Sexta, 19 Junho 2020 14:15

QUANDO PEDRAS SÃO COLOCADAS NO CAMINHO... - Alair Silveira

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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Alair Silveira
Profa. Depto. Sociologia e Ciência Política –SOCIP/ICHS/UFMT
 
             Os tempos sombrios cada vez mais assumem forma - e nomes – na UFMT. O problema, portanto, não são “as pedras no caminho”, mas quem as coloca lá para desviar o curso das coisas. A reunião conjunta dos três conselhos superiores (CONSEPE, CONSUNI e DIRETORES), convocada pelo Reitor Evandro A. Soares da Silva para o dia 17 de Junho/2020, tendo como pauta o Colégio Eleitoral Especial, é a demonstração de como pedras podem ser colocadas no caminho da UFMT, de maneira a lhe comprometer o trajeto democrático. Curiosamente, em nome da preservação democrática!
 
            Ensina a sabedoria popular que quando quiseres verdadeiramente conhecer alguém, conceda-lhes poder. Lamentavelmente, reuniões dos conselhos superiores têm oferecido oportunidades para conhecermos tanto aqueles que os presidem quanto aqueles que se curvam aos seus desmandos. Assim foram algumas reuniões do CONSEPE e do CONSUNI, quando o Regimento foi seletivamente ignorado, apesar dos apelos verbais e/ou formais de alguns conselheiros. Como a prática de alguns e a conivência de muitos também consolidam experiências, o que ocorreu na Reunião de ontem (17/06) foi, ao mesmo tempo, uma face mais truculenta de uma mesma prática, e a afirmação de um caminho de costas para a história da UFMT.
 
            Não se trata somente de um professor da instituição (e procurador-geral do estado, Luiz Alberto E. Scaloppe) ter atuado de forma profundamente lamentável na condução da Reunião, atropelando intervenções, negando direito regimental à declaração de voto de abstenção, ignorando pedidos de esclarecimentos para a votação etc., mas de uma parcela significativa de conselheiros ter consentido essa atuação. Para o Reitor que gosta de citar poetas, sugiro a leitura do poeta carioca Eduardo Alves da Costa, que lamenta as flores roubadas e os jardins destruídos com a indiferença de muitos.

 

            Se no dia 16 de Junho/2020 tivemos que ouvir conselheiros reconhecer a desigualdade social, para realçar sua existência histórica; conselheiros elogiarem – e não contestarem – os argumentos apresentados pelo conselheiro relator, mas manterem-se imunes ao seu apelo social; enfim, conselheiros ostentarem discursos democráticos e socialmente referenciados, e, ao cabo, com seus votos, decretaram a indiferença social como política da Instituição.

 

            Afinal, a UFMT moderna, tecnológica, “empreendedora” precisa mostrar trabalho à sociedade. Precisa abrir mercado para os mercadores de tecnologias e plataformas de ensino remotas. Mesmo que ao custo de deixar pelo caminho vários dos seus estudantes. Aqueles mesmos que um dia a UFMT se congratulou por recepcionar, como manifestação do seu compromisso com a democratização do acesso e da diversidade.

 

            Em que momento fomos ficando tão indiferentes socialmente? Quando foi que nos tornamos surdos aos argumentos dos outros? Aonde foi que esquecemos nosso compromisso com a Universidade Pública, Gratuita, Democrática, de Qualidade, Laica e Socialmente Referenciada?

 

            Mas, se o dia 16/06 foi triste, o dia 17/06 foi trágico. Afinal, como coroar a destruição daquela Universidade, senão atropelando sua tradição eleitoral democrática que, mais uma vez, penaliza estudantes, além dos técnicos? Reitor e Diretor buscaram responsabilizar as entidades sindicais e estudantil, sugerindo que a escolha por um processo eleitoral de costas para a tradição eleitoral democrática da UFMT foi resultado da inação da ADUFMAT, do SINTUF e do DCE.

 

            Como toda memória seletiva pauta-se pela conveniência, oportunamente lembraram da legislação para justificar as imposições de uma consulta não paritária e muito provavelmente virtual. Em contraposição, esqueceram que foram justamente enfrentando a Lei que as entidades garantiram, historicamente, a votação democrática e paritária.

 

            Esqueceram das reuniões entre entidades e o Reitor, assim como o documento protocolado pelas mesmas, endereçado à Reitoria, defendendo a não realização do pleito em meio à pandemia e a prorrogação do mandato do Reitor, como forma excepcional de manter nossa tradição democrática, sem “flexibilizar” nossos princípios.

            Mais triste do que a regência truculenta dos desapegados aos procedimentos democráticos, é tentar responsabilizar àqueles que se mantêm inarredáveis dos caminhos das flores que a todos incluem, para tentar invisibilizar as pedras que não só matam as flores, mas refletem indiferenças e silêncios.

 

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