Quarta, 13 Março 2019 11:08

DEMOCRACIA E SAÚDE - Juacy da Silva

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O Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 

No período de 04 a 07 de Agosto próximo será realizada em Brasília, a 16a. Conferência Nacional de Saúde, tendo como tema “Democracia e Saúde: saúde como como direito, consolidação e financiamento do SUS”.


Para facilitar as discussões e agregar as contribuições oriundas de uma ampla participação popular que deverá ocorrer no país inteiro, nas conferências municipais, regionais e estaduais, que já estão em curso; o Conselho Nacional de Saúde, responsável pela convocação desta conferência nacional, desdobrou o tema em eixos temáticos.

 

Esses eixos temáticos, em torno do qual os participantes serão distribuídos são: I – Saúde como direito; II – Consolidação dos princípios do SUS e III – Financiamento adequado do SUS.


Esta será a 16a. Conferência Nacional e tem um significado especial como o Conselho Nacional tem enfatizado, no que poderíamos demonizar de 8a. + 8 = 16, destacando o papel fundamental que representou a 8a. Conferência Nacional ocorrida em 1986, quando foram aprovadas as diretrizes para a criação do SUS, no que foi também a primeira conferência nacional que contou com ampla participação popular, tanto nas discussões quanto na formulação de propostas que iriam estar também inseridas na Constituição Federal de 1988.


O SUS foi criado através da Lei Federal 8080, de 19 de setembro de 1990, atendendo aos princípios contidos na Constituição Federal de 1988, nos artigos 196 até 200; cabendo destaque que, pela primeira vez na história do Brasil a saúde, de forma explícita e clara, com fundamento na Constituição estabelece que:


“ Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.


Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.


Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:


I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.


§ 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. (Parágrafo único renumerado para § 1º pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000)”
 
A Lei de criação do SUS, detalhou de forma mais clara o sentido da saúde como direito das pessoas e obrigação do ESTADO, ou seja, da União, dos Estados federados e Distrito Federal e dos municípios, deixando claro que cabe a esses entes públicos, através de outras politicas publicas, além da politica de saúde propriamente dita, em sentido restrito; prover condições para que a saúde, além de cuidar das doenças, também atenda `a uma definição estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), organismo especializado da ONU, da qual o Brasil participa e é signatário de todos os seus tratados, inclusive os relativos `a saúde.


Para a OMS saúde não é apenas ausência de doenças, mas também o mais completo bem-estar físico, mental e emocional e, em sendo assim, não podemos falar em saúde publica quando mais da metade da população brasileira não tem acesso a esgoto tratado e o meio ambiente sendo desrespeitado e totalmente degradado no país inteiro; onde milhões de famílias vivem na pobreza e passam fome; onde faltam leitos hospitalares, profissionais de saúde; equipamentos e recursos financeiros e orçamentários, quando o Brasil gasta por ano mais de 46% do Orçamento Geral da União com pagamento de juros e serviços de uma divida publica que alimenta a agiotagem do Sistema financeiro nacional e internacional; quando a União abre mão e deixa de arrecadar mais de R$350 bilhões por ano em renúncia fiscal e outro tanto em subsídios a setores e grupos econômicos que se capitalizam `as custas do tesouro e do sofrimento do povo, além de bilhões que são sonegados em todos os níveis, ante a passividade do Estado.


Se o Brasil é realmente um estado democrático de direito, com a Constituição e as Leis sendo cumpridas de fato e não uma democracia corrompida e que cria privilégios para os donos do poder e grupos econômicos que alimentam um Sistema e processo político-eleitoral corrupto; o SUS, que em breve estará completando 29 anos, deveria estar funcionando “às mil maravilhas”, dentro de seus princípios, bases legais e constitucionais, o que não acontece.

Enquanto dezenas de milhares de pessoas sofrem nos corredores de hospitais, postos de saúde ou nas filas visíveis e invisíveis, os donos do poder, os governantes passados, presentes e com certeza futuros estarão fazendo belos discursos e promessas durante os períodos eleitorais e, depois de eleitos e empossados, fazem “ouvidos moucos”,  pouco ligando para a miséria e sofrimento do povo.


Em torno de 77% da população brasileira, que coincide com a grande massa de trabalhadores, empregados, desempregados, subempregados e aposentados, dependem única e exclusivamente do SUS para os seus cuidados com a saúde, por ano milhares de pessoas, em todas as faixas etárias continuam sofrendo e morrendo devido à precariedade em que se encontra a saúde publica em nosso país, mesmo com a constante judicialização da saúde, último bastião que o povo recorre para garantir um direito líquido e certo que consta da Constituição de forma expressa , da Lei de criação do SUS e demais disposições existentes em nosso complicado e ordenamento jurídico e moroso Sistema judicial.


Para que a saúde seja de fato um direito do cidadão e dever do Estado, é fundamental que a democracia também seja algo verdadeiro e não um conjunto de princípios, ideias e ideais em que poucos são cumpridos.


Este é o sentido desta 16a. Conferência Nacional de Saúde e das conferências regionais, municipais e estaduais que as antecedem, como a de Cuiabá que terá inicio no próximo sábado e se estenderá até os dias 10 a 12 de abril próximo.


Sem ampla participação popular, controle social e transparência tudo isso continuará apenas como meros desejos, fantasias e letra morta, enfim, um mundo de fantasias; enquanto pessoas também estarão morrendo por falta de atendimento.

Defender o SUS é defender não apenas os direitos humanos, sociais e políticos, mas também é defender a vida em sua plenitude, principalmente das camadas mais pobres, os excluídos, é também defender a democracia, em seu sentido verdadeiro.


Se o povo , principalmente quem tem apenas o SUS como garantia do direito à saúde, não defender o SUS e aguardar que os donos do poder, grupo privilegiado e seus asseclas, o defendam; não vai demorar nossos governantes irão acabar com o SUS como estão fazendo com a Previdência e a Seguridade Social.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, titular e aposentado UFMT, mestre em sociologia, articulista de diversos veículos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy
 

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