Segunda, 05 Novembro 2018 18:08

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Roberto de Barros Freire*
 

Aqueles, como eu, que estão perplexos com essa eleição, devem se dar conta, a esta altura, de que perdemos contato com a base da sociedade. As principais marcas da eleição deste ano foram a renovação e a repulsa à política tradicional. Medebistas, pesedebistas, assim como os petistas apostaram no caminho inverso: tentaram reciclar antigas lideranças e o governo Lula, e formaram uma tropa composta especialmente por veteranos que foram defenestrados da política através do voto. O congresso salvou a Dilma mesmo com o impeachment, mas o povo a repudiou. Voltaram para cena política, previsivelmente, os queixumes contra o impeachment de Dilma e a “prisão injusta” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O autoengano servindo à militância contribuiu para envenenar o ambiente político, enquanto a sigla manteve o culto a líderes flagrados em desmandos e se esquivava de reconhecer seus erros econômicos e políticos.


Os partidos que não expulsaram de suas fileiras os acusados, presos e condenados acabaram punidos pelo voto popular, que cansado de ver as mesmas caras sempre enroladas com a justiça, resolveram fazer justiça com as próprias mãos. Não à toa, MDB, PSDB e PT foram os três partidos que mais perderam governos e cargos eletivos. Foi uma rejeição à política considerada tradicional, e um voto no combate à corrupção e a maior punição à criminalidade, cujos partidos tradicionais não mais representavam esses antigos anseios. Isso que as urnas mostraram.


Na verdade, a elite intelectual não percebeu que os seres humanos querem respostas simples, certezas absolutas e a destruição de quem não pensam como eles. Falar para um público que não dá atenção aos professores, aos jornalistas, aos artistas e aos ativistas e que trata, com alguma razão, como uma elite progressista arrogante, revelou o desprezo com que elites políticas e culturais passaram a olhar para os eleitores. O povo fede, o povo é boçal, o povo não sabe o que quer e deve ser educado —ou ignorado, uma espécie de despotismo iluminado dos intelectuais. Enfim, a elite não percebeu a falta de confiança nos políticos e na política desde 2013, a crise econômica, o desgaste do longo governo do PT, a força da Lava Jato, o aumento da violência, além da reação a mudanças que afetaram os conceitos e valores tradicionais a respeito de família e gênero. Deu-se muita ênfase as questões de gênero ou meio ambiente, e se esqueceu das questões que mais aflige a maioria: a insegurança monetária ou jurídica. Não se percebeu que o povo considera a luta pelos direitos humanos como uma coisa para salvar bandido da cadeia. E não importa que isso não seja verdadeiro, o importante é como se sente. Como querer salvar os homossexuais, uma minoria, quando as crianças, uma maioria, estão ameaçadas? Como querer a igualdade de gênero quando todos se sentem excluídos dos direitos? Como querer salvar samambaias e taturanas, quando se assiste as pessoas serem mortas na porta de casa?


Não foi Bolsonaro quem inventou a intolerância e a violência no país, que remontam aos tempos do Brasil Colônia. Ele a catalisou, a projetou e a acentuou, e os brasileiros se projetaram nele. A lógica comumente difundida por setores da esquerda de "quem não está comigo, está contra mim" também não ajuda — é, também, intolerante. E o mundo cultural passou a representar a corrupção da inteligência, e a arte foi vista como uma ferramenta de doutrinação. Universidades, intelectuais, jornalistas e artistas passaram a ser vistos como defensores de minorias em detrimento da maioria, defensores de valores degenerados, defensores dos “pecados”.


É preciso encarar a realidade do conservadorismo nacional, que as bandeiras progressistas não são atraentes à grande maioria, que os brasileiros desconfiam da liberdade que acreditam que levam a licenciosidade, e que a força é o único recurso contra a violência. Devemos nos acostumar a conviver com a direita na arena política, que foi hegemonicamente dominada pela esquerda desde a redemocratização. O fato é que teremos que dialogar com uma direita que saiu às ruas e quer ser escutada, e se fazer prevalecer na arena política. Isso não é algo estranho à vida política, isso era apenas algo ausente até esse momento. A direita não quer mais se esconder ou se calar, e se expressou de forma rotunda.
 
*Roberto de Barros Freire
Professor do Departamento de Filosofia/UFMT
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Quinta, 01 Novembro 2018 10:01

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo pela USP/Professor da UFMT
 

Desde o dia 28/10, entramos na pré-nova era nacional. Quando janeiro chegar, “novas” cartilhas, cheias de coisas que supúnhamos ultrapassadas, estarão a nossa espera. 

Sendo assim, como tudo que supúnhamos fosse importante para nossas vidas pessoais e nossas relações sociais não era tão abrangente e duradouro, como poderia ter sido, pantaneiramente falando, é bom não nos esquecermos: “em rio que tem piranha, jacaré nada de costas”.

Dito isto, a este artigo, exponho impressões sobre três discursos vindos a público, tão logo a vitória de Bolsonaro foi confirmada pelo TSE.

Começo com o pronunciamento de Dias Toffoli, presidente do STF, que lembrou ao presidente e ao vice-presidente vitoriosos: “uma vez eleitos, os senhores passam a ser os representantes da nação e não apenas dos seus eleitores...” Por isso, há de se “respeitar aqueles que não lograram êxito em se eleger e também a oposição política que se formará".

Toffoli pontuou outros itens, como “a pluralidade política, um dos fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito, que tutela a liberdade em suas diversas formas, dentre elas, a liberdade de expressão, de opinião e de consciência política, de crença e de culto, de identidades e de convivência harmoniosa entre diferentes formas de viver e conviver uns com os outros". Também por isso, insistiu na necessidade de situação e oposição se empenharem no sentido de superação do estágio de radicalismos vivido nos últimos meses.

No tocante à liberdade de imprensa, Toffoli foi enfático, destacando a importância de uma imprensa verdadeiramente livre de interferências.

O outro discurso destacado é o de Bolsonaro, feito por etapas. De início, algo próximo a cultos de agradecimento a Deus. Logo, muito coerente com a base de sua campanha política: a passagem bíblica Jo; 8: 32 (conhecereis a Verdade, e a verdade vos libertará). A política nossa de cada dia, ou seja, aquela que verdadeiramente nos regerá, podendo até nos escravizar, foi secundarizada.

Depois, e só após observações que já eram feitas pela mídia sobre as lacunas daquela primeira fala, Bolsonaro retornou para alguns complementos “esquecidos”. Assim, falou em pacificar o país, cumprindo a Constituição, recusando-se a qualquer tipo de preconceitos. Disse que respeitará as liberdades individuais e a liberdade de imprensa, desde que sem “fake news”, como teria, em sua opinião, feito a Folha de São Paulo algumas vezes nos últimos meses.

Se cumprirá o que foi dito, apenas o futuro dirá. Até lá, só há o império das palavras e os receios diante de inaceitáveis afirmações já enunciadas por ele próprio em discursos sobre negros, gays, ativistas dos movimentos sociais et alii. Em princípio, tudo assustador, mas nada que fosse desconhecido para alguém.

Da parte de Haddad, limitações suas se tornaram nítidas. Ex.: ele não foi capaz de ligar para o vencedor, como manda a etiqueta burguesa. Essas mesuras precisam ser cumpridas, não importa a circunstância.

Como extensão, em seu discurso, não citou o nome de Bolsonaro. Falou apenas para a própria militância. Assim, perdeu a chance de se mostrar como grande líder político, independentemente (e apesar) de Lula. Haddad precisava ter sido enfático na cobrança da defesa da democracia e de todas as liberdades. Não fazendo isso, foi insuficiente para a importância que o momento demandava de sua pessoa.

No dia seguinte, enviou mensagem por rede social a Bolsonaro, dizendo que o Brasil precisa, “neste momento, do melhor”.

O Trump dos trópicos, ironicamente, só tinha de concordar. 

Quarta, 31 Outubro 2018 10:45

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Parece que o Brasil entra em mais uma nova fase de sua história e, como em tantas outras, muitas coisas podem mudar, algumas para melhor e outras para pior, com certeza. Alguns dizem que as crises e os conflitos são parteiros da história, pois exigem que os países tenham a capacidade de se reinventarem.

Este é um novo momento em nossa história politica quando velhos caciques e raposas perderam as eleições, velhos esquemas se mostraram ineficientes e partidos, até então considerados “fortes” e donos da verdade quase desapareceram, como no caso do antigo e novamente MDB e o PSDB.

Quanto ao PT, surgido em pleno período de governos militares, fruto da luta sindical, depois de diversas tentativas chegou ao poder em 2003, após três derrotas consecutivas de LULA, seu líder maior e que nesta eleição teve que assistir de dentro de uma prisão a vitória da extrema direita através do voto de milhões de eleitores, mesmo que em percentual bem menor do que de suas duas vitórias e da primeira vitória de Dilma, sua sucessora, em 2010.

Mesmo sendo derrotado, para tristeza de seus algozes, o PT ainda demonstra um grande fôlego, um capital politico e eleitoral considerável que lhe garantiu vitórias importantes em todos os estados do nordeste, além de Tocantins e do Pará, onde Fernando Haddad foi o vencedor no segundo turno.

De uma figura de pouco brilho na Câmara Federal durante sete mandatos, integrante do chamado “baixo clero”, quase invisível para a opinião publica, tendo passado por diversos partidos, seu partido atual, um dos até poucos meses considerado nanico, o PSL, antes o PSC que não topou apostar da candidatura de Bolsonaro, demonstrou alguns aspectos e fatos novos na politica brasileira.

Primeiro, ficou a certeza de que tempo de TV e um monte de partidos tradicionais não pavimentam o caminho da vitória. Através de uma coligação considerada pífia o PSL, melhor dizendo, Bolsonaro conseguiu “desbundar” o MDB de Temer e Romero Jucá e o PSDB de Geraldo Alkmin que tinha quase todo o tempo do mundo de propaganda eleitoral no rádio e TV e como aliados diversos partidos  fisiológicos do chamada “centrão”, que já estiveram com Lula, com Dilma, com Temer e com certeza estarão com Bolsonaro.

A votação inexpressível de Alckmin em todos os estados, inclusive em São Paulo, onde ele próprio já exerceu o cargo de governador por quatro mandatos e o PSDB é “dono do pedaço” há mais de duas décadas não impediram que Bolsonaro o derrotasse no primeiro turno de forma vergonhosa.

Parece que o PSDB entrou dividido na disputa presidencial em 2018 e saiu não apenas derrotado mas estraçalhado, incluindo a derrota de alguns de seus caciques em diversos estados como Mato Grosso, Minas Gerais, Goiás, Paraná e no nordeste inteiro.

Os tucanos que em 2014 elegeram 54 deputados federais viram a bancada cair para quase a metade nas eleições de 2018, quando conseguiram eleger apenas 34 deputados, passando da condição de terceira maior bancada há quatro anos para a nona, empatado com o DEM a partir de 2019.

A mesma sorte teve o MDB que caiu da segunda posição em 2014 quando elegeu 66 deputados federais para 34 na eleição deste ano. Pela ordem, os quatro partidos que mais perderam cadeiras na câmara federal nas eleições de 2018 foram: MDB 32; PSDB 25; o PTB 15 e o PT 13 e o único que realmente ganhou um espaço de grande destaque foi o PSL, partido de Bolsonaro, que  em 2014 elegeu apenas um deputado federal e nesta eleição passou `a condição de segundo maior partido na Câmara Federal, com 52 parlamentares e que com a sinuca de bico em que se encontram 14 partidos que elegeram 41 deputados mas não conseguiram superar a chamada clausula de barreira, poderá receber logo no inicio da legislatura mais de uma dezena de parlamentares eleitos por esses partidos e que desejam mesmo é estarem à sombra do poder, de onde pode jorrar leite e mel, sonho acalentado por políticos fisiológicos que agem como mariposas em relação à luz.

Diferente de Collor de Melo que também foi eleito por um partido na época com pouca expressão politica e eleitoral, não tendo formado uma base parlamentar  forte no Congresso e acabou sofrendo o “impeachment”, Bolsonaro, chega ao poder com uma base parlamentar, principalmente na Câmara Federal com força suficiente para, se não conseguir aprovar tudo o que deseja, pelo menos para ter espaço suficiente para navegar em céu de brigadeiro, se não meter os pés pelas mãos, com propostas que dividam não apenas o Congresso mas, principalmente, o país que entrou dividido e saiu dilacerado dessas eleições.

Em uma democracia, quem ganha  também deve respeitar quem perde e não tentar eliminar os adversários como se inimigos fossem, afinal, em uma democracia podemos estar divididos em termos de ideologias, ideias, propostas e modelos de desenvolvimento para o país, jamais em Guerra real, onde, o que conta é a destruição ou até a eliminação física do adversário. Quando isto acontece, estamos na ante sala de um regime totalitário em detrimento das instituições do estado democrático e de direito. Aí o caos substitui a ordem democrática e a pluralidade, como atualmente acontece na Venezuela, cujo ciclo de violência politica teve inicio com a chegada ao poder, via eleições, até então livres, de um coronel do exército que acabou dando auto golpes, destruindo os poderes judiciário e legislativo e perseguindo implacavelmente a oposição, deixando um país arrasado para seu sucessor que continua sua obra devastadora no país vizinho.

O Brasil continua dividido não apenas em termos políticos e eleitorais, mas também em termos econômico, racial, social, cultural e religioso, o momento deve ser de tentarmos colar os lados do que resta de um país sofrido em meio a tanta violência, corrupção e desagregação institucional. Se antes o mapa do Brasil era dividido entre azul e vermelho, a partir dos resultados dessas eleições continuará dividido entre verde e vermelho, onde o verde apenas ocupou o lugar do azul, com a debandada do centro rumo a direita e extrema direita.

Dias nebulosos e sombrios ainda rondam os céus de nosso país, quem viver verá!


*JUACY DA SILVA, professor universitário, mestre em sociologia, articulista e colaborador de diversos veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.Twitter@profjuacy  Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

 

Sexta, 26 Outubro 2018 14:54

 

 

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Por Aldi Nestor de Souza
 

Estou, nesse momento em que escrevo, dentro de uma sala hermeticamente fechada, uma sala que sequer tem portas. Só paredes, piso e teto reforçados. É uma sala sem ar, sem água, sem móveis, sem luz, sem decoração, sem nada. É uma sala distante de tudo, alheia a qualquer tipo de relação. Essa sala é o lugar onde vivem os antipetistas fundamentalistas.

Claro, esse tipo de sala é o mesmo onde vivem os fundamentalistas em geral, só escolhi os antipetistas devido ao calor da hora. É claro também que os petistas fundamentalistas vivem numa sala igual.

Pra eu entrar nessa sala, evidentemente, tive que optar por morrer primeiro, entendendo que só a morte poderia me proporcionar peripécias tais como atravessar paredes instransponíveis e achar que eu não tenho nada a ver com o que ocorre no mundo, com as mazelas da sociedade em geral.

Pois, pelo menos a meu juízo, é exatamente isso o que ocorre com os antipetistas fundamentalistas: a sensação de viverem num mundo à parte, num mundo sem relações, num mundo idealizado, num mundo hermético, num mundo só deles. E aqui estou falando de todos os antipetistas fundamentalistas. Todos: dos intelectuais aos hipopótamos.  

Uma característica bem visível de um antipetista fundamentalista é que ele não consegue falar, como um todo, dos governos petistas. E isso é compreensível, até bem natural, de quem se julga fora do processo, fora do embate, dentro de uma sala hermeticamente fechada.

Por exemplo, o combate à fome, o bolsa família, raramente entra na sessão de argumentos de um antipetista fundamentalista. E não entra por um motivo também evidente: não se pode falar contra, com desenvoltura, de um programa que tirou , segundo a ONU, pela primeira vez nos últimos 500 anos,  o país do mapa da fome. A fome é difícil de medir, ela é singular demais pra caber na pena ou na bile de um sujeito enfurecido e alheio às relações que determinam a vida em sociedade. A fome desconcerta qualquer argumento. A fome é a fome e ponto final.

Também não se fala do lado positivo da expansão de universidades e de institutos de ensino públicos nascidos ao relento e espalhados país afora. No lugar disso, como é óbvio, é muito mais confortável centrar força na precariedade da expansão.  

Aqui, na sala onde estou, fala-se aos gritos desses males. Nesse momento, por exemplo, uma pessoa não para de erguer os braços, de gesticular com ferocidade e de bradar as mais terríveis palavras de repúdio ao campus da Federal que brotou lá no meio da caatinga nordestina, lá onde só tinha pedra, xiquexique e gente, lá onde não tinha nada. Mas o brado é porque tá faltando alguns ingredientes pra um laboratório e grana pra se fazer aula de campo. Quase todo o resto tá funcionando, tem gente se formando, tem gente trabalhando, a cidadezinha de merda prosperou, o xiquexique floresceu, a pedra deu experimento. Mas nada disso vale, quando se vive numa sala hermeticamente fechada.

Mas a coisa preferida mesmo dos antipetistas fundamentalistas, pelo menos é a mais badalada aqui na sala e a grande geradora de ódio, é a execrável corrupção. A corrupção é sedutora demais, levanta até a moral dos velhinhos sem saúde. E a corrupção tem a vantagem de já vir pronta, não precisa explicação, o censo comum basta.

Mas a corrupção, inevitável no modo de produção capitalista, não faz nem cócegas nos problemas sérios do Brasil. Por exemplo, segundo a polícia federal, após mais de quatro anos de investigação, o famoso Petrolão, muso inspirador de jornalistas e articulistas de pena pesada, desviou 42 bilhões da Petrobrás. Uma fortuna, realmente. Inaceitável. Essa fortuna gerou uma infinidade de assustadoras manchetes de jornais e artigos de opinião, segundo os quais a empresa petroleira brasileira, em função disso, havia quebrado.

Perto da avalanche sobre o escândalo do Petrolão, a notícia de que cinco brasileiros, exatamente cinco, tem a mesma renda de metade da população mais pobre, virou apenas uma reles notinha de pé de pagina. Uma coisa que, de tão nanica, quase ninguém lembra mais.

Por outro lado, segundo o jornal correio brasiliense, de 19/05/2018, em uma semana de greve dos caminhoneiros, greve que ocorreu em maio, a Petrobrás teve um prejuízo de 118 bilhões de reais. Ou seja, quase três Petrolões em apenas uma semaninha e a empresa segue firme, vendendo normalmente seus pedaços de pré sal pro mercado internacional. Esse Prejuízo, no mundo das narrativas antipetistas, sequer foi comparado ao Petrolão.

Outra coisa que os antipetistas fundamentalistas não levam em conta é a simbologia, para a classe trabalhadora, do ex metalúrgico, aquele de dedo torado no torno. Aqui a coisa fica mais complicada. Falar desse ex metalúrgico é como tocar num ponto nevrálgico, de dor cortante.  Para os antipetistas fundamentalistas, o ex metalúrgico não é um ex metalúrgico, não é um ex retirante nordestino, que almoçava do marmitex da empresa e guardava a carne pra janta, não é um degustador de cachaça, não é um sujeito que engole plurais.

Não. Nenhum desses símbolos, símbolos estes que caracterizam a enorme maioria da classe trabalhadora brasileira, é levado em conta. Nenhum. Na briga de narrativas, para um antipetista fundamentalista, mesmo para aqueles que são trabalhadores, valem apenas as coisas óbvias: as “irrefutáveis”, as “apuradas” em investigações, as denunciadas pelos ex companheiros, as “julgadas” pela justiça, as que horrorizam o componente moral.

Por fim, um antipetista fundamentalista, de tão certo, parece capaz de se submeter à barbárie, de deixar fraquejar a democracia, de deixar fraquejar os direitos humanos, de não maneirar no julgamento nem na pena, mesmo diante da catástrofe, e de fazer crítica pesada, repetida e requentada, ao partido e ao ex metalúrgico, mesmo estando todos nós à beira do abismo e de uma tragédia bem maior, tragédia que poderá tirar, até dos mortos, o direito de pensar livremente e de opinar.
 

*Aldi Nestor de Souza
Professor do departamento de matemática. UFMT/Cuiabá.
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Sexta, 26 Outubro 2018 11:36

 

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Wescley Pinheiro

Professor do Departamento de Serviço Social da UFMT

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        Não há como não se afetar com os elementos presentes na conjuntura. Não existe ninguém satisfeito com as coisas como estão e, seja qual for a posição política diante do quadro atual, é inegável que o agravamento das questões atravessam nossas relações pessoais, atinge nossas emoções e causam sofrimento. Isso ocorre de diferentes formas e níveis e por distintas motivações. Nesse sentido, com o processo de recrudescimento do conservadorismo e ascensão do protofascismo, legitimado pelas parcas estruturas democráticas, temos a tônica de algo tão doloroso quanto real: a hipertrofia da violência vivida no cotidiano.

        Esse fenômeno tira do armário todos os preconceitos, vilipendia qualquer concessão civilizatória, vomita tudo de desumano que se encontrava aparentemente domesticado em nossas relações e, sem necessidade de lógica e coerência, os espaços da singularidade e das particularidades são tomados de assalto por todas as formas de opressões historicamente determinadas. Dos púlpitos das cátedras ou das catedrais, dos bancos ou das bancadas, das piadas infames ao relativismo das desigualdades impera a explosão de violações travestidas de neutralidade, boa vontade ou explicitamente agressivas. Entre a patologização da questão social, a normalização da exploração e das opressões, a medicalização da vida e a moralização da barbárie caminha nosso processo de individuação entre relacionamentos abusivos, práticas intolerantes e relações adoecedoras no desencaixe dos espaços comuns.

        Com isso as violências morais, simbólicas e psicológicas cravam as possibilidades mais severas por via de instituições tão caras ao nosso tempo histórico. Por tudo aquilo que colocamos no texto “O ovo da serpente foi chocado: protofascismo brasileiro e novos desafios frente ao obscurantismo contemporâneo” cresce a necessidade da busca pelos culpados nos espaços cotidianos diante daquilo que nos desumaniza.

        Para aprofundarmos o entendimento de como um projeto autoritário ganha força nos setores populares e de como isso faz com que fortaleça opressões históricas é preciso compreender a estrutura da hegemonia e sua retroalimentação ideológica para além da política formal, perpassando a mídia, a religião, a ciência, além dos diversos aparelhos ideológicos, instituições e ambientes importantes para a propagação e reprodução da cultura, inclusive o lócus de socialização primária. Quando aquilo que chamamos de “esquerda”, por diversas razões, perdeu espaço, abriu mão ou se equivocou na construção da contra-hegemonia, com táticas reformistas e/ou reproduzindo práticas de estranhamento no trato nas relações particulares, o vácuo possibilitou a ampliação avanço protofascista.

        Quando a crise do capital degrada a condição de vida das pessoas, o Estado busca tomar as rédeas para administrar a possibilidade das taxas de lucro de modo mais agressivo e a moral aparece como instrumento mistificador da realidade, engabelando possíveis resistências diante das questões essenciais e dirigindo olhares para a superfície. Por isso, as relações subjetivas, os espaços cotidianos de trabalho, assim como a família, os lugares coletivos onde buscamos fortalecer o espírito, as relações de amizade, entre outros afetos surgem com toda a violência possível, materializando em nossas vidas aquilo que se projeta, se propaga e se consolida no fascismo contemporâneo.

        A negação dos elementos que fundamentam a realidade frente aos fragmentos da cotidianidade se alastram na constituição individual em tempos de acirramento das contradições de classe. O sofrimento subjetivo busca o pensamento mágico, particularismos e esquivas diante do real. Nesse sentido, tanto conservadores quanto muitos daqueles que buscam desconstruí-lo desenvolvem suas manifestações de mistificação.

        No entanto, mesmo nos meandros da fantasia a realidade existe. Ela é inexorável, objetiva, concreta, complexa, cheia de determinações, se expressando no cotidiano irremediavelmente heterogêneo, imediato, fragmentado, insuprimível. A realidade se esconde e se revela sorrateira, surge com vendas em nossos olhos, nos permitindo conhecê-la parcialmente por nossas experiências. Ela se manifesta caleidoscópica, cumprindo suas armadilhas de sugerir-se inteira a partir das vivências particulares.

        Entre um ser humano inteiro e o inteiramente humano vamos dançando o baile entre nosso cotidiano e a realidade. Permanecemos passeando pelo que nos salta aos olhos, comumente sem conseguir ultrapassar o alcance da nossa visão, ainda com esforço, mesmo que pintemos esse espetáculo com os sentidos que queremos. A tarefa não é simples, sobretudo num tempo de confusão, onde o ar é pesado, as falas são duras e os laços frígidos.

        Buscando atalhos há quem acredite não haver o real, embora ele esteja lá, há quem acredite que o real é apenas aquilo que vive, ou ainda que é possível somente por ali conhecer todas as mediações que o constituem. Há também quem molde um real amplo para o seu particular, quem mergulhe nas buscas profundas, mas se afogue em seu próprio ar. O tempo da barbárie também é o tempo da vaidade e da ultrageneralização.

        Diante desses desafios tudo tende a ser reduzido ao binômio causa-consequência ou à falácia da impossibilidade. Criam-se mitos para dar sentido às percepções, referendam-se crenças nas mudanças singulares ou nas respostas microscópicas ou ainda naquelas que são supostamente amplas. Por outro lado, se confunde universalidade com totalidade, jogam as apostas nas mudanças de sentido e significado, blefam na dinâmica da imediaticidade rivalizando, fulanizando, umbiguizando as coisas.

        Nesse jogo, nessa dança, nesses olhares, a busca pela trajetória mais difícil tem sucumbido, perdido ressonância, vivido um descompasso. O temor é que não haja mais tempo nem espaço para se aprofundar. Que seja realmente o espetáculo do maniqueísmo, da dieta da consciência aparentemente radical, temperada com hedonismo ou individualismo, com moralismo ou fatalismo, com as tintas e cores moribundas e verossímeis, mas perecíveis. O temor subjetivo é que seja isso tudo nosso espectro do tão pouco.

        O desespero e o desamparo constitui sujeitos armados de metralhadoras giratórias, vociferando o não-diálogo, ampliando o irracionalismo e abstraindo que aquilo que aparece como fórmula mágica para a resolução de problemas políticos viola seus comuns. Para quem sofre com as opressões e com a possibilidade direta de perda de direitos, aquilo que é aparentemente uma opinião divergente é, na verdade, pura reprodução de desigualdade, risco iminente.

        A violência física e simbólica, aparente nos números oficiais, obscurecida nas percentagens oficiosas e tão relativizadas em tempos sombrios atinge cada vez mais os setores que sempre estiveram às margens das mínimas garantias da emancipação política do Estado democrático de direito. Mais que atiradores de elite, o medo social, aliado ao moralismo e catalisado pelo fundamentalismo religioso se funde à seletividade do judiciário e a criminalização midiática para multiplicar atiradores da elite. Com as desculpas fundamentadas e capilarizadas, sem o devido contraponto estabelecido, essa forma de violência funde com ferro e fogo nas marcas da sociabilidade cotidiana da classe trabalhadora brasileira para garantir um cotidiano paramilitar. O baile de máscaras entoa o canto da serpente fascista para multiplicar ódios, rancores e afogar qualquer luta emancipatória.

        Entre os eleitores de Bolsonaro existem os que organizadamente militam pela potencialização dos preconceitos e da discriminação, no entanto, há também os que são tomados pelo saudosismo mistificador, que se veste com o moralismo reacionário para acalentar uma suposta reestruturação da sociedade, deslocando tudo isso da política e fingindo que isso trará atenuantes às expressões da questão social.         Essa direção ganha contornos absurdos para um país que nunca efetivou a laicidade do Estado, não amadureceu a democracia e não enfrentou sua tradição autoritária, patriarcal, racista e machista. Os sujeitos querem resoluções imediatas, buscam um discurso seguro, absorvem a tragédia e a farsa bonapartista pela sua carência de projeto coletivo e qualquer simbologia que dê uma direção que pareça diferente do vento que nos carrega, ainda que seja apenas um sopro mais forte para o caos, é uma aposta a se fazer.

        Para esses sujeitos, há uma abstração do cotidiano, o moralismo é percebido como mero discurso, com materialização distante de seus comuns, algo no campo das ideias e, ainda que sejam capazes de refletir sobre discursos violentos, preferem fechar os olhos para o óbvio e apostar que o discurso de ódio seja exagero, efeito colateral de uma proposta de ordem e progresso. Assim, submersos nas turvas águas das fake news, de discursos de pastores inescrupulosos e de bravatas de asseclas da econometria, abstraem que amigos/as, filhos/as, tios/as que pensam diferente ou que simplesmente existam, sejam nordestinos/as, negros/as, LGBT´s, mulheres estarão sofrendo ainda mais riscos dentro do protofascismo legitimado.

        Quando o moralismo e a violência simbólica não são somente abstrações que potencializam o aumento das estatísticas, mas aparecem entre nós, nos grupos de whatsapp, nas reuniões de família, nas relações mais prosaicas, ainda que saibamos as razões, criamos a expectativa, pela famosa empatia, de um processo mínimo de identificação e sensibilidade. Desejamos a compreensão, ainda que limitada, de que a ferida aberta e cutucada por tudo aquilo que virou moda possa ser entendida como a propagação de uma ideologia capaz de estruturar coisas que farão sangrar seus semelhantes. O sofrimento se amplia quando percebemos que isso tende a não ocorrer.

        O (des)afeto dentro desses grupos, por sua própria estrutura conservadora, acaba por cavar buracos ainda mais profundos, desavergonham os preconceitos, retiram laços, enchem os espaços de perversidade diante do diferente. O tempo do protofascismo se constitui também pelo mascaramento da realidade e desmascaramento de violências entre as pessoas próximas, onde o ódio ou a indiferença crescem ao som da trilha sonora da crueldade, do relativismo, do desdém oriundo dos discursos de autoridade que consideram tudo coitadismo.

        No livro os “Sofrimentos do Homem Burguês”, Leandro Konder reflete sobre nós, aqueles do tipo humano da sociedade burguesa, seres ontologicamente sociais, que transcendem e potencializam sua individualidade por via da coletividade, que criam possibilidade pela diversidade através da nossa capacidade de fazer história, mas que, numa sociedade fundada na apropriação das coisas e das pessoas, buscamos (e não encontramos) essa essência em coletividades estranhadas, em relações alienadas e alienantes e, assim, o autor reflete como nossos arranjos e relações familiares e toda sua carga histórica são passíveis de naturalização de opressões, como nossas religiões mistificam o mundo concreto, normalizam o hegemônico e moralizam a diferença, como a mídia rebaixa tudo em mercadoria, como a história é vista apenas como passado e não como possibilidade concreta de construirmos o presente e o futuro.

        Numa reprodução hegemônica do discurso de que democracia é a ditadura da maioria e não a convivência da diversidade de pensamento, onde os valores moralistas circulam sempre nas práticas políticas, onde público e privado sempre se confundiram, onde combater privilégios e a intolerância foi e é visto como ataque aos direitos, numa sociedade absolutamente perversa e que amorteceu possibilidades amplas de construções coletivas com sentido, o cotidiano, espaço privilegiado de naturalização daquilo que é construído socialmente, apura seu caráter mistificador, imediatista, heterogêneo, capaz de negar qualquer lógica, racionalidade e elementos da realidade.

        Assim, o descolamento do real é característica do nosso tempo. Não importa se o sujeito que diz que “odeia o pecado, mas ama o pecador” defende líderes políticos que potencializam crimes de ódio, se defende a vida e, ao mesmo tempo, a tortura, se estuda para concursos públicos e milita para o fim dos mesmos, se sonha com educação para seus filhos e aprofunda a desconstrução dela como direito, se é contra a corrupção e a mentira, mas desconsidera as práticas corruptas de seus mitos diante da necessidade de vencer o inimigo. Não importa o real, as evidências e tudo aquilo que aponta a direção que estamos seguindo, a ideia de que é preciso mudar, ainda que para pior, constitui o sadomasoquismo social do “sofrimento do homem burguês” e negar a realidade faz parte disso.

        Tudo aquilo que produziu a possibilidade real de hegemonia do protofascismo constituiu também subjetividades dilaceradas, visões opacas diante do outro, relações ainda mais coisificadas. O discurso pautado no mito de dois extremos quando, na realidade, só há um, aquele da violência sob todas as formas, amplia no cotidiano as atitudes de poder e desvalor sobre as pessoas tidas como “não-normais” e, portanto, compreendidas como menos humanas. A apatia ou a agressividade diante do caos cotidiano, ação desmedida, desenfreada, sem projeto coletivo ou sobreposta de pura reprodução das opressões atinge em cheio nossas subjetividades.

        A insensibilidade diante do fato que poderemos perder o emprego ou nunca ter um, que poderemos ser “varridos”, agredidos, violentados, presos ou mortos nos afeta quando vem como discurso personificado por aqueles que nos conhecem e sabem que não somos uma caricatura. A desumanização é ainda mais devastadora quando vem daqueles que nutrimos afetos, que construímos projetos ou histórias e que, ainda assim, não são capazes de perceber que o discurso que reproduzem afeta a vida concreta daqueles que dizem amar. A profusão de um sentimento reificado se constitui mútuo, mas a decepção e o sofrimento aparecerão muito mais do lado de quem é coisificado.

        Diante de rupturas particulares em relações tão caras, diante de posicionamentos tão duros e irresponsáveis com aquele/as que dizem nutrir afeto, num tempo histórico onde nossa emoção é estranhada e o irracionalismo toma de conta atingimos a agudização do individualismo. Ele vem fantasiado de preocupação com o futuro, de conversão religiosa, de afeto familiar, de amizade, mas sempre traz na mão o punhal das opressões e a bainha do preconceito.

        Precisamos reinventar coletivos com sentido, necessitamos construir tanto a resistência objetiva quanto a subjetiva. Elas caminharão juntas. Até as coisas se revelarem, até conseguirmos suspender o cotidiano, até demonstrarmos todas as determinações que nos levaram ao protofascismo muito sofrimento se aprofundará. Nenhum espaço de nossa vida pode ser desprezado na luta contra reprodução da exploração, da violência e das opressões. Construir formas de disputa no campo dos valores, apreendendo a vida concreta e a cultura dos setores populares para um projeto emancipatório é fundamental. Para isso precisaremos pleitear novos valores em todos os âmbitos de socialização e também exercitar formas de autocuidado.

        Os espaços onde nos encontramos, onde socializamos nossas angustias, medos e vontades, onde apreendemos que essas experiências são constituídas historicamente, onde desnaturalizamos as coisas e mostrando possibilidades para outra sociabilidade, onde potencializamos as respostas coletivas podem nos fortalecer enquanto indivíduos e nos ajudar na construção de relações mais profundas.

        Na exacerbação da forma mais grave da sociabilidade capitalista a reprodução do protofascismo exigirá de nós a necessária construção coletiva, a paciência histórica e o exercício da lucidez. Entre as estratégias e as táticas, entre as reuniões e os atos, entre sofrimentos, desapontamentos e desafetos, entre a necessária resistência e a vida cotidiana haverão ainda mais desafios. O exercício de diálogo, de enxergar as pessoas, de construir relações para visibilizar nossa humanidade nos outros será também rebeldia em tempos de cólera. O desafio é enorme pois não haverá relações com sentido numa sociedade sem sentido.

 

Quinta, 25 Outubro 2018 15:24

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

Estamos quase chegando ao final do OUTUBRO ROSA, mês dedicado ao alerta, principalmente `as mulheres, quanto aos riscos do CÂNCER DE MAMA e a importância do diagnóstico precoce para que o tratamento seja viável e possível, evitando-se mais mortes, consideradas desnecessárias.


Dentro de uma semana, será iniciado o NOVEMBRO AZUL, mês dedicado ao alerta, principalmente, aos homens quanto ao CÂNCER DA PRÓSTATA, doença que também vem crescendo e fazendo vitimas que poderiam não apenas sobreviverem mas terem uma vida digna em lugar de mortes precoces e evitáveis, em meio a um grande preconceito quanto ao exame de toque é a forma de detectar-se a doença.


O câncer, em seus mais de 22 tipos diferentes, mas com o mesmo estigma e pavor que causa nas pessoas e em seus familiares, é uma doença que data de milhares de anos e, mesmo com o avanço da medicina, da indústria farmacêutica e uma verdadeira revolução tecnológica na saúde, ainda está presente no mundo através de mais de 18,1 milhões de novos casos em 2018 e em escala crescente pelos próximos anos, podendo chegar a mais de 25 milhões de novos casos em 2030, além de 9,6 milhões de mortes, muitas totalmente evitáveis, caso a doença tivesse sido detectada, diagnosticada e o tratamento realizado a tempo.


Só para se ter uma ideia, em 2012 foram estimados 14,1 milhões de novos casos de câncer no mundo, passando para 18,1 milhões em 2018 e deverá atingir mais de 25 milhões em 2030. Em relação `as mortes por câncer, no ano 2000 ocorreram 6,9 milhões de óbitos; passou para 8,1 milhões em 2010, este ano de 2018 deverá registrar 9,6 milhões e em 2030 estima-se que mais de 21 milhões deverão morrer vitimas de algum tipo de câncer, sendo que os principais serão: pulmão; colorretal, estômago, fígado, mama e esôfago.


Em relação aos novos casos, em 2018, pela ordem decrescente os mais significativos são: Pulmão e mama, com 2,1 milhões de casos aproximadamente cada um; colorretal com 1,7 milhões; próstata com 1,3 milhões e estômago com 1,03 milhões de casos.


No Brasil o panorama acompanha da tendência mundial, com um fator agravante que é a circunstância de sermos um país subdesenvolvido ou emergente, com poucos recursos para a saúde em geral e a área do câncer em especial, além do caos em que se encontra a saúde pública em nosso país, pela da falta de planejamento, gestão empírica e deficiente, situação ainda mais agravada pela corrupção endêmica que tomou conta do Brasil em geral e da saúde pública em particular, há décadas ou séculos, pouco importando o tipo de governo ou ideologias defendidas pelos governantes de plantão.


Segundo estimativas do INCA – Instituto Nacional do Câncer e de outras instituições públicas e não governamentais, a luta contra o câncer, inclusive do CÂNCER DE MAMA, objeto do OUTUBRO ROSA ou do CÂNCER DE PRÓSTATA que será destaque dentro de poucos dias com o NOVEMBRO AZUL, tanto em 2018 quanto 2019, o número de novos casos de câncer no Brasil será de 634.880, um aumento de 35,1% em relação a 2008 e 2009 quando ocorreram aproximadamente 470 mil casos.


Neste mesmo período o número de novos casos de câncer de mama passaram de 49.400 em 2012 para 59.700 em 2018/2019; o de próstata aumentou de 49.530 em 2012 para 68.220 em 2018; o colorretal de 26.990 para 36.360 e o de pulmão de 22.770 em 2012 para 31.270 em 2018.


O que mais desafia a sociedade brasileira quando falamos de câncer é que o tratamento é caro e as vezes se prolonga por vários anos e para 80% da população que é constituída de trabalhadores, urbanos e rurais, de baixa renda, onde mais de 85% tem uma renda per capita de no máximo 2,5 salários mínimos, a única alternativa para diagnosticar a doença e realizar o tratamento é o SUS, que está praticamente falido, faltando recursos para aquisição de medicamentos de alto custo, como são os  relacionados com tratamento de câncer e outras doenças crônicas, falta de equipamentos como mamógrafos, tomógrafos e para outras imagens ou mesmo falta de leitos hospitalares e profissionais nas áreas de média e alta complexidade. Por isso este número elevado de mortes e muito sofrimento.


Segundo matéria da BBC/Brasil em fevereiro último, nada menos do que 235 mil pessoas morreram de câncer no Brasil em 2017, sendo que dessas mortes 38,7% eram de pessoas entre 15 e  65 anos, ou seja , participantes da população economicamente ativa , outra parte entre crianças e a maior parte entre idosos, grupo populacional bastante vulnerável e excluídos social, econômica e politicamente em nosso país.


Enfim, tanto o OUTUBRO ROSA quanto o NOVEMBRO AZUL e os demais meses com suas cores e fitas ligadas aos demais tipos de câncer, não basta apenas alertar a população, despertar a consciência para que as pessoas se precavejam,  se, ao mesmo tempo, nossos governantes, nos poderes legislativos, executivos e judiciário também não se conscientizarem de que tratamento do câncer e de todas as demais doenças, principalmente as crônicas, não se faz com discursos e belas mentiras, mas sim, com dotações e execução orçamentárias adequadas e uma gestão humanizada e de qualidade.


Se isto não for feito, vamos presenciar centenas de milhares de pessoas sofrendo, sendo mal tratadas e morrendo ante o descaso de quem tem por obrigação e dever de zelar pela dignidade e qualidade de vida da população. Para isso é que são eleitos ou designados para cargos importantes nos governos federal, estaduais e municipais. O resto é conversa mole ou discursos para boi dormir.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, colaborador e articulista de diversos veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@ profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

 

Quinta, 25 Outubro 2018 09:34

 

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Roberto Boaventura da Silva Sá

Prof. de Literatura/UFMT; Dr. em Jornalismo/USP

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Domingo (28/10), longe das opções singelas entre “Ou Isto ou Aquilo”, inseridas em um “poema infantil” de Cecília Meireles, os brasileiros elegerão o novo presidente; em princípio, para quatro anos. “Em princípio”, pois é certo o futuro incerto.

Dos mais recentes discursos e acontecimentos sabidos, destaco o vídeo em que Eduardo Bolsonaro – filho do “capitão” Jair – admite estarmos caminhando a um “estado de exceção”. Para ele, o STF poderia, a qualquer momento, ser fechado “por um simples cabo e um soldado”, sem sequer precisar “de jipe”.

Estarrecedora declaração.

Pior: o estarrecimento deve ser redimensionado, pois esse filho de Bolsonaro teve a maior votação que um deputado já pode ter em nossa história republicana.

Feito o registro daquela aberração, seguida de inaceitáveis desculpas, tanto do pai, quanto do filho, a realidade é que tais criaturas – em nome da Tradição, Família e Propriedade, tendo “Deus acima de todos”, é que, conforme as últimas pesquisas – deverão conduzir os rumos de nosso país.

Céus! A que ponto descemos!

Mas, agora que a “Inês já é morta”, melhor do que o desespero, seria didático para todos nós, defensores da democracia, entendermos os motivos pelos quais a esse ponto chegamos; afinal, é indiscutível que manifestações conservadoras e protofacistas possam surgir do nada.

Logo, se tal situação não vem do nada, por que a maioria de nosso povo está dando aval a um candidato com os mais profundos vínculos com o militarismo? Como faremos para sobreviver ao que poderá vir?

Partindo das indagações acima, é possível que leitores possam avaliar que antes de pensar sobre isso, o ideal seria, em nome de salvar o regime democrático, fechar os olhos e tapar o nariz para a história recentíssima do país e acatar a chantagem do “voto crítico” em Haddad.

Infelizmente, divergindo de amigos tão caros, não reflexiono em cima de cadáveres. Repito, hoje, a “Inês já é morta”. E foi “morta” – antes de outras quaisquer – pelas ações do PT, que insistiu em errar, deixando-nos num beco sem saídas, a não ser voltar a seus próprios subterrâneos políticos, ainda que a volta seja estratégica e momentânea, dado o esforço que isso exige de tantos, inclusive de filhos pródigos do Partido. 

Mas a propósito: quem “mata Inês” pode salvar a democracia?

Convenhamos. A derrota do PT era previsão dada. Sem Lula, o Partido perderia o segundo turno, fosse a quem fosse. Bolsonaro, idem, desde que não disputasse com o PT. Portanto, se todos sabiam disso, tínhamos saídas, mas todas foram inviabilizadas pelo PT. Agora, a reversão desse quadro seria enorme surpresa.

Por que?

Porque “nunca antes na história...” o “antipetismo” foi tão forte. Por isso, não leu os rumos que a rua foi tomando quem não quis. E quem não quis, apostou no escuro.

Agora, imersos ao desespero, seria interessante desvendar os porquês de não terem lido as evidências.

Arrisco a dizer que muito do estrago feito à nossa democracia se deu por conta dos caprichos do “comandante” preso, que apostou em si até o limite. Depois, acreditou que passaria sua herança política a alguém. Não fosse isso, nossa democracia não correria o risco que corre; não da forma como corre. Ninguém seria obrigado a se juntar a uma “organização criminosa” travestida de partido.

Por fim, antes que o futuro sombrio chegue de fato, é prudente, desde agora, a quem puder, “já ir” pensando em saídas, pois, para nós, o sinal poderá se fechar de repente, não mais do que de repente.

Que tristeza.

Quarta, 24 Outubro 2018 17:50

 

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Por Alice Saboia*

 

PARA “BONS ENTENDEDORES” POUCAS PALAVRAS NÃO BASTAM? HÁ MAIS “MISTÉRIOS” ENTRE OS POLITIQUEIROS DE PLANTÃO E O PROJETO DE PODER E DE DESMANDO NO BRASIL DO QUE DESCONFIA O ELEITOR!!! EIS A QUESTÃO! A QUEM SERVEM TAIS DESPAUTÉRIOS? AO INTERESSE PÚBLICO? COM CERTEZA NÃO!

Um ponto fundamental do conhecido filme de Ingmar Bergman é destacar que os humanos, de maneira geral, trazem, em si mesmos, o bem e o mal. Aliás, para ser mais precisa, essa dicotomia atravessa toda a história da humanidade e, de tudo que se sabe, esteve bem em foco durante a chamada “idade das trevas”, a Idade Média, nos famosos procedimentos de “caça às bruxas” que levaram tantos e tantos às fogueiras da inquisição... Na estética romântica também foi pano de fundo. A literatura, de modo geral, é prenhe do emprego da dicotomia bem versus mal, heróis versus anti-heróis e por aí segue.

Certos “modismos, são cíclicos. Volta e meia aparece um “exorcista” de plantão para jogar os infiéis à fogueira! Melhor forma não existe que adotar um “argumento” que cala alto à alma dos “santos”, como, por exemplo, o “ovo da serpente”!!! Não é de graça que os politiqueiros de plantão jogam com o “medo” e a “esperança”, ou seja: o “demônio”, a reencarnação dos torturadores, a volta da ditadura militar, tudo a ser derrotado pelo “salvador da pátria”.

A propósito dos “temidos militares”, das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) Polícias, Militar e Civil, ocorre, sempre, uma pergunta: os militares são “extraterrestres do mal” que têm o propósito de torturar as pessoas do bem? Pelo que se sabe, só brasileiros podem integrar os contingentes militares. Normalmente, esses contingentes são constituídos por jovens (filhos, hoje também filhas) das famílias brasileiras, e têm obrigação de prestar serviço militar.

Tudo faz crer que a referência raivosa às Forças Armadas Brasileiras não passa de um grande equívoco, ou de uma terrível desinformação. Quanto aos embates a que insistem em se referir alguns “ideólogos”, esses foram, de fato, fantasiosos fogos cruzados, de parte a parte... Não há tantos santos crucificados, como querem fazer crer, nem demônios a ser exorcizados. A “briga” foi pau a pau. Bateram e levaram, levaram e bateram. As verdadeiras vítimas estavam enterradas numa vala comum no Cemitério de Perus, São Paulo. Os demais não passam de atores medíocres fazendo mera figuração.

Por todo o mundo, sabe-se que há alguns “mecanismos” temíveis e terríveis, em alguns países, como a famosa, temida e indestrutível KGB russa, pouco referida no Brasil. Certas lembranças não são tão convenientes... Não é mesmo? Os soviéticos não não nazistas! Nem fascistas! São eles mesmos e dispensam ideologias importadas, pois não precisam disso...

Aqui muito se fala do DOI-CODI, de triste memória, já foi, faz muito tempo, juntamente com os “guerrilheiros anistiados”, estes continuam recebendo polpudas aposentadorias e pensões, quando jamais contribuíram para a Previdência Social.

Que tal jogar um aterrorizante “ovo da serpente”, como uma espécie de “premonição” de instauração de um regime fascista ou nazista, se o candidato do outro lado que não o do ideólogo vencer nas urnas com o voto da maioria que, nesse caso, será constituída dos “nazistas ou dos fascistas”? Dependendo do ponto de vista (na grande tirada na trilha do inesquecível e irreverente Millor Fernandes), se o povo escolher seu governante democraticamente nas urnas, mas a maioria depositar seu voto em um candidato que não seja o “recomendado” pelos ideólogos bons, será esse povo, imediatamente, carimbado de nazista ou fascista.

No entendimento dos “bons”, o mal, diferentemente do “bem”, não costuma ser tão “evidente”, a não ser que aqueles que se julgam “bons” e emissários do “bem” tratem de evidenciá-lo nos outros, não em si mesmos! O ”ovo da serpente” é gestado sempre, sempre, sempre nos outros... Seria trágico, se não fosse hilariante... Só os “clarividentes” são capazes de detectá-lo, nos outros, naturalmente... É claro!!!

O conhecido cientista inglês, Stephen Hawking (falecido em março do ano passado, depois de uma longa doença paralisante), no exercício normal de sua respeitável sabedoria e de sua reconhecida sapiência, certa vez teria asseverado que, no DNA do ser humano, há informações que o conduzem para o bem e(ou) para o mal. Um exemplo disso é o fato de todo ser humano ser movido pela ambição que tanto pode conduzi-lo à prática do bem, quanto do mal. Em excesso, a ambição conduz a guerras e a toda sorte de práticas maléficas, por isso, segundo esse gênio único, a ambição está na raiz de todas as guerras. Pode-se concluir: tudo em torno das disputas pelo poder.

Tudo levar a crer que não é diferente nas disputas políticas e eleitorais.

Nessa linha, há temas que conduzem os humanos a desencontros muito graves. No Brasil, por exemplo, as discussões sobre times de futebol que têm torcidas numerosas, religião, partidos políticos com diferentes ideologias, gênero e raça são bastante controvertidas e, não raro, levam às vias de fato os mais radicais, que beiram ao fanatismo irracional.

Nos tempos atuais, os brasileiros deveriam aproveitar a oportunidade de escolher seus governantes e os seus representantes no Parlamento, neste momento de gravíssima crise econômica, social e, sobretudo, ética, sem precedentes, para consignar suas aspirações por uma sociedade melhor, mais justa, calcada em valores como decência, dignidade da pessoa humana, honestidade, desenvolvimento social, atendimento competente às necessidades públicas em saúde, educação, segurança, infraestrutura e fortalecimento das instituições públicas, investimento na ciência, na tecnologia, enfim, na produção do conhecimento que assegure à nação brasileira uma posição de autonomia em todos os setores da produção do saber, com soberania, independência e respeito no concerto das nações, sem filiação a qualquer fanatismo político-ideológico, como é de esperar de uma não nação livre e democrática.

Não se sabe exatamente por qual razão determinados ideólogos consideram que esses valores são de “direita”, “insulto”, utilizado de regra, pelos que se consideram de “esquerda”!

Como humoristicamente diria Millor Fernandes, direita e esquerda dependem sempre do ponto de vista de quem olha. Direita e esquerda são apenas as designações de lados opostos linearmente que se podem alternar, dependendo da perspectiva e dos interesses em jogo... Acontece que o universo não se constitui apenas de direita e de esquerda, porque ele é multidimensional. Reduzi-lo à direita e à esquerda é de uma mediocridade espantosa, principalmente quando isso parte de pessoas consideradas “esclarecidas”...

Nessa mesma visão simplória, é que, para certas pessoas, "serpentes" sempre são as outras. É o caso de quem só acha que é o outro o culpado, e os outras pessoas são "serpentes venenosas" (pleonasmo vicioso!!!, porque toda serpente é venenosa!). Ela pica, na certeza de que, com seu veneno, eliminará o outro ser, de quem pretende defender-se)... Assim, como o veneno é-lhe inerente, conhece muito bem seu potencial destrutivo, logo, trata de disseminá-lo, de forma a “eliminar” as outras “serpentes” que, por vezes, são cobras inofensivas...

É obvio que, ao praticar tal “precaução” as serpentes, pensam passar a falsa ideia de que seu veneno não é veneno, mas "forma de limpar" o ambiente das “impurezas” produzidas pelas serpentes infiéis. Essa é a lógica daqueles que se julgam bons... Nessa perspectiva, quem não se subordina a essa mesma lógica, tem que ser destruído... Não é isso? A lógica destrutiva, projetiva, assenta-se em atribuir ao outro a gestação do "ovo de serpente"...

A cegueira político-ideológica é um mal que destrói qualquer possibilidade de convivência respeitosa, harmoniosa, digna, decente, honesta, leal, enfim, todas as práticas positivas na direção de uma sociedade saudável, fraterna, humana e humanitária.

O bom-senso e a democracia deveriam fazer com que todos respeitassem o direito de o cidadão votar, segundo seu entendimento, aspirações, visão de mundo, etc. sem manipulações da parte de quem quer que seja... Essa, sim, a verdadeira democracia. Ganhar ou perder são contingências normais da vida.

Ganhar, a qualquer custo, ou impingir derrota ao outro, a qualquer preço, é a concretização da barbárie.

Em síntese, politicamente, a direita e a esquerda se merecem mutuamente...

Um bom fecho é o que disse, certa vez, Millor Fernandes:

Não gosto da direita porque ela é de direita, e não gosto da esquerda porque ela é de direita.

*Alice Saboia, Professora Titular (aposentada), Doutora em Letras e Linguística - (USP), Pós-Doutorado - Université Lumière Lyon II, Pós-Doutorado - Université de Toulouse, Le Mirail - França

Quarta, 24 Outubro 2018 17:46

 

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Por Vicente Machado Ávila
  

Deixem o povo votar, exercer seu livre arbítrio. É assim que quer o Papa Francisco.

Não transforme sua Igreja em um palco de RINGUE

Preguem o amor, a paz e a democracia. É assim que queria o pastor Martin Luther KING.

Deixem o povo votar, livremente escolher, caminhar, rezar e sonhar.

É assim que queria a Madre Teresa de Calcutá.

Deixem o povo votar, livremente sem raiva e sem medo.

Não faça da sua missão uma ferramenta do voto de cabresto.


Professor Vicente Ávila
Colaboradoras
Professoras Enelinda Escala e Acadêmica de Direito Silvia Melo

 

Terça, 23 Outubro 2018 16:21

 

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Por Aldi Nestor de Souza*
 

A mãe de Adelina sabia tudo do algodão. Mas tudo mesmo, do plantio ao feitio das roupas. Até o solo pra receber e gestar as sementes ela sabia preparar. Plantava, cultivava, colhia, descaroçava, fiava, tecia, fazia até linha de costura e costurava. Era isso: de uma sementinha de algodão e o conhecimento adquirido dos pais, avós, bisavós e etc, ela conseguia fazer uma blusa, uma saia, uma calça, uma rede.

E tudo isso se dava ali, no sossego do roçado ao redor da casa, no alpendre ventilado e na sala espaçosa. Era uma fábrica sem pressa, sem hora marcada, que conseguia dar conta de tudo, da matéria prima ao produto final, e que funcionava de portas abertas, de chinelo de dedo, de calção cerzido, de saia de chita, às vezes pra empurrar o tempo. Era uma fábrica muito engraçada, uma fábrica que nem era fábrica.

Adelina, que agora vive muito longe dali, se pegou pensando nessas habilidades da  mãe ao dobrar uma blusa de algodão, feita artesanalmente, e muito parecida com as que a mãe fazia. Ela estava numa casa, de pessoas completamente desconhecidas, prestando seus serviços de arrumadeira de mala de viagem. Um aplicativo da internet a levou até ali.

O serviço dela consiste apenas de arrumar mala de viagem. É o seguinte: alguém um dia percebeu que poderia ser um bom negócio, assessorar as pessoas que viajam e que costumam esquecer de colocar na bagagem os pertences necessários para tal. Daí nasceu a figura do Personal Organizer, com especialização em arrumação de malas, que é o caso de Adelina.

Para se tornar um profissional como esses, você precisa primeiro fazer um curso de Personal Organizer, que é uma formação geral, e depois se especializar. Pode ser em arrumação de malas, como a Adelina, mas pode ser em arrumação de gavetas, em arrumação de interiores de casa, arrumação de armário de banheiro, arrumação de quarto de criança, pode ser apenas especialização em dobrar roupas. Sim porque tem gente que até consegue colocar as roupas no guarda roupa ou na mala, mas não sabe dobrá-las.

Para contratar os serviços de Adelina, o cliente precisa saber: para onde está viajando, quantos dias vai ficar lá, se é viagem a negócio ou a passeio, se no lugar tem pontos turísticos e quais, se tem praia, etc. Com tudo isso informado no aplicativo, Adelina segue até o destino e faz seu trabalho. Uma nota pelo aplicativo, sela a qualidade do serviço prestado.

Adelina, ao lembrar da mãe,  lembrou também da fábrica sem pressa e de quando brincava de fazer nuvem com a lã do algodão. Ela tinha inclusive um céu inteiro, todo cheio de nuvem no seu quarto. Tinha nuvem escura, pintada de carvão, que era pro tempo de chuva. E tinha nuvem escassa, nuvem de tempo limpo.

Adelina abandonou suas nuvens para ir pra cidade estudar. Hoje ela é formada em administração de empresas. Sabe até falar língua distante. Mas com o desemprego, acabou indo parar na onda tecnológica e no empreendedorismo. Agora ela é uma micro empreendedora individual. Não tem patrão, o aplicativo é quem dita as regras. Mas é um aplicativo que ela carrega dentro da própria bolsa, no seu próprio celular, é tudo de casa, portanto.

A mãe de Adelina, que sabia tudo do algodão, que sabia preparar o solo, que sabia plantar, que sabia cultivar, que sabia colher, que sabia descaroçar, que sabia fiar, que sabia tecer, que sabia fazer linha de costura, que sabia costurar, nunca foi à escola.

A fábrica sem pressa não existe mais. Não existe mais tempo vadio nesse mundo. A fábrica, o roçado, o alpendre, a sala e as nuvens, não resistiram a exatidão do aplicativo.


*Aldi Nestor de Souza
Professor do departamento de matemática UFMT/Cuiabá
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