Sexta, 08 Março 2024 14:21

 

O golpe que instalou a ditadura empresarial-militar no Brasil completa 60 anos no próximo dia 31 de março. Nessa terça-feira (5), o Conselho Universitário (Consun) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) decidiu, por unanimidade, cassar os títulos de Doutor Honoris Causa dos ditadores Jarbas Gonçalves Passarinho e Emílio Garrastazu Médici. A cassação representa uma reparação histórica e mais um passo para estabelecer a verdade e a memória sobre o impacto do regime ditatorial nas universidades federais.

Consun da UFPel decidiu, por unanimidade, cassar os títulos de Doutor Honoris Causa dos ditadores Jarbas Passarinho e Emílio Médici.
Foto: Arquivo / Adufpel SSind.

A Comissão para Implementação de Medidas de Memória, Verdade e Justiça (CMVJ) da UFPel analisou, de maio a setembro de 2023, a conveniência e os motivos que levaram à concessão dos títulos à época da repressão. A CMVJ foi criada após o Ministério Público Federal (MPF) solicitar esclarecimentos à instituição sobre as ações voltadas à memória do período da ditadura e questionar se a UFPel havia concedido honrarias ou títulos honoríficos a pessoas vinculadas ao regime militar. A CMVJ irá implementar outras medidas voltadas à memória, à verdade e à justiça, sobre a perseguição a professores, professoras, técnicas e técnico-administrativos e estudantes.

Diversas universidades do país passaram a criar Comissões da Verdade, a partir do trabalho da Comissão Nacional da Verdade (2012 a 2014), o que já resultou na revogação de outros títulos Honoris Causa concedidos a ditadores, como é o caso da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que também cassaram o título dado ao coronel Passarinho.

Emílio Garrastazu Médici foi general do exército e ex-presidente da República (1969 a 1974). Durante seu governo, o regime militar atingiu o auge da repressão e violência, com controle das atividades políticas, proibição de opiniões contrárias ao sistema, reforço à censura, às instituições civis, torturas, desaparecimentos e assassinatos. Jarbas Passarinho foi coronel do exército, participou da articulação do golpe de 64 e foi autor da conhecida declaração de apoio ao AI-5. Atuou em diversos cargos no período: governador do estado do Pará, ministro do Trabalho, da Educação, da Previdência Social e da Justiça, além de presidente do Senado Federal.

Foto: Arquivo / Adufpel SSind.

Comissão da Verdade da Adufpel SSind.

A Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas (Adufpel-SSind) também criou uma Comissão da Verdade, em 18 de maio de 2023. A medida, aprovada em assembleia geral, tem o objetivo de fazer um levantamento e denunciar os impactos dos fatos perpetrados contra as e os docentes durante a ditadura empresarial-militar, além de trabalhar para a cassação de títulos Honoris Causa concedidos a ditadores. O Grupo de Trabalho de História do Movimento Docente (GTHMD) da Seção Sindical também foi reativado no ano passado. 

42º Congresso aprova ações do GTHMD nas seis décadas de ditadura

O 42º Congresso do ANDES-SN, realizado de 26 de fevereiro a 1º de março, aprovou que o Grupo de Trabalho História do Movimento Docente (GTHMD) realize, ainda no primeiro semestre deste ano, o Seminário "60 anos do Golpe de Estado de 1964 - Memória, Verdade, Justiça e Reparação". Também foram aprovadas oficinas e espaços práticos de formação, criação de comissões da verdade e desomenagens a perpetuadores de crimes, defensores e cúmplices da ditadura, além da retirada de homenagens a personagens escravocratas e conservadores.

Também foi aprovado reivindicar, do governo federal e das Reitorias, a criação de um lugar de memória sobre a ditadura, assim como a criação de um espaço de homenagem dentro do Espaço de Memória do ANDES-SN, na sede do Sindicato, para aprofundar os estudos e debates para a criação de um Memorial em homenagem às e aos docentes e todas e todos os exilados, presos, assassinados e desaparecidos pelo regime ditatorial e as e os vitimados pelas inúmeras formas de violência e repressão, com destaque às e aos docentes negros, indígenas, ciganos, LGBTQIA+. Saiba mais.

Fonte: Adufpel SSind., (com edição e inclusão de informações do ANDES-SN)

Quinta, 28 Setembro 2023 13:49

 

 

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A Comissão para Implementação de Medidas de Memória, Verdade e Justiça na Universidade Federal de Pelotas (CMVJ) finalizou, na primeira semana de setembro, o relatório de recomendações para a cassação dos títulos de Honoris Causa concedidos pela instituição a pessoas que fizeram parte do núcleo central da ditadura empresarial-militar brasileira, autoras direta ou indiretamente de graves violações de direitos humanos no decorrer do período entre 1964 e 1985.

 

A Comissão foi formada após o envio de um memorando do Ministério Público Federal (MPF) para a instituição no final do ano passado, no qual pedia esclarecimentos sobre o que a Universidade tinha realizado até então de ações voltadas à memória do período da ditadura e se havia concedido honrarias ou títulos honoríficos a pessoas vinculadas ao regime para, sendo o caso, justificar o que seria feito a partir disso. 

 

Durante quatro meses, de maio a setembro deste ano, o grupo ficou responsável por fazer uma análise profunda da conveniência e dos motivos que levaram à concessão dos títulos, quase 60 anos após o golpe que deu origem à ditadura no Brasil e em um cenário marcado por medidas semelhantes em outras instituições de ensino superior. 

 

Os trabalhos da Comissão originaram um documento que foi entregue à reitoria, recomendando a cassação dos títulos de Honoris Causa de Jarbas Gonçalves Passarinho e Emilio Garrastazu Médici. Além disso, segundo o professor do Departamento de Sociologia e Política e presidente da CMVJ na UFPel, Carlos Artur Gallo, foi recomendado que a Universidade tente implementar outras medidas voltadas à memória, à verdade e à justiça, pois não há informações precisas sobre todas as pessoas atingidas pela repressão, nem dados compilados sobre estudantes perseguidos e até mesmo desligados. 

 

Conforme avalia Gallo, a Comissão dialoga com os acontecimentos recentes, de tentativa de golpe de Estado e uma conjuntura política tumultuada, e também serve para sinalizar, hoje, o que se espera em termos de universidade pública, democracia e direitos humanos.

 

Próximos passos

 

O relatório já foi entregue ao gabinete da reitoria e circula entre os departamentos antes de ser apreciado pelas instâncias superiores da UFPel: Conselho Diretor da Universidade Federal de Pelotas (Condir) e Conselho Universitário (Consun).

 

“Elas [instâncias] vão avaliar o documento que produzimos e, quando se reunirem, provavelmente mais para o final deste ano, vão se pronunciar a respeito das nossas recomendações, seja votando e aprovando ou seja também rechaçando elas pelos motivos que acharem convenientes, porque isso não compete a nós como Comissão. Claro, nós fizemos as recomendações e gostaríamos que elas fossem atendidas, mas não temos nenhuma prerrogativa e não é uma decisão vinculante a nossa”, explicou Carlos Gallo. 

 

 

Reparação histórica 

 

De acordo com o professor, a universidade pública tem o dever de resguardar os valores que a própria sociedade quer ver alcançados. “Se nós defendemos discursivamente democracia e direitos humanos, não podemos ser coniventes com a manutenção de uma homenagem que é destinada a pessoas que são responsáveis por violações”. 

 

Ele reforça a importância do papel desempenhado pela Comissão em um momento tão emblemático. “Fico bastante orgulhoso de ter podido fazer parte da equipe que trabalhou a respeito desse tema e de podermos fazer essa recomendação para as instâncias superiores da Universidade, sobretudo porque estamos há poucos meses dos 60 anos do golpe de 64. Inclusive é simbólico. A Universidade Federal de Pelotas terá essa oportunidade histórica de poder se manifestar”. 

 

Nomes para cassação 

 

O relatório aponta dois nomes de ditadores para a cassação dos títulos: Jarbas Gonçalves Passarinho e Emilio Garrastazu Médici.

 

O coronel Passarinho participou da articulação do golpe de 64 e foi autor da conhecida declaração de apoio ao AI-5, considerado o mais duro instrumento de repressão da Ditadura, do qual foi um dos 17 signatários. Foi governador do Estado do Pará, ministro do Trabalho, da Educação, da Previdência Social e da Justiça, além de presidente do Senado Federal. 

 

Emilio Garrastazu Médici foi o 28º Presidente do Brasil, o terceiro do período da ditadura brasileira, entre 30 de outubro de 1969 e 15 de março de 1974. Ao longo do seu governo, o regime militar atingiu seu pleno auge, com controle das poucas atividades políticas toleradas, proibição da manifestação de opiniões contrárias ao sistema, repressão e reforço à censura às instituições civis. Foi um período marcado pelo uso sistemático de meios violentos como tortura e assassinato. Seu período na presidência ficou conhecido historicamente como “Anos de Chumbo”.

 

Indicação segue modelo de outras instituições

 

A partir do trabalho da Comissão Nacional da Verdade, órgão temporário que funcionou de 2012 a 2014, diversas universidades do país passaram a criar Comissões da Verdade ou outros tipos de mecanismos e grupos de trabalho voltados a lidar com o tema da memória da ditadura. 

 

O objetivo foi o de mapear os impactos do regime às instituições superiores de ensino e seus docentes, técnico-administrativos e discentes, que foram perseguidos, vigiados, presos, mortos, privados de seu trabalho, proibidos de se matricularem e até mesmo de realizarem pesquisas acadêmicas. 

 

Esse trabalho já resultou na revogação de alguns títulos Honoris Causa concedidos a ditadores. Em abril de 2021, o Conselho Universitário (Consuni) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) cassou o de Jarbas Passarinho. Em setembro do mesmo ano, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) foi a segunda a revogar o título dado também ao coronel Passarinho. Em agosto de 2022, foi a vez do Conselho Universitário (Consun) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) a revogar as homenagens aos ditadores Arthur da Costa e Silva e Emilio Garrastazu Médici. 

 

Comissão da Verdade da ADUFPel

 

No dia 18 de maio, professores e professoras, em Assembleia Geral, aprovaram a instalação da Comissão da Verdade da ADUFPel-SSind. A partir da reativação do Grupo de Trabalho de História do Movimento Docente (GTHMD), ela foi instituída com o intuito de fazer um levantamento em história oral para registrar e denunciar os impactos dos fatos perpetrados contra docentes universitários durante a ditadura empresarial-militar e trabalhar para a cassação de títulos Honoris Causa concedidos a ditadores. 

 

Podcast Viração aborda o tema

 

A entrevista completa com o professor Carlos Artur Gallo irá ao ar na próxima segunda-feira (02), às 13h, na RádioCom 104.5 FM ou nas plataformas digitais a partir das 8h.

 

Escute no:

Spotify for Podcasters (gratuito)

 

Fonte: Assessoria ADUFPel