uma mentira repetida diversas vezes, talvez se torne algum dia uma verdade.


Devemos dar a presunção da inocência aos políticos? Só se fossem pessoas comuns, sem cargos ou poder político. Para os políticos, é fundamental que se diga, não basta serem honestos, é preciso também parecer honesto, e na dúvida sobre seus atos ou ditos, devem ser imediatamente afastados de seus cargos e postos, colocados em ostracismo, até que se prove sua inocência. O benefício da dúvida é prerrogativa do povo, e se o povo tem alguma suspeita sobre seus políticos, os mesmos precisam se retirar da arena pública até que provem que as suspeitas estão erradas. É o que acontece na maior parte do mundo civilizado: na ocorrência de uma acusação, o político imediatamente sai do cargo que ocupa, do partido político a que pertence, e vai para a justiça comum provar sua inocência. Se comprovada sua inocência, recebe o direito de voltar à esfera política e ocupar cargo de poder.


Enfim, PMDB, PSDB e PT são mais semelhantes em suas práticas e discursos do que querem nos fazer crer que tenham grandes diferenças seus defensores. Para mim, tudo de ruim que um partido fala do outro é absolutamente verdadeiro, o que é falso o que cada um alega sobre suas qualidades.
 
Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Sexta, 20 Abril 2018 15:19

 

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Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Roberto Boaventura da Silva Sá

Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT

Na linda canção “Pranto do Poeta”, Cartola registra uma certeza sua diante da morte: em “Mangueira// Quando morre um poeta// Todos choram”, embora, paradoxalmente, seja “um pranto sem lenço// Que alegra a gente”.

No dia 16/04/18, não a Mangueira, mas o Império Serrano e o Brasil inteiro viveram a experiência da morte, aos 96 anos, de Ivone Lara, uma compositora/poeta, que aos 13 anos de idade, brindou-nos com “Tiê”, uma canção feita a um passarinho que havia ganhado como presente de aniversário:

“...Passarinho estimado// Que me deu inspiração// Dos meus tempos de criança...”

E a inspiração daquele juvenil momento perdurou até pouco antes de sua morte. Ivone Lara teria deixado aproximadamente quarenta canções feitas nos últimos quatro anos.

Mas, independentemente dessas novidades, até por conta de sua saúde, bem debilitada nos últimos anos, o que já havia composto era suficiente para que ela fosse reverenciada por todos os que apreciam uma canção liricamente bem feita. Reverência que lhe rendeu o respeitoso tratamento de Dona, a dama do samba.

Dentre seus apreciadores, estão os principais nomes da MPB. Maria Bethânia e Gal Costa talvez tenham sido as admiradoras mais importantes para sua carreira. Ambas gravaram a antológica e delicada canção “Sonho Meu”, composta por Ivone Lara, em parceria com Délcio Carvalho:

“Sonho meu// Vai buscar quem mora longe... Sinto o canto da noite// Na boca do vento// Fazer a dança das flores// No meu pensamento// Traz a pureza de um samba// Sentidos, marcado das mágoas de amor// Um samba que mexe o corpo da gente// E o vento vadio embalando a flor// Sonho meu”.

“Sonho Meu” veio a público no final dos anos 70. Por isso, ainda que não houvesse confirmação alguma, ficava bem difícil não imaginar que aquele poema musicado não fizesse referência a exilados políticos. Vale lembrar que o país vivia seus piores anos do regime militar; logo, o exílio fizera muita gente querida viver distante da terra onde os sabiás cantavam nas palmeiras ou nas laranjeiras.

Seja como for, na esteira de Clementina de Jesus e Jovelina Pérola Negra, Dona Ivone Lara completou uma singular tríade de mulheres negras, que viveram e venceram preconceitos, mas sem nunca servirem, deliberadamente, de bandeira ideológica a nenhuma militância de grupos.

Questionada sobre os preconceitos de que era vítima, Ivone Lara, com um lindo sorriso negro, respondeu que não ligava para isso; que, sempre firme, seguia adiante sua vida, compondo e cantando.

E por falar em sorriso negro, este foi o título de uma de suas canções – lírica e politicamente – mais lindas. Com base estrutural consolidada em um forte conjunto anafórico, tudo ali é feito com muita delicadeza poética. Às vezes, a sutileza da arte pode ser uma bandeira, mas sem que seja identificada como tal:

“Um sorriso negro, um abraço negro// Traz... felicidade// Negro sem emprego, fica sem sossego// Negro é a raiz da liberdade// Negro é uma cor de respeito// Negro é a inspiração// Negro é silêncio, é luto// Negro é... a solidão//  Negro que já foi escravo// Negro é a voz da verdade// Negro é destino, é amor// Negro também é saudade...”

E saudade é o que nos deixa Dona Ivone Lara. Todavia, sua falta física entre nós será sempre diminuída toda vez que, em algum lugar desse imenso e miscigenado país, em algum show ou roda de samba, no lugar do pranto, alguém, respeitosamente, cantar qualquer uma de suas inúmeras canções, todas, poeticamente, emocionantes.