Carta aberta aos docentes, da UFMT, em apoio à carta enviada pelo Prof. Francisco de Almeida Lobo.
Prezadas e prezados colegas,
Com exceção de alguns itens, apoio o conteúdo da carta enviada pelo Prof. Francisco de Almeida Lobo.
Não foi possível estar presente na Assembleia realizada no dia 17/09, mas fiquei atenta às discussões realizadas e não temo pelo que pode acontecer com a radicalização da greve, mas com a DESMOBILIZAÇÃO que a greve acarreta entre os professores e a comunidade universitária.
A greve na nossa universidade é um movimento de desmobilização e não de mobilização dos professores. Quantos professores estão, de fato, mobilizados? Quantos professores sabem o que está acontecendo? Quantos alunos sabem os reais motivos da nossa luta? O quanto crescemos e nos fortalecemos, como um grupo coeso, nesta luta?
Penso que tem uma mobilização sendo feita: a de Brasília, dos professores que estão lá, propondo encontros, invadindo, discutindo, pressionando. Esta tem pressionado o governo porque tem visibilidade. Mas, o quanto a nossa paralização, nos campus, tem gerado visibilidade, tem mobilizado nossa comunidade?
Um governo que permite que fiquemos quatro meses em greve, que desmarca reunião, que não tem pauta, está muito pouco preocupado com o que nos ocorre aqui.
Mas, nós deveríamos estar preocupados com o que nos ocorre aqui.
A greve não é a ausência de atividades que afetará o governo. Como disse o prof. Francisco, isso é para greves na produção de carros e sapatos. Nossa greve nos afeta em muito maior grau do que ao governo. Nossa greve envolve a conscientização da comunidade, justamente, porque lidamos com o conhecimento. E como isso tem sido gerado? Alguém disse: essa greve tem caráter político. Greves sempre tem caráter político, principalmente, a nossa, já que estamos numa universidade. É preciso atentar para isso.
Outra coisa, o sindicato. É necessário muito cuidado para que opiniões não se tornem verdades absolutas e impeçam que opiniões divergentes, mas genuínas dos sindicalizados, sejam tidas como ingênuas ou despropositadas, ou pior, que pareçam querer desmobilizar o grupo e a luta. Não é possível que a direção do sindicato permita desqualificar diferentes opiniões.
Eu confio no meu sindicato. Aprendi muitas coisas indo nas assembleias e vendo análises da conjuntura que, sozinha, nunca faria. Leio artigos que me fazem refletir sobre a situação do país, da universidade. Ouço professores que dão aulas de política e economia. Mas, é necessário ouvir a todos nas suas angústias.
Ouvir a todos, também, significa ouvir os não sindicalizados, já que são, igualmente, afetados pela greve. Os não sindicalizados não podem votar, mas são obrigados a entrar na greve. Não parece uma contradição? Bem, isso é assunto para outro momento.
Eu quero pensar em outra alternativa para além de uma greve que paralisa as atividades. Quero pensar numa real mobilização da comunidade universitária diante dos disparates do governo, da desvalorização profissional, da decadência da Educação.
E se pudéssemos decretar ‘estado de greve’? Tomei este termo emprestado da greve dos professores do Estado e poderíamos avançar na sua proposta. Num estado de greve, poderíamos nos organizar para, toda semana, num dia específico a ser definido, fazermos um ato que envolvesse a todos. Neste ato, poderíamos ter aulas, discussões, música. Um ato político que estendesse as discussões feitas nas assembleias para toda a comunidade. As aulas, atividades, pesquisas, extensão continuariam, nos outros dias. As diferentes faculdades e institutos poderiam se envolver, organizando o ato, uma cada semana. A mídia, que tem estado muito ausente deste processo, poderia ter interesse em cobrir tal mobilização, já que envolve barulho. Meu colega professor, disse: poderíamos, neste dia, parar o trânsito por 15 minutos. Achei a ideia ótima.
Propostas de manifestações, dessa natureza, já foram feitas pela Adufmat, muitas vezes, mas com pouca adesão e, creio que, pela “desmobilização” que a greve causa na comunidade.
Bem, estas são minhas considerações. Esta proposta é ingênua? Incentiva o produtivismo? Foge das intenções da luta? Pode ser que sim, pode ser que não. Mas, sugiro que, sem autoritarismos, possamos ouvir nossos pares e pensar em outras propostas de luta.
Cuiabá, 21 de setembro de 2015.
Jane Teresinha Domingues Cotrin
Professora do Departamento de Psicologia/ Instituto de Educação
UFMT/ Cuiabá
TENSÕES DE GREVES
Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. Jornalismo/USP; Prof. Literatura/UFMT
No início de minha carreira, ainda em Goiás, vivenciei minha primeira greve. Infelizmente, não foi a última. Outras tiveram de vir, pois o desrespeito de diferentes governos a essa indispensável profissão é constante e cruel; às vezes, a crueldade vem acompanhada da humilhação social.
Já na deflagração daquela primeira greve, uma colega indagou se eu não tinha amor pela profissão; se eu não pensava no prejuízo dos alunos.
Respondi que – como eu não considerava o magistério um sacerdócio, mas uma das profissões existentes, quiçá a mais importante – eu havia me preparado para exercer a profissão com muito respeito para ser digno de servir à classe trabalhadora de minha sociedade.
Disse mais: que os trabalhadores – incluindo os alunos – também não precisavam ser amados pelos governantes; o respeito bastava. Todavia, como sistematicamente nossos governantes não nos respeitam, temos de fazer greve.
Por isso, sempre que voto pela greve, voto pelo respeito à profissão, pois almejo salário digno e melhores condições de trabalho; por consequência, voto pela própria classe trabalhadora de meu país que algum dia poderá usufruir das condições adequadas para o exercício da vida acadêmica.
Mas fazer greve sempre foi dureza, pois além do embate com os governantes, lidamos com colegas que não compreendem que sem as greves, as universidades públicas, p. ex., já nem existiriam como tais.
Alguns professores ainda acreditam que há outras formas melhores do que a greve para resolver impasses com os governos. Não há. Simples assim. Se houvesse, elas já teriam sido apresentadas por algum gênio e usadas por todos nós, é claro. Quaisquer atividades existentes, e há várias, como fechar rodovias, passeatas, promover shows culturais, elaborar faixas, outdoors, boletins informativos, palestras de formação, ocupação de prédios públicos etc., são atividades complementares de uma greve; portanto, nenhum governo dialoga se não for efetivamente exposto e forçado a isso. Essas atividades ajudam a mostrar a real situação do momento, mas têm de ser feitas em greve. Fora da greve o efeito é mínimo, quando há.
Por conta dessa incompreensão de alguns, ao longo do tempo, já ouvi coisas absurdas. Mas nada supera o que disse um colega em nossa última assembleia (17/09), que, aliás, confirmou a necessidade da greve, pois o pacote do governo, de 14/09, retirou ainda mais nossas conquistas e direitos. O governo Dilma/PT foi longe demais em sua opção pelas elites.
Mas afinal o que disse o colega?
Coisas impensáveis, quando vindas de um professor universitário!
Antes, é preciso lembrar que, mesmo diante de tantas subtrações de direitos e conquistas, um pequeno grupo de professores – alguns ligados a partidos governistas, como o PCdoB e PT, para facilitar a vida do governo – propôs o final da greve por meio de um “manifesto” que pressupunha apelar “à razão”. Obviamente, o texto, apesar de sua boa redação, é irracional.
Nesse contexto, o colega referido, mesmo sendo um doutor de disciplinas que estudam a dinâmica social, portanto, amalgamadas às questões políticas, afirmou que não estava ali para discutir sobre o governo e nem falar de política; que queria discutir apenas a greve, propondo seu final.
Na sequência, como um lunático, babou seu ódio contra a classe trabalhadora, da qual pertence sem nela se reconhecer. Babou seu ódio contra sua própria categoria profissional, demonstrando ira contra os docentes que compõem o Comando Local de Greve.
Diante de sua intervenção, algumas perguntas: como é possível falar de greves nas federais sem falar das políticas do governo, que assaltam a autonomia, que precarizam, terceirizando os serviços nas universidades, que destroem nossa carreira, que suspendem concursos públicos? Como não falr de um governo que se nega ao diálogo eficaz, deixando nossa categoria em greve já perto de completar quatro meses? Que congela nossos salários?
Como é impossível descolar as greves das opções políticas do governo, considero que um docente desse tipo não faz falta à universidade pública. Ele está no lugar errado. Sua mente é formatada pela lógica do mercado, onde predomina a dinâmica do pagou, levou. Esse colega deixou sua leitura mercadológica evidente; por isso, é incapaz de compreender uma universidade federal como espaço público e socialmente referenciado. É um ser deslocado que perambula em nosso meio; que nos constrange academicamente. Pior: sua fragilidade teórica é tão perceptível quanto o sol de Cuiabá.
Enfim, tenho pena de seus estudantes. Jamais aprenderão com essa criatura o que vem a ser um profissional e um cidadão com o olhar voltado para sua própria classe.
PS.: quem considera o magistério como um sacerdócio deveria dispensar todos os investimentos, incluindo os salários, que o Estado lhe fornece, e recorrer às paróquias, cúrias metropolitanas e até à Santa Sé para a manutenção de sua sobrevivência. Professor é profissão; portanto, é um trabalhador que precisa ser respeitado, tanto quanto os que fabricam sapatos, carros etc.