Terça, 14 Novembro 2017 11:20

 

*****
O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
*****

 

Dirceu Grasel

Professor Titular da Faculdade de Economia/UFMT

 

 

Estudos mostram reiteradamente que a carga tributária do Brasil é muito alta ou a maior do mundo, detalhando percentuais de incidência de alíquotas de impostos sobre alguns produtos que chegam próximos de 50% do preço de mercado, para exemplificar e sustentar o argumento.

A carga tributária se refere ao percentual do PIB que é arrecadado pelo setor público na forma de impostos. No Brasil, ela gira em torno de 32 a 35% do PIB, o que é equivalente aos países europeus desenvolvidos. Deste total, no Brasil, aproximadamente, 69% é arrecadado pela União, 25% pelos Estados e 6% pelos municípios.

Como não é possível saber com precisão qual é o nível de sonegação no Brasil, é comum que os estudos realizados desconsiderem esta informação e se limitem a trabalhar com dados oficiais, mas fazem comparações com outros países, onde a sonegação não existe ou é bem menor e chegam à conclusão de que a carga tributária no Brasil é elevada e em alguns casos a maior do mundo. Esta é uma comparação inconsistente, pois desconsidera especificidades da economia brasileira e pouco contribui para o debate, especialmente ao se propor a opinar sobre a necessária reforma fiscal e tributária no Brasil. Um estudo mais realista deveria partir dos dados oficiais e trabalhar com cenários de sonegação.

Neste sentido, para efeitos de ilustração, não é exagero considerar que aproximadamente 20% do PIB do Brasil é informal, portanto, não tributado, o que em termos de comparação com países europeus, onde a economia informal não existe ou é muito inferior; levaria a carga tributária brasileira para algo em torno de 25 a 26% do PIB, bem próximo das cargas tributárias mais baixas do mundo. Sendo assim, a carga tributária real do Brasil não é alta e muito menos a maior do mundo, na verdade uma das mais baixas.

Merece destaque que, diferentemente da maioria dos países europeus, no Brasil não existem serviços públicos como contrapartida ao pagamento dos impostos e quando existem são de qualidade questionável, o que de fato torna qualquer imposto elevado.

De fato nem poderia ser diferente, é difícil fornecer serviços públicos com qualidade comparada a dos países europeus, com aproximadamente 40% do orçamento público federal sendo destinado para o pagamento de juros. No país dos bancos, do incentivo a especulação e desestímulo a produção, todos os que trabalham e quase todos os que produzem, sustentam esta realidade. Ou seja, a economia toda trabalha para engordar os rentistas e os bancos.

Logo, diante disso, já podemos considerar algumas questões: 1) não é a carga tributária no Brasil que é alta, mas os impostos para alguns; 2) estudos que desconsideram especificidades da Economia Brasileira escondem questões importantes que não interessa à alguns que sejam respondidas, por exemplo, quem realmente paga imposto no Brasil? Questão que passo a me dedicar a partir de agora.

A resposta a esta pergunta é complexa, mas é possível afirmar, que: 1) a maioria paga muito, 2) outros pagam pouco e 3) outros não pagam nada ou quase nada. Isto porque a maior incidência dos impostos no Brasil é sobre o consumo, aproximadamente 50% de toda a arrecadação; o que é ruim, pois torna os preços elevados e prejudica a competitividade dos produtos que são produzidos no Brasil, já que nem todos os impostos podem ser retirados na hora de exportação para atender ao princípio de não exportação de tributos, principalmente os que incidem em cascata.

Uma estrutura fiscal e tributária eficiente e razoável deveria fazer incidir os impostos mais fortemente sobre a renda de forma progressiva, pagando mais, quem ganha mais e não sobre a produção e sobre o consumo.

A questão que se coloca então, como o imposto incide mais fortemente sobre o consumo, quem de fato paga imposto no Brasil? 1) evidentemente os que consomem, porque o imposto incide predominantemente sobre o consumo, o que é ruim e injusto, pois quem ganha um salário mínimo paga o mesmo que aquele que ganha um  milhão por mês ao adquirir os mesmos produtos que ambos consomem. 2) os que produzem e não conseguem repassar isso para os preços, o que justifica uma parte de informalidade da economia brasileira.

Portanto, temos o seguinte quadro: 1) os trabalhadores e os pequenos empresários, que são tomadores de preço e não podem repassar custos maiores aos preços, por causa da elevada competição, pagam muito. Aqui é preciso destacar que o simples alivia a carga dos impostos sobre a empresa em si, mas como a grande maioria dos pequenos empresários empreende para sobreviver, a lógica destes empresários passa a ser a mesma logica dos trabalhadores.

2) Os rentistas e os grandes empresários que não sonegam, pagam pouco. Os rentistas, porque os tributos que incidem sobre seus rendimentos são baixos. Os grandes empresários, porque eles não são tomadores de preço, ou seja, eles (por serem oligopólios[1]) têm o poder de repassar todos os custos para os preços. Nestas empresas, qualquer aumento de custos, inclusive impostos, resulta em aumento dos preços e repasse do ônus ao consumidor.

3) Os grandes empresários sonegadores não pagam nada ou quase nada, pois além de repassar o imposto aos preços, cobram impostos também sobre a parte informal do seus negócios, já que não existem diferenças nos preços das vendas formais e informais (com nota ou sem nota fiscal). Ou seja, cobra o imposto sobre a parte informal do consumidor e não repassa ao governo por ser venda informal (sem nota fiscal), tendo assim na prática um lucro extraordinário, que se refere ao lucro normal, mais imposto recolhido do consumidor e não repassado ao setor público.

É fato que para estes a sonegação está se tornando sempre mais difícil, em função de informatização dos sistemas de fiscalização. Além disso, eles também são grandes devedores de impostos pelo simples motivo de não pagar o imposto formalmente devido, com a alegação de que a carga tributária é impraticável, mesmo que na prática não paguem imposto, apenas repassem. Algumas destas empresas também não pagam o imposto formalmente devido para capitalizar a empresa e assim deixam a dívida do imposto acumular para ver no que dá; e no futuro negociam, porque no Brasil da impunidade se convencionou que é melhor receber uma parte do imposto que é devido do que falir com a empresa. Além deste, existe ainda o discurso adicional da perda de emprego e renda futura.

Sendo assim, a carga tributária no Brasil não é alta e muito menos a maior do mundo. Os impostos para os trabalhadores e pequenos empresários (apesar do simples) são elevados, porque alguns não pagam e outros pagam pouco imposto.



[1] Estrutura de mercado em que poucas grandes empresas dominam o mercado.

Sexta, 27 Janeiro 2017 12:30

 

Retomando do quadro internacional, a balança comercial brasileira pode chegar de 2  a 3 bilhões no negativo. A proteção a indústria, a produção e emprego nos EUA na era Trump envolve a revisão e cancelamento de acordos comerciais. O caminho do isolacionismo comercial, afetando a China, maior produtora industrial e poluidora do mundo. No Brasil, a crise fiscal agravada entre 2014 e 2016, tendo perdido em 3 anos 172 bi de arrecadação. O orçamento recentemente aprovado foi cerca de 1,187 trilhão, estimativa irreal, na medida que contam com receitas que podem “cair do céu”, tal como a expectativa do aumento do PIB em 1,6%.


 
Estudos, simulações, mostram possibilidade máxima de aumento em 0,5%, em risco de ser até negativo. O tensionamento está entre o aporte de recursos e as metas fiscais, sob o plano de ajuste e contenção de gastos nos próximos 20 anos. Parte de um déficit de 139 bilhões. Já é dado como certo o aumento de juros pelo Federal Reserve (Banco Central dos EUA), com proposta crescente de 2017 a 2018. Embora esteja caindo timidamente os juros no Brasil, um dos impactos a nível internacional é a fuga de capitais.


 
Na crise brasileira em curso, as commodities, sustentando a estratégia neodesenvolvimentista destes últimos 13 anos. A perspectiva da queda do “boom” das commodities com o ameaçador cenário que se desenrola a partir da China, pode avançar perigosamente para exportadores de matérias primas como o Brasil. Centrado no mercado chinês como no caso do Brasil e MT, é uma pauta de exportação rigorosamente desindustrializadora, o pouco emprego que produz está especialmente no setor de serviços, e de baixa remuneração. A inserção no mercado internacional é a mesma, subordinada drasticamente aos interesses dos grandes conglomerados financeiros, que se acentua.


 
A produção é altamente subsidiada, pressão devastadora sobre os recursos naturais, detonando com direitos originários e constitucionais, jogando para o limbo a produção alimentar para abastecimento interno. Também, a diminuição da receita, pressionada pelo déficit fiscal, em função da queda do PIB e das vantagens tributárias desiguais oferecidas ao setor (em MT não pagam impostos). Aí, soma-se o aumento das despesas, das taxas de juros, sob o pretexto de controlar a inflação. No modelo ancorado no “boom” das commodities, problemas estruturais da economia brasileira não são enfrentados, senão, pelas políticas focalizadas da transferência de renda, bolsa família, aumento incipiente do salário mínimo. Isto impacta sim, na situação de pobreza extrema, reduzindo marginalmente as desigualdades sociais.


 
A fragilidade social continua, deixados de lado o emprego formal de qualidade, acesso à terra e condições de produção e comercialização. De fora, a consolidação e a construção de um padrão de universalização dos serviços públicos como saúde e educação, outros componentes importantes como transporte público e habitação popular. Esta última, foi atrelada em interesses de preços e lucros escorchantes do mercado imobiliário. Esta foi a alternativa do modelo assumido nos 13 anos do governo petista, assentado na corrente neodesenvolvimentista. Priorizou-se o consumo individual aliado ao crédito, subordinados ao mercado financeiro, em uma nefasta conciliação para ter uma forte base aliada de sustentação no poder.


 
Assim, não tocaram as estruturas que impactam de fato desigualdades e pobreza, produziram a falácia da nova classe média atrelada ao aumento da produção e preços das commodities. Este legado, soma-se aos impactos da recessão e crise no Brasil. O turbilhão da crise econômica e política, é agravado pelo avanço da operação Lava Jato nas investigações, desencadeando um desmascaramento contundente de partidos e uma previsível quantidade de políticos.


 
O governo Temer, prestes a ser desapeado, passa a PEC do teto de gastos, e a reforma previdenciária adentra 2017 como prioridade. Perdas brutais, desde o sistema de aposentadoria, atingindo até invalidez. Os gastos como saúde e educação não só serão congelados, como sofrerão persistente e gradativa diminuição. No entanto, esta PEC não congela pagamentos de juros e amortização da dívida pública, atendendo exigências dos grandes conglomerados financeiros. A correção dos gastos vinculada a inflação significa o aumento de capital para pagamento da dívida pública. Já paga, e como cobram, completamente impagável. É preciso auditar a dívida pública brasileira, conforme a Constituição Federal de 88 (vetada pela ex presidente Dilma). Muitos(as) consistentes economistas dizem que as medidas em andamento para ajuste fiscal não farão nem cócegas para alterar o rigor da recessão. Existem outras alternativas!


 
Waldir Bertulio

Terça, 20 Dezembro 2016 09:01

 

Projeto favorece empresários, com renúncia a recursos da União, e facilita demissão sem justa causa

 

Logo após a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição 55, que congela os gastos primários da União por 20 anos, com a desculpa de déficit e falta de recursos, o presidente Michel Temer anunciou, na última quinta (15), um pacote de medidas microeconômicas, que, assim como as demais medidas do governo federal, penaliza os trabalhadores, com a desculpa do ajuste fiscal, enquanto favorece o setor privado. O pacote foi anunciado em meio à divulgação de delações premiadas da Lava Jato que atingem diretamente a cúpula do governo Temer, e de pesquisas de opinião público que indicam grande rejeição ao presidente.

 

A medida mais polêmica é o fim de parte da multa de 50% sobre o saldo do FGTS, que precisa ser paga pelas empresas quando um trabalhador é demitido sem justa causa. O governo renuncia à parcela de 10% paga pelos empregadores à União, como penalidade por demitir o trabalhador sem justificativa. Em meio ao crescimento do desemprego, essa proposta favorece ainda mais as demissões. De acordo com o projeto, a multa será extinta gradualmente, durante dez anos.

 

 

 

O pacote prevê ainda uma “renegociação” de dívidas, com a qual o governo autorizará, as empresas que demonstrarem que tiveram prejuízos, a abaterem uma parcela das dívidas em impostos anteriores a novembro de 2016. Desde que estas aceitem pagar imediatamente 20% das dívidas, elas poderão parcelar um eventual saldo negativo (depois de abatidos os seus prejuízos) em até 96 vezes. A proposta também permite que empresas médias passem a usufruir de benefícios do BNDES antes restritos às pequenas. E libera às empresas cobranças de valores diferentes para pagamentos com ou sem cartão de crédito.

 

O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) divulgou, nesta segunda (19), uma nota técnica sobre o projeto (leia aqui). Para o Dieese, “o conjunto de medidas anunciadas pelo governo não é um programa de estímulo à economia e não será capaz de impulsionar a atividade produtiva. Esperava-se do governo um conjunto de iniciativas que mobilizasse investimentos e retomasse o consumo interno, com o Estado assumindo papel de indutor da empreitada de tirar a economia da recessão”.

 

Sobre o fim do pagamento dos 10% ao FGTS em caso de demissão, o Dieese afirma que “a supressão dos 10% adicionais da multa reduzirá o custo da demissão, trazendo maior instabilidade para o trabalhador e, na medida em que facilita a rotatividade da mão de obra, precariza ainda mais o mercado de trabalho. De outro lado, com o fim dos 10% adicionais, menos recursos estarão disponíveis para o financiamento das obras de utilidade pública. Não foi possível identificar nenhum alívio que tal medida pode trazer ao mercado de trabalho no sentido de mitigar o desemprego, que continua crescendo devido à queda dos investimentos, decorrentes de altas taxas de juros e de um ambiente de negócios extremamente deteriorado”, completa a nota técnica.

 

Entre as medidas anunciadas estão:

 

- Um programa de “regularização” das dívidas das empresas;

 

- mudanças no cadastro “positivo” de crédito;

 

- autorização para as empresas fazerem cobranças de taxas / descontos relacionados à utilização de diferentes meios de pagamento;

 

- medidas de informatização / simplificação das interações das empresas com o governo; e) novos instrumentos de captação de crédito imobiliário;

 

- aumento dos recursos disponíveis e do teto de faturamento para utilização dos financiamentos para pequenas e médias empresas do BNDES, bem como ampliação dos valores máximos do chamado “microcrédito” (de R$ 120 mil para R$ 200 mil);

 

- uma reforma do FGTS para extinguir a multa de 10% sobre o saldo do FGTS paga pelas empresas no caso de demissões sem justa-causa e uma alteração no cálculo de correção do fundo.

 

Fonte: ANDES-SN (com informações de Dieese, EBC e Esquerda Online