Segunda, 19 Novembro 2018 09:44

 

Na última semana (6), a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi) do Ministério da Educação (MEC) abriu para consulta pública a atualização da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI).

As alterações na política para educação inclusiva foram anunciadas em abril deste ano pelo MEC. No entanto, só foram publicizadas no início desse mês. Até o dia 21 de novembro, estudantes, familiares, instituições de ensino e pesquisadores da área poderão participar do debate.

Segundo a pasta, o objetivo é adequá-la à legislação mais recente, melhorando a organização dos serviços e ampliando o atendimento a esse público. Porém, a avaliação de especialistas da área é de que as mudanças representam um retrocesso na política vigente em relação às conquistas alcançadas pelas pessoas com deficiência e suas famílias. 

Para Ana Cláudia Mendes de Figueiredo, advogada e vice-presidente da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD), as alterações são amplas e profundas e modificam os principais pilares da PNEEPEI. 

“A proposta altera a concepção da inclusão escolar como direito humano; o estabelecimento da natureza transversal, complementar e suplementar da educação especial; a institucionalização de recursos, estratégias e serviços, entre os quais o atendimento educacional especializado, para eliminação de barreiras, e a adoção do modelo social de deficiência, consagrado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD, ratificada com valor de norma constitucional”, explica. 

A consultora na área de Direitos das Pessoas com Deficiência destaca ainda que a implementação de uma política pública de grande porte, como é a PNEEPEI de 2008, é complexa e demanda tempo para assimilação e esforços significativos do Estado e de toda a sociedade para o atingimento de excelência. 

Para isso, segundo a especialista, é imprescindível a ampliação do aporte de recursos públicos indispensáveis ao aprimoramento da educação especial. É necessária também a ampliação do número de salas de recursos multifuncionais e a oferta adequada de tecnologia assistiva, com equipamentos e materiais pedagógicos. Além disso, é fundamental a formação inicial e continuada de professores, coordenadores e gestores que atuam na educação especial e na educação comum. 

Retrocessos
Entre as alterações apresentadas pelo MEC, está a já superada visão de Educação Especial como modalidade escolar.  Embora os autores da nova política afirmem, como um dos princípios desse documento, “a educação como direito e para todos em um Sistema Educacional Inclusivo”, propõem várias mudanças que anulam esse princípio. Entre as quais, a previsão da “escola especial” para “estudantes com impedimentos individuais múltiplos e significativos”.

“Com isso, a nova Política restaura a educação especial – atualmente transversal a todos os níveis, etapas e modalidades do ensino comum e de caráter complementar ou suplementar –  como modalidade escolar e substitutiva da educação regular, bem como restabelece o modelo médico da deficiência, hoje  superado pelo modelo social de deficiência”, explica Ana Cláudia.  

Ela critica também a proposta de “diferenciação curricular”, que retira do estudante a possibilidade de participação do processo escolar global, de interação com seus pares e de desenvolvimento do máximo do seu potencial.  “A educação inclusiva deve assegurar, nos termos do artigo 28, III, da LBI, acesso pleno ao currículo em condições de igualdade, mediante projeto pedagógico que institucionalize o atendimento educacional especializado e os demais serviços e adaptações razoáveis. Eventuais flexibilizações do currículo e adequação de métodos e estratégias acontecerão, assim, em relação a todos os estudantes, incluindo aqueles com deficiência”, detalha a advogada. 

Outra alteração trazida pelo novo documento refere-se ao papel do Atendimento Educacional Especializado (AEE). A reforma volta a enxergar o AEE como um profissional habilitado em uma única deficiência, ao invés de um professor articulado ao Projeto Político Pedagógico da escola e cujas atribuições são apoiar e produzir recursos para quebrar barreiras que resultam em situações de deficiência. Além disso, segundo a proposta o AEE poderá ser viabilizado não apenas no contraturno, como ocorre hoje, mas também “no mesmo turno de escolarização”. 

O que indica que os professores vinculados a esse atendimento poderão retirar os alunos com deficiência e transtornos globais do desenvolvimento da sala comum para serem atendidos nas salas de recursos multifuncionais. Ou poderão, ainda, atuar na própria sala de aula regular como “apoio” direto do estudante. 

“Tal mudança altera significativamente, em relação aos estudantes com deficiência e transtornos gerais do desenvolvimento, o papel do professor do atendimento educacional especializado, de orientação da construção conjunta e colaborativa do plano do AEE - visando à superação das barreiras impeditivas da aprendizagem - e de articulação com os demais professores, famílias e profissionais da saúde, se for o caso,  bem como modifica as atribuições dos respectivos profissionais, de estudo de casos,  consideradas as especificidades educacionais e necessidades pedagógicas de cada estudante”,  critica a vice-presidente da FBASD.

Mobilização
A proposta do MEC foi mal recebida pelas entidades e movimentos que lutam em defesa dos direitos das pessoas com deficiência. A apreensão é que, além dos retrocessos nas políticas de educação inclusiva, a reforma possa agravar ainda mais condutas ilegais praticadas por instituições de ensino. Entre as ilegalidades estão a negação de matrícula e a cobrança de taxas adicionais em casos de estudantes com deficiência.

“Eu e a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down, assim como outras tantas entidades voltadas à defesa de direitos das pessoas com deficiência, vemos com extrema preocupação esse processo, velocíssimo, de mudanças radicais, incompatíveis com a inclusão escolar”, comenta Ana Cláudia.

Segundo a advogada, a PNEEPEI materializou a inclusão de milhares de estudantes com deficiência nas escolas comuns. O que foi possível a partir da institucionalização de recursos, estratégias e serviços voltados à acessibilidade e eliminação de barreiras à participação. Isso conferiu aos estudantes com deficiência “o direito humano fundamental de pertencer a uma escola para todos, sem discriminação de qualquer natureza e em igualdade de oportunidades com os demais estudantes. De pertencer, enfim, a uma escola que tem sido instada a rever suas práticas pedagógicas para vencer o desafio de ensinar a todos e a cada um em suas especificidades, diferenças e necessidades”, acrescenta. 

Ana Cláudia finaliza reforçando que a sociedade e as entidades contrárias às mudanças impostas pela reforma, em consulta pública até o dia 21, continuarão se manifestando em todos os espaços em que eventualmente viável suscitar o tema, tais como audiências públicas, seminários e encontros. “Continuaremos nos pronunciando em todos os meios de comunicação e mídias possíveis e denunciando ao Ministério Público Federal. Caso necessário, levaremos ao Poder Judiciário as violações praticadas contra a Constituição Federal, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão”, finaliza.

ANDES-SN na luta
Em deliberação inédita, no 62º Conad realizado em junho de 2017, o ANDES-SN inseriu a temática na agenda de lutas do Sindicato Nacional. Os docentes deliberaram que o Sindicato - através das suas Secretarias Regionais e em unidade com as seções sindicais -, organize atividades sobre o tema; lute pela implementação do Decreto n° 9.034/17 e pela criação nas IES e Institutos federais do Núcleo de Atendimento Educacional para oferecer condições pedagógicas e instrumentais para que os estudantes com deficiência possam ter acesso aos processos pedagógicos e docentes e técnico-administrativos exerçam todas as funções atribuídas pelo cargo exigido no trabalho, entre outras medidas.

Leia também:
ANDES-SN debate capacitismo nas instituições de ensino

 

Fonte: ANDES-SN

 

Terça, 02 Outubro 2018 15:43

 

O debate sobre temas ligados à deficiência física ainda ocupa um lugar periférico na universidade. A afirmação é de Livia Barbosa, docente da Universidade de Brasília (UnB), que estuda, entre outros assuntos, bioética, pessoas com deficiência. Ela participou, na manhã de sábado (29), do painel “A luta contra o capacitismo nas Instituições de Ensino Superior”. O evento aconteceu no Auditório da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Santa Maria (Sedufsm – Seção Sindical do ANDES-SN).

 

A atividade foi organizada por três grupos de trabalho do ANDES-SN: de Política Educacional (GTPE), de Seguridade Social e Assuntos de Aposentadoria (GTSSA) e de Política de Classe, questões étnico-raciais, Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS). Também participou dessa discussão Anahi Guedes de Mello, antropóloga e cientista social, professora do departamento de Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

 

A incipiência dessa discussão, ressalta Livia, tem uma relação direta com o sistema político e econômico no qual vivemos. Segundo ela, citando diversos estudos, a prioridade no capitalismo são as necessidades do próprio sistema, que se sobrepõem às necessidades das pessoas. Pelo fato de que, para o capitalismo, o que importa é a produtividade máxima, ou seja, quem tem dificuldade para produzir, torna-se desimportante. Nesse sentido, ela entende que existe uma hierarquização dos corpos, na qual, o funcionamento corporal é definido a partir de uma expectativa de normalidade, através de um conceito chamado de “corponormatividade”. Ou seja, a normalidade de um corpo é ter dois braços, duas pernas, dois olhos, dois ouvidos. O diferente disso é visto de forma estranha.

 

Para a pesquisadora, é preciso rever alguns parâmetros na discussão sobre deficiência física, em que os que falam sobre o assunto são pessoas que não têm essas limitações. Conforme Livia, as desvantagens existentes para os deficientes não são naturais, elas são produzidas socialmente, da mesma forma que também são construídos limitadores para mulheres, negros.  Ela dá alguns exemplos: é ruim ser surdo, mas numa sociedade em que não é difundida a Língua de Sinais (Libras); é ruim ser cego em um ambiente em que a arquitetura não é preparada com elementos táteis. No entanto, frisa a docente, em virtude da legislação existente, as universidades têm como tarefa prioritária discutir a deficiência.

 

Capacitismo

  

Anahi Mello, professora da UFSC, e que vive na pele as barreiras impostas à deficiência física. Por ser surda, iniciou sua explanação destacando, assim como Livia Barbosa, que o “capitalismo hierarquiza os corpos”. Com o auxílio de lâminas projetadas em um datashow, ela destacou de forma simples o conceito de capacitismo. Conforme o conceito trazido por ela, o capacitismo está vinculado a uma postura preconceituosa que hierarquiza as pessoas em função da adequação dos corpos à “corponormatividade”.

 

Amplificando a compreensão do termo, Anahi ressaltou que o capacitismo é uma “categoria que define a forma como as pessoas com deficiência são tratadas, de modo generalizado, como incapazes de produzir, de trabalhar, de aprender, de amar, de cuidar, de sentir desejo e ser desejada, de ter relações sexuais, etc.”. Esse modo de ver, segundo a professora, “aproxima as demandas dos movimentos de pessoas com deficiência a outras discriminações sociais, como o sexismo, o racismo e a homofobia”.

 

A antropóloga lotada na UFSC trouxe em sua análise uma crítica às origens da Antropologia no Brasil. Segundo ela, o mito da “purificação racial” marcou os estudos dessa ciência social no início do século XIX. A ideia “eugênica” de “inteligência” (Q.I) era associada a raças superiores, inteligentes, enquanto as raças inferiores eram vistas como “retardadas”.

 

Dessa forma, foi difundida a visão de que “retardamento mental” mobiliza a categoria deficiência e a vincula a ideia de raça. Logo, a miscigenação entre as raças “superiores” e “inferiores” deve ser evitada para não haver um “emburrecimento” das populações humanas.

 

Deficiência x capacidade

  

Voltando ao ponto em que se fala sobre um sistema capitalista que hierarquiza os corpos, Anahi desvela que a “ordem natural das coisas” é uma corporalidade funcional e capacitada, ou seja, um corpo sem doenças ou deficiências. Conforme o entendimento dela, a partir de seus estudos, a noção de deficiência se materializa e se retroalimenta através de práticas sociais e discursos que a colocam como o “oposto da capacidade”.

 

Saudação sindical e classista

 

Antes da abertura do seminário, formou-se uma mesa com lideranças sindicais. Raquel Dias Araújo (1ª tesoureira do ANDES-SN), Carlos Pires (1º Vice-Presidente da Regional RS do ANDES-SN), Julio Quevedo (presidente da Sedufsm-SSind), Clóvis Senger (Atens), Alcir Martins (Assufsm), Marília Bairros (DCE) e Daiane Tucum (CSP-Conlutas regional Centro) fizeram a saudação e as boas-vindas ao evento.

 

Avalição

 

Caroline Lima, 1ª secretária do ANDES-SN e uma das coordenadoras do GTPCEGDS, avaliou positivamente o evento e ressaltou a importância da participação de docentes deficientes no evento. “Conseguimos cumprir a tarefa iniciada com debates dentro dos GTs do ANDES-SN. O seminário trouxe uma discussão teórica da necessidade de debater capacitismo dentro das instituições de ensino e dentro dos sindicatos. Houve docentes deficientes participando do seminário. Ouvimos que o ANDES-SN conseguiu tirar o debate do capacitismo do tema de motivação e autoajuda, levando o debate para o mundo do trabalho e para a universidade”, comenta. 

 

“Temos que iniciar um processo de adequação de nosso sindicato a essas necessidades, como criar um mecanismo que dê conta da demanda de docentes deficientes em Congressos e Conads. Temos que ampliar a discussão sobre a lei que garante a inclusão de docentes deficientes nas universidades. O capacitismo é uma discussão interseccional, que acaba entrando no debate das opressões. O preconceito contra o docente e o servidor deficientes é muito grande ainda. O seminário trouxe elementos para essa reflexão. Em uma conjuntura de retirada de direitos, o seminário do capacitismo reafirma que o Sindicato Nacional continua defendendo os interesses da categoria e fazendo uma defesa política não só da inclusão, mas do enfrentamento à violência e ao preconceito dentro das instituições de ensino”, completa Caroline. 

  

 Fonte: Sedufsm-SSind (com edição de ANDES-SN).

 

 

Terça, 07 Agosto 2018 11:37

 

Em reunião do Grupo de Trabalho de Política Educacional (GTPE) do ANDES-SN, realizada nos dias 4 e 5 de agosto em Brasília (DF), docentes de todo o país debateram a residência pedagógica instituída pela Portaria 38/2018 da Capes. Os docentes também debateram a organização de um Seminário Nacional sobre Capacitismo, um Seminário sobre Ensino à Distância (EAD) e do III Encontro Nacional de Educação (ENE).

  

A reunião contou com a presença de 18 docentes, representando 12 seções sindicais. O debate sobre a residência pedagógica foi iniciado com uma apresentação do professor Nilson Cardoso, da Universidade Estadual do Ceará (Uece). O docente apontou uma série de problemas no programa instituído pela Capes: a possibilidade de substituição nas escolas de professores por estudantes bolsistas, a divisão dos estudantes estagiários entre residentes e não residentes, entre outros.

 

Raquel Araújo, 1ª tesoureira do ANDES-SN e uma das coordenadoras do GTPE, ressalta que o debate sobre a residência pedagógica foi deliberado pelo 63º Conad, realizado em Fortaleza (CE) no último mês. “O ANDES-SN tem uma posição aprovada em congresso de lutar contra a Portaria 38/2018 da Capes, que trata da residência. A exposição de Nilson servirá para subsidiar a produção de materiais sobre o tema”, comenta. O GTPE produzirá um InformANDES Especial para tratar da residência pedagógica, além de outros assuntos como a Contrarreforma do Ensino Médio, a Escola Sem Partido e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

 

A coordenadora do GTPE aponta que a Portaria 38/2018 traz muitos problemas. “Não há flexibilidade no número de estudantes na residência, por exemplo. Os grupos só podem ser formados por 24 estudantes, nem mais, nem menos, o que afronta a autonomia universitária. O programa também possibilita a substituição de professores da rede básica por residentes, aprofundando o processo de precarização do trabalho docente”, critica.

 

Seminários

 

O GTPE também discutiu a organização de dois seminários no segundo semestre de 2018. Nos dias 8 e 9 de dezembro terá lugar um Seminário sobre EAD, na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). Já a cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, receberá um Seminário sobre o Capacitismo, no dia 29 de setembro. Esse evento será organizado em conjunto pelo GTPE e pelos Grupos de Trabalho de Política de Classe Para Questões Étnicorraciais, de Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGS) e de Seguridade Social e Assuntos de Aposentadoria (GTSSA).

 

A organização do III ENE, previsto para o mês de abril de 2019 na capital federal, também foi discutida pelos docentes presentes.

 

Fonte: ANDES-SN