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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
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JUACY DA SILVA*
Em deliberação ocorrida na 14a. Sessão da Assembléia Geral da UNESCO, realizada em 26 de outubro de 1966, desde 1967, o DIA INTERNACIONAL DA ALFABETIZAÇÃO é “comemorado” na grande maioria dos países em 08 de Setembro de cada ano.
Nesta data ou em dias anteriores ou posteriores diversos países e nesses, entidades públicas e também não governamentais costumam realizar diversos tipos de eventos como conferências, foruns de debates, audiências públicas, enfim, eventos que coloquem a questão da alfabetização ou inversamente do analfabetismo, no contexto da educação como um mecanismo ou instrumento para provocar mudanças nas pessoas e nas sociedades.
A cada ano a UNESCO indica um tema especial para servir de base nessas comemoracçõs. O tema deste ano é “alfabetização e multilinguismo”, para enfatizar os desafios da alfabetização tanto de crianças e quanto de jovens e adultos em dois contextos: a) globalização e multiculturalismo e b) transformações tecnológicas, que tem permitido falarmos que o mundo está entrando e cada vez mais se aprofundando na “era digital”, onde a internet e as redes sociais estão se transformando emu ma grande biblioteca mundial, fonte de conhecimento acessível a todas as pessoas.
Diante desta nova realidade mundial, a alfabetização só pode ser realizada no contexto do desenvolvimento de uma educação crítica, inclusiva, libertadora e que possibilite a todas as pessoas estarem inseridas neste mundo tecnológico.
Ai surgem as figuras tanto do analfabetismo funcional, decorrente da baixa qualidade do ensino formal, pessoas que mal conseguem aprender ler, escrever poucas palavras e fazerem poucas operações aritiméticas e são incapazes de interpretar textos de baixa a média complexidade. A outra figura é do analfabetismo tecnológico, principalmente entre a população adulta acima dos 50 anos ou idosos acima de 60 anos que tem muitas dificuldades para se adaptarem `as essas mudanças tecnológicas e o mundo digitalizado e robotizado.
De acordo com a UNESCO, a alfabetização tem um grande poder de transformação pessoal, social, econômico e politico, por isso muitos governantes corruptos, ditadores e incompetentes não valorizam nem a educação e muito menos a alfabetização, pois educação rima com revolução, com inovação e tambem com luta e cidadania. Isto , se por um lado fortalece a democracia, por outro contribui para mudancas de hábitos culturais arraigados e abrem novos horizontes de possibilidades `as camadas excluidas e exploradas que despertam para seus direitos.
O Brasil, há pouco mais de 50 anos tinha praticamente os mesmos índices de analfabetismo que a China, a Coréia do Sul e um PIB maior dos que esses países. Tanto o Brasil quanto China e Coréia do Sul tinham a maioria de sua população no meio rural, com elevados índices de pobreza, miséria e exploração politica, econômica e social.
Enquanto a China e a Coréia do Sul fizeram uma verdadeira revolução na educação, reduzindo drasticamente os niveis de analfabetismo e desenvolvendo a ciência e a tecnologia, transformando tais sociedades em exemplos de sucesso industrial e tecnológico, nosso país jamais teve um plano educacional sério, nem para possibilitar combater de fato o analfabetismo quanto oferecer uma educação, principalmente, pública, laica e de qualidade.
Prova disso é que o Brasil tem o segundo pior índice de analfabetismo da população de 15 anos e mais, na América do Sul, só ficando atraz da Guiyana e na América Latina e Caribe apenas seis países tem índices de analfabetismo piores do que o Brasil. De forma semelhante a taxa de analfabetismo em nosso país é a segunda pior entre os BRICs, só perdendo para a África do Sul.
Dados recentes da UNESCO e de outras agências e organizações internacionais, relativos a 2017, indicam que o Brasil ostenta o segundo pior índice de analfabetismo entre idosos (população com 65 anos e mais) na América do Sul, só perdemos para a Bolívia e na América Latina, poucos países tem índices de analfabetismo piores do que o Brasil. O mesmo acontece quando o parâmetro de referência é o sexo. O Brasil tambem é campeão de analfabetismo tanto entre homens quanto mulheres, perdendo para poucos países de sua dimensão econômica, geo-política e estratégica.
Segundo a ONU e a UNESCO, a eliminação do analfabetismo e a melhoria da qualidade da educação no mundo poderiam contribuir paraa aumentar o PIB mundial em mais US$1,2 trilhões de dolares, pois educação não é gasto público ou privado, mas sim investimento que produz altos retornos para as pessoas e para a sociedade/países. Outros resultados da alfabetização e melhoria da qualidade da educação são: a) redução em 12% dos niveis de pobreza absoluta e miséria pois permitiria retirar mais de 171 milhões de pessoas nessas condicoes; b) redução em 50% das taxas de mortalidade infantil, que são enormes entre familias e mulheres analfabetas ou semi-alfabetizadas; c) redução de 7 milhões de casos de HIV/AIDS; d) redução de 1/6 dos casos de gravidez infanto-juvenil; e) aumento da produtividade do trabalho e da economia.
Mesmo diante de tanto conhecimento que reforçam e realçam a importância da alfabetização, do combate ao analfabetismo e `a educação de baixa qualidade, nossos governantes teimam em retirar /cortar recursos orçamentários, materiais, tecnológicos e humanos da área da educação, que continua uma vergonha nacional, demonstrado sobejamente em inúmeros “rankings” mundiais como o PISA ou outros mais, isto há varias decadas.
Além de índices vergonhosos de analfabetismo, o Brasil ainda ostenta um dos maiores índices de analfabetismo funcional, mais de 35% das pessoas consideradas “alfabetizadas” estão classificadas nesta categoria. Com frequência ouvimos empresários dizendo que a qualidade da mão-de-obra brasileira é de baixa qualidade, acarretando também a já super conhecida baixa produtividade da economia brasileira e a culpa, segundo tais empresários é a nossa educação de baixa qualidade.
Apenas um último aspecto que devemos considerar neste DIA INTERNACIONAL DA ALFABETIZACÃO, o Brasil é o oitavo país do mundo em número de analfabetos, em 2018 , nada menos do que 14 milhões de pessoas. Esse contingente populacional constituido de pessoas analfabetas e tambem, com certeza, do outro contigente ainda maior que é constituido dos analfabetos funcionais concentra-se em maior proporção das regiões nordeste, norte e Centro-Oeste, com índices bem maiores do que os constantes para os Estados das regiões sudeste e sul.
O Brasil precisa, com urgência, da mesma forma que em diversas outras áreas como o meio ambiente, de um PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO de verdade, articulado e integrado entre União, Estados e municipios que contemple todos os niveis de ensino, do infantil, pré-escolar, ensino fundamental, médio e superior, tentando superar o fosso que existe entre educação privada e educação pública.
Educação é investimento e define o futuro de um país e de uma sociedade. Não podemos continuar assistindo reportagens e noticiários que mostram escolas públicas caindo aos pedaços, sem instalações adequadas, sem laboratórios, sem instalações sanitárias, sem equipamentos esportivos, transporte escolar que não atende `as necessidades dos estudantes, violência que domina o espaço escolar, ou o sucateamento das universidades federais e dos institutos federais de ensino ou ainda o desmantelamento de organismos de fomento `a ciência e a pesquisa como CNPq e CAPES e contiuarmos ouvindo discursos demagógicos por parte de nossos politicos e governantes, enfatizando que a educação é uma prioridade do país, dos estados ou dos municipios.
A prova mais cabal desta maneira enganosa de governar foi a medida que estabeleceu o teto dos gastos públicos no Governo Temer e que deverá vigorar ate 2033; onde recursos foram cortados e também agora, no atual Governo Bolsonaro, onde o orcamento do MEC está o tempo todo sendo tesourado. Sem recursos orçamentários e financeiros adequados a educação brasileira estara regredindo aos patamares de quase um século, enquanto os demais países avançam rapidamente, aumentando o fosso entre nosso país e os demais que tem a mesma dimensão geo-estratégica que o nosso.
Falar em plano de alfabetização que combata o analfabetismo ,o analfabetismo funcional e o analfabetismo tecnológico mais se parece com um sonho, uma ilusão, diante da realidade da gestão pública nacional, estaduais e municipais na área da educação.
Portanto, neste DIA INTERNACIONAL DA ALFABETIZAÇÃO no Brasil temos pouquissimo, se é que temos, a comemar e muito mais a lamentar e nos indiganarmos com o descaso como a educação vem sendo tratada em nosso país.
Um país que não investe em educação e em ciência e tecnologia está fadado a perder o ‘bonde da história” e ser um mero produtor de materias primas, commodities e continuar sendo uma mera colônia das super-potências e dos demais países desenvolvidos. Falar em soberania nacional neste contexto soa muito mais como uma piada de mau gosto ou uma forma de manipulação ideológica, a serviço da dominação politica, econômica e social.
*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.