Terça, 17 Agosto 2021 19:47

 

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou o coronel da reserva do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura, conhecido como major Curió, pelo homicídio qualificado e ocultação do cadáver do camponês Pedro Pereira de Souza, o Pedro Carretel. O coronel já foi recebido pelo presidente Jair Bolsonaro, no Palácio do Planalto, em maio de 2020.

O assassinato ocorreu no início de 1974, no sudeste do Pará. A vítima era integrante da guerrilha do Araguaia, movimento de resistência armada contrário à ditadura militar-empresarial brasileira, que atuou entre as décadas de 1960 e 1970. Na época, Pedro Carretel já tinha se entregado aos militares, estava preso e era obrigado a trabalhar como guia do Exército nas matas da região, conforme a denúncia do MPF enviada à Vara Única da Subseção Judiciária de Marabá.

Um grupo chefiado por Curió levou a vítima de uma base militar conhecida como Casa Azul, em Marabá (PA), até uma fazenda em Brejo Grande do Araguaia, e executou o preso a tiros enquanto ele estava sentado e de mãos amarradas. A base era utilizada para interrogatórios, torturas, prisões e assassinatos de camponeses, camponesas e militantes.

Segundo a denúncia do órgão, os demais membros das Forças Armadas que auxiliaram Curió a matar o guerrilheiro ainda não foram identificados ou já estão falecidos. O cadáver da vítima foi ocultado e os restos mortais não foram encontrados até o momento, registra a ação, assinada por sete procuradores da República integrantes da Força Tarefa Araguaia, do MPF.

Denúncia
Ajuizada no último dia 9 de agosto, e divulgada na segunda-feira (16), essa é a décima  denúncia do MPF contra militares por crimes na repressão à guerrilha. No total, já são sete denúncias pelos assassinatos de dez opositores à ditadura, duas denúncias pelo sequestro e cárcere privado de seis vítimas e uma denúncia por falsidade ideológica. Sebastião Curió, que comandou o combate aos guerrilheiros, é acusado em sete das dez ações criminais.

Extermínio como política estatal
Dados oficiais, relatórios produzidos sobre o assunto e investigações realizadas pelo MPF atestam que a repressão política à guerrilha do Araguaia foi responsável por quase um terço do número total de desaparecidos políticos no Brasil durante a ditadura militar-empresarial, destaca a denúncia.

Para o MPF, o extermínio dos guerrilheiros decorria de diretrizes padronizadas e planejadas pelo Exército, e não de excessos pontuais ou casos isolados. As práticas criminosas traduziam a política estatal, que determinou o comportamento dos agentes militares no Araguaia, frisam os procuradores da República na denúncia. Estima-se que 67 integrantes do movimento de resistência foram mortos durante o conflito com militares. Desses, 41 foram presos, amarrados e executados quando não ofereciam risco às tropas.

Essas práticas foram especialmente violentas durante a terceira e mais sangrenta fase de combate à guerrilha, batizada de operação Marajoara, da qual Pedro Carretel foi uma das vítimas.  Segundo o Ministério, Curió e os militares subordinados a ele, mataram as e os guerrilheiros, mesmo quando rendidos ou presos com vida, e pela forte repressão aos moradores locais como forma de obter informações e impedir a perpetuação da guerrilha.

Na operação Marajoara houve o “deliberado e definitivo abandono do sistema normativo vigente, decidindo-se pela adoção sistemática de medidas ilegais que visavam, notadamente, o desaparecimento forçado dos opositores”, assinalam os procuradores da República.

O MPF trava um embate jurídico desde 2012 pela responsabilização dos militares envolvidos em atos criminosos cometidos durante o regime ditatorial, por considerar que representam atos de lesa-humanidade. Por isso, com base no direito internacional e em decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (caso Gomes Lund vs Brasil), tratam-se de crimes não alcançados pela prescrição ou anistia.

Leia Também

MPF obtém sentença histórica contra ex-agente da repressão por crime político na ditadura 

Em meio à ascensão do autoritarismo, golpe militar-empresarial no Brasil completa 57 anos

 

Fonte: Ministério Público Federal (com edição e acréscimo de informações do ANDES-SN)

Sexta, 13 Abril 2018 15:47

 

Lei da "vingança pornográfica" e alteração na Lei Maria da Penha também foram aprovados no Congresso Nacional

 

Crimes praticados pela internet, que disseminem conteúdo misógino, de propagação de ódio ou a aversão às mulheres, serão investigados pela Polícia Federal (PF). A Lei nº 13.642/18, publicada no último dia 4, no Diário Oficial da União (DOU), altera a Lei nº 10.446/02, a qual trata da competência da instituição policial brasileira em crimes de repercussão interestadual ou internacional.

 

Agora, os crimes virtuais contra as mulheres estão amparados na mesma categoria de crimes como sequestro, formação de cartel, violações de direitos humanos e roubo de instituições financeiras.

 

A lei é oriunda do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 186/17, de autoria da deputada Luizianne Lins (PT-CE), que, na justificativa do projeto, afirmou que o PLC é mais uma ferramenta para coibir as formas de violência contra a mulher e adotar medidas que possam conter a propagação de conteúdo misógino no espaço virtual. 

 

Para Caroline de Araújo Lima, 1° vice-presidente da Regional Nordeste III do ANDES-SN e uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Política de Classe para Questões Etnicorraciais, Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS) do Sindicato Nacional, a lei é um avanço. Entretanto, é necessário criar outros mecanismos para combater a violência contra as mulheres, que não seja apenas o método punitivo.

 

“Apoiamos tudo o que for para garantir a vida das mulheres, mas não podemos deixar de fazer uma reflexão de que o machismo e violência contra a mulher é estrutural na nossa sociedade e o encarceramento, por si só, não evita a violência contra as mulheres, precisamos de ações preventivas e de formação, para que esse discurso de ódio e, no caso, a violência na internet diminua por meio da conscientização. Esse tipo de violência faz com que as mulheres adoeçam psicologicamente e, muitas vezes, cometam suicídio”, explicou a docente.

 

Um dos casos conhecidos nacionalmente de crime virtual de incitação a misoginia é o da ativista feminista Lola Aronovich, professora de Literatura em Língua Inglesa na Universidade Federal do Ceará (UFC) e autora do blog Escreva Lola Escreva. Lola sofre ataques e ameaças de morte online há muitos anos, sem que a polícia conseguisse identificar os responsáveis. A professora teve o seu blog clonado em 2015. Em seu blog, Lola Aronovich, falou sobre a importância da lei. "É uma lei importante, e uma vitória de todas nós. Atribui à Polícia Federal a investigação de crimes cibernéticos contra mulheres. (...) Lógico que eu sou apenas uma de inúmeras mulheres que são atacadas na internet. As redes sociais realmente são espaços tóxicos para mulheres em geral e feministas em particular, segundo a Anistia Internacional", comentou a professora, que desde 2011 já fez 11 boletins de ocorrência registrando os ataques virtuais sofridos.

 

Caroline pondera também que tão importante como aprovar a lei, é garantir a destinação de recursos para a aplicabilidade da legislação. “Se não houver o aumento do contingente da Polícia Federal e de equipamento tecnológico para apurar esses crimes, a própria PF não irá articular essas ações com as políticas públicas que contribuem na formação tanto das mulheres quanto dos agressores. E aprovar a lei, sem prever orçamento, não faz com que ela saia do papel, e as mulheres continuarão desprotegidas”, ressaltou.

 

Alterações na Lei Maria da Penha


Ainda no dia 4 de abril, foi pulicado no DOU a Lei 13.641/2018 (oriunda do PLC 4/16), que torna crime o descumprimento de medidas protetivas determinadas pela Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), com pena de detenção de três meses a dois anos.

 

Em novembro do ano passado, o presidente Michel Temer publicou com vetos, no DOU, uma lei que alterava a Lei Maria da Penha, criada com o objetivo de aumentar o rigor das punições sobre crimes domésticos, em especial a homens que agridem física ou psicologicamente uma mulher. Foi vetado o artigo que permitiria à autoridade policial conceder medidas protetivas de urgência em casos em que houver "risco atual ou iminente à vida ou à integridade física e psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar o de seus dependentes".

 

“O veto foi um retrocesso, pois muitas mulheres vivem situações de violência doméstica e não conseguem entrar em casa, pois o companheiro tira dela o seu direito de entrar na residência, cometendo violência patrimonial. E quem acompanha o dia a dia das mulheres violentadas não são as varas de juizado, são as delegacias, e as policias de assistência social. O veto de Temer prejudica toda uma movimentação em defesa da vida das mulheres que estão sendo ameaçadas”, criticou Caroline.  

 

Vingança pornográfica


Outro projeto de lei, aprovado no Senado, mas ainda não sancionado, torna crime a vingança virtual, com a divulgação e a exposição pública da intimidade sexual - mais conhecido como “revenge porn” (tradução livre: revanche/vingança pornográfica). O Projeto de Lei (PL) 5555/2013, mais conhecido como Lei Rose Leonel, altera a Lei Maria da Penha criando mecanismos para o combate a condutas ofensivas contra a mulher na internet ou em outros meios de propagação da informação.

 

O caso da jornalista Rose Leonel, de Maringá (SP), influenciou o autor da proposta, o deputado João Arruda (PMDB/PR). Em 2005, após o fim de um relacionamento, a jornalista teve imagens íntimas divulgadas pelo ex-namorado, que não aceitou a separação. As imagens tiveram grande repercussão na cidade, afetaram a vida da jornalista e foram parar até na escola onde estudavam os dois filhos de Rose.

 

Os projetos aprovados que combatem a violência contra a mulher foram aprovados pelo Senado no dia 7 de março, como parte da pauta apresentada pela bancada feminina, um dia antes do Dia Internacional da Mulher Trabalhadora.

 

“Ao mesmo tempo em que temos os avanços, com as leis Maria da Penha, do Feminicídio e a aprovação Lei Rose Leonel, e da competência de investigação de crimes virtuais, temos também um estado que limita as ações de proteção as vítimas. Temos que pensar em ações para além de punitivas, temos que pensar na assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar e em ações de formação dos indivíduos agressores, para que de fato a violência contra a mulher acabe de uma vez por todas. A nossas vidas continuam correndo risco”, alertou a diretora do ANDES-SN.

 

 

Fonte: ANDES-SN