Segunda, 17 Abril 2023 08:31

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 

“A degradação do solo devido às mudanças climáticas e à expansão da agricultura, das cidades e das infraestruturas prejudica o bem-estar de 3,2 bilhões de pessoas. É prejudicial à biodiversidade e possibilita o surgimento de doenças infecciosas, como a Covid-19. Restaurar terras degradadas removeria o carbono da atmosfera. Ajudaria as comunidades vulneráveis a adaptarem-se às mudanças climáticas. E poderia gerar US $ 1,4 trilhão de dólares extras na produção agrícola a cada ano”. António Guterres. Secretário Geral da ONU, 17/6/2021, por ocasião da celebração do Dia Mundial de combate á desertificação e às secas.

Por iniciativa do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) no dia 13 de Novembro de 1986, através da Lei 7.876, foi aprovada a criação do DIA NACIONAL DE CONSERVAÇÃO DO SOLO, a ser celebrado anualmente no dia 15 de Abril, com o objetivo de despertar a consciência nacional, principalmente por parte de governantes, da população em geral e dos setores agropecuário, florestal e de mineração, quanto `a necessidade de que o uso e ocupação do solo, principalmente rural, seja feita com sustentabilidade, justiça ambiental e justiça intergeracional.

Só por ocasião da Assembleia Geral da ONU, em dezembro de 2013, que foi aprovada a criação do DIA MUNDIAL DE CONSERVACÃO DO SOLO, a ser comemorado anualmente, no dia 05 de Dezembro, a partir de 2014.

A preocupação com a conservação do solo, na verdade tem origem no no mundo logo após o final da II Guerra, para enfrentar o problema da fome e no Brasil nos anos sessenta no bojo da chamada revolução verde, quando muitos cientistas passaram a demonstrar que é muito mais racional e saudável para o planeta e para o meio ambiente, elevar a produtividade por área ocupada do que promover a expansão das fronteiras agrícolas, que incentiva o desmatamento, as queimadas e a degradação dos solos e dos mananciais, cujas consequência são a erosão, a desertificação, a perda da fertilidade dos solos e o encarecimento dos alimentos, principalmente.

Para entender bem este binômio conservação do solo x degradação ambiental é fundamental coloca-lo em um contexto histórico, cultural e dos diversos sistemas produtivos e também das relações de trabalho e produção. Afinal, todos sabemos e entendemos o que significa a exortação do Papa Francisco quando afirma que “tudo está interligado”.

Assim, ao longo de séculos e milênios a relação da humanidade com a natureza foi muito mais de dominação e destruição do que de cuidado, respeito e racionalidade. Ao imaginar que a natureza poderia ser usada a bel-prazer, ao longo de sucessivos estágios históricos e sistemas econômicos de produção e de relações de trabalho, de uma forma direta ou indireta o que movia o ser humano no planeta era a ganância e a busca de lucro fácil e rápido, pouco se importando com o rastro de destruição, o que hoje é denominado de “pegada ecológica”.

Neste processo irracional de exploração dos recursos naturais parece que ninguém imaginava e, lamentavelmente ainda muitos continuam utilizando esses mesmos modelos econômicos e sociais que deixam apenas destruição da biodiversidade, poluição das águas, dos mananciais, do ar e também dos solos e do subsolo, pouco se importando com as próximas gerações.

Falar para essas pessoas que imaginam que proteger o meio ambiente, a natureza, os territórios indígenas, as florestas são formas contrárias ao que definem como “progresso”, mas que na verdade são crimes ambientais e, de acordo com o Papa Francisco, na Encíclica Laudato Si, “um pecado ecológico”, tem se tornado quase que uma “pregação no deserto”.

Pior em tudo isso é quando autoridades e organismos públicos, que deveriam zelar pela saúde do planeta, em seus respectivos territórios, sejam países, estados, regiões ou municípios, simplesmente se omitem e compactuam com crimes ambientais, não agem para definirem políticas públicas, estratégias, planos, programas e ações que a um só tempo possam reduzir ou “mitigar” os efeitos deste processo de degradação ambiental e, também, recuperar o que foi destruído, se bem que isto além dos custos elevadíssimos ainda tem o aspecto de que as espécies vegetais , animais ou mesmo humanas (como diversos povos primitivos no Brasil) foram extintos jamais poderão retornar.

A preocupação com a questão de buscar um equilíbrio entre desenvolvimento e sustentabilidade, em todas as dimensões como a produção de alimentos para uma população mundial ainda em expansão, a questão da energia que ainda está baseada fundamentalmente em fontes sujas e altamente poluentes que são os combustíveis fósseis, o uso intenso dos solos e subsolo, destruindo recursos não renováveis ou com custos bilionários para sua recuperação, repito, esta preocupação com tais desafios é coisa relativamente recente, datam do início da década de 1970, quando da primeira Conferência Mundial sobre desenvolvimento e Meio ambiente, em 1972.

Foi a partir desta primeira conferência que o “alerta”, quanto aos danos que esses modelos econômicos estão produzindo sobre a saúde do Planeta Terra, que dezenas de milhares de cientistas passaram a ter vozes mais ativas, com suas descobertas quanto aos riscos que todas as formas de vida, inclusive a vida humano estão correndo.

Mesmo antes da publicação da Encíclica Laudato Si, quando o Papa Francisco unifica o pensamento da Igreja Católica quanto `a necessidade de todas as religiões e as demais organização tanto públicas quanto da sociedade civil organizada, já havia um certo consenso de que “tudo está interligado, nesta Casa Comum”, que é o planeta terra.

Sob a liderança da ONU, que pelo menos teoricamente representa todos os 197 países e territórios que congregam a população mundial, tem havido um esforço internacional, em alguns países e continentes de forma mais efetiva e em outros, como no Brasil, muito mais em discursos e no papel, para confrontar esses desafios.

Hoje, mais do que nunca, é perfeitamente conhecido que o desmatamento e as queimadas, enfim, a destruição das florestas, principalmente das florestas tropicais como na Pan Amazônia (e não apenas na Amazônia brasileira), na África e na Ásia, produzem um impacto no regime de chuvas e no clima ao redor do mundo; que a poluição urbana e industrial produzida pela China e demais países asiáticos, pelos países da União Europeia e outros países da Europa, da mesma forma que a degradação ambiental nos EUA, no Oriente Médio, na África, na Oceania ou da América Latina tem impactos globais e afetam o mundo todo, pouco importa a cor da pele, as religiões, o gênero das pessoas, os regimes políticos, das ideologias, pouco importa se democracias ou ditaduras, civis, militares ou religiosas, as consequências recairão sobre toda a humanidade.

E isto também é verdadeiro quando se refere `a questão da necessidade de conservação do solo ou seja, que os sistemas agropecuários, florestais ou de mineração precisam respeitar os limites da natureza, caso contrário o processo de degradação ambiental será cada vez pior e seus impactos devastadores tanto para a produção de alimentos e outras matérias primas necessárias `a produção de bens e serviços, para atender as necessidades e aspirações de uma população mundial ainda crescente que atualmente (2023) já supera mais de oito bilhões de pessoas e que em 2030 será de 8,5 bilhões de habitantes e em 2050 em torno de 9,7 bilhões e dentro  de    décadas, em 2080, deverá atingir 10,4 bilhões de pessoas.

Todavia, por mais que o crescimento demográfico pressione os sistemas produtivos, nada justifica que esses sistemas ignorem os limites do planeta e os riscos que formas irracionais de relações do ser humano com a natureza podem provocar, tornando a vida humana extremamente complicada, como o que está previsto em relação ao aquecimento global e `as mudanças climáticas.

Ao longo das últimas sete décadas, desde a 1ª. Conferência Mundial do Desenvolvimento e meio ambiente, em 1972 em Estocolmo, na Suécia, passando pela ECO-92, no Rio de Janeiro, depois a RIO +20, todas as Conferências Mundiais do Clima, a Carta da Terra, os Acordos de Kyoto e de Paris, a ONU tem feito um grande esforço para que todos os países e territórios pautem os processos de desenvolvimento pela sustentabilidade, pela justiça social, por relações de trabalho que respeitem os direitos dos trabalhadores e pelo respeito `a natureza.

Foi com esta preocupação que a ONU também estabeleceu os Objetivos do Milênio, que vigoraram do ano 2000 ate 2015, quando foram expandidos e substituídos pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, a vigorarem até 2030, marco este denominado de Agenda 2030.

Além disso, também a ONU aprovou que entre 2011 e 2020 fosse a Década da Biodiversidade, incluindo também um Plano Estratégico de Ações para a referida década; que 211 fosse o Ano Internacional das Florestas; que 2015 (ano da aprovação do Acordo de Paris) seria o Ano Internacional dos Solos e por ocasião do Dia Mundial de combate `a desertificação e `as secas, foi aprovada a Convenção Internacional para o combate a essas duas formas de degradação ambiental e dos solos.

Bem mais recente, por ocasião das comemorações do Dia Internacional do Meio ambiente em 2021, foi aprovada a DÉCADA DA RESTAURAÇÃO DOS ECOSSISTEMAS DEGRADADOS, a vigorar de 2021 até 2030, com uma meta ambiciosa de recuperar 350 milhões de hectares (ha) de áreas degradadas, de um total de mais de dois bilhões de ha de áreas degradadas ao redor do mundo, dos quais 140 milhões de ha estão no Brasil.

Desde o início de 2000, todos os países, inclusive o Brasil vem se comprometendo com a ONU, por ocasião de conferências mundiais, fóruns e convenções internacionais a cuidarem melhor do meio ambiente, em todas as suas dimensões, estabelecendo objetivos e metas nacionais, que passam a ser incluídos/incluídas em seus planos nacionais de desenvolvimento.

Desnecessário se torna dizer que a maior parte desses compromissos fica só no papel, nos discursos e cerimônias oficiais, algumas com muita pompa, mas longe de serem inseridos nos planos e orçamentos nacionais, regionais e locais e, enquanto isso, a degradação ambiental, a poluição, o desmatamento, as queimadas, as erosões, a contaminação das águas, o uso abusivo dos agrotóxicos continuam presentes no dia-a-dia ao redor do mundo.

Dados de diversas instituições de pesquisa como a FAO, a Embrapa e universidades ao redor do mundo, tem demonstrado que a erosão elimina entre 25 a 40 bilhões de toneladas de solos férteis por ano, reduzindo sensivelmente a produtividade agropecuária e aumentando consideravelmente os custos de produção e os preços dos alimentos.


A erosão afeta 68 milhões de ha anualmente no mundo, o que representa 4% dos solos férteis do planeta. Se nada for feito e com urgência dentro de 3 ou 4 décadas a produção de alimentos será afetada de forma muito grave, inclusive no Brasil, principalmente na Amazônia que é caracterizada por solos extremamente frágeis.


Relatório do Ministério do Meio Ambiente do Brasil, por ocasião do 9º Simpósio de Recuperação de áreas degradas em nosso país, em 2015, estimava que essas áreas representam 140 milhões de ha, das quais 69 milhões de ha eram de pastagens degradadas. Esses dados podem ser projetado como tendo aumentado em, pelo menos, mais 10% ou 15%, o que demonstra que estamos diante de um enorme desafio e de uma catástrofe anunciada.


O Brasil tem uma área de solos degradados maior do que toda a área ocupada com lavoura em 2022/2023 que, segundo a CONAB é de 77 milhões de ha nesta safra de 2022/2023, ou seja, as terras degradadas no Brasil representam praticamente toda a área agrícola ocupada, enquanto á área de pastagens é de 159 milhões de ha, das quais 69 milhões de ha eram degradas em 2015, podendo chegar a 80 milhões na atualidade.


Portanto, poderíamos aproveitar este 15 de Abril de 2023 e o resto deste ano para refletirmos o que tudo isso significa e buscarmos novos modelos mais racionais de produção que respeitem e conservem melhor os solos.


Se nada disso for feito, este será mais um capítulo do processo de degradação ambiental que está ferindo de morte o Planeta terra, onde e no qual o Brasil ocupa um lugar de destaque, lamentavelmente.

*JUACY DA SILVA, professor universitário titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

Quarta, 12 Abril 2023 10:36

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

A Arquidiocese de Cuiabá, bem como as demais Dioceses que fazem parte do Regional Oeste 2, da CNBB, tem seus territórios no que é denominada de Amazônia Legal, é neste contexto e território que faremos nossa caminhada enquanto integrantes da PEI Pastoral da Ecologia Integral.

Ao final do Sínodo dos Bispos da Pan Amazônia em Roma, da qual o Brasil faz parte, em 02 de Fevereiro de 2020, o Papa Francisco publicou uma Exortação Apostólica denominada de Querida Amazônia, em que são destacados seus quatro sonhos para esta região: Um sonho social, um sonho cultural, um sonho ecológico e um sonho eclesial.

Vale a pena transcrever, nesta oportunidade, a síntese desses sonhos, para que sejam também nossos faróis enquanto integrantes da PEI e caminheiros em defesa da Ecologia Integral.

Assim escreveu Francisco: “Sonho com uma Amazônia que lute pelo direito dos mais pobres, dos povos nativos, dos últimos, de modo que a sua voz seja escutada e que sua dignidade seja promovida; Sonho com uma Amazônia que preserve a riqueza cultural que a caracteriza e na qual brilha de maneira tão variada a beleza humana; sonho com uma Amazônia que guarde zelosamente a sedutora beleza natural que a adorna, a vida transbordante que enche os seus rios e suas florestas;  sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e de se encarnar na Amazônia, a tal ponto que deem `a Igreja rostos novos com traços amazônicos”

Desde o início de nossa caminhada, em Mato Grosso, iniciada em julho de 2020, com o objetivo e a missão de estruturar a PEI - Pastoral da Ecologia Integral na Região Centro Oeste, temos enfatizado a necessidade das pessoas que se dispõem a fazer esta caminhada, que tem as Encíclicas Laudato Si, a Fratelli Tutti , a Exortação apostólica Querida Amazônia, no pós Sínodo dos Bispos – Pan Amazônia, todas de autoridade do Santo Pontífice e que fazem parte do Magistério do Papa Franco, bem como outros documentos da Igreja como das diversas Conferências do CELAM (Doc. Medellin, Doc de Puebla, Doc de Santo Domingo e Doc de Aparecida) e também a DSI – Doutrina Social da Igreja, procurem ler, refletir e aprofundar na compreensão dessas leituras, que são, na realidade nosso mapa da jornada.

E, neste sentido, o entendimento e aprofundamento do que seja Educação Ecológica, no contexto desta base doutrinária e também de conhecimentos técnicos é de suma importância. Cabe ressaltar que a educação ecológica, no contexto da Igreja ou enfim, de uma espiritualidade ecológica, independente de vinculação com uma determinada religião, é um pouco do que normalmente compreendemos como educação ambiental como tem sido divulgada ou implementada.

A estruturação, organização formal e o Envio por parte de Dom Mário, em setembro de 2022, Arcebispo da Arquidiocese de Cuiabá, foi o reconhecimento da existência oficial da PEI - Pastoral da Ecologia Integral, no âmbito da Arquidiocese,  não como mais uma Pastoral, mas sim com uma Pastoral com dimensão transversal, integradora, de conjunto, no contexto que a CNBB denomina de Ação Sociotransformadora e que deve estar articulada com todas as demais pastorais sociais, movimentos e serviços da Igreja.

O Papa Francisco ao publicar a Encíclica Laudato Si, em 24 de Maio de 2015, portanto, há quase 8 anos, enfatizou alguns aspectos que devem servir de base para as ações da PEI, inclusive para o desenvolvimento da Educação ecológica, dentre os quais podemos destacar: a) Tudo está interligado, ou seja, o planeta terra é um grande sistema que pode entrar em desequilíbrio quando qualquer de suas partes estejam em processo de degradação e que os seres humanos fazem parte do meio ambiente, não existe dicotomia entre ser humano e natureza; b) não existem duas crises separadas, uma de cunho social, econômico e político e outra crise ambiental, mas apenas uma grande, complexo e desafiadora crise socioambiental; c) que o processo de degradação ambiental, o aquecimento global, as mudanças climáticas e os desastres naturais afetam de forma mais impactante os pobres e excluídos, social, política e economicamente; d) que é necessário, fundamental que os Estados Nacionais e demais entes públicos definam e implementem políticas públicas que enfrentem esta crise socioambiental em caráter prioritário; e) que no contexto internacional os países ricos, que mais tem poluído e degradado o planeta e continuam a faze-lo, sejam responsáveis por aportes de recursos financeiros para implementarem políticas e estratégias internacionais que busquem equacionar esta crise socioambiental, enquanto é tempo, pois com o passar dos anos e décadas essa degradação terá consequências catastróficas e seus custos serão exorbitantes; e, finalmente, f) na raiz da crise ecológica/ambiental ou socioambiental estão as ações humanas que não respeitam os limites do planeta e nem a dignidade dos pobres e excluídos. É neste sentido que Francisco diz que “o grito da terra é também o grito dos excluídos”.

Cabe ainda destacar que esses aspectos estão integrados com outras dimensões como: Justiça climática, Justiça Intergeracional, Justiça Ambiental e Justiça social, formando as bases para novos paradigmas que promovam transformações profundas nos modelos políticos, econômicos, sociais e culturais, uma verdadeira revolução mundial, a partir do contexto ecológico (ecologia integral).

Assim, para entendermos a caminhada da PEI no Brasil, temos também enfatizado que a mesma já existe com este ou outros nomes, há mais de 30 anos, em algumas Arquidioceses, Dioceses e Paróquias, principalmente nas regiões Sudeste e Sul, e em alguns territórios eclesiásticos do Nordeste, não é uma ONG, nem empresa de Consultoria e muito menos um empreendimento econômico-financeiro ou comercial, surgiram bem antes da publicação da Laudato Si, na esteira da Eco-92 e demais conferências de desenvolvimento, meio ambiente ou do clima.

Conforme descrito em nosso documento base, aprovado de forma coletiva pelos integrantes do grupo que caminhou até a estruturação da PEI (Pastoral da Ecologia Integral) na Arquidiocese de Cuiabá, esta pastoral é um conjunto de ações, formalmente estruturadas, que a Igreja Católica utiliza em sua missão evangelizadora, para enfrentar os desafios das relações do ser humano com a natureza, da qual faz parte, combatendo a crise socioambiental, que se abate sobre a Casa Comum”.

É importante também destacar mais dois aspectos contidos no citado documento constitutivo da PEI - Arquidiocese de Cuiabá. A) A missão da PEI é despertar nos cristãos e não cristãos a consciência da gravidade  da crise socioambiental e a necessidade de um melhor cuidado com a Casa Comum, promovendo a conversão ecológica, como condição necessária para enfrentar os desafios socioambientais que estão presente na atualidade brasileira  e nos demais países, condição para atingirmos a cidadania ecológica. B) caráter ecumênico, inter-religioso da PEI, voltada para cristãos (católicos e evangélicos) e não cristãos (outra religiões ou até mesmo para pessoas que não professem qualquer religião), tendo em vista que os desafios  ambientais, a degradação do planeta, a destruição da biodiversidade animal e vegetal, o aquecimento global e as mudanças climáticas afetam a humanidade por inteiro, independente de suas crenças ou outros aspectos.

No contexto da caminhada da PEI diversos aspectos se apresentam como desafios sérios e graves, entre os quais destaco a questão da educação ambiental ou educação ecológica, que faz parte do processo do despertar da consciência individual e coletiva, dimensão fundamental para atingirmos o fortalecimento da espiritualidade ecológica que estimula a CONVERSÃO ECOLÓGICA, que nas exortações do Papa Francisco deve ser não apenas individual, mas também comunitária, ou seja, coletiva, base para a CIDADANIA ECOLÓGICA.

Podemos imaginar a PEI - Pastoral da Ecologia Integral no formato de um triângulo, que representa também a Trindade, na base do triângulo deve estar a ESPIRITUALIDADE ECOLÓGICA, em seu lado esquerdo a FORMAÇÃO, tanto nos aspectos técnicos, científicos quanto nos aspectos do conhecimento oriundo das fontes mencionadas anteriormente (Documentos da Igreja); e, só então, podemos imaginar o lado direito do triângulo que é a AÇÃO.

Sem não nos aprofundarmos nas duas dimensões, a base e o lado esquerdo do triângulo, qualquer ação que seja realizada, será apenas um ativismo ambiental, ecológico, pois faltarão a espiritualidade ecológica que tem também uma dimensão sóciotransformadora, ou seja, uma espiritualidade encarnada, engajada e uma base sólida de conhecimento.

Por isso, para a formação de agentes da PEI - Pastoral da Ecologia Integral, qualquer que seja o território ou âmbito de ação, para sermos coerentes com o magistério, exortações e Encíclicas do Papa Francisco e tantas outras pessoas, teólogos, cientistas sociais, pesquisadores, enfim, pessoas que também fazem parte desta jornada, desta luta em defesa da ecologia integral e da Casa Comum, do Planeta Terra, cuja celebração deverá ocorrer proximamente, dia 22 deste mês de Abril, é importante destacarmos a importância da educação ecológica ou educação ambiental.

A Educação ecológica, da mesma forma que a Pastoral da Ecologia Integral, tem uma dimensão transversal e intergeracional e deve estar presente não apenas nos sistemas educacionais convencionais, mas sim, ser um verdadeiro processo de educação popular, envolvendo Igrejas, Sindicatos, empresas, escolas, movimento comunitário, clubes de serviço, veículos de comunicação, enfim, um processo que visa despertar consciências e mudar hábitos, estilos de vida e modelos econômicos, sociais, políticos e culturais, modelos esses que facilitam o consumismo, o desperdício, o aumento de lixo/resíduos sólidos, a degradação ambiental, a destruição da biodiversidade do planeta e colocam em risco a existência de todas as formas de vida, inclusive da vida humana.

Este é um grande desafio, ante o qual não podemos fugir, ou salvamos o Planeta hoje, agora ou estaremos apressando o processo de extinção da vida no mesmo!


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

Quarta, 05 Abril 2023 09:19

 

 

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JUACY DA SILVA*

Há poucos dias (21 e 22 de março último) foram celebrados, respectivamente, o Dia Internacional das Flores e o Dia Mundial da Água, com o objetivo de propiciar oportunidade para uma reflexão em torno da situação de degradação e destruição desses dois componentes dos ecossistemas e como o desmatamento, as queimadas, a poluição do ar, dos mananciais, enfim, o processo acelerado de degradação dos biomas, no mundo todo, inclusive e, principalmente, no Brasil estão contribuindo para o aquecimento global e para as mudanças climáticas.

Neste mês de abril, também teremos dois momentos significativos relacionados `a destruição do planeta e como isto tem nos afetado e afetará muito mais as próximas gerações. Em 19 de Abril é o Dia dos Povos Indígenas e no dia 22 será o DIA DA TERRA.

Com certeza, no caso brasileiro, não temos nada a comemorar, mas sim, utilizar esses dias para refletirmos sobre a situação lamentável dos centenas de povos indígenas, ameaçados também de extinção, como temos visto na tragédia, verdadeiro genocídio, do povo Yanomami, da mesma forma que tantos outros em todos os Estados.

Neste contexto não podemos deixar de mencionar o aumento de assassinatos e outras formas de violências contra os povos indígenas, principalmente contra suas lideranças e também de pessoas que estão ao lado desses povos, lutando pela defesa de seus territórios, suas culturas e estilo de vida.

Por outro lado, a destruição dos recursos naturais, da biodiversidade animal e vegetal e a exploração predatória dos recursos minerais, colocam em risco a sobrevivência de todas as formas de vida no planeta, inclusive da vida humana. Dezenas de milhares de espécies animais, terrestres, lacustres, fluviais e marinhas já foram extintos e estão processo de extinção de forma criminosa e acelerada.

Muita gente imagina que a destruição e degradação do meio ambiente seja algo que acontece apenas longe de nós, em outros países, outros continentes e, como afetados por uma cegueira social, política e ecológica, não percebem que bem perto de onde moramos ou trabalhamos ou próximos de nossos templos, igrejas a degradação ambiental está acontecendo e quase nada fazemos para confrontarmos esta catástrofe anunciada, que é, ao um só tempo, pecado ecológico e crimes ambientais.

É isto o que está acontecendo em uma área de nosso Estado de Mato Grosso, que tem em seu território, três dos seis biomas brasileiros, todos passando por um processo de degradação intensa, que são a Amazônia Mato-grossense, o Cerrado e o nosso Pantanal, biomas esses que estão morrendo.

Para acelerar este processo de degradação ambiental e aumentar a área a ser desmatada, queimada, destruída, com sérias repercussões não apenas à imagem do Brasil no exterior, mas também para o futuro das próximas gerações, existe até um projeto tramitando na Câmara Federal que pretende alterar o que foi concebido na década de 1950, do século passado, pretendendo retirar Mato Grosso da Amazônia Legal, facilitando a vida de grileiros, mineradores, legais ou ilegais, madeireiros e destruidores dos ecossistemas.

Este processo de destruição dos biomas está bem presente na área conhecida como Baixada Cuiabana, Vale ou bacia do Rio Cuiabá, que, diga-se de passagem, não é um rio interestadual como dizem, mas um Rio de Mato Grosso e um dos alimentadores do nosso Pantanal.

A degradação do Rio Cuiabá e de seus afluentes, da mesma forma que outros rios e bacias que dão vida e mantém a exuberância do Pantanal, inteiro, de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, da Bolívia, do Paraguai, também tem se acelerado pela ganância de grandes grupos econômicos, que não tem qualquer compromisso com a ecologia integral, com o meio ambiente, mas apenas em transformar os recursos naturais (água, solo, subsolo, minerais, matas/florestas) em mercadorias a serem apropriadas e exploradas com avidez, em busca de um lucro fácil e imediato, pouco se importando com as gerações futuras, com a justiça socioambiental, com a justiça climática, com a justiça intergeracional e com a justiça social.

A degradação do território da Bacia do Rio Cuiabá e do Pantanal está ocorrendo pela falta de saneamento básico das cidades que usam os córregos e rios que formam esta Bacia hidrográfica para lançar esgotos in natura, lixo (rejeitos sólidos), resíduos hospitalares, industriais, agrotóxicos, erosão, desmatamento das matas ciliares e, mais recentemente, milhares de tablados no Rio Cuiabá e seus afluentes, pesca predatória e, também, com a tentativa de alguns grupos econômicos inescrupulosos que pretendem construir seis barragens no Rio Cuiabá, além de mais de 133 nos diversos rios da bacia do Alto Paraguai, decretando a morte definitiva tanto do Rio Cuiabá quanto do Pantanal.

Como forma de confrontar essas ameaças e este processo de degradação e destruição do meio ambiente, na região que concentra o maior conglomerado urbano do Estado e quase um terço da população de Mato Grosso, em boa hora a Assembleia Legislativa, por iniciativa do Deputado Wilson Santos, aprovou um Projeto de Lei, que acabou sendo vetado pelo Governador do Estado, proibindo a construção de barragens no Rio Cuiabá.

Mesmo percebendo que a construção dessas represas representam um perigo enorme tanto para o Rio Cuiabá e seus afluentes quanto para o meio ambiente, inclusive para o Pantanal, o Governador acabou vetando o projeto, o que beneficiaria o apetite desses grupos econômicos.

Por pressão e mobilização popular a Asssembleia Legislativa em sessão plenária, rejeitou o veto do governador e transformou o referido projeto em Lei estadual.

Todavia, os interesses econômicos continuam aguçados e presentes. Foi apresentado um recurso, por parte desses grupos econômicos, junto ao Supremo Tribunal Federal arguindo a constitucionalidade da referida lei estadual, sob o argumento de que o Rio Cuiabá é um rio interestadual e, portanto, somente a União pode legislar sobre tal assunto.

Acontece que o Rio Cuiabá não é um rio interestadual e isto está sendo questionado na Justiça em Brasília. Até que tudo isto seja dirimido, o assunto continua na ordem do dia.

Para possibilitar uma melhor articulação e participação popular, da população que vive nesta região da Baixada Cuiabana, onde manter o Rio Cuiabá e o Pantanal vivos, é condição de sobrevivência de centenas de milhares de famílias e mais de um milhão de habitantes que vivem nesta região, foi articulada a organização de uma associação civil, sem fins lucrativos, mas, fundamentalmente, como instrumento de luta popular e da cidadania na defesa de nossos recursos naturais.

No último dia 03 de Abril de 2023, nas dependências da Assembleia Legislativa de MT, a convite do Dep. Wilson Santos, ocorreu a Assembleia de fundação da Associação em defesa da Bacia do Rio Cuiabá e do Pantanal - MT.

Foi uma reunião que contou com a presença de diversas pessoas representando inúmeros segmentos, incluindo universidades, ONGs, organismos de estudos e pesquisas, Pastoral da Ecologia Integral, sindicatos e diversos profissionais, líderes de entidades de defesa de Pescadores.
Foi discutido e aprovado o Estatuto da Associação, onde constam suas finalidades, objetivos, composição da Direção da entidade e as principais linhas de ação a serem articuladas.

Foi feito também um informe sobre a tramitação da ação que tramita no STF, onde alguns grupos econômicos que teimam em construir as seis barragens no Rio Cuiabá, que se concretizarem vão matar definitivamente este lendário Rio e também ferir de morte o nosso Pantanal, esta maravilha que é uma dos patrimônios da humanidade, declarado pela UNESCO.

Ficou aprovado também que dentro de algumas semanas deverá ser realizada nova reunião/Assembleia Geral para a escolha da Diretoria da Entidade, que é aberta à participação de todas as pessoas que desejarem somar esforços em defesa do Rio Cuiabá e de nosso pantanal.

Ficou patente e aprovada a ideia de que precisamos mobilizar a população, para juntarmos forças e impedirmos que grupos econômicos possam transformar nossa natureza em objeto de ganância e lucro de uns poucos em detrimento de milhões de pessoas.

De igual forma ficou patente que precisamos lutar contra todas as formas de degradação, poluição da Bacia do Rio Cuiabá, que, se continuarem no ritmo em que ocorrem, dentro de poucos anos esta degradação será total e com custos bilionários para a sua recuperação ou restauração.


Não podemos permitir que o Rio Cuiabá e o Pantanal continuem sendo também degradados por esgotos, lixo, erosão, assoreamento, agrotóxicos, rejeitos de mineração, pesca predatória e tantos outros crimes ambientais, como tem ocorrido e continua ocorrendo com diversos cursos d''agua, cujo exemplo maior e mais triste é o estado atual dos córregos e rios que formam a bacia dos Rios Tiete, Pinheiros e Tamanduateí, em SP.


Se nada for feito, com certeza, o Rio Cuiabá será, se já não o seja, o MAIOR ESGOTO A CÉU ABERTO do Centro Oeste Brasileiro.


Os diversos córregos que formam a bacia do Rio Cuiabá, principalmente, os localizados na área urbana de Cuiabá e Várzea Grande, já foram aterrados, estão mortos, sem vida, sem água, sem peixes e são efetivamente esgotos, “encaixotados” ou abertos.


Reflita sobre esta realidade triste e vergonhosa. Junte suas forças em defesa da Bacia do Rio Cuiabá, de seus afluentes e do Pantanal. Oxalá, a população que vive nas demais bacias hidrográficas de Mato Grosso também acordem para a degradação e destruição ambiental que está em curso acelerado. O futuro do Pantanal pode ser catastrófico, manchando de vez a imagem no Brasil no contexto internacional, pior do que está acontecendo com os biomas da Amazônia e Cerrado.
 

*Juacy da Silva, professor titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

Segunda, 27 Março 2023 09:55

 

 

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Juacy da Silva*
 


“Quando os seres humanos destroem a biodiversidade da criação de Deus; quando os seres humanos, (com suas ações e ganância), comprometem a integridade da terra, desnudando-a de suas florestas naturais ou destruído suas zonas úmidas; quando os seres humanos contaminam as águas (córregos, rios, lagoas, lagos e oceanos); o solo (com agrotóxicos, erosão e desertificação) e o ar (com poluição, emissão de gases tóxicos que causam o aquecimento global)... tudo isso é pecado (pecado ecológico). Porque um crime contra a natureza é um crime contra nós mesmos e um pecado contra Deus” (Para Francisco, Laudato Si 8; transcrevendo parte do pronunciamento do Patriarca Bartolomeu, em Santa Bárbara, EUA, novembro de 1997).

O mês de Março de 2023 está chegando ao fim, mês dedicado `a luta contra a violência e a Defesa dos Direitos da Mulher, sem que a desigualdade de gênero tenha sido banido entre nós, sem que o feminicídio, a violência e outras formas de agressões sejam algo do passado.

Também nesta semana que está chegando ao final, tivemos duas datas muito importantes e significativas na luta ambientalista: 21/03 DIA INTERNACIONAL DAS FLORESTAS  e 22/03 DIA MUNDIAL DA ÁGUA.

No próximo próximo mês de abril, teremos outras datas importantes para a população em geral e para os ambientalistas em particular, como o 07 dedicado como Dia Mundial da Saúde; 15 Dia Nacional da Conservação do Solo; 17 Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária (tema bastante esquecido há muito tempo nos debates públicos); 19 Dia dos povos indígenas (que continuam sendo massacrados e violentados, cujo exemplo mais recente e cruel foi a constatação do genocídio do povo Yanomami; e 22 o Dia da Terra.

Todas essas datas e diversas outras nos demais meses do ano, tem por objetivo estimular uma reflexão mais profunda, tanto por parte da população em geral quanto dos poderes públicos em particular, sobre a realidade atual das diversas dimensões da ecologia integral e os cenários, indicando se a destruição da natureza continua e o que isto representa para o futuro do planeta e inclusive para a sobrevivência da espécie humano.

É mais do que sabido, amplamente conhecido e os cientistas tem-nos alertado sobejamente de que o planeta terra tem uma determinada capacidade ou seja tem limites, além dos quais uma destruição planetária é inexorável.

Além de muitos discursos, quase sempre extremamente demagógicos de inúmeras autoridades, a realidade em relação a essas duas realidades, tanto no Brasil quanto no mundo todo não é nada animador.

Por exemplo, apesar do que costumamos ouvir, a realidade diante de nossos olhos, no caso do Brasil, é o desmatamento, as queimadas continuam destruindo nossas florestas na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal e demais biomas, deixando um rastro de destruição da biodiversidade, erosão, contaminação dos solos e das águas por pesticidas, herbicidas, fungicidas, enfim, agrotóxicos que envenenam os alimentos e prejudicam a saúde humana.

Quase a metade da população brasileira ainda aguarda por um direito fundamental que é o saneamento básico, intimamente relacionado com o bem estar e a saúde humana, nossos córregos e nossos rios, como no caso de Cuiabá e Várzea Grande, o maior aglomerado urbano de Mato Grosso, já com mais de UM MILHÃO de habitantes, foram e continuam sendo degradados com esgotos escorrendo pelas ruas, a céu aberto, contaminando de forma criminosa o nosso lendário Rio Cuiabá, que além do lixo, da destruição de suas nascentes e desmatamento de suas margens, ainda está ameaçado pelo apetite de grandes grupos econômicos que querem transformar a água, que é um bem coletivo e universal em um simples produto de mercado em busca de lucro, a título de gerar energia, quando o mundo todo está migrando para energia oriunda de fontes renováveis e com menor ou nenhum impacto ambiental que são a energia solar e a eólica.

Neste sentido merece um destaque o fato de que toda a região Centro Oeste e, particularmente, Mato Grosso a viabilidade econômica e a sustentabilidade é altamente propícia, com incidência solar muito maior de que diversas outras regiões do Planeta, onde essa fonte de energia (solar) já é amplamente utilizada. Prova disso é que Mato Grosso é o estado que mais tem progredido na geração de energia solar, apesar da falta de incentivos por parte dos poderes públicas, até o absurdo do governo do Estado tributar a energia solar, simplesmente para encarecer a energia solar e facilitar os interesses de grupos econômicos de outros setores energéticos.

Todos os córregos da área urbana deste aglomerado urbano já referido já se transformaram em verdadeiros esgotos a céu aberto, além de toneladas de lixo que são carreadas diariamente para os cursos d’água, destruído todas as formas de vida aquática e afetando de morte este, outrora exuberante Pantanal, que hoje está também ameaçado de morte.

Por incrível que possa parecer, mesmo que no papel existam políticas, estratégias, planos e programas federais, estaduais e municipais relacionados com o meio ambiente, enfim, com a ecologia integral, as ações, poucas que existem, estão longe de mudarem a realidade dramática em que vivem  a grande maioria da população brasileira e, particularmente, de Mato Grosso em geral e da Baixada Cuiabana , com destaque para Cuiabá e Várzea Grande, em particular.

Precisamos cuidar melhor do meio ambiente, reduzir o consumismo, cuidarmos do nosso lixo, de nossa água, de nossas florestas, nossos recursos naturais, evitar todas as formas de desperdício e sabermos que a nossa geração tem por  dever deixar um mundo politicamente, socialmente, economicamente e ecologicamente melhor para as próximas gerações. isto se chama JUSTIÇA INTERGERACIONAL, JUSTIÇA SOCIAL e JUSTIÇA ECONÔMICA.

Um, não o único, fator da degradação do meio ambiente é a GANÂCIA HUMANA, a busca insenssante por lucro imediato e uma corrida sem sentido por acumulação e sabemos que quando as pessoas morrem não levam nada deste planeta.

Em decorrência, é necessário, é fundamental que também tenhamos em mente que existem dois níveis de responsabilidade, o primeiro nível é o individual, comunitário e empresarial e o segundo é o nível da responsabilidade pública, que no caso brasileiro está muito longe de ser realidade.

Por exemplo, de pouco ou quase nada adianta serem realizadas campanhas para combater o consumismo, o desperdício e a geração de lixo, resíduos sólidos, estimular a separação do lixo, a reciclagem etc., se as Prefeituras não incluem nas licitações públicas que as empresas vencedoras das licitações da coleta de lixo sejam obrigadas a realizarem a coleta seletiva e o destino apropriado do lixo.

Ou que as pessoas devem economizar energia, água e outros recursos naturais se os poderes públicos não dão o exemplo e continuam malbaratando esses recursos e não pautam suas ações por transparência, ética e parcimônia, racionalidade, eficiência e eficácia.

De forma semelhante, de pouco adianta as famílias, principalmente  das classes média e alta, implantarem sistemas para uso da energia solar, que, diga-se de passagem, mesmo com a falta de incentivos dos poderes públicos, se os imóveis, prédios públicos continuarem a não usarem energia solar, que reduz as despesas públicas com energia e também contribui para a sustentabilidade.

Todos sabemos da importância da arborização urbana, das árvores tanto nos quintais quanto nos logradouros públicos para o sombreamento, o bem estar das pessoas e para o clima, no entanto nossas cidades continuam sem árvores, o que aumentam as ondas de calor no meio urbano.

De pouco adianta as pessoas, os moradores plantarem algumas poucas árvores em frente `as suas casas se as Prefeituras não tiverem os Planos Municipais de Aroborização Urbana, os PADAUS, nossas ruas , avenidas e praças continuarão “peladas”.

Enfim, precisamos cuidar melhor do meio ambiente, reduzirmos o consumismo, o desperdício, cuidarmos de nosso lixo, das nascentes, dos mananciais, das águas, precisamos evitar todas as formas de desperdício e sabermos que a nossa geração deve deixar um mundo social, econômica e ecologicamente melhor para as próximas gerações.

isto se chama JUSTIÇA INTERGERACIONAL e JUSTIÇA SOCIAL e JUSTIÇA ECONÔMICA. Um, não o único, fator da degradação do meio ambiente é a GANÂNCIA HUMANA, a busca insensata por lucro imediato e uma corrida sem sentido por acumulação de capital, renda e riquezas sem considerar os custos desta degradação ambiental. Precisamos refletir que quando as pessoas morrem não levam nada  deste planeta.

Nossas autoridades falam e prometem muito e realizam pouco, oxalá as mesmas façam menos discursos demagógicos e realizem mais ações públicas, voltadas, de fato para o cuidado com o meio ambiente, com a ecologia integral, enfim, que os organismos públicos coloquem a questão do meio ambiente, da ecologia integral como uma das ou talvez como a prioridade central de todas as ações de governo.

Cabe, por outro lado, também `a população, que na verdade são os eleitores que livre, democrática e soberanamente elegem os governantes, inclusive governantes incompetentes, demagogos e corruptos, cobrarem dessas autoridades ações que enfrentem e solucionem os problemas e desafios socioambientais.

Afinal, esta mesmo população também são os contribuintes, que sofre com uma das maiores cargas tributárias do planeta, sem que em troca ou em retorno, pouco ou nada recebem em termos de obras e serviços públicos de qualidade e universais.

Exigir obras públicas e serviços públicos de qualidade e universais não é favor que os governantes devem prestar à população, mas sim, UM DIREITO da cidadania, do povo.


Todavia, a omissão do povo e, ao mesmo tempo, a manipulação que nossos governantes promovem em relação ao que realizam ou dizem realizar é uma das razões de todas as mazelas que afetam nosso país, não apenas em relação às questões ambientais, mas em todas as demais áreas como saúde, saneamento básico,  abastecimento, educação, justiça, segurança pública, habitação, urbanismo, direitos humanos e outras mais.

Para salvamos o planeta de uma catástrofe, já amplamente anunciada, precisamos ter em mente também a nossa responsabilidade, como cristãos ou não cristãos. É neste sentido que nos exorta o Papa Francisco ao dizer que “ toda abordagem ecológica deve integrar também uma perspectiva social que tenha em conta os direitos fundamentais dos mais desfavorecidos. O princípio da subordinação da propriedade privada ao destino universal dos bens e, consequentemente, o direito universal ao seu uso é uma “regra de ouro”  do comportamento social e o primeiro princípio de toda a ordem ético social” Laudato Si, 93.


*JUACY DA SILVA, professor titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @Profjuacy 

Terça, 21 Março 2023 09:32

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 


O Dia Internacional das Florestas é celebrado em 21 de Março e o Dia Mundial da Água em 22 de Março de cada ano, conforme Resoluções da ONU. Os temas deste ano são: Florestas e saúde; e, quanto ao Dia mundial da Água: Acelerando as mudanças – seja a mudança que você deseja ver no mundo”.

Para melhor compreendermos alguns dos desafios socioambientais que ameaçam a vida no planeta, podemos imaginar um triângulo em que em sua base estejam as florestas, de um lado as águas e do outro as mudanças climáticas e como essas três realidades afetam os sistemas econômicos, a vida e a sobrevivência no planeta. No Centro deste triângulo, como enfatiza o Papa Francisco, está a Ecologia Integral, dentro da máxima de que “tudo está interligado, nesta Casa Comum”, que o Planeta terra.


A destruição das florestas afeta o regime de chuvas, o clima e as águas, da mesma forma que a poluição e degradação dos vários cursos d’água e dos oceanos afetam a biodiversidade, a vida aquática, marinha e também a vida na terra, a produção de alimentos e de outras matérias primas essenciais para a vida no planeta.


Sem florestas e sem água todas as formas de vida, inclusive a vida humana fica ameaçada de extinção, esta é uma catástrofe anunciada há muitas décadas e que a cada ano se torna mais grave e mais iminente.


Ao longo dos últimos últimos 50 anos a crise socioambiental mundial tem se agravado de uma forma muito intensa e rápida. Diversas são suas manifestações e consequências como aquecimento global, mudanças climáticas, degradação dos diversos ecossistemas, aumento da desertificação, da erosão, do desmatamento e destruição das florestas, poluição do solo, do ar e das águas interiores e dos oceanos; destruição da biodiversidade, colocando em risco todas as formas de vida no planeta terra, inclusive a vida humana.


Ao longo dessas cinco décadas não tem faltado alertas quanto à gravidade desta crise socioambiental planetária, tanto por parte de dezenas de milhares de cientistas, lideres mundiais de todos os setores, inclusive líderes religiosos, como o Papa Francisco que, em 2015 publicou a Encíclica Laudato Si, coincidindo com o estabelecimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável pela ONU e pela aprovação do Acordo de Paris, com objetivos e metas com os e as quais praticamente todos os países, com apenas algumas exceções, se comprometeram a cumprir, transformando-os e transformando-as em políticas de governo.


No ano 2000, a ONU estabeleceu As oito Metas do Milênio, como base para que os países conjugassem esforços, tendo o ano de 2015 como referencial visando a combater a pobreza, a miséria e a melhor cuidar dos diversos aspectos socioambientais que colocavam e ainda colocam em risco as possibilidades de um planeta saudável e sustentável.


Desnecessário dizer que tais metas não foram plenamente atingidas e deixaram muito a desejar. Assim, em 2015 em Assembleia Geral a ONU, com anuência de praticamente todos os países, aprovou um novo Pacto em torno de 17 grandes objetivos que, da mesma forma que as metas do milênio, deveriam servir de base para a definição das políticas nacionais, tendo em vista o horizonte de mais 15 anos, ou seja, até 2030, que passaram a ser conhecidas como Agenda 2030.


Dentre tais objetivos do desenvolvimento sustentável, cabe destaque nesta reflexão o de número 06 Água limpa e saneamento básico, número 14 que se refere `a vida na água e o de número 15 que está voltado para a vida na terra.


Em 1980 a ONU proclamou, aprovou que até 1990 seria a Década da Água e, em 1992, pouco antes da ECO 92 no Rio de Janeiro, na Conferência sobre Água e Meio Ambiente, realizada em Dublin, na Irlanda do Norte foi aprovado o que seria o primeiro tratado internacional sobre Água, sendo que em seu primeiro princípio ficou estabelecido que “a água doce é um recurso finito, vulnerável e essencial para garantir a vida, o desenvolvimento e o meio ambiente.


Para enfatizar mais ainda o compromisso em relação às questões socioambientais a ONU também definiu  que de 2011 a 2020 seria a Década da Biodiversidade, que o ano de 2011 seria o Ano Internacional das Florestas e entre 2021 até 2030 seria a Década da Restauração dos Ecossistemas Degradados.


Apesar desses esforços da ONU a cada ano mais de 10 milhões de florestas são destruídas no mundo, sendo que quase metade dessas se transformam em áreas degradadas.


Além disso, diversas Conferências Internacionais sobre meio ambiente, água, clima, biodiversidade e outras mais, foram e continuam sendo realizadas ao longo de mais de 50 anos, sem que, todavia, a grande maioria dos Governos Nacionais cumpram com os compromissos, objetivos e metas estabelecidos nesses acordos, mesmo que firmados de maneira soberana polos diversos países, ou seja, muita “pompa e cerimônias”, declarações que, na verdade servem mais para alimentar a mídia do que realmente bases para políticas públicas, estratégias e planos de desenvolvimento nacional, regional e local.


A prova cabal deste distanciamento entre acordos firmados e ações realizadas é representada por um grande abismo, demonstrando a falta de vontade política e a demagogia como características dos governantes dos vários países, inclusive do Brasil.


Na Assembleia Geral da ONU em 2012 foi aprovada a Resolução instituindo o DIA INTERNACIONAL DAS FLORESTAS a ser celebrado anualmente em 21 de Março, como um marco para reflexões sobre a situação das florestas no mundo inteiro e o que está acontecendo em relação `as florestas em todos os países, principalmente aqueles que ainda tem em seus territórios florestas nativas como o Brasil e também os países que integram a Pan Amazônia, a Rússia, o Congo e outros países Africanos, a Indonésia e outros países asiáticos, o Canadá, os Estados Unidos e outros mais.


As informações, os dados e as estatísticas que a ONU tem divulgado sobre questões socioambientais, principalmente em relação `a destruição das florestas e ao estado das águas são estarrecedores e fazem parte de um cenário muito sombrio que paira sobre todos os países e apontam horizontes extremamente graves.


Na Encíclica Laudato Si, o Papa Francisco nos exorta de que na base desta catástrofe anunciada, nesta complexa e grave crise socioambiental, que afeta toda a humanidade, mas de uma maneira mais cruel os pobres, ou seja, as camadas excluídas, tem como causas a ganância humana, os modelos socioeconômicos e políticos que facilitam a exploração dos recursos naturais de maneira predatória, com vistas apenas ao lucro fácil e imediato, `a concentração de capital, renda, riqueza e propriedades em um número extremamente reduzido de pessoas, em detrimento da imensa (90%) da maioria da população mundial e de cada país.


Este modelo desumano desconsidera os direitos das pessoas a usufruírem dos bens e serviços produzidos socialmente e também os princípios da justiça social e da justiça intergeracional, bem como os limites e direitos da natureza.


Por exemplo, a ONU estima que até 2040 nada menos do que 600 milhões de toneladas de plástico deverão ser carreados para os oceanos e talvez o dobro disto deverá estar poluindo rios, lagoas e córregos nos diversos países.


Em 2022 a quantidade de pessoas no mundo que ainda continuavam sem acesso `a água potável era de 2,0 bilhões de pessoas; 2,8 bilhões ainda não tem acesso ao saneamento básico e mais de 1,9 bilhão não tem água sequer para higiene pessoal.


No Brasil também a situação é extremamente grave e vergonhosa. Em torno de 35 milhões de pessoas não tem acesso à água potável de qualidade e mais de 100 milhões de habitantes não tem acesso ao saneamento básico, convivem com esgotos a céu aberto, lixo, degradação ambiental e poluição, tornando a qualidade de vida de quase a metade da população brasileira extremamente degradante. Mas isto não consta da “pauta” das preocupações de nossos governantes e das camadas privilegiadas, que só “enxergam” essa população miserável por ocasião das eleições.


Quanto `as florestas o panorama não é nada animador. A expansão das fronteiras agrícolas, as atividades de mineração legais ou ilegais, a construção de barragens para a produção de energia, o desmatamento e as queimadas, o uso predatório do solo e subsolo, tem afetado os mananciais e as nascentes de córregos e rios de todas as bacias, em todos os países, inclusive no Brasil.


Em 40 anos, entre 1980 e 2020, o mundo assistiu `a destruição de mais de um bilhão de hectares (ha) de florestas e savanas e juntamente com essa devastação, mais de 40 mil espécies animais e vegetais foram extintas e milhares de outras estão em processo de extinção.


Estima-se que 40% da área Terrestre já esteja extremamente degradada. O custo anual para se combater a degradação e recuperar esses ecossistemas e dos oceanos, segundo cálculos da ONU, contidos no relatório de 2022 “Global Land Outlook 2” é de aproximadamente entre US$125 a 140 trilhões de dólares, bem maior do que o PIB mundial em 2021, que foi de 97 trilhões de dólares.


A ONU declarou que entre 2021 e 2030 é a Década para a Restauração de áreas Degradadas, sendo que no mundo existem mais de 1,0 bilhão de ha de áreas degradadas, das quais 140 milhões de ha no Brasil. A Meta da ONU é que até 2030 em torno de 350 milhões dessas áreas degradadas sejam restauradas/recuperadas, mas isto depende, do esforço de todos os países, principalmente os países, como o Brasil que tem grandes territórios e, também, grandes áreas degradadas e que continuam desmatando, destruindo os biomas.


Outra consequência extremamente grave produzido pela destruição das florestas, além de afetar os mananciais e o regime de chuvas, é a produção e emissão de gases tóxicos na atmosfera, que produz o aquecimento global, via efeito estufa e provoca as temíveis mudanças climáticas.

Esta destruição das florestas contribui para a emissão de 7,5 milhões de toneladas de dióxido de carbono e outros gases que agravam o aquecimento global. De 2000 até o ano de 2100, essas emissões de gases tóxicos na atmosfera deverão atingir 98,7  gigatons de Co2 e outros gasess de efeito estufa, causando o aquecimento da temperatura média da terra em mais de 2,5 graus, nível praticamente impossível para várias formas de vida, inclusive da vida humana.


Enfim, oxalá tanto a população quanto os governantes do mundo todo e, principalmente, no Brasil possamos aproveitar o Dia Internacional das Florestas e o Dia Mundial da Água, para uma reflexão mais profunda sobre tanto o nosso modelo de “desenvolvimento” quanto nosso compromisso de pautarmos nossas ações individuais e coletivas pela sustentabilidade, pela justiça social, pela justiça intergeracional e por uma economia mais racional, que respeite os limites da natureza e o direitos dos trabalhadores e dos consumidores, através da produção e do consumo responsáveis e sustentáveis.

Só assim estaremos melhor cuidando do planeta, protegendo nossas florestas, nossos mananciais e garantindo qualidade de vida para toda a população de nosso país e não apenas uma minoria privilegiado.


Em tempo, tanto no Brasil quanto em Mato Grosso tanto as florestas quanto as águas e saneamento básico continuam em processo de destruição e degradação extremamente graves, colocando em risco a vida, a saúde e o bem estar da grande maioria da população. Cabe a nós refletirmos criticamente sobre esta situação e buscarmos as saídas e as alternativas de ação.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista e articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profJuacy

Quinta, 23 Fevereiro 2023 13:44

 

 

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Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Juacy da Silva*
 

Apesar dos “avanços” ocorridos com a promulgação da Constituição de 1988, em relação aos direitos dos povos indígenas, como destaca o professor de direito Gustavo Proença, parece que na prática a realidade é bem outra, muito diferente do que consta no texto constitucional.

Vejamos esta reflexão, sob a ótica da Jornalista Cristiane de Oliveira - Repórter da Agência Brasil, Rio de Janeiro, em artigo publicado em 19/04/2017, por ocasião do DIA DO ÍNDIO/ DOS INDÍGENAS: “A Constituição de 1988 pode ser considerada um marco na conquista e garantia de direitos pelos indígenas no Brasil. A afirmação é do professor de direito Gustavo Proença, pesquisador da área de direitos humanos. Para ele, a Carta Magna modificou um paradigma e estabeleceu novos marcos para as relações entre o Estado, a sociedade brasileira e os povos indígenas.

Enquanto o Estatuto do Índio (Lei 6.001), promulgado em 1973, previa prioritariamente que as populações deveriam ser "integradas" ao restante da sociedade, a Constituição passou a garantir o respeito e a proteção à cultura das populações originárias. “O constituinte de 1988 entende que a população indígena deve ser protegida e ter reconhecidos sua cultura, seu modo de vida, de produção, de reprodução da vida social e sua maneira de ver o mundo”, destaca Proença”.

A Constituição Federal de 1988 traz em seu bojo diversos dispositivos que se aplicam, diretamente aos povos indígenas e outros dispositivos gerais, principalmente garantias individuais e coletivas que, de forma indireta, também se aplicam a esses povos tradicionais, garantindo, inclusive, suas ancestralidades.

Vale a pena destacar nesta reflexão alguns desses dispositivos constitucionais: “Art. 20. São bens da União: XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XIV - populações indígenas; Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: XVI - autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais; Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: XI - a disputa sobre direitos indígenas. Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. § 1.º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa brasileira de capital nacional, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas. Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. § 2.º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem. Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. § 1.º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

CAPÍTULO VIII Dos Índios Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. § 1.º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2.º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. § 3.º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei. § 4.º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. § 5.º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco. § 6.º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé. § 7.º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3.º e 4.º. Art. 232.

Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

Art. 67. A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da Constituição”. (ou seja, esta determinação constitucional que deveria ter sido executada ate 1993, praticamente foi ignorada, principalmente no último período governamental, em que nenhuma demarcação de território indígena foi realizada). Apesar deste artigo constar explicitamente na Constituição nem mesmo o STF, que é considerado o “Guardião” da Constituição parece ignorar este dispositivo.

No entanto, apesar desses marcos legais/constitucionais, vejam que absurdo, parece que estão colocando a raposa para tomar conta do galinheiro ou o vampiro para administrar o banco de sangue. Reflitam sobre o que já aconteceu, o que está acontecendo e o que ainda pode acontecer em relação a esta tragédia anunciada e perpetrada ao longo de séculos, décadas, mas, principalmente, nos últimos quatro, sete ou dez anos em relação aos diferentes povos indígenas no Brasil, uma verdadeira calamidade, uma tragédia humanitária, uma vergonha nacional e mundial.

Acabo de receber em meu correio eletrônico (E-mail) uma notícia, se não estarrecedora, pelo menos inusitada. Trata-se de uma Comissão constituída no âmbito do Senado Federal para “Acompanhar e fiscalizar” as providências que estão sendo tomadas, principalmente pelo Governo Federal e também outros organismos públicos, para enfrentar a chamada crise do povo indígena Yanomami, que na verdade é um genocídio contra este e tantos outros povos indígenas que, ao longo de séculos foram e continuam sendo dizimados, literalmente.

Transcrevo aqui parte do teor do e-mail contendo a notícia a que me refiro, cuja fonte é o Site Climainfo (https://www.climainfo.org.br 17/02/2023) “O Senado Federal instalou, nesta 4ª feira (15/2), uma comissão temporária para acompanhar a situação dos Yanomami, que vivem uma grave crise humanitária e sanitária decorrente da presença ilegal de garimpeiros em seu território, e observar os esforços do governo federal em retirar os invasores. Para a presidência da comissão, uma escolha insólita, se não imprópria: o senador Chico Rodrigues (PSB-RR),aliado do governo Bolsonaro, de quem foi vice-líder no Congresso Nacional, tem laços públicos e notórios com atividades de garimpo em Roraima e defensor de garimpeiros, a quem chegou a elogiar essas atividades criminosas como um “trabalho fabuloso”.

Ao ser escolhido para Presidir a referida Comissão, o Senador  fez uma declaração claramente preconceituosa. Em entrevista à Globonews, o mesmo disse que os garimpeiros são “vítimas” da situação e classificou os Yanomami como “a última etnia do planeta no século XXI que ainda é primitiva, totalmente primitiva”.

Voltando `a minha reflexão, gostaria de enfatizar que a crise humanitária, a fome que já matou centenas de crianças e também adultos do povo Yanomami é apenas a parte visível deste que pode ser considerado como um “iceberg”, que a sociedade brasileira e o resto do mundo tem tomado conhecimento apenas agora, pois o genocídio e tantas outras formas de violência, inclusive assassinatos de inúmeras lideranças indígenas já vem ocorrendo no Brasil há décadas, sem que providências concretas tenham sido ou estejam sendo tomadas para garantir, como a Constituição Federal estabelece, não apenas os territórios desses povos, mas também sua cultura, suas tradições, enfim, suas formas de viver, integrados com a natureza/meio ambiente.

Integração e enculturação forçadas representam um verdadeiro atentado contra todos os povos tradicionais, os quais tem o direito vivem conforme os costumes, tradições e crenças culturais e não as normas e formas culturais impostas de forma autoritária pelos “donos do poder” e seus agentes.

Inúmeros estudos, pesquisas tem demonstrado que os povos indígenas, ao longo dos tempos, de décadas e séculos foram e continuam sendo os verdadeiros guardiões das florestas, da biodiversidade, dos biomas, das águas, enfim, da biodiversidade tão ameaçadas e ameaçados nos últimos tempos, que tem causado preocupação e indignação ao redor do Planeta.

Portanto, garantir os direitos dos povos indígenas, como constam não apenas em nossa Constituição, mas também em inúmeros tratados articulados e aprovados pela ONU, dos quais o Brasil tem sido signatário é obrigação, dever legal dos organismos públicos nacionais e fundamentos para o estabelecimento de políticas públicas que garantam a vida, incluindo a saúde, o bem estar e as culturas dos povos indígenas.

Mas isto praticamente não tem ocorrido, a não ser quando verdadeiras calamidades são reveladas publicamente, como está sendo este genocídio do povo Yanomami.

Diante disso, podemos nos perguntar: onde estavam os Podres da República, os governos e as autoridades federais, estaduais e municipais que se omitiram e silenciaram diante de uma tragédia anunciada?

Onde estavam os MPs (Ministérios Públicos) Federal e Estaduais, principalmente os localizados em Roraima e na Amazônia ou de outros estados onde povos indígenas tem sido vítimas de muita violência, desrespeito e exploração?

Onde estavam a Câmara Federal, o Senado da República, principalmente os senadores e deputados federais dos estados da Amazônia Legal que nada fizeram,?

Onde estavam as Forças Armadas, o Conselho da Amazônia, a Funai, o IBAMA e outros órgãos públicos que deveriam cuidar do Meio ambiente?

No Congresso Nacional existem as Frentes Parlamentares ou as bancadas da Bala, do Boi, da Bíblica, dos Evangélicos, das mulheres, da Educação, da saúde e tantas outras, indagamos, porque não uma bancada, uma frente parlamentar em defesa dos povos indígenas, dos quilombolas, remanescentes da escravidão, enfim, grupos étnicos e raciais tão vilipendiados e excluídos dos “frutos” do crescimento econômico e do “desenvolvimento nacional”?

Onde estavam os veículos de comunicação que se calaram? Onde estavam o “deus mercado”, os “defensores” da liberdade, que se omitiram ante a negação do direito que é o mais importante para um ser humano que é a própria vida?

Da mesma forma que os Yanomamis, também todos os demais povos indígenas no Brasil inteiro estão sendo vítimas de violência, dizimados, suas terras invadidas, suas culturas destruídas. Os povos indígenas no Brasil há décadas estão se transformando em verdadeiros párias de nossa sociedade e com o avanço das fronteiras agropecuárias, mineração legal e ilegal, a grilagem consentida, a ação ilegal e criminosa de madeireiros, o desmatamento, a construção de grandes barragens, este processo está, na verdade sendo financiado grandes grupos econômicos nacionais e internacionais, mas também pelos Governo Federal e Estaduais através de crédito subsidiado, renúncia fiscal, sonegação consentida, “incentivos fiscais”, enfim, este genocídio faz parte de políticas públicas, custeadas com o suado dinheiro dos contribuintes.

O caso dos Yanomamis é apenas pontual, ou como se diz, “a bola da vez”, onde a luz, os holofotes dos meios de comunicação produzem um efeito momentâneo; precisamos refletir, discutir a questão indígena brasileira por inteira, analisar a situação de todos os povos, como, por exemplo, os guarani-kaiowá, os ticunas, os terena, os xavantes, os bororos, os pataxós, os caetés, os caiapós, os nhabiquaras, os macuxis, os caigangue e tantos outros que também estão sofrendo ameaças de toda sorte, inclusive de extinção enquanto grupos demográficos com identidade própria.

Este é o foco da discussão e não apenas medidas emergenciais e assistencialismo, que, cessada a “onda” da publicidade tudo volta `a mesma situação e o genocídio continua!

Em boa hora o Governo Lula criou o Ministério dos povos indígenas. Oxalá tanto este Ministério quanto todos os organismos a ele vinculados como a FUNAI e também o Ministério do Meio Ambiente e do Clima, tenham recursos orçamentários suficientes para não apenas definirem mas de fato implementarem políticas públicas que defendam a um só tempo tanto o meio ambiente quanto a vida e direito dos povos indígenas existentes no Brasil, dentro do conceito de Ecologia Integral, como tanto tem enfatizado o Papa Francisco, “onde tudo está interligado, nessa Casa Comum”, que é o nosso Planeta Terra.

Neste sentido, precisamos também de Igrejas, Católica e Evangélicas e de outras crenças, não apenas as que representam o cristianismo, que promovam uma evangelização “enculturada”, que tenham também a cara e o olhar dos povos originários, que respeitem suas culturas, suas línguas, suas tradições, suas crenças e não apenas a cara dos colonizadores e destruidores das culturas desses povos.

Enfim, a questão indígena no Brasil não é um tema ou um assunto de interesse exclusivo dos povos indígenas, mas da sociedade como um todo, não podemos fazer coro com quem imagina e vocifera o tempo todo que no Brasil “existe muita terra para poucos indígenas” ou que esses povos e a defesa do meio ambiente sejam empecilho ou obstáculo para o desenvolvimento, local, estadual ou nacional.

Precisamos repensar nossos conceitos, nossas atitudes e nossas ações, os povos indígenas representam vidas e precisamos defender todas as formas e tipos de vida, inclusive ou principalmente dos povos indígenas, que são excluídos social, econômica e politicamente e que continuam ameaçados em todos os aspectos tão caros/importantes para essas pessoas, que também, como diz o adágio, “são filhos e filhas de Deus”!


*JUACY DA SILVA, 80 anos, professor titular aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

Quinta, 16 Fevereiro 2023 11:42

 

 

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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 


“Enquanto eu distribuía alimentos aos pobres (assistencialismo) eu era considerado um santo; a partir do dia em que comecei a falar das causas/origens da fome, passei a ser considerado comunista” Dom Helder Câmara, Fundador da Caritas Brasileira e um dos fundadores da CNBB.

Em relação `a fome podemos identificar pelo menos quatro grandes grupos de causas (raízes): a) as estruturais/socioeconômicas e políticas;  b) as ecológicas/ambientais c) as geopolíticas que são as guerras, os conflitos armados entre grupos dentro de um mesmo país; d) os fenômenos da natureza como terremotos, furacões, tornados e vulcões. Com exceção das últimas, todas as demais tem suas origens nas ações ou omissões humanas, sociais, econômicas ou políticas.

Nesta reflexão/artigo, pretendo abordar apenas algumas dessas causas, no futuro podemos retornar a este assunto ampliando o escopo da análise.

No caso do Brasil, enquanto mais de 73% dos trabalhadores na ativa e 91% dos aposentados ou pensionistas vivem ou meramente sobrevivem com no máximo dois salários mínimos, que na verdade é um rendimento de fome e ainda assim, tem o poder desta renda reduzida, comida pela inflação ao longo de décadas, minguando ano após ano, um número super reduzido de milionários e bilionários tem suas rendas, riquezas e propriedades sendo multiplicadas dezenas vezes, ampliando o fosso social entre esses dois grupos. Isto, com certeza, faz o regozijo do “deus” mercado, dos especuladores financeiros e dos rentistas, verdadeiros parasitas sociais e oportunistas políticos.

A inflação não é apenas um indicador técnico extremamente valorizado pelos economistas e adoradores do mercado, mas sim um processo alimentado pelos agentes econômicos, principalmente pelo capital financeiro, coadjuvados pelas instituições públicas, vale dizer, governo, que, através de políticas públicas geram recessão, aumento da carga tributária e uma imensa injustiça fiscal, onde os mais pobres transferem renda, oriunda de trabalho sub valorizado, para os detentores do capital e dos meios de produção e seus defensores nas estruturas do poder, os chamados “marajás da república”.

Nesta esteira surgem as injustiças sociais, a concentração de renda, as desigualdades sociais, regionais e setoriais, a pobreza, a pobreza extrema, a miséria e A FOME, cujas raizes são estruturais, razões pelas quais não se combate a fome e nem a pobreza com assistencialismo e programas paternalistas ou manipulação política e eleitoral como a famosa distribuição de sacolões ou outros bens e serviços que são trocados por votos, colocando ou mantendo nas estruturas do Poder, as mesmas pessoas, os mesmos grupos que em lugar de defenderem os interesses, aspiraações ou necessidades do povo, transformam-se em representantes dos interesses dos grandes grupos econômicos ou de outros tipos.

Esta é a dinâmica socioeconômica, política e cultural que alimenta a exclusão de milhões de pessoas em todos os países, inclusive no Brasil e bilhões no mundo, que tornam as pessoas que fazem parte da chamada classe média em pobres; os pobres em miseráveis e os miseráveis em zumbis, mortos-vivos, onde a fome é apenas a face mais visível deste drama social que afeta essas pessoas, ante o olhar passivo, omisso e complacente da grande maioria da população, inclusive de governantes que, como o sacerdote e o levita, não socorreram um homem assaltado e violentado na estrada e mencionado por Cristo na Parábola do Bom Samaritano.

A fome é um dos dramas mais pungentes que tem acompanhado a humanidade ao longo de séculos e milênios. Muitos a associam com castigos dos “deuses”, de Deus; outras pessoas imaginam que a fome esteja ligada `a pobreza e que ambas são frutos da preguiça, de quem não quer trabalhar e outras pessoas, mais estudiosas tentam ir mais a fundo e identificar as suas verdadeiras causas e também as consequências da fome, que se não for debelada, provoca muito sofrimento, vergonha e a morte, como costumávamos ver através de reportagens dos diversos meios de comunicação, mostrando fotos ou cenas com pessoas literalmente morrendo de fome, pessoas vivas mais se parecendo com esqueletos humanos.

Tais cenas nós, brasileiros/brasileiras, associávamos isto como sendo uma realidade dura, nua e crua apenas em alguns países da Ásia, da América Latina e da África, continente este pilhado pela rapinagem dos países europeus durante séculos de ocupação e colonialismo, de violência, incluindo a destruição da natureza, da extração de recursos naturais e práticas desumanas como a escravidão, cujas consequências ainda estão presentes em todos os países que tiveram esta forma perversa e trágica de trabalho, na origem de sua riqueza e opulência capitalista, inclusive no Brasil.

A partir da próxima quarta feira de cinzas, quando para a Igreja Católica ocorre o período da Quaresma, 40 dias que devem ser de oração, reflexão, caridade (esmola), misericórdia e arrependimento dos pecados, inclusive dos pecado social e ecológico, será realizada a CAMPANHA DA FRATERNIDADE (CF), conduzida pela CNBB e articulada em todas as Arquidioceses, Dioceses , Paróquias e comunidades católicas no Brasil inteiro.

Todos os anos a CNBB escolhe um tema e um lema para orientar as reflexões da CF. Neste ano de 2023, o tema escolhido foi “ FRATERNIDADE E FOME” e o Lema, um versículo da Bíblia que traz um mandamento que nos deixou o Mestre (Jesus) quando ante a fome das pessoas que o seguiam disse aos seus discípulos “Dai-lhes vós, mesmos, de comer”, Evangelho de São Mateus, 14:16.

A Cáritas Brasileira, fundada em 12 de novembro de 1956, é uma das 170 organizações-membro da Cáritas Internacional, que, ao longo desses quase 70 anos tem prestado um grande serviço de apoio as pessoas pobres, excluídas, que sofrem e que também passam fome em nosso país.

Conforme dados de diversas Instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, a FOME, diferente do que pensava e dizia o último presidente da República, que não existe no Brasil, mas, repito, diversas organizações e centros de pesquisas tem demonstrado sobejamente que em nosso país em torno de 33 milhões de pessoas passam fome e mais de 130 milhões vivem em situação de insegurança alimentar.

O drama dos indígenas YANOMAMIS, que os meios de comunicação tem mostrado ao vivo e em cores e que tem maculado a imagem do Brasil ao redor do Mundo, é uma demonstração cabal desta tragédia humana, motivada, não por desígnios transcendentais ou castigo das divindades, mas pela ganância de uns poucos e também pela incúria, convivência e omissão de nossas autoridades que nada fizeram ao longo dos últimos anos para colocarem um paradeiro nas invasões das terras dos vários povos indígenas, na grilagem dessas áreas, na destruição do meio ambiente, na contaminação das águas e na desorganização social desses povos por garimpos ilegais, grileiros e madeireiros é a prova mais clara e cabal de que a fome existe no Brasil e podemos identificar suas causas.

Outro exemplo da fome que podemos perceber todos os dias, muitas vezes bem ao nosso lado ao transitarmos pelas ruas, avenidas e praças das grandes e médias cidades é o aumento acelerado da chamada população em situação de rua. Segundo estimativas do IPEA esta realidade já atinge próximo de 300 mil pessoas.

A CNBB, representando a Igreja Católica, desenvolveu uma metodologia para orientar suas atividades pastorais que está sintetizada em 4 etapas: VER, JULGAR, AGIR e CELEBRAR. Isto significa que para agirmos e celebrarmos as vitórias sobre as mazelas que afetam o ser humano, precisamos primeiro olhar para a realidade, analisar de forma crítica e criadora a mesma; só então podemos interpretar, identificar as verdadeiras causas que deram origem ao problema ou desafio que pretendemos enfrentar.

Feito isto, cabe-nos definir as formas de AGIR, ou seja, o planejamento de nossas ações, através de projetos que contemplem todas as etapas de uma ação racional, com objetivos, metas , origem dos recursos e um calendário a ser seguido, sempre contando com a PARTICIPAÇÃO das pessoas que estejam em situação de vulnerabilidade, para que sejam tratados como sujeitos e não objetos de nossas ações.

A Cáritas Brasileira, tem insistido, desde as suas origens, que não podemos estimular apenas as ações assistencialistas, essas são importantes em caráter imediato, urgente diante de uma crise que esteja colocando em risco a vida e a própria sobrevivência das pessoas e que podem leva-las até a morte, como no caso da fome.

Diante da complexidade dos desafios sociais, econômicos, culturais e políticos que estão presentes na questão da vulnerabilidade social ou no que denominamos de exclusão e a configuração da sociedade brasileira em classes, a Cáritas enfatiza que existem Três níveis de caridade: a ASSISTENCIAL “que oferece o peixe”; a PROMOCIONAL “ que ensina a pescar” e, finalmente, a LIBERTADORA “que pesca juntos”.

A Caridade assistencial é feita através de doações imediata de alimentos, roupas, assistência médica-hospitalar a quem tem fome, doente e passando por necessidades extremas; a Caridade promocional, é realizada através de cursos, treinamentos para que as pessoas marginalizadas ou em vulnerabilidade possam se qualificar e participar de forma mais efetiva do mercado de trabalho, são programas de geração de trabalho e renda.

Já a CARIDADE LIBERTADORA, procura despertar entre as pessoas excluídas, marginalizadas a consciência de que são cidadãos e cidadãs, sujeitos de direito e que precisam lutar para romper as amarras que as aprisionam em cadeias de exploração e manipulação política, social ou ideológica, que os problemas sociais e econômicos que afetam a população, como, por exemplo, a fome, a precariedade dos serviços de saúde e de educação, o desemprego, subemprego, a falta de moradia, a falta de terra para trabalhar, os esgotos que correm a céu aberto, a miséria, a violência e tantas outras mazelas, tem causas estruturais mais profundas e que não serão equacionadas com medidas assistencialistas,  mas sim através de mudanças, quase sempre radicais, das estruturas opressoras e exploradoras que geram tais anomalias sociais, que denominamos de exclusão e pobreza.

No caso da fome, podemos compara-la a uma árvore. A gente costuma ver uma árvore e sabemos que a mesma tem raízes que as alimentam e as sustentam, se cortarmos as suas raízes ou permitirmos que parasitas suguem sua seiva, com certeza, a árvore vai morrer, ou seja, vai desaparecer.

Assim também é a fome, o que nós vemos é sua forma aparente, mas o que dá origem e mantem a fome são suas raízes, que a gente, mesmo que imaginemos saber, não conseguimos ver à primeira vista, precisamos ir mais ao fundo, identificar suas raízes e também os parasitas sociais, econômicos e políticos que sugam, exploram e se apropriam dos frutos do fator trabalho.

A raiz mestre ou o que se costuma chamar de “pião”, é a pobreza, em suas variadas formas e não apenas nos aspectos econômicos e financeiros, como até bem pouco tempo a maioria dos pesquisadores acreditava ser a única ou a principal causa da fome.

Se as pessoas não tem renda, não tem salário, se estão desempregadas faltam-lhes recursos suficientes para comprar os alimentos que lhes garantam a sobrevivência e, neste particular, esconde-se  outras mazelas oriundas das estruturas sociais, econômicas, culturais e políticas injustas, como a excessiva concentração de renda, riqueza e propriedades em pouquíssimas mãos.

Essas estruturas injustas quase sempre são “alimentadas”, criadas e mantidas pela dinâmica do poder, onde as elites dominantes, as camadas abastadas da sociedade, ou o que se costuma chamar de “donos do poder” e os “marajás da república”, contribuem para a acumulação do capital via políticas públicas como subsídios aos grandes grupos econômicos, sonegação fiscal consentida; injustiça fiscal, juros subsidiados, “incentivos fiscais”, sem acompanhamento para avaliarem se realmente quem os recebe está contribuindo de alguma forma para gerar empregos e salários justos e decentes e não trabalho semiescravo e salário de fome, como é o poder aquisitivo do salário mínimo no Brasil.

A ONU através de suas agências especializadas , como a UNEP, em 2022 aprofundou seus estudos quanto aos indicadores que devem ser utilizados para dimensionar a natureza e nuances da pobreza, que é, na verdade uma das ou a principal raiz da fome.

Até recentemente considerava-se pobre quem recebia em poder de compra relativo (a chamada PPP) até US$5,00 (cinco dólares) que em reais representa aproximadamente R$26,00 por dia e R$780,00 por mês e pobreza absoluta quem recebe ou dispõe de renda equivalente a US$1,90 ou R$10,00 por dia ou R$300,00 por mês, convenhamos valores que não são suficientes sequer para alimentar dignamente uma pessoa, bem abaixo até mesmo do salário mínimo de fome que vigora no Brasil até os dias de hoje.

Para a ONU a pobreza deve ser observada/entendida a partir de três dimensões: Saúde, educação e nível ou padrão de vida, considerando 10 indicadores. Na saúde os indicadores são: nível de nutrição/desnutrição e subnutrição e índices de mortalidade infantil; na educação: anos de escolaridade e frequência/matricula escolar e no nível/padrão de vida: fonte de energia usada para cozinhar; instalações sanitárias na habitação, acesso `a água potável tratada/qualidade, acesso `a eletricidade domiciliar; condições e tamanho da habitação, incluindo índices de saneamento comunitário e, finalmente, valor da propriedade.

Para finalizar, gostaria de refletir como a fome está relacionada com o fator trabalho, razão pela qual o Papa Francisco sempre tem insistido no que é chamado de três “Ts”: terra, teto e trabalho. Sem trabalho as pessoas não tem como conseguir renda; trabalho incerto e intermitente, o chamado trabalho informal , o subemprego também não garante renda suficiente para ter sequer alimentação regular e de qualidade e, finalmente, com salário aviltado, o que eu chamo de salário de fome, como é o poder de compra do salário mínimo, as pessoas também não despem de renda suficiente para alimentar-se ou atender as suas outras necessidades.

O poder aquisitivo do salário mínimo, que é regulado e manipulado pelo governo ao longo de mais de 80 anos, desde a sua criação em 1936, sua regulamentação em 1938 e estabelecimento de 14 faixas regionais de valor em 01 de Maio de 1940, perdeu em torno de 84% do poder aquisitivo neste período.

O DIEESE, instituição sindical de estudos e estatísticas do trabalho, demonstrou recentemente que o valor do salário mínimo a vigorar a partir de janeiro de 2023 ao invés de R$1.302,00 reais para manter o poder de compra que o mesmo tinha em 1940 deveria ser hoje de R$6.647,63.

Até 1984 vigoravam 14 faixas distintas regionais de salário mínimo, sendo que a em vigor na Capital da República, primeiro no Rio de Janeiro e ultimamente em Brasilia representava 3 vezes mais do que o Nordeste, demonstrando como uma política pública gera pobreza, fome e miséria.

Pela Constituição Federal de 1988, no Artigo sétimo está escrito, de forma clara, que “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social:.....IV Salário mínimo, fixado em Lei, nacionalmente unificado, capaz de atender suas necessidades vitais básicas e de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preserve o poder aquisitivo”.

Se considerarmos que 73% dos trabalhadores na ativa e 91% dos aposentados recebem no máximo dois salários mínimos e que 64,4% dos aposentados e 38% dos trabalhadores na ativa ganham apenas um salário mínimo, além de mais de 9 milhões de desempregados e mais de 39 milhões de subempregados/informalidade podemos entender o drama da fome no Brasil. Por isso, mais de 60 milhões de pessoas estão “penduradas” em programas emergenciais ou de transferência de migalhas orçamentárias, que não passam de medidas assistencialistas e de manipulação política eleitoral

Recuperar o poder aquisitivo do salário mínimo, concedendo apenas 2% ou 3% acima da inflação, a cada ano, o que é um sacrilégio para o “deus mercado” e um pecado para os economistas liberais ou neoliberais, vai demorar pelo menos 30 anos para repor o mesmo poder de compra que o salário mínimo tinha quando foi estabelecido em 1940.

Reduzir a carga tributária sobre alimentos e sobre as camadas salariais com menor poder aquisitivo é a um só tempo medida de justiça fiscal e corrigir as distorções e regressividade do Imposto de Renda é,  ao mesmo tempo, uma forma melhor de combater a fome e devolver a dignidade a milhões de pessoas e famílias em nosso país.

Se continuar a mesma política de governo por mais alguns anos , dentro de uma década, o salário mínimo não chegará sequer a 10% em poder de compra do que representava há 83 anos, quanto menor for a renda real dos trabalhadores e dos aposentados no Brasil, maiores serão os índices de fome, de desnutrição, subnutrição e insegurança alimentar em nosso país.

O assistencialismo jamais vai combater efetivamente a fome, a pobreza, a miséria e a exclusão, precisamos de uma transformação profunda e radical nas estruturas sociais, econômicas e políticas e também a definição e implementação de políticas públicas de valorização real do trabalho, de melhor cuidado com a ecologia integral e o cumprimento da Constituição, em sua integralidade, inclusive no que concerne aos direitos dos trabalhadores e da população em geral.


Não existe democracia de verdade em um país com dezenas de milhões de pessoas famintas, pobres, miseráveis, sem teto, sem trabalho, sem renda e excluídas. Precisamos urgentemente repensar os conceitos de democracia e de estado republicano de direito, para quem?


Da mesma forma que os atos terroristas de 08 de janeiro último em Brasília foram considerados gravíssimos, a fome também é um atentado grave `a democracia, `a medida que solapa seus verdadeiros alicerces que é a cidadania plena, a garantia das pessoas viverem com dignidade, o que lhes é negado pela fome , pela pobreza e pela miséria!


Estava concluindo este artigo quando surgiu a notícia da entrevista do Presidente Lula anunciando que a partir de 01 de Maio próximo o valor do salário mínimo passará de R$1.302,00 para R$1.320,00 ou seja um aumento de R$18,00 reais por mês, nada mais do que 1,38% acima da inflação do ano passado (2022).  


Mesmo ante um aumento real praticamente insignificante para a vida de milhões de trabalhadores, o “deus mercado” reagiu negativamente, porquanto este aumento representará mais de R$7,7 bilhões de reais nos gastos do Governo Federal, quando nada é dito que o Governo Federal deverá gastar nada menos do que R$2,038 trilhões de reais, um aumento de 8,4%, dos R$1,88 trilhões de reais em relação ao que o governo Bolsonaro pagou em juros e amortização da dívida pública em 2022.


Tomando este percentual irrisório de aumento do poder de compra decorrente deste reajuste real do salário mínimo em 2023, para recompor o poder aquisitivo que o salário mínimo tinha em 1940, serão necessários 61 anos, ou seja, só em 2084.


O total do aumento de gastos públicos com este aumento/reajuste do salário mínimo em 2023 representa apenas e tão somente 0,38% dos gastos do Governo Federal com a rolagem da divida pública, contra isso nem os parlamentares, nem os economistas liberais e neoliberais e muito menos o “deus mercado” reagem, ficam todos de bico calado.

*JUACY DA SILVA, 80 anos, professor titular aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy 

Terça, 14 Fevereiro 2023 11:51

 

 

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JUACY DA SILVA*
 


O Câncer, como todas as demais doenças não representam um “carma”, castigo de Deus ou uma mera loteria genética, mas, os seus cuidados estão diretamente relacionados com a realidade socioeconômica e cultural que excluem as pessoas pobres quanto `a garantia de seus direitos humanos fundamentais, o principal deles que é a vida.


Enquanto as elites econômicas e os donos do poder dispõem de recursos próprios ou oriundos do Tesouro, para buscarem atendimento em hospitais de primeira linha em São Paulo, Rio de Janeiro, em diversas capitais ou até no exterior, os pobres, miseráveis e excluídos engrossam as filas, virtuais ou físicas, das unidades de saúde sucateadas e sem condições de atenderem a quem precisa. Esta é a realidade da saúde pública em nosso pais.


Há poucos dias, tendo em vista o DIA MUNDIAL DO CÂNCER 2023, “comemorado” no último dia 04 deste mês de Fevereiro, escrevi um artigo alusivo a esta questão, tendo sido publicado em diversos veículos de comunicação, após o que, compartilhei os “links”,  procurando ampliar o número de pessoas que poderiam ler e refletir sobre o desafio que esta doença representa na atualidade.


Dando prosseguimento a essas reflexões sobre esta que é uma das mais temidas doenças que a cada ano afeta milhões de pessoas, grande parte das quais não resistem e acabam sucumbindo, o que representa uma grande perda e muito sofrimento familiar, nesta oportunidade gostaria de chamar a atenção quanto ao DIA INTERNACIONAL DO CÂNCER INFANTIL, cuja data de “celebração”, que na verdade é um alerta principalmente `as famílias que tem crianças, adolescentes e jovens, é o DIA 15 DE FEVEREIRO.


Este dia representa o início de um movimento mundial que surgiu em 2002; portanto, há pouco mais de duas décadas, pela união de esforços, de propósitos e de luta pela vida, entre 170 organizações de famílias de crianças com câncer, em mais de 93 países, dando origem a uma rede internacional de apoio mútuo, que luta por melhores condições para prevenção, diagnóstico precoce, tratamento médico-hospitalar e apoio material, financeiro e psicológico, tanto às crianças vítimas de câncer quanto suas famílias, principalmente em países pobres, de renda baixa e média e em todos os países, para famílias pobres que não dispõem de recursos suficientes, sequer para se alimentarem, quanto mais para fazerem face aos custos elevados que o tratamento de câncer representa.


Surgiu assim a Organização Internacional de apoio `as famílias de crianças com câncer, cuja denominação em inglês significa (CCI - Childhood Cancer International), cuja missão fundamental é advogar pela garantia de todas as pessoas `a saúde, mas, principalmente, `a garantia dos DIREITOS DAS CRIANÇAS, em convenção da ONU que estabelece “ As crianças (neste conceito quem tem menos de 20 anos de idade) tem o direito de usufruírem do mais elevado padrão de cuidados e atendimento médico-hospitalar, material e financeiro, em caráter prioritário”; cabendo ao Estado, poderes e instituições públicas em cada país garantirem que tais direitos sejam não apenas reconhecidos mas, também, plenamente respeitados.


Conforme dados estatísticos e estudos publicados pela OMS – Organização Mundial da Saúde e outras organizações públicas e privadas nacionais e internacionais, a cada ano nada menos do que 400 mil crianças são diagnosticadas com algum tipo de câncer.


A taxa de sobrevivência varia de 80% nos países desenvolvidos a menos de 20% nos países pobres e de renda média, sendo que este mesmo perfil  socioeconômico é observado em todos os países quando se leva em conta a classe social, ou seja, crianças com câncer pertencentes a famílias de alta renda tem muito mais chance de serem diagnosticadas e serem tratadas precocemente do que crianças com câncer cujas famílias são pobres e não dispõem de recursos e meios para fazer face a este desafio.


Na quase totalidade dos países, principalmente nos países pobres e de baixa ou média renda a saúde publica, como acontece no Brasil, é um simulacro, ou seja, não dispõe de meios e recursos técnicos, tecnológicos, humanos, financeiros e orçamentários para oferecer uma saúde de qualidade em caráter universal; na maior parte dos casos está em completo abandono, sucateada e, ainda, sujeito `a corrupção que rouba os já minguados recursos necessários ao atendimento digno à população.


Quem rouba recursos da saúde pública ou quando esta não tem índices de qualidade, são verdadeiros assassinos, pois impossibilitam que milhares de pessoas tenham acesso aos cuidados de saúde e a serem condenadas `a morte pela falta de atendimento e isto também é verdadeiro para as pessoas com câncer, inclusive, crianças com câncer.


No mundo morrem aproximadamente 180 mil crianças com câncer por ano, entre as mais de 400 mil que são diagnosticas todos os anos. O Câncer infantil, dependendo dos países, está sempre entre as três principais causas de morte de crianças, adolescentes e jovens com menos de 20 anos.

A Meta estabelecida pela OMS juntamente com diversos governos nacionais e outras instituições públicas e privadas é de elevar para 60% a média mundial de sobrevivência de crianças com câncer e, assim, reduzir em um milhão de mortes de crianças com câncer em uma década.


A Campanha em curso entre 2021 a 2023 tem como tema “A sobrevivência com melhores cuidados/dignidade é possível” e o símbolo representa que “de mãos dadas” podemos garantir vida digna e plena a todas as crianças com câncer.


Neste sentido dar as mãos representa tanto a solidariedade quanto o espírito de luta para a garantia dos direitos das crianças viverem felizes, mesmo aquelas que são diagnosticadas com câncer e que a presença do Estado/Poderes Públicos é fundamental nesta caminhada, imprescindível. Direito este que não pode ser negado a quem luta desesperadamente pela vida.


Da mesma forma, tenho plena convicção que cabe ao ESTADO, ou seja, às instituições públicas, como bem atestam tanto os acordos internacionais aprovados sob os auspícios da ONU/OMS quanto, no caso brasileiro, a nossa Constituição Federal e a Lei de Criação do SUS, que diz e estabelece textualmente que “A saúde é um direito de todos e DEVER DO ESTADO”.


Diante disto, lutar para que nossos governantes, principalmente os integrantes dos Poderes Legislativos e Executivos definam e implementem políticas públicas, universais e humanizadas, para que a população pobre, mais de 120 milhões de pessoas tenham garantido este direito `a saúde, de verdade e não apenas no papel. Não podemos continuar passivos, omissos diante do sucateamento e da corrupção que campeiam, impunemente, na saúde pública sob a alegação de que é preciso respeitar o teto dos gastos e o equilíbrio das contas públicas, simplesmente não constar dos orçamentos públicos recursos suficientes para o pleno atendimento da população, quando se refere `a saúde publica.


É muito importante a responsabilidade fiscal na gestão das instituições públicas, mas da mesma forma, não podemos deixar de lado a RESPONSABILIDADE SOCIAL, ou seja, os orçamentos públicos não podem ser secretos, para beneficiarem uma minoria, dos donos do poder, mas sim, públicos e contemplarem, de fato, as demandas e necessidades da população.


Não tem sentido que o Orçamento Geral da União destine, todos os anos, ao longo de décadas mais de 50% dos gastos públicos com pagamento de juros, amortização e “administração” da DÍVIDA PÚBLICA, que ao longo dos últimos 6 ou 7 anos, destinaram alguns trilhões de reais, que contribuíram para que o sistema financeiro e seus agentes fiquem a cada ano mais ricos, milionários e bilionários valores quase dez vezes mais do que os recursos destinados `a saúde pública que deve atender milhões de pessoas, principalmente as pobres que vivem na exclusão.


Nossa luta por SAÚDE PÚBLICA de qualidade, humanizada e implementada com ética e transparência,, eficácia e efetividade deve ser permanente, e esta luta deve ser também implementada pelos organismos de controle social como os Ministérios Públicos Federal e Estaduais, afinal, essas instituições são consideradas “os fiscais da Lei”, e existem para realmente fiscalizarem e responsabilizarem os demais organismos públicos que agem em desacordo com as Leis, principalmente, a nossa Constituição Federal.


Sobre o artigo que escrevi há poucos dias alusivo ao DIA MUNDIAL DO CÂNCER 2023, recebi diversas msg , inclusive uma solicitando-me se eu poderia agendar uma consulta, ante o que, informei que não sou médico , mas sim sociólogo e imagino que todas as pessoas precisam participar do despertar da consciência quanto `a necessidade de uma “educação para a saúde”, que possa representar a porta de entrada para os cuidados profissionais necessários e também o despertar da consciência de que como pessoas, cidadãos e cidadãs, temos o direito `a saúde, e em consequência, garantir nosso maior direito humano que é a VIDA. Recomendei, sugeri, que a pessoa procurasse alguma unidade de saúde pública e buscasse atendimento, pois isto é um direito de todas as pessoas.


Transcrevo uma das inúmeras msg recebidas, esta de uma amiga (virtual) psicóloga que, depois de ler o artigo, enviou-me sua reflexão que, julgo eu, possa também ser objeto da leitura de outras pessoas.


Segue a reflexão dessa minha amiga. “ Boa tarde, amigo! Obrigada por enviar seu texto. Estou me organizando por aqui e assim que conseguir ler conversamos e irei também lhe enviar meus textos por e-mail. Um forte abraço e uma boa semana!”


“Querido amigo, acabei de ler seu texto sobre o dia mundial do câncer. Fiquei bastante tocada com o tema pois fui acometida de um carcinoma de mama em 2006 aos 35 anos. E hoje estou viva graças à prevenção que me acompanha desde então. Em minha família muitas tias inclusive minha mãe, tiveram câncer de mama e faleceram pela doença. Por isso fico vigilante. Seu texto me chama muito a atenção por alertar sobre o aspecto multidimensional da abordagem sobre o cuidado e prevenção do câncer. Concordo enormemente com sua ideia de que justiça social deve ser o alicerce para a saúde pois isso engloba a conscientização acerca da prevenção mas também todo um cabedal de estruturas acolhedoras que precisam e devem existir quando se fala em saúde pública. Venho de família de uma classe social menos abastada e conheço os efeitos da injustiça social. Hoje, com meu trabalho, construí uma vida mais estabilizada para mim e me tocam as inúmeras atrocidades por falta de respeito à população. Seu texto é uma fotografia bem nítida dos problemas de saúde pública de nosso país. Você é um ser humano muito especial! Obrigada professor!”


São manifestações como esta que nos animam, mesmo com quase 81 anos, a continuar a escrever  semanalmente sobre temas variados, mas todos de cunho socioambientais e tão importante na atualidade mundial e brasileira.


Não ganho nada, financeiramente, com isso, apenas a certeza de que estou ajudando, de alguma forma, a despertar a consciência de que se nos omitirmos diante de tantas mazelas e desafios, com certeza os espíritos gananciosos e materialistas continuarão nadando de braçada e a pobreza, a miséria, a fome e a exclusão continuarão sendo esta grande e vergonhosa nódoa que tantos males continuam causando no mundo inteiro, inclusive em nosso Brasil.


De pouco adianta as pessoas se enrolarem na bandeira nacional e se auto denominarem “patriotas” se nada fazem para reduzir as desigualdades, a miséria, a opressão, a exclusão, o ódio, a violência e falta de acesso dos pobres `a saúde pública, que tantas vítimas continuam fazendo todos os dias em nosso país!

*Juacy da Silva, 80 anos, professor universitário aposentado UFMT. Sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

Terça, 07 Fevereiro 2023 14:17

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*



Quem não luta pelos seus direitos não é digno deles”. Rui Barbosa.

Todas as doenças merecem ser combatidas de forma efetiva, incluindo mudanças de hábitos perniciosos e estilo de vida que contribuem para o seu surgimento, quanto diagnósticos precoces, para que o tratamento seja corretamente recomendado por profissional da área específica e que o paciente tenha condições de realizar este tratamento, independente de sua renda ou disponibilidade financeira, pois a vida (lembrando que as doenças são formas de negação da vida) é um direito inalienável e garantido também pela nossa Constituição Federal de 1988 e por diversas outras Leis, cabendo ao Estado, ou seja, aos poderes públicos garantirem este direito a todas as pessoas em nosso país, e isto só é feito mediante saúde pública de qualidade, universal e, realmente, humana, sendo, realmente, prioridade quando da definição das políticas públicas, políticas de governo.

Lutar por saúde pública de qualidade, universal e humana é e deve ser uma luta continua e permanente da cidadania, que exige coragem e participação de todas as pessoas e não apenas de algumas organizações não governamentais ou do voluntariado.

Conforme informações contidas na página (Site) do INCA – Instituto Nacional do Câncer, o DIA MUNDIAL DO CÂNCER, que neste ano de 2023 será “comemorando” em 04 de FEVEREIRO, ou seja, neste sábado.

Esta data surgiu em 2005, como uma forma, um mecanismo, enfim, um instrumento para despertar tanto as pessoas, individualmente, quanto as entidades da sociedade civil organizada e, principalmente, as Instituições públicas, governamentais, em todos os níveis de poder, para despertar a consciência, a importância e a responsabilidade de todas as pessoas,  principalmente agentes públicos, governantes quanto `a necessidade de levarmos esta questão mais a sério Brasil.

Assim, informa o INCA,  “O Dia Mundial do Câncer, 4 de fevereiro, é uma iniciativa global organizada pela União Internacional para o Controle do Câncer (UICC) com o apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS). Tem como objetivo aumentar a conscientização e a educação mundial sobre a doença, além de influenciar governos e indivíduos para que se mobilizem pelo controle do câncer”.

Na verdade, esta data não é para ser “comemorada”, mas sim, que seja um sinal de alerta quanto aos cuidados que todos nós precisamos ter quanto `a prevenção, diagnóstico e tratamentos desta que é a segunda causa de morte no mundo.

Quando se fala em prevenção, na verdade estamos falando em estilo de vida, no controle de hábitos deletérios que “detonam” a saúde humana e, em relação ao câncer, conforme milhares de estudos tem demonstrando cada vez mais, tais hábitos maléficos e estilo de vida acabam estando associados ao surgimento de inúmeras doenças e isto está muito bem documentado em relação a todos os tipos de câncer.

Diferente do que se imaginava há décadas ou até mesmo mais de um século, os aspectos genéticos, inclusive a hereditariedade, não é uma sentença de morte que afeta milhões de pessoas, como se isto fosse uma “maldição. Estudos tem demonstrando que esses aspectos (genética e hereditariedade) representam em torno de um terço ou pouco mais, no surgimento do câncer, sendo, portanto quase dois terços associados a tais hábitos maléficos e estilo de vida que não levam em consideração a necessidade de cuidarmos melhor de nossa saúde.

Boa parte das doenças que acabam provocando a morte estão também relacionadas a fatores culturais, religiosos e tradições resistentes às mudancas de comportamento, o que é denominado de herança cultural.

De acordo com informações do Ministério da Saúde (do Brasil), tendo por base dados e estudos do INCA, da OMS -Organização Mundial de Saúde e a OPAS – Organização Pan americana de Saúde “Mais da metade de todos os cânceres são evitáveis com a adoção de um estilo de vida saudável e submetendo-se a exames de rotina., principalmente Câncer de mama, de próstata,  de pulmão, de colo do útero e colo retal e podem ser tratados com sucesso quando detectados precocemente”.

A chamada “educação para a saúde”, que na verdade é a forma mais eficiente, efetiva e eficaz de prevenção de todos os tipos de doenças, inclusive do câncer, deve ser promovida não apenas pelas instituições educacionais públicas e privadas, mas também estar na base quando da definição e implementação das políticas nacional, estaduais e municipais de saúde pública, bem como nas ações das diversas organizações não governamentais que defendem e lutam por uma saúde pública universal, de qualidade e realmente humana.

No triênio 2002 até 2024, o DIA MUNDIAL DO CÂNCER tem como tema geral “fechar a lacuna dos cuidados”, com ênfase na questão da necessidade de cuidados mais justos, considerando os níveis de pobreza e exclusão da grande maioria das pessoas, em torno de 80% da população brasileira que dependem apenas e tão somente dos serviços do SUS – Sistema Único de Saúde, para os cuidados, sejam de prevenção, diagnóstico e tratamento de inúmeras doenças, inclusive todos os tipos de câncer.

Assim, conforme destaca a rede de organizações não governamentais denominado de “Todos Juntos contra o Câncer”, que faz da luta contra esta terrível doença, sua missão e seus objetivos, ao enfatizar que “O Dia Mundial do Câncer de 2023 marca o segundo ano da campanha de três anos ‘Fechar a lacuna de cuidados’, que é centrada na questão da equidade e liderada pela Union for International Cancer Control”.

E vai mais além, quando enfatiza que no primeiro ano (2022) da campanha “Por cuidados mais justos” foi sobre entender e reconhecer as ‘iniquidades’ no tratamento do câncer em todo o mundo, inclusive no Brasil e seu impacto na saúde pública e nas taxas de mortalidade decorrentes do câncer.

E que agora em 2023, quando mais um dia de alerta e conscientização sobre o Câncer está em pauta, enfatiza que neste ano, mais do que nunca, principalmente pelos reflexos que a CONVID-19, o isolamento das pessoas impediram ou reduziram os atendimentos aos pacientes com câncer e diversas outras doenças, é preciso, é fundamental “unir indivíduos e organizações, defensores e formuladores de políticas públicas para exigir mudanças e agir com determinação e coragem”.

Trata-se também de celebrar o progresso do mundo real, não apenas em inovação e avanços médicos e hospitalares, mas até mesmo nas ações mais simples de solidariedade, que podem ter um impacto significativo: motivar os vizinhos a fornecer transporte para tratamento de câncer para um colega residente ou garantir que opções de alimentação saudáveis e acessíveis sejam oferecidas na escola local.

Quando se fala tanto em câncer quanto todas as demais doenças que afetam a vida do povo brasileiro, é fundamental que a questão da saúde pública, muito sucateada, sem os recursos humanos, tecnológicos, financeiros e orçamentários, necessários, mas bastante negligenciados nos últimos tempos, seja colocada realmente com um prioridades nas ações de governo, quando se trata de uma política pública que deve estar na base de uma melhor qualidade de vida, principalmente para as camadas pobres da população.

Não tem sentido falar em prevenção, diagnóstico e tratamento, principalmente da população pobre, excluída, desempregada ou subempregada que não tem sequer renda e recursos para comer, se alimentar, quanto mais para cuidados com a saúde e tratamentos das doenças e aquisição de remédio.

Como mulheres irão se prevenir contra o câncer de mama se não conseguem fazer exames de mamografia ou ginecológicos periódicos , quando com tanta frequência faltam mamógrafos e outros aparelhos e exames laboratoriais na saúde pública ou quando para conseguir uma consulta com um especialista nas instituições públicas (postos de saúde, policlínicas, UPAs ou hospitais) demoram meses ou até anos.

As vezes quando são “chamadas” para fazerem esses exames os agentes públicos acabam sabendo que a ou o paciente já faleceu, por incúria das instituições públicas, governantes e outros agentes públicos, de pouco adiantou, por exemplo, uma decisão judicial que garantia ao paciente o atendimento para salvar-lhe a vida, se tal decisão judicial simplesmente tenha sido ignorada pelo órgão Público responsável pelo cumprimento daquela decisão judicial.

Como as pessoas, homens e mulheres, podem realizar prevenção e diagnósticos de câncer colorretal, de pulmão, de próstata, do estômago ou outros órgãos internos do corpo ou leucemia, se não tem acesso aos exames necessários como colonoscopia, endoscopia ou exames de imagem e laboratoriais que, além de estarem ausentes nas pequenas e médias cidades, sem falar da precariedade, pior ainda, da saúde pública nas comunidades mais distantes e no meio rural.

Bem sabemos que os cuidados com a saúde, diagnósticos e tratamentos, principalmente para doenças crônicas, degenerativas, as vezes raras, complicadas como os vários tipos de câncer são extremamente onerosos, que, `as vezes, até os planos e seguros de saúde privados limitam esses atendimentos.

A realidade brasileira tem demonstrando que quando as pessoas, principalmente a população pobre e excluída, consegue ser atendida e realizar os diagnósticos de doenças como o câncer, após meses ou anos nessas filas vergonhosas, virtuais ou físicas, que caracterizam a saúde pública (SUS), o inicio do tratamentos demora e, em relação aos vários tipos de câncer, principalmente câncer de pulmão, o tempo é um fator primordial, repetindo, após o diagnóstico a demora em iniciar e dar continuidade ao tratamentos é crucial e pode ser um sentença de morte para o paciente. Isto é muito triste e revoltante, mas não sensibilizada nem o famoso “mercado” que só se preocupe com taxas de juros, lucros e acumulação de capital e boa parte dos governantes que continuam cortejando os eleitores, de quatro em quatro anos, inclusive parentes e familiares de pessoas que morreram por falta de atendimento.

Outro problema é que o custo de tratamento do câncer é elevado  e por falta de meios e recursos, e também pelo abandono e sucateamento do SUS, com frequência os pacientes com câncer ou outras doenças precisam servir-se da Justiça (via defensoria pública, pois quem é pobre nem recursos financeiros para custear um advogado não tem) para garantir seus direitos, inclusive e principalmente, O DIREITO `A VIDA, conforme estabelece Constituição Federal: “Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

O artigo quinto da Constituição Federal de 1988, a chamada Constituição Cidadã, em seu artigo quinto estabelece de forma clara que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade …”

Muita gente, inclusive governantes e seus seguidores, como temos visto ultimamente, falam o  tempo todo nas garantias individuais, destacando a liberdade, a propriedade que estão ameaçadas pelo comunismo e nesta defesa cometem atos terroristas, depredam o patrimônio público, tramam golpe de estado, com o objetivo de implantarem sistemas autoritários e totalitários de governo, tramam contra as Instituições nacionais, contra a democracia e o estado democrático de direito, mas pouco falam e lutam pela vida.

O obscurantismo, o negacionismo, a difusão de notícias falsas, mentirosas, as chamadas “fake news” durante o período da pandemia do coronavírus (covid-19) foram responsáveis pela morte de quase 700 mil pessoas em nosso país, além de milhares com câncer que tiverem seus tratamentos ou busca por diagnóstico de câncer postergados, acarretando também milhares de mortes evitáveis.

Pela precariedade em que se encontram as políticas de saúde pública e as deficiências estruturais e falta de recursos orçamentários para a saúde pública em todos os níveis, além da corrupção que continua presente, lamentavelmente, nesta área é a demonstração cabal de que nossos governantes fazem falsos discursos em defesa da saúde pública, mas agem completamente distantes tanto do que estabelecem a nossa Constituição Federal e outras leis, que tratam da garantia e defesa da vida humana.

Com certeza nossos governantes, com raras exceções, só são solidários com a miséria humana em que vive a maior parte da população brasileira apenas da boca para fora, principalmente porque não sofrem  tanto quando algumas doenças, inclusive lhes afetam ou aos seus familiares, afinal, não precisam entrar nas filas físicas e virtuais do SUS, passarem por humilhações, pois o contribuinte garante seus privilégios e regalias, através de planos  especiais de saúde, para buscarem atendimento, diagnóstico e tratamentos em hospitais de primeira linha, alguns em que as diárias custam diversas vezes o salário mínimo de fome, rendimento menor do que isto ou até sem nenhuma renda para fazer face a todas as necessidades de uma família inteira.

Por essas e tantas outras razões é que nesses dias especiais, como o Dia Mundial da Saúde (07 Abril próximo), Dia Mundial do Câncer, e tantos meses com ênfase a cores diferentes, amarelo, verde, rosa, roxo, azul voltados para despertar a consciência popular e nacional sobre importância de cuidarmos melhor de nossa saúde, é fundamental que também coloquemos neste contexto a questão da saúde pública, como prioridade para que o SUS, em nome do Estado Brasileiro, cumpra com o mandamento constitucional de defesa da vida.

Que tal a gente refletir neste 04 de fevereiro de 2023 sobre o tema CÂNCER e Saúde pública, em cada município, em cada estado e no Brasil inteiro, esta é a questão de fundo neste despertar de consciência coletiva.

Dialogando com um professional da saúde há algum tempo, sobre a vergonha que é a precariedade da saúde pública no Brasil, por acaso surgiu a questão do câncer e aquele professional, competente, que atendia na saúde pública e não tinha a medicina apenas como uma forma de ganhar um bom dinheiro e talvez até ficar rico se atendesse apenas a camada mais abastada da população dizia, no caso do câncer de mama, que continua matando dezenas de milhares de mulheres todos os anos  no Brasil, repito, dizia ele “ é importante estimular as mulheres a fazerem o autoexame, apalpar seus seios, identificar nódulos; mas só isso não é suficiente”.

Prosseguindo, dizia este meu amigo, “muitas mulheres identificam nódulos e ai bate o desespero das mesmas e de suas familiares, pois por serem pobres dependem apenas do SUS e quando procuram a saúde pública não conseguem atendimento para, de fato, realizaram um diagnóstico correto e definitivo, muitas vezes naquela região o SUS não tem médico especializado, não tem mamógrafo ou o mamógrafo está estragado”’, e completava, “esta é a realidade que tanto angustia profissionais de saúde que um dia juraram defender, de fato, a vida e fazem da saúde pública seu ideal professional”.
Apenas algumas informações para demonstrar a importância dessa discussão, reflexão. O câncer é a segunda causa de morte no mundo, responsável por 10,1 milhões de mortes por ano. Sendo os principais tipos, pela ordem de óbitos: Câncer de mama, de pulmão, colorretal, próstata, pele (não melanoma) e estômago.

Cabe ressaltar que por ano ,no mundo, surgem mais de 400 mil casos de câncer em crianças e adolescentes e entre adultos 18,6 milhões de novos casos também são diagnosticados a cada ano, sendo 9,8 milhões entre homens e 8,8 milhões entre mulheres.

Estudos, pesquisas bem fundamentadas por diversas instituições no Brasil e em outros países tem demonstrando que apesar dos avanços científico, tecnológico e na indústria farmacêutica, voltados para a prevenção, diagnóstico e tratamento de diversas doenças, a incidência do câncer continua avançando mundo afora e no Brasil este cenário não é diferente.

O INCA projeta um cenário de que até 2025, ou seja, dentro de três anos, incluindo este que mal se iniciou, no Brasil, a cada ano serão diagnosticados nada menos do que 704 mil novos casos de câncer, com destaque para os casos de câncer de próstata entre os homens, de mama entre as mulheres e câncer colorretal e de pulmão tanto entre homens quanto mulheres.

Notícia, reportagem publicada pelo Jornal O Estado de São Paulo, em 27 de Julho de 2021, é um alerta quanto ao desafio que o câncer representa no Brasil. “O número de brasileiros que morreram de câncer aumentou 31% de 2010 a 2019- foi um salto de 178.990 para 235.301. Os dados, tabulados pelo Estadão a partir do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, mostram que os tumores com maior número de vítimas no País foram os de pulmão, intestino e mama”. Ou seja, a cada década mais de 1,3 milhões de pessoas morrem por câncer no Brasil e esses números tendem a aumentar, tornando-os uma verdadeira tragedia nacional.

Com certeza as pessoas diante desses números e deste cenário podem estar se perguntando sobre as razões dessas projeções nada animadoras. As respostas vem de alguns especialistas renomados na área de oncologia e para as quais devemos estar bem atentos e para embasar nossas ações e nossa luta contra todos os tipos de câncer.

O aumento de casos de câncer na população brasileira é multifatorial. Além do próprio aumento populacional em uma década, temos também o envelhecimento da população, o aumento de forma exponencial da obesidade, o aumento da incidência de doenças crônicas, além de maior sedentarismo da população e exposição a mais fatores de risco, como tabaco e álcool. O consumo excessivo de gorduras saturadas e produtos industrializados que se tornaram mais acessíveis à nossa população também influencia’, diz o cirurgião oncológico Gustavo Cardoso Guimarães, diretor do Instituto de Urologia, Oncologia e Cirurgia Robótica, que também atua como coordenador dos departamentos cirúrgicos oncológicos da Beneficência Portuguesa de São Paulo”.

Outro alerta que não podemos ignorar, vem de outra professional da área, oncologista da clínica Onco Star e do Hospital São Luiz Itaim, da Rede D’Or São Luiz, a médica Maria Del Pilar Estevez reforçando o argumento de que deve-se acrescentar à lista de fatores que explicam o aumento dos casos de câncer ‘a crescente urbanização, com mudanças do estilo de vida, como sedentarismo e obesidade, além da maior exposição a carcinógenos’. Estudos mostram, por exemplo, que a poluição do ar, (que é responsável por mais de sete milhões de mortes por ano no mundo) muitas vezes ignorada, pode contribuir para o desenvolvimento dos tumores. Além do uso de fungicidas, herbicidas e pesticidas; agrotóxicos que contaminam os alimentos e estão associados ao surgimento de alguns tipos de câncer.

O rastreamento do câncer, segundo Maria Del Pilar, é outro gargalo que precisa ser enfrentado, para que os casos possam ser tratados mais cedo, em última análise, a politica adotada principalmente pelo SUS é aguardar que a população (geralmente pobre) procure os serviços de saúde seja de forma rotineira ou em casos em que a doença já está instalada, quando o tratamentos torna-se bem menos efetivo do que se fosse realizado de forma preventiva.

Finalmente, uma última palavra, da mesma forma que o combate `a fome não pode ficar restrito `as ações assistencialistas, motivadas pela solidariedade das pessoas e das organizações não governamentais, que, diga-se de passagem, são meritórias, principalmente ante a omissão das instituições públicas e governantes insensíveis, corruptos e demagogos, é necessário, é fundamental, imperioso que a população lute para que a saúde pública seja dotada de recursos técnicos, tecnológicos, financeiros, orçamentários e humanos, capaz de atender `as demandas do povo, principalmente, das camadas pobres e excluídas, cumprindo, integralmente o que consta da Constituição Federal e do ordenamento jurídico que garante a todas as pessoas os direitos humanos fundamentais, a começar pelo DIREITO `A VIDA, para todos e não apenas para quem tem dinheiro para fazer face ao desafio de encarar doenças terríveis, como o câncer.

Este é o sentido e a reflexão que devemos fazer sempre, principalmente, neste DIA MUNDIAL DO CÂNCER.

*JUACY DA SILVA, 80 anos, professor titular aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy

Terça, 20 Dezembro 2022 10:12

 

 

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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.

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JUACY DA SILVA*
 


O Papa Bento XVI em seu discurso perante o Corpo Diplomático acreditado junto ao Vaticano, em 08 de Janeiro de 2007, assim dizia “É preciso, de forma urgente, eliminar as causas estruturais das disfunções da economia mundial e corrigir os modelos de crescimento econômico que parecem incapazes de garantir o respeito ao meio ambiente”.


O Papa Francisco, poucos anos após o inicio de seu Pontificado publicou a Encíclica Laudato Si, unificando diversos fragmentos do pensamento da Igreja (Católica) quanto `a necessidade de um melhor cuidado com a Casa Comum sob um novo paradigma que é a Ecologia Integral.


Publicada em 24 de maio de 2015, a Laudato Si insere-se e enriquece a Doutrina Social da Igreja e orienta tanto católicos quanto evangélicos e não cristãos quanto `a importância desse cuidado, dentro do contexto de que “tudo está interligado, nesta Casa Comum”, por isso sua atualidade até os dias de hoje.


No item 3, sobre a Perda da biodiversidade Francisco deixa claro que “Os recursos da terra estão sendo depredados também por causa de formas imediatistas de entender a economia e a atividade comercial e produtiva. A perda de florestas e bosques implica, simultaneamente, a perda de espécies que poderiam  constituir, no futuro, em recursos extremamente importantes, não só para a alimentação, mas também para a cura de doenças e vários serviços….Neste  sentido, o custo dos danos provocados pela negligência egoísta (e exploração predatória dos recursos naturais) é muitíssimo maior do que os benefícios econômicos que se possa obter”.


Podemos também perceber esta mesma preocupação nas palavras do Secretário Geral da ONU, António Guterres, na abertura da COP-15, no último dia 07 deste mês de dezembro de 2022 “Mais da metade do PIB global, o equivalente a US$ 41,7 trilhões, depende de ecossistemas saudáveis. Bilhões de pessoas, em nações desenvolvidas e em desenvolvimento, se beneficiam diariamente da natureza e produtos que ela proporciona, incluindo alimentos, energia, materiais, medicamentos, recreação e muitas outras contribuições vitais para o bem-estar humano. Ecossistemas saudáveis também são fundamentais para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e limitar o aquecimento global a 1.5°C, no entanto, é provável que a mudança climática se torne um dos maiores motores da perda de biodiversidade até o final do século”.


Podemos também asseverar que a perda/destruição da biodiversidade tem um impacto significativo e grave nas mudanças climáticas e no aquecimento global. É o verso e o reverso da mesma moeda. Apesar disso, parece que a questão da destruição acelerada da biodiversidade não tem tido a mesma preocupação como tem acontecido com as mudanças climáticas, lamentavelmente.


Enquanto a maior parte do planeta não tirava e continua não tirando os olhos dos jogos da copa do mundo de futebol que está sendo realizado no Catar; enquanto no Brasil os bolsonaristas continuam acampados em frente aos quartéis ou promovendo arruaças nas rodovias, ruas, avenidas, atentando contra a democracia e as Instituições nacionais, depredando bens públicos e privados, cerceando a liberdade de ir e vir das pessoas, teimando em não aceitar a derrota que os eleitores impuseram `a extrema direita; enquanto a Guerra absurda que a Rússia promove contra a Ucrânia, tentando destruir totalmente aquela país; enquanto os conflitos armados em países Africanos, Asiáticos e do Oriente Médio continuam ceifando milhares de vidas e fazendo vítimas todos os dias; quase que anonimamente representantes de centenas de países e milhares de ambientalistas estão reunidos desde o último dia 07 deste mês de Dezembro de 2022, em Montreal, no Canadá, para discutir, avaliar e definir estratégias, planos e ações para combater a destruição acelerada da biodiversidade em todos os continentes e países, inclusive no Brasil.


Esta é a COP-15, a Conferência Mundial em Defesa da Biodiversidade que deverá se encerrar na próxima segunda feira, dia 19 , um dia após o Mundo já ter um novo Campeão Mundial de Futebol. Parece que “pão e circo” sempre tem tido um apelo muito maior na consciência coletiva do que problemas graves, como as mudanças climáticas, a degradação do planeta e a destruição acelerada da biodiversidade e o risco de desaparecimento de todas as formas de vida no planeta, inclusive da vida humana.


Há pouco mais de 30 anos, na Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro, a ECO-92, entre 03 e 14 de Junho de 1992, quando uma das decisões mais importantes, senão a mais importante, foi a aprovação por quase a totalidade das Delegações dos países presentes àquela Conferência de uma Resolução que instituiu a Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica ou Biodiversidade, que entrou em vigor em 29 de Dezembro de 1993, tendo sido ratificada até o momento por mais 185 países e territórios, inclusive o Brasil, com exceção dos EUA e de alguns poucos países mais.


Para nortear as discussões e reflexões dos participantes da COP-15 e também da população mundial em geral, os diversas estudos e relatórios da ONU e outras organizações nacionais e internacionais apontam as principais causas da destruição da biodiversidade: degradação dos ecossistemas e dos “habitats”/territórios das várias espécies animais e vegetais; exploração excessiva e predatória dos recursos naturais terrestres, marítimos, lacustres e ribeirinhos; avanço de espécies invasoras e de doenças que afetam a biodiversidade; poluição dos solos, das águas e do ar, principalmente pelo uso abusivo/exagerado de agrotóxicos, pesticidas e outros produtos tóxicos; mudanças climáticas que aumentam a incidência de desastres naturais como chuvas torrenciais; desabamento de encostas, inundações, maremotos, furacões; secas prolongadas, falta de saneamento básico e destinação incorreta de rejeitos (lixo); consumismo e o desperdício que estimulam o uso super intensivo e incorreto dos recursos naturais dentre outras.


Desde a ECO-92 até o presente a ONU vem realizando um grande esforços, emitindo alertas através de relatórios de milhares de cientistas, estudiosos das questões socioambientais. Centros Nacionais e Internacionais de pesquisas tem demonstrando de maneira cabal que o mundo está caminhando aceleradamente para um grande desastre já bem conhecido colocando em risco todas as formas de vida no planeta, inclusive a vida humana.


Esses esforços podem ser observados no estabelecimento dos Objetivos do Milênio (2000); nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável em 2015 (a chamada Agenda 2030), as Conferências do Clima, o protocolo de Kyoto; a Convenção de Paris sobre as mudanças climáticas (2015), a Década da Proteção da Biodiversidade (2011 – 2020); a Década da Recuperação dos Ecossistemas Degradados ( 2021 -2030); a Década de Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável ou a chamada Década dos Oceanos, que foi aprovada em 2017 e que deve vigorar de 2021 até 2030.


Diversas outras iniciativas tem sido tomadas pela ONU quando aprovou em 2007 o ano internacional do Planeta terra; 2010 Ano Internacional da biodiversidade;  2011 como Ano Internacional das florestas;  2015 como o Ano Internacional dos Solos, como forma de combater tanto as mudanças climáticas quanto para reduzir a destruição da biodiversidade resultante da degradação e destruição de dezenas de milhares de espécies vegetais e animais em  mais de 520 milhões de ha de terras antes agricultáveis.


Neste sentido a Sociedade Brasileira para a Ciência dos Solos vem alertando para os riscos da degradação dos solos quando, em Janeiro de 2015, enfatizava que “A degradação do solo é reconhecida como componente de risco para manutenção da vida no planeta. Enquanto isso, o aumento da população implica em maior demanda por alimentos e matéria prima vegetal e animal. Depara-se assim com o dilema de, ao mesmo tempo, produzir alimentos, reduzir os impactos ambientais causados pelo uso intensivo (e irracional) do solo, recuperar grande parte dos recursos naturais já degradados e, ainda, preservar os sistemas naturais remanescentes”.


Todas essas iniciativas tem como objetivo despertar a consciência da população mundial e também dos diversas governos nacionais, regionais e locais sobre aspectos importantes relacionados com a questão ambiental/recursos naturais e sua importância para a vida humana. Apelo este que, lamentavelmente, parece não estar ainda despertando o interesse e a consciência coletivo da humanidade.


Quando cientistas e a própria ONU alertam para a questão das mudanças de uso dos solos e a degradação de milhões de hectares (ha) a cada ano, incluem-se neste aspecto também o desmatamento, as queimadas e a erosão, que destroem de forma grave tanto a biodiversidade vegetal quanto animal, como tem ocorrido com frequência em todos  os ecossistemas ao redor do mundo, inclusive, nos seis Biomas brasileiros, com ênfase maior quanto a este processo de destruição irracional no Pantanal, na Amazônia e no Cerrado, além da Caatinga, dos Pampas e da Mata Atlântica, esses três últimos, que estão praticamente destruídos, cuja recuperação se torna quase impossível ante a destruição de uma, outrora, rica biodiversidade.


Mesmo assim o Brasil ainda ocupa em termos globais o topo do “ranking” mundial quanto ao tamanho e variedade da biodiversidade tanto vegetal quanto animal, razão pela qual é visto como um ator fundamental nesta cruzada internacional para salvar o que ainda resta de vida terrestre e aquática (lacustre, ribeirinha e marinha) do planeta.


Quando da aprovação pela Assembleia Geral da ONU declarando  a Década da Proteção da Biodiversidade a ser observada entre 2011 e 2020, foram estabelecidos os seguintes objetivos e metas: 1) despertar e aumentar a consciência mundial quanto `a importância da biodiversidade no planeta; 2) defender uma maior integração de esforços quanto aos valores da biodiversidade; 3) reformar e aumentar os incentivos para que a biodiversidade seja protegida; 4) produção e consumo responsáveis e sustentáveis ( combater o consumismo e o desperdício que induzem `a destruição dos recursos naturais); 5) redução de 50% das perdas/destruição da biodiversidade; 6) gestão sustentável dos recursos aquáticos (rios, lagos e oceanos); 7) agricultura, aquicultura e silvicultura sustentáveis; 8) reduzir os níveis de contaminação dos solos, do ar e das águas por pesticidas e agrotóxicos; 9) prevenção e controle das espécies invasoras; 10) redução dos níveis de vulnerabilidade dos ecossistemas `as mudanças climáticas; 11) aumentar e melhorar o cuidado com as áreas protegidas; 12) redução dos riscos de extinção das espécies animais e vegetais (terrestres, lacustres, ribeirinhas e marítimas); 13) salvaguarda da diversidade genética; 14) estimular os serviços dos ecossistemas; 15) restauração e resiliência dos ecossistemas (objeto novamente que deu origem à Década da Restauração dos Ecossistemas Degradados, já mencionada anteriormente nesta reflexão); 16) acesso amplo dos países aos recursos genéticos e participação em seus benefícios; 17) estratégias e planos nacionais, regionais e locais e ações visando a proteção da diversidade biológica/biodiversidade; 18) catalogar e valorizar o conhecimento sobre a biodiversidade 19) intercâmbio de informações e conhecimento sobre a biodiversidade e, finalmente, 20) mobilização mundial de recursos de todos os tipos e fontes, para combater a perda/destruição da biodiversidade.


Concluída a Década Mundial de Proteção da Biodiversidade, a ONU, através de suas diversas agências especializadas e com a participação dos países membros, realizaram uma avaliação quanto aos objetivos  e metas estabelecidas e, LAMENTAVELMENTE, a conclusão é que quase nada ou poucas conquistas ocorreram, ou seja, o mundo continua destruindo implacavelmente a biodiversidade e degradando todos os ecossistemas, de uma forma quase que irrecuperável e  a custos bilionários ou trilionários.


Durante os dez anos da Década Mundial de Proteção da Biodiversidade só o desmatamento destruiu em torno de 100 milhões de ha de florestas e nada menos do que 420 milhões de ha entre 1990 até 2020. De acordo com dados da ONU de 2020, só esta área destruída nesses ecossistemas abrigavam a maior parte das espécies do planeta, com cerca de 60 mil espécies de árvores, 80% de todos os anfíbios, 75% das aves e 68% dos mamíferos.


Não podemos também esquecer que a poluição dos oceanos contribuir significativamente para a destruição da biodiversidade marinha. Por ano mais de 30 milhões de toneladas de lixo são carregadas para os oceanos, sendo que 80% deste lixo são os plásticos. Este cenário pode triplicar até 2040, cujo custo anual passaria de US$15,0 bilhões para mais de US$100.0 bilhões.


Constatou-se que praticamente todos os países ficaram muito aquém de atingir os objetivos e metas estabelecidos e aceitos na forma de compromissos soberanamente firmados e ratificados, ou seja, os acordos e decisões das Assembleias Gerais da ONU tem sido meros documentos assinados e ratificados, sem que os mesmos sejam cumpridos, resumindo: letra morta e discursos demagógicos em fóruns internacionais  para alimentar o noticiário e manipular a opinião pública nacional e internacional, como vimos recentemente por ocasião da COP 27 no Egito.


Em termos globais, tendo o ano de 1970 como parâmetro temporal, até 2020 foi constatada que as perdas/destruição da biodiversidade são alarmantes: a fauna marinha, lacustre e ribeirinha 83%; a biodiversidade terrestre também caminha na mesma direção, em todos os continentes: Ásia/Pacífico 55%; África 66%; América Latina e Caribe 94%; Europa/Ásia Central 18%, Estados Unidos 20%, do total de biodiversidade que existia em 1970. Vale destacar que a destruição da biodiversidade tanto na Europa quanto nos EUA já em 1970 tinha atingido níveis alarmantes e até mesmo catastrófico.


O relatório da ONU que avaliou o cumprimento dos objetivos e metas do Acordo de 2010, deixa claro que atualmente mais de um milhão de espécies animais e vegetais correm o risco de serem extintos,  desaparecerem dentro de poucas décadas, como aconteceu na Era dos Dinossauros.


O mundo já perdeu dezenas ou centenas de milhares de espécies animais e vegetais, incluindo mais de 50% de todos os corais e nos ecossistemas terrestres continua desmatando e queimando em torno de dez milhões de hectares por ano, 95% desta destruição ocorrem nos países tropicais, onde estão concentrados mais de 70% de toda a biodiversidade planetária, mas continuam utilizando este processo para produção e exportação de “commodities” principalmente para atender suas metas de exportação e ao  consumo dos países ricos, que, indiretamente são  parceiros desta destruição irracional e contribuem para que as atuais gerações deixem para as próximas um passivo ambiental imenso, impagável de destruição, sofrimento e morte.


Os interesses econômicos e financeiros imediatos, a busca do lucro, cada vez mais gananciosa e a acumulação de renda, riqueza e poder continuam falando mais alto do que o compromisso de governos  nacionais, regionais ou locais em participar dos esforços coletivos para evitar o desastre anunciado que são as mudanças climáticas e a destruição da biodiversidade, o que colocará a humanidade, principalmente as próximas gerações , diante de desafios mais prementes, mais , mais onerosos e com maior poder de destruição.


Por isso, a realização da COP 15, que termina na próxima  segunda feira, 19 de dezembro de 2022, no Canadá, um dia após a final da Copa do Catar, está sob ameaça de fracasso, tendo em vista que seu objetivo fundamental é definir um acordo internacional, à semelhança do Acordo de Paris, com objetivos e metas concretas para nortearem o estabelecimento de políticas, estratégias, planos, projetos e ações dos países, em seus diversas níveis de governo: nacional/federal; regionais/estaduais e locais/municipais, bem como definir formas como a iniciativa privada, os agentes econômico, o famoso mercado, os setores produtivos e a sociedade em geral (população) também participem deste esforço coletivo, a vigorar de 2023 até 2032; coincidindo praticamente com a Agenda 2030, quando o mundo, se honrar seus compromissos acordados em 2015, deverá atingir todos os ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e suas metas, vários dos quais estão direta ou indiretamente vinculados tanto ao combate das mudanças climáticas quanto ao combate `a destruição da biodiversidade.


Neste sentido, em seu discurso na Abertura da COP-15, há poucos dias em Montreal, Canadá, o Secretário Geral da ONU, António Guterres tornou a enfatizar os alertas que vem fazendo há alguns anos quanto a importância e urgência das questões socioambientais e disse textualmente “o planeta não pode continuar sendo a lixeira e a latrina da humanidade, algo tem que mudar e mudar com urgência”.


Oxalá, que para além de pão e circo e dos conflitos políticos e ideológicos que estão a cada dia mais se acirrando no Brasil, o próximo governo (Lula) a ter inicio a partir de Janeiro próximo (dentro de poucos dias), coloque, de fato as questões socioambientais/ecologia integral como uma de suas reais prioridades, considerando, principalmente que são as camadas pobres, excluídas que acabam pagando a conta da degradação dos ecossistemas, da destruição da biodiversidade e das mudanças climáticas. A conferir!


*Juacy da Silva, professor titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Instagram @profjuacy