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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 


O Dia Internacional das Florestas é celebrado em 21 de Março e o Dia Mundial da Água em 22 de Março de cada ano, conforme Resoluções da ONU. Os temas deste ano são: Florestas e saúde; e, quanto ao Dia mundial da Água: Acelerando as mudanças – seja a mudança que voce deseja ver no mundo”.
Para melhor compreendermos alguns dos desafios socioambienais que ameaçam a vida no planeta, podemos imaginar um triângulo em que em sua base estejam as florestas, de um lado as águas e do outro as mudanças climáticas e como essas tres realidades afetam os sistemas econômicos, a vida e a sobrevivência no planeta. No Centro deste triângulo, como enfatiza o Papa Francisco, está a Ecologia Integral, dentro da máxima de que “tudo está interligado, nesta Casa Comum”, que o Planeta terra.


A destruição das florestas afeta o regime de chuvas, o clima e as águas, da mesma forma que a poluição e degradação dos vários cursos d’água e dos oceanos afetam a biodiversidade, a vida aquática, marinha e também a vida na terra, a produção de alimentos e de outras matérias primas essenciais para a vida no planeta.


Sem florestas e sem água todas as formas de vida, inclusive a vida humana fica ameaçada de extinção, esta é uma catástrofe anunciada há muitas decadas e que a cada ano se torna mais grave e mais iminente.


Ao longo dos ultimos últimos 50 anos a crise socioambiental mundial tem se agravado de uma forma muito intensa e rápida. Diversas são suas manifestações e consequências como aquecimento global, mudanças climáticas, degradação dos diversos ecossistemas, aumento da desertificação, da erosão, do desmatamento e destruição das florestas, poluição do solo, do ar e das águas interiores e dos oceanos; destruição da biodiversidade, colocando em risco todas as formas de vida no planeta terra, inclusive a vida humana.


Ao longo dessas cinco decadas não tem faltado alertas quanto `a gravidade desta crise socioambiental planetária, tanto por parte de dezenas de milhares de cientistas, lideres mundias de todos os setores, inclusive líderes religiosos, como o Papa Francisco que, em 2015 publicou a Encícilica Laudato Si, coincidindo com o estabelecimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável pela ONU e pela aprovação do Acordo de Paris, com objetivos e metas com os e as quais praticamente todos os paises, com apenas algumas excessões, se comprometeram a cumpir, transformando-os e transformando-as em políticas de governo.


No ano 2000, a ONU estabeleceu As oito Metas do Milênio, como base para que os países conjugassem esforços, tendo o ano de 2015 como referencial visando a combater a pobreza, a miséia e a melhor cuidar dos diversos aspectos sócioambientais que colocavam e ainda colocam em risco as possibilidades de um planeta saudável e sustentável.


Desnecessário dizer que tais metas não foram plenamente atingidas e deixaram muito a desejar. Assim, em 2015 em Assembléia Geral a ONU, com anuência de praticamente todos os paises, aprovou um novo Pacto em torno de 17 grandes objetivos que, da mesma forma que as metas do milênio, deveriam servir de base para a definição das políticas nacionais, tendo em vista o horizonte de mais 15 anos, ou seja, até 2030, que passaram a ser conhecidas como Agenda 2030.


Dentre tais objetivos do desenvolvimento sustentável, cabe destaque nesta reflexão o de número 06 Água limpa e saneamento básico, número 14 que se refere `a vida na água e o de número 15 que está voltado para a vida na terra.


Em 1980 a ONU proclamou, aprovou que até 1990 seria a Década da Água e, em 1992, pouco antes da ECO 92 no Rio de Janeiro, na Conferência sobre Água e Meio Ambiente, realizada em Dublin, na Irlanda do Norte foi aprovado o que seria o primeiro tratado internacional sobre Água, sendo que em seu primeiro princípio ficou estabelecido que “a água doce é um recurso finito, vulnerável e essencial para garantir a vida, o desenvolvimento e o meio ambiente.


Para enfatizar mais ainda o compromisso em relação `as questões sócioambientais a ONU também definiu  que de 2011 a 2020 seria a Década da Biodiversidade, que o ano de 2011 seria o Ano Internacional das Florestas e entre 2021 até 2030 seria a Década da Restauração dos Ecossistemas Degradados.


Apesar desses esforços da ONU a cada ano mais de 10 milhões de florestas são destruidas no mundo, sendo que quase metade dessas se transformam em áreas degradadas.


Além disso, diversas Conferências Internacionais sobre meio ambiente, água, clima, biodiversidade e outras mais, foram e continuam sendo realizadas ao longo de mais de 50 anos, sem que, todavia, a grande maioria dos Governos Nacionais cumpram com os compromissos, objetivos e metas estabelecidos nesses acordos, mesmo que firmados de maneira soberana polos diversos países, ou seja, muita “pompa e cerimônias”, declarações que, na verdade servem mais para alimentar a mída do que realmente bases para políticas públicas, estratégias e planos de desenvolvimento nacional, regional e local.


A prova cabal deste distanciamento entre acordos firmados e ações realizadas é representada por um grande abismo, demonstrando a falta de vontade política e a demagogia como características dos governantes dos varios países, inclusive do Brasil.


Na Assembléia Geral da ONU em 2012 foi aprovada a Resolução instituindo o DIA INTERNACIONAL DAS FLORESTAS a ser celebrado anualmente em 21 de Março, como um marco para reflexões sobre a situação das florestas no mundo inteiro e o que está acontecendo em relação `as florestas em todos os países, principalmente aqueles que ainda tem em seus territórios florestas nativas como o Brasil e também os países que integram a Pan Amazônia, a Rússia, o Congo e outros países Africanos, a Indonésia e outros países asiáticos, o Canadá, os Estados Unidos e outros mais.


As informações, os dados e as estatísticas que a ONU tem divulgado sobre questões socioambientais, principalmente em relação `a destruição das florestas e ao estado das águas são estarrecedores e fazem parte de um cenário muito sombrio que paira sobre todos os países e apontam horizontes extremamente graves.


Na Encíclica Laudato Si, o Papa Francisco nos exorta de que na base desta catástrofe anunciada, nesta complexa e grave crise sócioambiental, que afeta toda a humanidade, mas de uma maneira mais cruel os pobres, ou seja, as camadas excluidas, tem como causas a ganância humana, os modelos sócio-econômicos e politicos que facilitam a exploração dos recursos naturais de maneira predatória, com vistas apenas ao lucro fácil e imediato, `a concentração de capital, renda, riqueza e propriedades em um número extremamente reduzido de pessoas, em detrimento da imensa (90%) da maioria da população mundial e de cada país.


Este modelo desumano desconsidera os direitos das pessoas a usufruirem dos bens e serviços produzidos socialmente e tambem os princípios da justiça social e da justica inter-geracional, bem como os linites e direitos da natureza.


Por exmplo, a ONU estima que até 2040 nada menos do que 600 milhoes de toneladas de plastico deverão ser carreados para os oceanos e talvez o dobro disto deverá estar poluindo rios, lagoas e córregos nos diversos países.


Em 2022 a quantidade de pessoas no mundo que ainda continuavam sem acesso `a água potável era de 2,0 bilhões de pessoas; 2,8 bilhões ainda não tem acesso ao saneamento básico e mais de 1,9 bilhão não tem água sequer para higiene pessoal.


No Brasil também a situação é extremamente grave e vergonhosa. Em torno de 35 milhões de pessoas não tem acesso `a água potável de qualidade e mais de 100 milhões de habitantes não tem acesso ao saneamento básico, convivem com esgotos a céu aberto, lixo, degradação ambiental e poluição, tornando a qualidade de vida de quase a metade da população brasileira extremamente degradante. Mas isto não consta da “pauta” das preocupações de nossos governantes e das camadas privilegiadas, que só “enxergam” essa população miserável por ocasião das eleições.


Quanto `as florestas o panorama não é nada animador. A expansão das fronteiras agrícolas, as atividades de mineração legais ou ilegais, a construcao de barragens para a produção de energia, o desmatamento e as queimadas, o uso predatório do solo e subsolo, tem afetado os mananciais e as nascentes de córregos e rios de todas as bacias, em todos os países, inclusive no Brasil.


Em 40 anos, entre 1980 e 2020, o mundo assistiu `a destruição de mais de um bilhão de hectares (ha) de florestas e savannas e juntamente com essa devastação, mais de 40 mil espécies animais e vegetais foram extintas e milhares de outras estão em processo de extinção.


Estima-se que 40% da área Terrestre já esteja extremamente degradada. O custo anual para se combater a degradacao e recuperar esses ecossistemas e dos oceanos, segundo cálculos da ONU, contidos no relatório de 2022 “Global Land Outlook 2” é de aproximadamente entre US$125 a 140 trilhões de dólares, bem maior do que o PIB mundial em 2021, que foi de 97 trilhões de dólares.


A ONU declarou que entre 2021 e 2030 é a Década para a Restauração de áreas Degradadas, sendo que no mundo existem mais de 1,0 bilhão de ha de áreas degradadas, das quais 140 milhões de ha no Brasil. A Meta da ONU é que até 2030 em torno de 350 milhões dessas áreas degradadas sejam restauradas/recuperadas, mas isto depende, do esforço de todos os países, principalmente os países, como o Brasil que tem grandes territórios e, tambem, grandes áreas degradadas e que continuam desmatando, destruindo os biomas.


Outra consequência extremamente grave produzido pela destruição das florestas, além de afetar os mananciais e o regime de chuvas, é a produção e emissão de gases tóxicos na atmosfera, que produz o aquecimento global, via efeito estufa e provoca as temíveis mudanças climáticas.
Esta destruição das florestas contribui para a emissão de 7,5 milhões de toneladas de dióxido de carbono e outros gases que agravam o aquecimento global. De 2000 até o ano de 2100, essas emissões de gases tóxicos na atmosfera deverão atingir 98,7  gigatons de Co2 e outros gasess de efeito estufa, causando o aquecimento da temperatura média da terra em mais de 2,5 graus, nível praticamente impossível para várias formas de vida, inclusive da vida humana.


Enfim, oxalá tanto a população quanto os governantes do mundo todo e, principalmente, no Brasil possamos aproveitar o Dia Internacional das Florestas e o Dia Mundial da Água, para uma reflexão mais profunda sobre tanto o nosso modelo de “desenvolvimento” quanto nosso compromissao de pautarmos nossas ações individuais e coletivas pela sustentabilidade, pela justica social, pela justica inter-geracional e por uma economia mais racional, que respeite os limites da natureza e o direitos dos trabalhadores e dos consumidores, atraves da produção e do consumo responsáveis e sustentáveis.
Só assim estaremos melhor cuidando do planeta, protegendo nossas florestas, nossos mananciais e garantindo qualidade de vida para toda a populacao de nosso país e não apenas uma minoria privilegiado.


Em tempo, tanto no Brasil quanto em Mato Grosso tanto as florestas quanto as águas e saneamento básico continuam em processo de destruição e degradacao extrremamente graves, colocando em risco a vida, a saúde e o bem estar da grande maioria da população. Cabe a nós refletirmos criticamente sobre esta situação e buscarmos as saídas e as alternativas de ação.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista e articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profJuacy

 

 

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Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Por Aldi Nestor de Souza*


 

 

Há quem diga que a parte mais importante de um congresso, seja qual for o congresso, é a que se dá nos bastidores: as conversas de café, os intervalos,os encontros casuais. Essa é a parte viva dos eventos, o motor de ideias novas, o formulador de novas pautas, o combustível da transformação. Não sei se isso é verdade. De todo modo, começo o repasse, que dividirei em três partes, do 41º Congresso do Andes –SN, que aconteceu em Rio Branco, no Acre, de 6 a 10 de fevereiro de 2023, justamente pelo relato de uma conversa de bastidor.

Um papo com um velho amigo, antigo professor, que me deu aula na graduação, lá em Mossoró-RN e que estava no 41º Congresso, durou todo o congresso. E ainda dura. Foi uma alegria sem tamanho encontra-lo. À base de muito café e de várias e longas conversas, atualizamos um pouco os assuntos da terra do sal e que expulsou Lampião, da capital do agronegócio e da fila do osso, da conjuntura nacional. Em meio a isso, ele, que aprendeu álgebra na USP e capotaria no bairro Auto São Manuel em Mossoró, perguntou se eu poderia ler e opinar sobre um artigo que acabara de escrever. Disse que sim.

Álgebras de Colombeuau é o abrigo geral onde vive a especificidade de sua pesquisa. Colombeau é francês, vive no Brasil e trabalha na USP há alguns anos. Os reflexos de suas álgebras podem ser notados em diversas regiões do Brasil. De Mossoró, passando por Campina Grande, São Paulo, Interior de Minas, Norte, Nordeste, Centro Oeste, Sul e Sudeste, enfim, todas as regiões do Brasil estão impregnadas por elas.

Mas foi ali, no calor da terra de Chico Mendes, numa terra marcada pelas mais abissais contradições, numa terra em que quase 80 por cento das pessoas votaram em Bolsonaro, que tive meu primeiro, inesquecível  e irreparável contato com elas.

Em entrevista concedida à UNICAMP, em 2016, Jean-François Claude Colombeau disse, não conseguindo esconder um certo orgulho e felicidade, (ver os minutos 19:40 a 21:40 da entrevista a seguir) https://www.facebook.com/watch/?v=1807003736284419, que suas álgebras, particularmente no que se refere a Multiplicação de Distribuições, foram usadas no início dos anos de 1980, pelo exército francês, para melhorar a qualidade de seus blindados. Disse ainda, na mesma entrevista, que um novo tipo de tiro havia sido desenvolvido naquele período e que tinha a potência de ultrapassar qualquer blindado com até 50 cm de espessura. Esse tipo de tiro, sentenciou,“tinha o poder de fazer com que todos os blindados do exército soviético fossem jogados na lata do lixo”. Colombeau ainda acrescentou que sua teoria seria utilizada pela marinha francesa, especificamente para a melhoria dos submarinos.

A sensação foi a de um turbilhão à queima roupa. O ANDES se divorciando da CSP Conlutas, instrumento de luta que ajudou a construir, e as álgebras de Colombeau, que muito provavelmente influenciaram no destino da guerra fria, lado a lado, disputando cada minuto de minha atenção e capacidade de compreensão e reflexão.

O estudo do meu colega, como acontece com toda pesquisa em matemática pura, é sorrateiramente atemporal, sem sujeito, sem lugar, sem sociedade, sem crise, sem guerra, sem tiro. É uma álgebra com qualquer outra. Uma estrutura matemática com cara de neutra.

Como diz Alfred SohnRethel no seu Trabalho Intelectual e Trabalho Espiritual, no capítulo A Matemática Como Limite entre Cabeça e Mão,

“ pela matematização a ciência do novo tempo comparte sua qualificação com o conceito de valor da economia das mercadorias, a cujos interesses ela serve direta e indiretamente. Como sua igualdade de origem com o capital e seu modo de produção está completamente obscurecida para os detentores da ciência, estes se regozijam pela independência imaginária da motivação de seu pesquisar em sua era clássica com base na universalidade de sua forma conceitual e sua distância ideal do capital.”

Diversas questões se levantaram desse episódio. Por exemplo, Quão profunda foi a valorização do valor que essas álgebras proporcionaram aos aliados da França  na guerra fria? Terá sido esse um golpe de misericórdia no conflito? Como um capoteiro, um homem que recuperava sofás velhos na periferia de Mossoró, tem acesso e contribui com o aprimoramento dessas álgebras? Os descendentes de Colombeau, espalhados de Norte a Sul do Brasil tem ideia da bomba que carregam nas mãos? É a matemática a rainha da alienação?

O 41º congresso do ANDES aprovou ajuda financeira para o povo Yanomami, que há décadas sofre com o avanço da mineração e do desmatamento em seu território. As notícias mais recentes sobre esse povo sãos as de morte por fome sendo transmitidas ao vivo, em rede nacional. Um horror. Além da doação, o 41º Congresso fez também um caloroso debate sobre o tema. As álgebras de Colombeau, por óbvio?, não participaram do debate. Mas acho que deveriam fazê-lo. Porque, afinal de contas, os temas são inseparáveis. De nada adianta doar uma quantia em dinheiro para um povo indígena que perece de fome e dar de bandeja uma pesquisa de ponta, publicada em inglês e numa revista internacional, para fortalecer ainda mais o capital dos impérios que nos sufocam.

Disse a meu colega que o que acontece com a ciência em geral e a matemática em particular, para gente como nós, habitantes da periferia do mundo, é algo digno de muito cuidado. A quem servimos? Qual a finalidade de nossas pesquisas? O que pesquisamos ajuda a entender nossa posição nesse mundo? Nunca é demais lembrar que o Brasil, como bem disse Darcy Ribeiro, é um moinho de moer gente.


*Aldi Nestor de Souza é professor do Departamento de Matemática da UFMT-CUIABÁ e membro do GTPFS-ADUFMAT; e-mail: O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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