Sexta, 13 Março 2020 14:50

 

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para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 

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JUACY DA SILVA*

O ano de 2015 foi muito significativo e emblemático para as questões ambientais. Inúmeros acontecimentos já estavam em curso desde 1972, quando do Relatório da Comissão mundial sobre o meio ambiente e desenvolvimento da ONU, desde então conhecido como “NOSSO FUTURO COMUM”, diversos marcos importantes vem sendo estabelecidos nas discussões relativas ao meio ambiente e `a sustentabilidade.

Cabe destacar, por exemplo, o Protocolo de Kyoto, em 1997 que estabeleceu novos parâmetros relativos `as questões climáticas e a importância das questões ambientais como parte fundamental no processo de desenvolvimento mundial e nacional.

No ano de 2000 a ONU realizou a chamada CÚPULA DO MILÊNIO, quando foram definidos oito objetivos que, na perspectiva dos participantes, deveriam mudar o mundo. Esses objetivos deveriam vigorar, como de fato aconteceu, até o ano 2015.

Sempre é bom lembrar esses oito objetivos, para entendermos como a caminhada ambiental transcorreu até que o Papa Francisco, em 2015, apresentasse ao mundo a primeira Encíclica da Igreja Católica, a LAUDATO SI, onde um novo paradígma apareceu com toda a força. Este novo paradígma é a ECOLOGIA INTEGRAL.

Os oito objetivos do milênio são/foram os seguintes: 1) acabar com a fome e a miséria; 2) oferecer educação básica, de qualidade, para todos; 3) promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4) reduzir a mortalidade infantil; 5) melhorar a saúde da gestante; 6) combater a AIDS, a malária e outras doenças; 7) garantir qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; e, 8) estabelecer parcerias para o desenvolvimento.

Pois bem, foi neste Quadro de referência de engajamento internacional que no dia 24 de maio de 2015; antes que a ONU tornasse a se reunir e aprovasse a Agenda 2030, com os OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, que o Papa Francisco assinou e deu ao público, católico e a não catolicos, a ENCÍCLICA LAUDATO SI,  por muitos conhecida como a ENCÍCLICA VERDE.

É bom recordar as palavras do Sumo Pontífice quando, logo no inicio da Laudato Si, afirma de maneira clara e objetiva que “Nesta Encíclica, pretende, especialmente entrar em diálogo com todos acerca da NOSSA CASA COMUM”.

Recorda também o Papa Francisco palavras de seu antecessor, o Papa Bento XVI que em discurso ao Corpo Diplomático acreditado no Vaticano, em 08 de Janeiro de 2007  disse , de forma enfática que é preciso “eliminar as causas estruturais das disfunções da economia mundial e corrigir os modelos de crescimento que parecem incapazes de garantir o respeito ao meio ambiente”.

A Encíclica Laudato Si está estruturada em seis capítulos, seguindo o método de VER, JULGAR e AGIR: Capítulo I O que está acontecendo com a nossa casa comum; capítulo II O Evangelho da criação; Capítulo III A raiz da crise ecológica; IV Uma ECOLOGIA INTEGRAL; Capítulo V Algumas linhas de orientação e ação e, Capítulo VI Educação e Espiritualidade ecológicas.

Quando de seu lançamento, esta Encíclica representou um grande impacto nas discussões sobre esta nova visão de tratar as questões ambientais, antes havia a idéia de que existe uma certa separação entre o ser humano e a natureza, como se fossem duas realidades distintas e separadas.

Na Laudato Si, o Papa Francisco chama a atenção de que não existem uma crise ambiental propriamente dita e outra ou outras crises como social, econômica e polítca, mas que, como no refrão da música inspirada na Encíclica e que muito anima as reuniões da IGREJA, “tudo esta interligado, como se fôssemos um. Tudo esta ligado, nesta Casa Comum”.

Ainda sob o impacto do lançamento da Laudato Si, entre os dias 25 e 27 de Setembro de 2015, a Assesmbléia Geral da ONU aprovou por unanimidade os OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, em substituição aos Objetivos do Milênio, contendo 17 objetivos e 169 metas, todas praticamente contidadas no bojo da Laudato Si.

A chamada AGENDA 2030, pretende ser a bússula para transformar o mundo, corrigir as mazelas ambientais, sociais, econômicas e politicas, acabar com a fome, a miséria, a desigualdade, as injustiças, a discriminação, a violência, as guerras, a destruição da biodiversidade, a poluição, as mudanç de as climáticas, a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres, enfim, garantir um mundo melhor para as próximas gerações.

Neste sentido os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, ao enfatizar o conceito de sustentabilidade como pilar fundamental do desenvolvimento, representam não apenas o conceito, mas o novo paradígma de desenvolvimento destacado e enfatizado pelo Papa Francisco que é a ECOLOGIA INTEGRAL.

Antes de falar sobre a REPAM – Rede Eclesial Pan-Amazônica, é necessário também mencionar que ainda no ano de 2015 foi assinado, em 12 de Dezembro daquele ano o Tratado de PARIS e, a partir daquele tratado, anaualmente são realizadas as Conferências do Clima, as COPs, para aprofundar as discussões e compromissos dos governos e diversos setores, principalmente o mundo empresarial e outros setores não governamentais, quanto `a necessidade de se combater as mudanças climáticas, reduzindo a velocidade do aquecimento global e suas consequências sobre o planeta. Daí a idéia de que “tudo esta interligado”, o que um país ou região provoca em termos de danos ambientais acaba impactando negativamente o clima, o regime de chuvas em diversos outros países. A idéia de soberania nacional, neste contexto, reduz a co-responsabilidade com o “nosso futuro comum” e precisa ser revisto no contexto de uma ordem econômica, social e politica mundial, afinal, todos somos “filhos e filhas da terra”.

Anualmente um grupo de cientistas, conforme estabelecido na Resolução da ONU que aprovou os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, realiza estudos quanto `as mudancas climáticas e apresenta relatórios fundamentados, científicos, quanto ao que está acontecendo com o Planeta Terra, em termos de mudanças climáticas e de aquecimento global.

Existe também um grupo que avalia anualmente a implementação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e suas metas, pelos diversos países, tendo como referência o ano de 2030, qual o progresso que está acontecendo e em que rítimo.

Duas outras iniciativas da ONU são importantes quando se busca implementar a ECOLOGIA INTEGRAL. Em 2017 foi aprovado o Plano Estratégico da ONU para as florestas, a vigorar até 2030, coincidindo com a Agenda 2030 e, mais recentemente, também a ONU aprovou a Década da restauração das áreas degradadas, a vigorar entre 2021 e 2030.

É neste contexto de aprofundamento das discussões e ações relacionados com o meio ambiente, onde os conceitos e paradígmas da Sustentabilidade e da ECOLOGIA INTEGRAL que o PAPA FRANCISCO em 15 de Outubro de 2017 convocou o Sínodo dos Bispos da Pan-Amazônia, que deveria ser realizado, como de fato foi, em outubro de 2019.

Antes desta convocação, quando de sua viagem apostólica ao Brasil, em 27 de Julho de 2013, o Papa Francisco disse, a respeito da presença da Igreja na Amazônia, o seguinte. “ A Igreja não está na Amazônia como quem enche as malas e, depois, de explorá-la, vai embora. Há muitos séculos  está presente através de missionários, congregações, religiosas, sacerdotes, leigos, bispos; e a sua presença é fundamental para o futuro da região”

Na convocação do Sínodo, fica claro que a busca desses “novos caminhos”  para a evangelização deveriam ser encontrados para e pelo povo de Deus, que habita a região da Pan-Amazônia, com suas diversidades e peculiaridades, tais como habitantes de comunidades rurais, das cidades, metrópoles, indigenas (de inúmeras etnias e diferentes línguas, culturas e religiões), ribeirinhos, seringueiros, migrantes, desalojados, extrativistas e favelados urbanos.

O que se busca é constuir uma igreja com a cara da Amazônia e de seu povo, uma igreja em saida, missionária, acolhedora e também profética, no contexto da opção preferencial pelos pobres, excluidos e oprimidos. Uma Igreja que esteja a serviço da caridade, da solidariedade, da justiça, em defesa da vida em todas as suas dimensões, segundo os valores do evangelho, da doutrina social da Igreja e do paradígma da ECOLOGIA INTEGRAL.

Depois dos Encontros de Puyo/Equador em Abril de 2013; de Lima/Peru em Junho de 2013 e de Manaus em Outubro de 2013, os participantes, representantes de 11 países, no Encontro de Brasília entre os dias 9 e 12 de Outubro de 2014 decidiram constituir/fundar a REPAM – Rede Eclesial Panamazônica.

Conforme o documento constitutivo a Igreja, através da REPAM reafirma “seu compromisso de responder, de maneira eficaz e orgânica aos clamores de nosso tempo”.

A REPAM assumiu como missão “criar (e despertar) consciência nas Américas sobre a importância da Amazônia para toda a humanidade. Estabelecer laços entre as igrejas locais dos diversos países sul americanos, que estão na Amazônia, uma pastoral de conjunto, com prioridades diferenciadas para criar um modelo de desenvolvimento que privilegie os pobres e sirva ao bem comum”. (Documento de Aparecida 475).

Diversos organismos e setores da Igreja, em diferentes países contribuiram para a estruturação e atividades da REPAM, incluindo a CNBB,  a CARITAS, CELAM e CLAR,  as diversas Conferências de Bispos dos países Amazônicos, além de sacerdotes, leigos, religiosos, religiosas.

Com a convocação do Sínodo da Amazônia (Assembléia Especial dos Bispos) coube `a REPAM um papel fundamental tanto no desenvolvimento de uma metodologia para os estudos da realidade dos diferentes territórios e a elaboração do documento de trabalho “Instrumentum Laboris” – Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ECOLOGIA INTEGRAL”, documento este que serviu de base para as discussões e deliberações do Sínodo realizado no Vaticano entre os dias 06 e 27 de Outubro de 2019.

Ao final do Sínodo, foi aprovado por praticamente unanimidade o documento final “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ECOLOGIA INTEGRAL”, contendo seis capítulos, uma introdução e uma conclusão.

O capítulo I Amazônia: da escuta `a coversão integral; capítulo II Novos caminhos de conversão pastoral; capitulo III novos caminhos de conversão cultural; capítulo IV novos caminhos de conversão ecológica; capítulo V novos caminhos de conversão sinodal.

Posterior ao encerramento do Sínodo e `a publicação do documento final, o Papa Francisco, fez sua apreciação sobre o objeto do Sínodo através da Exortação Pós-Sinodal “MINHA QUERIDA AMAZÔNIA”, destacanto e exortando tanto fiéis quanto a população em geral quanto `a necessidade da leitura e reflexão sobre o documento final do Sínodo.

Em sua Exortação Apostólica, datada de 02 de Fevereiro de 2020, o Papa Francisco se dirige “Ao povo de Deus e a todas as pessoas de boa vontade”, ou seja, aos católicos e também aos não católicos.

Além de destacar o sentido da Exortação, o Sumo Pontífice, fala de seus sonhos em relação `a Amazônia, com os seguintes destaques: I) um sonho social; II) um sonho cultural; III) um SONHO ECOLÓGICO; IV) um sonho eclesial.

Tendo como base todos esses documentos e resultados das reflexões de alguns anos, a partir deste inicio de ano (2020) a REPAM, tanto no Brasil quanto nos demais países que integram a Amazônia, está realizando seminários pos-sínodo, buscando aprofundar, a partir dos diferentes territórios, o estudo da realidade e o que fazer para que todos os sonhos do Papa Francisco, sonhos esses que também são os sonhos de milhões de pessoas que habitam a Amazônia, sejam transformados em realidade.

Foi neste sentido que no último final de semana (07 e 08 Março 2020) mais de 60 pessoas, incluindo bispos, sacerdotes, religiosas, leigos e leigas, representantes de diverssos povos indígenas estiveram reunidos em Cuiabá, no Centro Nova Evangelização – CENE, da CNBB/Regional Oeste 2 (Mato Grosso), representando praticamente todas as Dioceses de Mato Grosso e da Arquidiocese de Cuiabá.

Os resultados dos oito seminários que estão sendo realizados nos oito estados da Amazônia brasileira, deverão servir de base para o Plano de Ação e Evangelização, sob a coordenação e articulação da REPAM.

A metodologia utilizada foi a mesma: VER, JULGAR E AGIR.

Tanto a análise de conjuntura (ver) quanto o agir, tiverem como parâmetros os territórios (dioceses/arquidiocese) e também os sonhos cultural, social, ecológico e ecclesial, inserindo-se na temporalidade, territorialidade e os sujeitos/atores que entram em relações no seu cotidiano.

Cabe aqui um destaque ao agir que surgiu a partir dos diferentes grupos de trabalho e reflexão, tendo como base os quatro sonhos de Francisco.

Foram identificados os principais problemas e desafios como desmatamento, queimadas, poluição e uso abusivo de agrotóxicos, garimpos e mineração illegal, invasão de terras indigenas e de áreas de preservação ambiental, tráfico de pessoas, trabalho escravo, migrações internas e internacionais; ação ilegal de madeireiros, empobrecimento da população/favelização, precariedade dos serviços públicos, principalmente saúde, educação, transporte, habitação, problemas fundiários, grilagem de terras, violência contra agentes de pastorais, religiosos e religiosas e defensores do meio ambiente e dos direitos humanos.

As propostas do Grupo cultural foram: a itinerância; o pecado ecológico, a conversão ecológica, a demarcação das terras indigenas; a necessidade de respeitar a diversidade cultural e linguística.

As propostas do grupo da ECOLOGIA INTEGRAL foram: organizar a representação da REPAM nas dioceses; a criação de escola e cursos de ecologia integral, estruturar a PASTORAL DE ECOLOGIA INTEGRAL; promover a agroecologia; criar o observatório sócio ambiental pastoral na CNBB/Regional Oeste2; estimular a criação de legislação estadual e municipal que restrinja o uso de agrotóxico, principalmente a pulverização aérea.

As propostas do grupo social foram: criação, fortalecimento e articulação das pastorais sociais; fortalecimento dos conselhos de defesa de direitos; preparar leigos para participação nos conselhos de direitos.

As propostas do grupo eclesial foram: organizar a estrutura para ação missionária; articulação dos diaconatos; criar e fortalecer as Escolas de Fé e Política;  usar melhor as redes sociais para evangelizar; criar a universidade amazônica; definir pecado ecológico e conversão ecológica e, fomentar uma maior participação da mulher nas ações da Igreja.

Com certeza estamos iniciando um novo tempo para que a Igreja possa realmente  ter a “cara da Amazônia”. a cara dos pobres, dos excluidos e oprimidos que vivem e lutam neste imenso território, afinal, como bem tem dito o Papa Francisco, “o grito da terra” que está sendo destruida impiedosamente, é, também, o “grito do pobre”, pois é ele (o pobre)  quem mais sofre com a degradação ambiental, com a exclusão sócio-econômica e politica, a opressão, as injustiças e a violência que campeiam impunemente neste imenso território pan-amazônico.

Dentro de dois meses estaremos comemorando cinco anos do surgimento da LAUDATO SI, ocasião em que deveremos realizar uma avaliação da caminhada da Igreja rumo `a ECOLOGIA INTEGRAL, como paradígma do desenvolvimento e da evangelização tanto na Amazônia quanto em outros territórios ao redor do mundo.

Este é o sentido do novo paradígma da “ECOLOGIA INTEGRAL”, que também abrange a sustentabilidade e um novo modelo de desenvolvimento, ambientalmente sustentável, economicamente aberto e solidário, socialmente justo, políticamente inclusivo e espiritualmente inculturado.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.  Twitter@profjuacy
 

Segunda, 09 Março 2020 10:11

 

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JUACY DA SILVA*

Por mais que eu pense, reflita, raciocine, converse com outras pessoas, não consigo entender como a morte de 3.200 pessoas pelo CORONAVIRUS em menos de dois meses pode abalar tanto os países, afetar as bolsas, o câmbio e até mesmo provocar uma instabilidade e recessão econômica mundial e a morte de mais de 59 milhões de pessoas a cada ano, inclusive em 2019 e 2020, não tenha causado tanto pânico e preocupação das autoridades e da população em geral.

Independente ou antes do surgimento desta onda do CORONAVIRUS morrem no mundo por dia em torno de 161 mil pessoas decorrentes de diversas doenças já sobejamente conhecidas e para as quais existem tratamento. Mas nada disso comove , desperta a atenção ou causa pânico e alarmismo nas autoridades mundiais e na própria população.

Coisas inexplicáveis! Só Deus sabe o que existe por trás desta realidade e do alarmismo que ronda o mundo inteiro.

Em recente entrevista a um programa de TV com grande audiência nacional, a médica infectologista Christina Barros, professora titular da UFRJ, disse, ao comentar sobre o “avanço” do coronavirus em diversos países, que o maior desafio das autoridades sanitárias ao redor do mundo, inclusive no Brasil, é que “a gente não está conseguindo conter o pânico e alarmismo em torno deste novo virus”.

Em entrevista coletiva também as autoridades de saúde do Brasil disseram, mais ou menos na mesma época, que de quase cinco mil comunicações e telefonemas para o Ministério da Saúde e outros organismos da saúde publica, mais de 85% eram “fake news”, ou seja, mentiras.

Este é o Quadro que envolve a disseminação do coronavirus nesses quase dois meses. Parece que o mundo e o Brasil não foge `a regra, só tem uma pauta tanto em relação `as autoridades quanto dos grandes veiculos de comunicação e também, lamentavelmente, nas redes sociais.

Em artigo recente, de 21 fevereiro último, intitulado “Coronavirus e o retrato de um ecossistema de desinformação”, Ricardo Torres, doutorando em jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina, faz um alerta nos seguintes termos “Em temas sensíveis como os que envolvem elementos relacionados à saúde, os riscos da disseminação massiva de informações falsas são ampliados e podem ter desdobramentos extremos que, em última instância, levam ao caos social e a um estado de pânico generalizado. Lidar com essa situação impõe um desafio significativo que está causando dificuldades para quem acessa e para quem produz conteúdos jornalísticos”.

Com certeza, pelo fato de se tratar de um “novo” virus, sobre o qual pouco se conhece, cuja letalidade, ou seja, taxa de mortalidade é varias vezes maior do que as taxas de outras doenças ja conhecidas, principalmente, respiratórias, como a influenza, ou gripe comum, o pânico, o alarmismo ou até mesmo uma certa dose de histeria coletiva amplia o foco do poder destruidor do coronavirus, acaba destruindo não apenas o corpo, mas a consciência e a convivência humanas.

Outro aspecto fundamental é a questão do medo da doença e, maior ainda, o medo da morte, afinal, se pudessesmos seriamos imortais e nossos corpos seriam e estariam protegidos contra todas as doenças e males que possam significar a morte.

Mesmo que o coronavirus ainda esteja em estágio inicial de disseminação pelo mundo e já tendo atingido quase cem paises, com mais de 90 mil casos e pouco mais de 3 mil mortes, tanto as taxas de mortalidade e número de casos de várias doencçs que anualmente dizimam milhões de pessoas, parece que pouca atenção, pouco alarde ou nenhum pânico causa nem entre governantes e muito menos entre a população.

No inicio deste ano, em 13 de janeiro último, antes do surto do CORONAVIRUS, a OMS – Organização Mundial da Saúde,  alertou o mundo, todos os governos e a população em geral, em relação `as 13 grandes ameaças urgentes para a saúde nesta década de 2020 até 2030, no contexto dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

De forma resumida essas são as 13 ameaças: 1) Conscientizar as pessoas e governantes que as mudanças climáticas afetam em muito as condições de  saúde da população; 2) Os riscos para oferecer/promover cuidados de saúde em áreas de conflitos e guerras estão aumentando; 3) A importância em promover saúde em um mundo marcado pela desigualdade social, que gera pobreza, miséria, fome e exclusão é mais do que urgente e ncessário; 4) É preciso, é fundamental promover a universalização das vacinas e medicamentos, principalmente para a população mais pobre que não dispõe de renda/recursos para cuidar da saúde; 5) É imperioso e urgente controlar e extinguir as doenças infecto contagiosas e doenças parasitárias que a cada ano provocam milhões de mortes; 6) É necessário e também urgente preparar os sistemas de saúde, públicos e privados, para enfrentar as epidemias e pandemias, como dengue, febre amarela, penumonias, tuberculose, influenza, malária  e (acrescento, no momento o CORONAVIRUS); 7) É também importante proteger a população contra produtos perigosos que levam a doenças e mortes, como alimentos e dietas impróprias, o consumo de álcool, tabaco, açucar, sal, gordura (principalmente a trans) e medicamentos, onde o cuidado com a auto medicação é fundamental; 8) É preciso também investir mais no pessoal e profissionais da saúde, na formação, treinamento, segurança no trabalho, insalubridade, qualidade de vida); 9) É imperioso terem maiores cuidados com a segurança e proteção das criancas e adolescentes, evitando doenças e adições que também levam `a morte como DST/HIV/AIDS, drogas lícitas e ilícitas, sexo e gravidez na adolescência; delinquência, suicído; 10) Investir para conquistar a confiança da população e da opinião pública nos Sistemas de saúde e nas campanhas de vacinação, combater as “fake news” relacionados com a saúde; 11) Promover com urgência a universalização do uso das novas tecnologias, acesso aos resultados das descobertas científicas na área da saúde, principalmente na fabricação de medicamentos, novos insumos, digitalização, informatização, telemedicina, inteligência artificial, biotecnologia, imagens que possibilitam mais eficiência e eficácia dos sistemas de saúde; 12) Proteger os medicamentos e evitar/reduzir as resistências anti-microbianas, anti viróticas e desenvolver novos antibióticos e antivirus, reduzindo a letalidade de diversas doenças; 13) Cuidar para manter os sistemas de saúde públicos e privados (hospitais, clínicas, consultórios) limpos, higiênicos para evitar as infecções hospitalares, a disseminação de doenças e contágios.

Como pode ser visto, a OMS apresenta um roteiro para que os sistemas de saúde de todos os países possam melhorar o padrão de atendimento, reduzir os custos das doenças e das mortes e propiciar maior dignidade e segurança aos pacientes.

Voltando `a questao da mortalidade, devemos refletir com mais profundidade sobre a real situação da saúde tanto em nosso país quanto nos demais, afinal, vivemos em uma “aldeia global”, e tudo o que acontece em um país pode afetar o planeta inteiro. O maior exemplo é a situação que atualmente tanto pânico e alarmismo está causando, o CORONAVIRUS.

Tomando-se como referência os anos de 1980  até 2030, o número de mortes no mundo tem aumentando continuamente, apesar de que as taxas de mortalidade venham se reduzindo ao longo do periodo, mas como a população mundial e de varios países, inclusive os cinco mais populosos, ainda vem crescendo, a presença da morte por diferentes causas continua bem presente no cotidiano das pessoas.

Em 1980 ocorreram 46,7 milhões de mortes, em 1990 passou para 49,7 milhões, no inicio deste milênio, em 2000 foi de 53,1 milhões; em 2010 aumentou para 54,9 milhões, neste ano de 2020 deve atingir 59,3 milhões e as projeções indicam que em 2030 serão 62,8 milhões de mortes. A média anual para o periodo é de 54,7 milhões. Isto significa que entre 1980 até 2030, ou seja, em meio século vamos estar nos confrontando com 2,735 bilhões de mortes.

As principais causas de mortalidade no mundo em 2017 foram: a) doenças cárdio-vasculares (infarto e derrames -AVC) 17,8 milhões; b) Todos os tipos de cancer 9,6 milhões de mortes; c) doenças pulmonares obstrutivas crônicas 3,9 milhões; d) doenças das vias respiratórias inferiores 2,6 milhões; (essas duas que afetam o sistema respiratório somadas representaram 6,5 milhões de mortes; e) pneumonia 2,6 milhões, f) demências 2,5 milhões de mortes; g) diarréias 2,4 milhões h) desordens neonatais 1,8 milhões, i) diabetes 1,4 milhões; j) doenças hepáticas 1,3 milhões; k) acidentes de trânsito 1,2 milhões; l) doencas renais 1,2 milhões;  m) tuberculose 1,2 milhões (o Brasil está entre os 20 países com maior número de casos e de mortes devido `a tuberculose); n) HIV/AIDS 954 mil; o) suicídios 793 mortes e, p) malária com 620 mil casos.

A influenza, gripe, registrou em torno de 32 milhões de casos nos EUA no periodo do inverno, entre outubro 2017 e abril 2018, com 310 mil internações e 18 mil mortes. Entre 2010 e 2020 (até fevereiro último) foram registrados 290,3 milhões casos de influenza, disso resultando 370 mil mortes, número maior do que todas as mortes de americanos nas guerras das últimas seis décadas, incluindo desde as guerras da Coréia , do Vietnan e demais guerras externas nas quais os EUA estiveram envolvidos.

No Brasil, por exemplo, desde que apareceram os primeiros surtos de mortes por HIV/AIDS em 1980 até 2018 esta doença, contra a qual muito preconceito foi criado, ocorreram 338,9 mil mortes. Em 2010 foram registrados no Brasil 44 mil novos casos e em 2018 foram registrados 53 mil novos caos de HIV/AIDS.

Desde 1980 até 2019, nada no mundo, menos do que 74,0 milhões de pessoas já foram infectadas com HIV/AIDS, 32 milhões de pessoas morreram neste periodo e 37,9 milhões de pessoas convivem com o HIV/AIDS e talvez outros 12 milhões estejam infectados e não saibam, o que agrava ainda mais o problema. Apesar de já existir medicamentos (coquetel) que possibilitam os pacientes a conviveram com a “doenca”, em muitos países, inclusive no Brasil tanto para ser realizado o diagnóstico quanto acesso ao coquetel ainda existem muitas dificuldades, como ocorre com outros medicamentos e doenças, pela simples razão de que nossos governantes estão contribuindo para o completo sucateamento dos serviços públicos de saúde e empobrecimento da população.

Outro problema grave de saúde  são os índices de infecção hospitalar, que no Brasil é um dos maiores do mundo, em torno de 15%. Segundo informações do Ministério da Saúde/SUS em 2016 o número de pessoas que contrairam doenças relacionadas com infecção hospitalar foi em torno de 400 mil e as mortes por infecção hospitalar atingiram mais de 100 mil ou 14% dos pacientes internados, número quase o dobro dos assassinatos no país, que tanta preocupação tem causado na população e na agenda politica e institucional nos últimos anos.

Nos últimos 20 anos mais de um milhão de pessoas morreram e continuam morrendo no Brasil por causas decorrentes de infecções hospitalares, sem falar nas demais doenças infecto contagiosas como gripe, pneumonia, malária, hanseniase (lepra) ou outras decorrentes da falta de sanemanento e poluição do ar, dos alimentos, do solo e das águas.

Outra doença insidiosa e que está aumentando o número de casos e de mortes a cada ano, tanto no Mundo quanto no Brasil é o câncer (todos os tipos). No mundo o número de novos casos passou de 14,1 milhões em 2012, para 18,1 milhões em 2018, estando estimados 29,4 milhões para 2040.

De forma semelhante também as mortes decorrentes dos diversos tipos de câncer passou de 8,2 milhões em 2012; para 9,6 em 2018 e as projeções indicam que as mortes causadas por câncer (todos os tipos) deverão ser de 16,3 milhões em 2040.

Tenho tentado compreender o que pode ou deve estar por trás desta onda de medo, pânico, alarmismo e quase uma histeria coletiva em relação a uma doença que não esteja dizimando a população, enquanto existe um verdadeiro silêncio, ou seja, uma passividade em relação a doenças já sobejamente conhecidas, para as quais já existem tratamento e medicamentos que possibilitam se não a cura total, pelo menos prolongar a vida com mais dignidade para bilhões de pacientes quer seja em casa quer seja em leitos hospitalares que lutam pela vida, pela sobrevivência, enfim, pela dignidade e pelo mais sagrado dos direitos humanos que é a VIDA.

Lutar e colocar os países em condições médicas, sanitárias e hospitalares adequadas é importante, mas não menos importante é dotar os serviços de saúde, sejam públicos ou privados, de condições para enfrentar as doenças mencionadas neste artigo e que a cada ano provoca dor, sofrimento e morte a milhões de pessoas e seus familiares, é a maior obrigação, o maior dever das autoridades públicas e, ao mesmo tempo, direito das pessoas, da população em seu conjunto.

Afinal, qual a diferença de uma pessoa morrer de câncer, de gripe, assassinada, de doenças cárdio-vasculares, de poluição do ar, de tuberculose, de diabetes, de demência, de HIV/AIDS/DST, de malária, de pneumonia, de feminicídio ou atropelada impunemente em alguma via publica? A perda de um ente querido é a mesma, pouco importa a “causa mortis”.

Voce, caro leitor, eleitor, contribuinte, já parou para pensar como está a situação e qual é o cenário da saúde, pública ou privada, em nosso país, em nossos Estados, em nossos municípios? No Mundo?  Porque todo este pânico em relação ao coronavirus e uma certa passividade e alienação em relação a tantas doenças que também levam `a morte, pessoas de todas as faixas etárias e condições sócio-econômicas?

Pense nisso, reflita, dialogue com seus vizinhos, seus amigos e colegas de trabalho, as pessoas em sua igreja. Vamos colocar ou recolocar a questão da saúde pública na ordem do dia, na agenda politica e institucional de nosso país. Este ano deverão ser realizadas eleições para prefeitos e vereadores, voce já perguntou aos candidatos o que eles já fizeram (no caso dos que já detém mandato eletivo) ou irão realizar se eleitos forem? Acorde enquanto é tempo. O perigo é muito maior do que apenas o apresentado pelo CORONAVIRUS! O CAOS na saúde pública brasileira, o sucateamento do SUS é muito maior do que qualquer virus, por mais perigoso que ele seja. Não deixe que o pânico, o medo e o alarmismo tome conta de voce e afete sua capacidade de pensar criticamente.

 

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado Universidade Federal de MT, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy

Sexta, 06 Março 2020 14:41

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 

`A medida que a crise ambiental, com destaque para as mudanças climáticas, se agrava, boa parte dos países, das liderenças mundiais, das organizações não governamentais e de um grande número de pessoas conscientes da gravidade e da urgência desta que é, sem duvida, a maior crise que o planeta enfrenta nos últimos éeculos , percebemos que o tempo e a hora de agirmos está se esgotando inexoravelmente, antes que uma grande catástrofe coloque em risco a propria sobrevivência da espécie humana.

Isto não é alarmismo, apenas uma visao de future baseado em in formações científicas que estão `a disposição até mesmo das pessoas mais simples.

Ou lutamos de verdade e não apenas com palavras para enfrentar a degradação ambiental ou um verdadeiro desastre, de proporção catastrófica irá se abater sobre a humanidade. Agora estamos diante de uma já quase pandemia decorrente do CORONAVIRUS, que já infectou quase cem mil pessoas e levou a óbito/morte pouco mais duas mil pessoas. Um verdadeiro pânico esta tomando conta do mundo, é o assunto que domina os meios de comunicação, abala as bolsas de valores ao redor do mundo, desestabiliza a economia e as finanças mundiais.

No entanto, a poluição do ar mata a cada ano mais de sete milhões de pessoas no mundo. Segundo dados da ONU e suas agências especializadas, incluindo a Organização Mundial da Saúde, em 2018 existiam 24,5 milhões de pessoas com AIDS, 228 milhões com malaria e 10 milhões com tuberculose. As mortes decorrentes somente dessas tres doenças no mesmo ano foram: AIDS, 770 mil óbitos; malaria 405 mil e tuberculose 1,5 milhão; ou seja, total de 1,675 milhão de mortes. Outras informaões indicam que só a FOME levou a óbito/matou mais pessoas do que essas tres doenças juntas.

Todavia, mesmo diante de uma catástrofe como esta, onde quase dez milhões de pessoas morrem por doencas já conhecidas, diagnosticadas e que tem tratamento, ou diante da morte de milhões de pessoas só por poluição do ar, sem falar de outras mazelas ambientais que acabam também levando a morte a milhões de pessoas, como a falta de saneamento básicio, falta de acesso `a água tratada, habitações precárias e subhumanas, essas tgragédias pouca atenção recebem por parte de governantes, da midia ou até mesmo por parte da população que parece estar a cada dia mais anestesiada diante de uma catástrofe sem precedente, decorrente da degradação ambiental.

É bom também mencionar que por an o 1,35 milhão de pessoas morrem em acidentes de trânsito nas avenidas/ruas das cidades e nas rodovias ao redor do mundo; mais 2,35 milhões de trabalhadores morrem vitimas de acidentes de trabalho; 464 mil são vitimas de homicidios a cada ano;  por suicidio em 2017 foram 800 mil casos e óbitos/mortes por todos os tipos de câncder em 2017 foram 9,6 milhões de casos.

Alguém ou enfim, os leitores deste artigo, podem estar se perguntando, o que tem tudo isto a ver com o titulo do artigo? Passo a responder este questionamento relembrando que existe um silêncio conivente e pecaminoso quanto `a crise ecológica e suas consequências, que na linguagem do Papa Francisco, na Encíclica Laudato Si (139), quando afirma “Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma e complexa crise sócio ambiental. As diretrizes para a solução desta grave crise requerem uma aobrdagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluidos e, simultaneamente, cuidar da natureza”.

Diante deste Quadro complexo e grave, mesmo assim o Papa Francisco vê sinais de um novo despertar mundial (Laudato Si 19) ao afirmar que “ Depois de um tempo de confiança irracional no progresso e nas capacidades humanas, uma parte da sociedade está entrando em uma etapa de maior conscientização. Nota-se uma crescente sensibilidade relativamente ao meio ambiente e ao cuidado da natureza e cresce uma sincera e sentida  preocupação pelo que está acontecendo com o nosso planeta”.

Este despertar pode ser notado em relação a diversos governantes, organizações da sociedade civil, `as universidades, comunidade científica internacional, clubes de serviços, entidades esportivas, escolas e, também, em diversas igrejas ou grupos religiosos, com destaque para a Igreja Católica que tem mais de 1,2 bilhões de seguidores ao redor do mundo, evangélicos articulados pelo Conselho Mundial de Igrejas com mais de 500 milhões de fiéis; Igreja Católica Ortodoxa, diversas outras igrejas evangélicas como Luterana, Batista, Metodista, presbiteriana, algumas neo-pentecostais e até mesmo entre mulçumanos.

Essas igrejas/regiliões possuem milhões de templos e locais de adoração, enfim, locais onde semanalmente ou até mesmo diariamente reunem bilõoes de pessoas ao redor do mundo para orarem/rezarem, ouvirem prédicas, homilias, sermões, estudarem as sagradas escrituras ou seus livros sagrados.

`A medida que o despertar da consciência ambiental ou o que o Papa Francisco e diversos teólogos de diferentes credos religiosos denominam de conversão ecológica, tendo em vista que o desrespeito e a degradação ambiental é um pecado, o chamada pecado ecológico; neste contexto o papel das Igrejas na defesa, na preservação e conservação do meio ambiente é de suma importância. E este despertar deve ser convertido em obras, ações e não apenas em palavras.

Não se trata de transformar as igrejas em ONGs ou centros de debates ideológicos, mas sim, inserir a questão da ECOLOGIA INTEGRAL no contexta da fé que cada grupo religioso professa,  analisar e agir dentro dos parâmetros que tais textos indicam, afinal, para quem acredita que “ Deus, ou a divindade que seja o princípio criador, todas as obras na natureza foram criadas por Ele, inclusive o ser humano”. Assim, o papel das igrejas, religiões em geral e da Igreja Católica em particular é maior ainda pelas razões bem conhecidas.

Existem diversos sinais deste despertar, principalmente a partir do inicio da década de 1970, quando da publicação dos resultados dos trabalhos da Comissão Mundial sobre o meio ambiente e o desenvolvimento, que passou a ser conhecido como “NOSSO FUTURO COMUM”. Ao longo dessas praticamente 5 décadas a ONU tem feito um grande esforço para abrir espaço em suas Assembléias Gerais e outros foruns internacionais buscando aprofundar o conhecimento científico sobre a crise ecológica e os riscos da degradação ambiental, principalmente para as futuras gerações.

Diversas conferências de Meio ambiente foram realizadas como a ECO-92 e a Rio+20, ambas em nosso país, os vários tratados e acordos internacionais sobre o clima com destaque para Kyoto e o mais recente Acordo de PARIS, além dos trabalhos de grupos de cientistas que monitoram com seus estudos sobre a questão das mudancas climáticas e seus reflexos no planeta.

Foi também iniciativa da ONU o estabelecimento dos OBJETIVOS DO MILÊNIO, que vigorou até 2015, tendo sido substituidos pelos OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, ou agenda 2030, onde diversos dos 17 objetivos estão relacionados direta ou indiretamente com a questao sócio-ambiental.

Cabe aqui alguns destaques ou realce para alguns desses objetivos, os quais foram firmados pela quase totalidade dos 195 paises e territórios, inclusive pelo Governo brasileiro. Praticamente todos os 17 objetivos do desenvolvimento sustentáveis podem ser inseridos no paradígma da Ecologia integral. Vejamos: 1) Erracidação da pobreza; 2) Fome zero e agricultura sustentável; 3) saúde e bem estar; 4) Educação de qualidade; 5) Igualdade de genero; 6) ‘Agua limpa e saneamento; 7) Energia limpa e acessivel; 8) Trabalho decente e crescimento economico; 10) redução das desigualdade dentro e entre países; 11) Cidades sustentáveis; 12) Consumo e produção sustentáveis; 13) Ação contra as mudanças climáticas; 14) Vida na água; 15) Vida Terrestre; 16) Paz, justica e instituições eficazes.

Ora, se de fato, governantes e entes não governamentais estivessem de acordo com os compromissos firmados por praticamente todos os países, com certeza, tudo o que contém nos pressupostos e principios da ecologia integral, nosso país e todos os demais não estariam enfrentando tantos problemas graves como os que já sobejamente conhecemos. O Brasil seria muito melhor e o mundo estaria mem um novo patamar de desenvolvimento integral, diferente do que continuamos a perceber e sentir através da realidade tão cruel que dizima e exclui bilhoes de seres humanos, o que não deixa de ser uma vergonha planetária.

Coincidindo com o “lançamento” dos objetivos do desenvolvimento sustentável, também em 2015, o Papa Francisco, de uma forma corajosa, destemida e inovadora publicou a chamada Encíclica Verde, a LAUDATO SI, que passou, desde então a ser uma referência tanto para a ação da igreja na questão do que se propugna seja não apenas um novo conceito, mas sim um NOVO PARADÍGMA, a chamada ECOLOGIA INTEGRAL quanto também para o agir das demais igrejas e credos religiosos. Como bem disse o Papa Francisco, a Laudato Si não é dirigida apenas aos Católicos, mas também “nesta Encíclica, pretend especialmente entrar em dialogo com todos acerca da nossa Casa Comum”.

Para elaborar esta Encíclica o Papa Francisco guiou-se, primeiro, pelos principios e verdades contidas na Bíblia Sagrada, secundado pela Doutrina Social da Igreja, desde a Rerum Novarum, de Leão XIII, em 1891, passando pela Quadragéssimo Ano de Pio XI em 1931; pela Encíclica Mater et Magistra de João XXIII em  1961; a Populorium Progresso do Papa Paulo VI em 1967; do mesmo Papa também a Encíclicas Octagessima Adveniens, de 1971  e as tres Encíclicas do Papa, hoje São João Paulo II Laborens Exercens de 1981; Sollicitude Rei Socialis, de 1981 e Centesimus Annus de 1991, em comemoracao ao cdentenário da Rerum Novarum.

Cabe aqui um destaque quanto `a “consolidação” que foi fruto do trabalho do Pontifício Conselho  de Justiça do Vaticano em 2004, quando houve uma sistematização no “compêndio” da Doutrina Social da Igreja. Deve-se também destacar que outras contribuições que ajudaram a elaboração do texto final da Laudato Si também vieram dos resultados do Concílio Vaticano II, através da Encíclica Gaudium et Spes (Alegria e Esperança).

Mesmo que alguns setores da Igreja enfatizem que houve um certo “rompimento” ou mudanca de rumo entre o Papado de Bento XVI e das ênfases, orientações e exortações apostólicas do Papa Francisco, percebe-se, como mencionadas na Laudato Si, que por diversas vezes Bento XVI também apresentou suas exortações quanto `a necessidade dos cuidados com o meio ambiente, com constantes de suas Encíclicas Deus Caritas est (2005) e Caritas in Veritate (2009) quando afirma “Por isso a Igreja, com sua ação, procura não só lembrar o dever de cuidar da natureza, mas também e sobretudo, proteger o homem da destruição de si mesmo”.

Nesta mesma linha de raciocínio Bento XVI  afirma na Encíclica Caritas in Veritate (2009) que “o mercado, por si mesmo não garante o desenvolvimento humano integral e nem a inclusão social. Entretanto temos um superdesenvolvimento dissipador e consumista que contrasta, de modo inadmissível, com perduráveis situações de miséria desumanizadora”.

Além da influencia das diversas Encíclicas dos Papas que o antecederam, ao formular seu paradígma da ECOLOGIA INTEGRAL, o Papa Francisco se inspira também nos escritos do  jesuíta, teólogo e filósofo francês Pierre de Teilhard de Chardin, bem como nas obras de  Thomas Berry (1994), Leonardo Boff e Virgil Elzondo (1995), Michael Cohen (1993), Jacques Maritain. Todos esses pensadores e escritores refletiram sobre as inter-relações entre o ser humano e a natureza e a necessidade de uma abordagem integradora, holística.

De uma forma ou de outra surgiram diversos conceitos para possibilitar a análise da realidade ambiental e suas inter relacoes com o ser humano, na busca do “progresso” e “desenvolvimento”.

Leonardo Boff e Elizon tanto em 1995 quanto 1997 destacam que existe uma conjugação entre o grito da terra e o grito dos pobres e que somente através do paradígma da ecologia integral que leve em consideração os aspectos culturais, sociais, politicos, economicos e espirituais poderão viabilizar a ecologia integral em suas ligações necessárias para um desenvolvimento integral, sustentável, harmônico e, verdadeiramente, humano, que não gere pobreza, fome, miséria e nem exclusão social.

Para o Papa Francisco este é o caminho quando descreve essas realidades da ecologia ambiental, da ecologia econômica, da ecologia social, ecologia cultural e da ecologia politica, em uma nova síntese que seria a ECOLOGIA INTEGRAL e para complementar menciona também a Ecologia da vida humana, responsável pelo autêntico progresso que produza uma melhoria global na qualidade de vida humana e no espaço/terrotório onde as pessoas transcorrem sua existência.

Fala também na Laudato Si (151) que “é preciso cuidar dos espaços comuns, dos marcos visuais e das estruturas urbanas que melhoram o nosso sentido de pertença, a nossa sensação de enraizamento, o nosso sentido de estar em casa, dentro da cidade (ou do território) que nos envolve e nos une”. Só assim, em minha opinião, a Igreja pode ter a “cara da Amazônia”, com sua diversidade cultural milenária, seus costumes, suas práticas religiosas, suas crenças e seus sonhos e ao mesmo tempo ser uma Igreja missionária, em saida, considerando sua opação preferencial pelos pobres e, ao mesmo tempo, uma Igreja acolhedora e profética, não temendo denunciar as injustiças e as práticas da violencia, seja contra as pessoas ou o meio ambiente e a sua biodiversidade. A defesa da vida, em todas as suas formas, também faz parte da ecologia integral e é uma missão permanente da Igreja em todas as suas instâncias.

Como corolário do paradígma da Ecologia Integral o Papa Francisco destaca os tres “T” Terra, teto e trabalho, que são condições necessárias e fundamentais para a dignidade das pessoas e dos povos não apenas da Amazônia mas também que se aplica as demais regiões dos países, principalmente na América Latina, Ásia e África, onde estão concentrados os maiores contignentes de pobres e excluidioo. No caso da Exortação Apostólica Pos Sinodal Querida Amazônia esta idéia, foi reforçada de forma bem clara.

Nesta Exortação Apóstólica, além de reafirmar a importância do Documento Final do Sínodo dos Bispos “Amazônia: novos caminhos para  a Igreja e para uma Ecologia Ingetral”, aprovado por ampla maioria dos participantes, Francisco aponta alguns de seus sonhos para a Igreja e para a Amazônia, com destaque para:

a)     Um sonho social – “ o nosso é o sonho de uma Amazônia que integre e promova todos os seus habitantes para poderem consolidar o “bem viver”;  mas impõe um grito profético e um árduo  empenho em prol dos mais pobres;
b)      b) Um sonho Cultural – “ o objetivo é promover a Amazônia, isto, porém, não implica coloniza-la culturalmente, mas fazer de modo que ela própria tire o que for o melhor de si mesma;
c)      Um sonho ecológico – “numa realidade cultural como a Amazônia, onde existe uma relação tão estreita entre o ser humano com a natureza, a vida diária é sempre cósmica. Libertar os outros de suas escravidões implica, certamente, cuidar do seu meio ambiente e defende-lo”.
d)     Um sonho eclasial – “A igreja é chamada a caminhar com os povos da Amazônia…O caminho continua e o trabalho missionário, se quiser desenvolver uma igreja com rosto amazônico, precisa crescer numa cultura do encontro, rumo a uma harmonia pluriforme”.

Ao relatar este seu sonho ecológico, o Papa Francisco mencionada Bento XVI quando afirma “ Esta é primeira ecologia que precisamos. Na Amazônia, compreende-se as palavras de Bento XVI, quando dizia que “ ao lado da ecologia da natureza, existe uma ecologia que podemos  designar “humana”, a qual, por sua vez requer uma ecologia social”, esta é a ideia de que tudo esta conectado, tanto na Amazônia quanto nos demais territórie em todos os continentes, razão pela qual a ecologia integral é um novo paradígma que se aplica a todo o planeta.

Quando fala de seu sonho Eclesial Francisco destaca em sua Exortação apostolica (63) “A autêntica opção pelos mais pobres e abandonados, ao mesmo tempo que nos impele a libertá-los da miséria material e defender seus direitos, implica propor-lhes a amizade com o Senhor que os promove e dignifica”.

Neste particular, inserido na ecologia integral Francisco fala da importância das florestas para a estabelização do clima; das águas; dos solos e da proteção e cuidados com os ecossistemas e a defesa da biodiversidade.

Para que a Ecologia integral seja possivel de ser concretizada é necessário que a Igreja como um todo, suas estruturas eclesiáticas, bem como um engajamento mais firme por parte do clero e também do laicato, para que em todas as paróquias, comunidades, dioceses e Arquidioceses este novo paradígma inspire novas formas organizacionais, como as PASTORAIS DA ECOLOGIA INTEGRAL, os observatórios e inúmeras ações possam ser levadas a cabo tendo o meio ambiente e as pessoas como pontos de referência.

Neste particular merece uma reflexão especial e mais detida sobre o Documento Final  “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ECOLOGIA INTEGRAL”, aprovado por ampla maioria dos participantes do Sínodo dos Bispos para a Pan Amazônia.

No Capítulo que trata da Igreja que cuida da “Casa Comum” na Amazônia, este caminhar é explicitado em a) A dimensão sócioambiental da evangelização, principalmente no ítem 79 quando afirma “A Doutrina Social da Igreja, que há muito tempo lida com a questao ecológica, é, hoje enriquecida com um olhar mais abrangente que abarca a relação entre os povos da Amazônia e seus territórios, sempre em dialogo com seus conhecimentos e sabedorias ancestrais”;
 b) Igrreja pobre, com e para os pobres a partir das periferiais vulneráveis, onde no item 80 afirma textualmente “ Reafirmamos nosso compromisso de defesa da vida em sua integralidade, desde   a concepção até o seu ocaso e a dignidade de todas as pessoas”.

No Capítulo que trata dos Novos Caminhos para a promoção da ECOLOGIA INTEGRAL, no ítem que discute a “interpelação profética e mensagem de esperança para toda a Igreja e para o mundo inteiro”, podemos destacar as discussões sobre o “pecado ecológico” como “uma ação ou omissão contra Deus, contra o proximo, contra a comunidade e contra o meio ambiente”, é também “um pecado contra as futuras gerações. Propõe ainda a necessidade da “criação de ministérios especiais para o cuidado da Casa Comum e a protecao da ECOLOGIA INTEGRAL no nível paroquial e em cada jurisdição eclesiástica, que tenham como funções , entre outras, o cuidado com o território e das águas, bem como a promoção da Encíclica Laudato Si. Assumir o progtrama pastoral educativo e de incidencia da Encíclica Laudato Si, seus capítulos V e VI, em todos os niveis e estruturas da Igrerja”.

O ítem b, indica a necessidade ou sugere a criação do Observatório Sóciopastoral da Amazônia, como mecanismo para fortalecer “a luta em defesa da vida”. Este observatório seria uma integração das ações dos diversos movimentos,  organismos, instituicoes e pastorais que atuam diretamente na ação evangelizadora da Igreja, incluindo REPAM, CARITAS, Centros de Direitos Humanos, Universidades Católicas, CIMI, CPT e outros mais.

Com certeza, a implementação da ECOLOGIA INTEGRAL, não apenas na Amazônia, como nas demais regiões do Brasil e de outros países Amazônicos e Sul Americanos é um novo e grande desafio para a Igreja, mas do qual ela não poderá fugir, sob pena de que todo o arcabouço de sua Doutrina social e todas as referências sobre meio ambiente contidos na Biblia Sagrada sejam transformados em meros conceitos acadêmicos ou até mesmo em palavras mortas, neste sentido, e tendo em vista a opção preferencial pelos pobres, a Igreja não pode estar abracada com os poderosos e de costas para o sofrimento do povo, isto também é um pecado ecológico.

Oxalá possamos refletir mais profundamente sobre toda esta complexa realidade e a urgência que a catástrofe ambiental esta a exigir de cada cristão e da Igreja como um todo.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy

Segunda, 17 Fevereiro 2020 10:21

 

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JUACY DA SILVA*
 

“AO POVO DE DEUS E A TODAS AS PESSOAS DE BOA VONTADE, A AMAZÔNIA QUERIDA apresenta-se aos olhos do mundo com todo o seu esplendor, o seu drama e o seu mistério. Deus concedeu-nos a graça de a termos presente de modo especial no Sínodo que se realizou em Roma de 6 a 27 de outubro de 2019, concluindo com o Documento Amazônia: Novos Caminhos para a Igreja e para uma Ecologia Integral.”

“Sonhos para a amazônia. A Amazônia é um todo plurinacional interligado, um grande bioma partilhado por nove países: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Perú, Suriname, Venezuela e Guiana Francesa. Todavia dirijo esta Exortação ao mundo inteiro. Faço-o, por um lado, para ajudar a despertar a estima e solicitude por esta terra, que também é « nossa », convidando-o a admirá-la e reconhecê-la como um mistério sagrado; e, por outro, porque a atenção da Igreja às problemáticas deste território obriga-nos a retomar brevemente algumas questões que não devemos esquecer e que podem servir de inspiração para outras regiões da terra enfrentarem os seus próprios desafios.”

Esses dois parágrafos fazem parte da introdução da Exortação Apostólica do Papa Francisco, uma reflexão sobre o Documento Final do Sínodo dos Bispos para a Pan Amazônica, realizado no final de 2019 e que deverá servir como uma bússula para as ações da Igreja nesta parte da América do Sul, uma realidade multifacetada que abrange nove paises, inclusive o Brasil, cujos territórios tem a Amazônia como área em comum e especial.

A cada dia que passa o Papa Francisco deixa a marca de seu pontificado através de seus pronunciamentos, de suas exortações apostólicas e de suas Encíclicas. O chamada “Papa do fim do mundo”, por ser o primeiro chefe da Igreja oriundo da América Latina, onde as injustiças, as desigualdades sociais, a opresssão e a exclusão social sempre lhe motivaram posturas inovadoras e corajosas em favor dos pobres e oprimidos.

Com certeza, como tantos outros Papas, deixará suas marcas na história e na caminhada da Igreja, mesmo que alguns setores mais conservadores dentro e fora da Igreja não gostem. Desde o inicio de seu papado Francisco não deixa dúvida quanto ao seu compromisso integral com o Evangelho e a Doutrina Social da Igreja, quando afirmou e assim tem feito ao longo desses anos, que deseja uma Igreja Pobre, sem opulência, sem subserviência aos donos do poder temporal, mas uma Igreja pobre e voltada para os pobres, uma igreja missionária, em saida, uma igreja fraterna e servidora, solidária com os que sofrem e, em minha opinião, uma Igreja profética, que não se cale e nem se omita ante as injustiças, a violência, as desigualdades, a discriminação, o xenofobismo e os preconceitos.

Em várias de suas manifestações, Francisco tem procurando resgatar não apenas idéias e conceitos, mas o espirito do Concílio Vaticano II e todas as mudanças que o mesmo proporcionou `a caminhada da Igreja neste pouco mais de meio século de sua história.

Em 1959 o Papa João XXIII deixa claro que pretendia convocar um Concílio e no Natal de 1961, através bula papal Humanae salutis formaliza sua convocação. Foram anos de intensos debates dentro e fora da Igreja, sendo finalmente encerrado em 08/12/1965, bem após a morte de João XXIII ocorrida em 03/06/1963, já no Papado de Paulo VI, hoje São Paulo VI, eleito Papa em 21/06/1963.
Como afirma artigos, alguns mais antigos e outros mais recente veiculado no site  https://www.a12.com “O pontificado de João XXIII foi breve, mas intenso. Ele teve a coragem de convocar o Concílio Vaticano II, colocando a Igreja no coração do povo. Depois, as teses reformistas do Concílio foram aprofundadas por seu sucessor, Paulo VI.
O Concílio foi tão revolucionário que até hoje precisa ser compreendido. O Papa Francisco diz que as reformas do Concílio ainda não foram totalmente assimiladas. Já Bento XVI afirma que existe um concílio virtual, que ficou famoso na mídia, e o concílio real, que ainda precisa ser aplicado”.
Pouco lido, mesmo entre católicos e muito criticado por setores conservadores da Igreja, o Concílio Vaticano II foi convocado e concluido, sob as lideranças e orientações de dois papas que acabaram sendo canonizados, São João XXIII e São Paulo VI por suas ações e trabalho de evangelização e, inclusive, na influência que exerceram ao longo dos trabalhos do Concílio.
Uma das grandes controvérsias que até a atualidade ainda existe em relação ao Concílio Vaticano II, diz respeito `a Teologia da Libertação, que, segundo muitos teólogos e estudiosos da doutrina católica e da doutrina social da Igreja, reflete a forma de ser Igreja na América Latina.
Em diversos trechos , de forma direta ou indireta, tanto no Documento Final do Sínodo dos Bispos intitulado “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para a Ecologia Integral” quanto na Exortação Apostólica do Papa Francisco “Minha Querida Amazônia”, vemos diversas referências ao Concílio Vaticano II, aos documentos de Medelin, Puebla, Santo Domingo e Aparecida e, também, sobre a Encíclica LAUDADO SI, a chamada Encíclica Verde.
Isto, em minha opinião, demonstra a continuidade que deve existir na caminhada da Igreja, principalmente na América Latina e, em particular, na Amazônia, onde cada Papa, ao longo de décados ou até mesmo séculos, tem exortado para que a Igreja não esteja, nunca, de costas para os pobres e excluidos e abraçada com os poderosos e também reforçando a idéia e o princípio bíblico e evangélico de que “Do Senhor é a terra e toda a sua plenitude”, ou seja, temos, como cristãos uma responsabilidade muito maior em preservar e não destruir e degrader o meio ambiente, que também é uma obra criada por Deus. Isto é o que consta do cerne do conceito e paradígima de que tanto fala Francisco, a ECOLOGIA INTEGRA e também o conceito de pecado ecológico e conversão ecológica.
Pois bem, é neste contexto da caminhada da Igreja, principalmente na Amazônia, que devemos ler, interpretar tanto o documento final do Sinodo dos Bispos para a Pan Amazônia quanto a Exortação Apóstolica “Minha Querida Amazônia” e nos guiar, como Igreja em um território tão vasto, tão enigmático, tão rico e que desperta tantos debates, incompreensões e diferentes visões de mundo.
Por diversas vezes o Papa Francisco afirma claramente que deseja uma Igreja com a cara dos pobres e dos oprimidos; com a cara indígena, com a cara amazônica e, para tanto esta Igreja precisa ter uma abertura ecumênica, trans ou intercultural, identificada com os habitantes do território Amazônico, ouvir os gemidos dos que sofrem e estar ao lado dos mesmos quando de suas lutas por terra, trabalho, teto, dignidade e justica. Uma Igreja missionária, em saida, evangelizadora, servidora e profética.

Para entender bem as mensagens de Francisco é preciso,`as vezes voltar um pouco no tempo e refletir sobre  o significado de todas as mensagens do mesmo, os desdobramentos e desafios que ainda hoje a Igreja enfrenta ao redor do mundo e, principalmente na Amazônia, bem como toda a caminhada preparatória do Sínodo, incluindo os trabalhos da REPAM – Rede Eclesial Pan-Amazônica, tecendo redes em defesa de nossa Casa Comum, bem como o que e como aconteceu o Sínodo dos Bispos para a Pan-Amazônia e suas conclusões, expressas no documento final aprovado e que agora recebe a Exortação Apostólica, intitulado “Minha querida Amazônia”.

Logo no inicio, o PAPA assim se dirige aos fiéis: “3. Ao mesmo tempo, quero apresentar de maneira oficial o citado Documento, que nos oferece as conclusões do Sínodo e no qual colaboraram muitas pessoas que conhecem melhor do que eu e do que a Cúria Romana a problemática da Amazônia, porque vivem lá, por ela sofrem e a amam apaixonadamente. Nesta Exortação, preferi não citar o Documento, convidando a lê-lo integralmente.

Isto significa que Francisco nos estimula a ler o documento final do Sínodo e a refletir sobre o mesmo, quando diz textualmente “4. Deus queira que toda a Igreja se deixe enriquecer e interpelar por este trabalho, que os pastores, os consagrados, as consagradas e os fiéis-leigos da Amazóôia se empenhem na sua aplicação e que, de alguma forma, possa inspirar todas as pessoas de boa vontade.”

Feitas essas duas recomendações, o Papa Francisco fala de seus sonhos e da esperança quanto ao futuro da Igreja na Amazônia e seu compromisso tanto com a defesa da região quanto de sua população: indigenas, ribeirinhos, pequenos agricultores, migrantes e moradores das cidades, principalmente os que vivem nas periferias sociais, econômicas, politicas e existenciais.

A seguir podemos destacar, resumidamente os doze sonhos de Francisco, contidos em sua Exortação Apostólica: Querida Amazônia:

1. SONHO COM UMA IGREJA QUE ESTEJA AO LADO DOS OPRIMIDOS
2. Que a voz dos pobres seja forte na Amazônia
3. Sonho do poliedro amazônico, sem colonização
4. O sonho de apreciar a sabedoria dos indígenas
5. O sonho do cuidado do meio ambiente e das pessoas (O sonho da ecologia integral)
6. O sonho de escutar o grito do Amazonas
7. O sonho de uma Igreja com rosto amazônico
8. O sonho de que os sacramentos cheguem a todos
9. O sonho de mais missionários na Amazônia
10. O sonho de mais leigos comprometidos com a Amazônia
11. O sonho de mais mulheres protagonistas na Amazônia
12. Que os cristãos defendam os pobres da Amazônia
Para muitos que imaginam que o Papa Francisco esteja rompendo com alguma tradição da Igreja ou de alguns de seus antecessores, o Santo Padre, ao longo de sua Exortação Apostólica, recorre a algumas mensagens, inclusive do Papa Bento XVI quando afirma “Já o meu antecessor, Bento XVI, denunciava « a devastação ambiental da Amazônia e as ameaças à dignidade humana das suas populações ».

Na esteira da Encíclica LAUDATO SI e de sua recente Exortação apostólica e no momento, tanto para a Igreja no Brasil, não apenas as Arquidioceses, Dioceses, Paróquias e Comunidades nos Estados Amazônicos, quanto nos demais países que integram a Pan Amazônia, o Papa apresenta linhas de pensamento e de ação evangelizadora, com ênfaze nas pastorais sociais e no espirito de solidariedade e fraternidade que deve existir por parte da Igreja com as populações indigens e demais que estão em processo de exclusão social, miséria e sem perspectivas ou esperança.

O Documento Final do Sínodo apresenta também a ideia de “criar um Observatório sócio pastoral da Amazônia, fortalecendo a luta em defesa da vida. Realizar um diganóstico do território e de seus conflitos socioambientais em cada Igreja local e regional, a fim de assumir sua posição, tomar decisões e defender os direitos dos mais vulneráveis. O Observatório trabalhará em parceira com o CELAM, a CLAR, a CARITAS, a REPAM, os Episcopados nacionais, as Igrejas locais, as Universidades Católicas, a CIDH, além de outros atores não eclesiais no continente e representantes dos povos inígenas”.

Não podemos esquecer também o trabalho de outros movimentos e organizações como CIMI, CPT, CEBs e tantos outros que lutam pela defesa dos direitos humanos da populacão que vive nesta vasta regiao que é a Amazônia.

Imagino, que outras iniciativas como a organização de PASTORAIS DE ECOLOGIA INTEGRAL, possam contribuir sobremaneira para tornar real as decisões do Sínodo e também os Sonhos de Francisco, contidos em sua Exortação Apostólica.

Ao final de sua Exortação Apostólica, Francisco assim se expressa “Depois de partilhar alguns sonhos, exorto todos a avançar por caminhos concretos que permitam transformar a realidade da Amazónia e libertá-la dos males que a afligem”

Oxalá, a Igreja, não apenas em suas estruturas eclesiásticas, mas com e através do trabalho do laicato, abrasada pelo Espírito Santo e pelos sonhos de Francisco, para que a Amazônia e seus habitantes, principalmente os que jazem, `a semelhança do assaltado no caminho de Emaus, e, assim, assemelhar-se cada vez mais ao Bom Samaritano, sem perder suas demais dimensões, inclusive de uma Igreja profética, possa ser um refúgio para reduzir o sofrimento dos pobres e excluídos que habitam a Amazônia.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy

 

Quarta, 12 Fevereiro 2020 15:23

 

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JUACY DA SILVA*
 

Em dezembro de 1983, o Secretário Geral da ONU encarregou Gro Harlem Brundtland de organizar e presidir uma Comissão de Alto Nível para atender ao que havia sido aprovado pela, então, última Assembléia Geral da ONU, para propor “Uma agenda global para a mudanca” do mundo.

Dentre as diretrizes daquela decisão podemos inferir os objetivos que iriam nortear, por 900 dias, os trabalhos da Comissão, incluindo: a) propor estratégias ambientais de longo prazo, para obter um desenvolvimento sustentável, por volta do ano 2000, inicio de um novo milênio; b) recomendar medidas para que as, então, já crescentes preocupações com a degradação ambiental, pudessem se traduzir em cooperação entre países em estágios diferentes de desenvolvimento econômico e social; c) despertar a consciência da população e dos governantes quanto `a gravidade da degradação ambiental e urgência em combate-la de verdade; d) considerar e definir mecanismos mais eficientes e eficazes para lidar com as questões ambientais.

Em outubro de 1984 a Comissão se reuniu pela primeira vez e em abril de 1987 apresentou seu relatório, intitulado “NOSSO FUTURO COMUM”, cujos resultados e propostas representam um marco histórico na luta ambiental ao redor do mundo, antecedendo em cinco anos `a realização da ECO-92, no Rio de Janeiro, quando a questão ambiental aflorou com toda a sua gravidade.

Conforme descrito na apresentação do Relatório, em diversas línguas, “uma das ideias centrais do Nosso Futuro Comum afirma e comprova que um desenvolvimento econômico ideal torna imperiosa a conservação dos meios naturais” (biodiversidade do planeta). Sem mecanismos e medidas que assegurem a conquista deste macro objetivo, a humanidade colocará em risco  a sua própria sobrevivência.

No corpo do citado Relatório foram apresentadas diversas advertências que, passados 33 anos ainda permanecem de uma atualidade gritante, só não vê quem não ou não deseja ver. Dentre tais advertências destacamos a realidade observada e constatada naquela época quando afirma que a cada ano, mais de seis milhões de hectares de terras produtivas se transformam em desertos inúteis.

Neste particular, a ONU acabou de declarar o periodo de 2021 até 2030 , como a DÉCADA DA RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS, tendo como objetivos a recuperaçãao de nada menos que 350 milhões de hectares de áreas degradadas ao redor do mundo, inclusive algumas no Brasil e que pode gerar US$ 9 trilhões em serviços ecossistêmicos e remover de 13 a 26 gigatons adicionais de gases do efeito estufa da atmosfera.

Outra forma de degracação ambiental constatada então e que ao longo dessas tres decadas aumentou e se tornou mais grave é a questão do desmatamento, principalmente das florestas tropicais, onde a Pan Amazônia já era percebida não apenas como o “pulmão” do mundo, mas o papel que as florestas desempenham no regime de chuvas no mundo todo.

Dizia o relatório, “anualmente são destruidos mais de 11 milhões de hectares de florestas”, atualmente só na Amazônia brasileira entre 1988 e 2019 já foram desmatados 421.904 km2 ou seja, 42,2 milhões de ha.

Se considerarmos o desmatamento na Amazônia sob a soberania dos demais paises, podemos afirmar sem sombra de dúvida que o tamanho da área desmata na Pan Amazônia deve ultrapassar de 70 milhões de hectares.

O desmatamento, no caso do Brasil, por exemplo, tem sido feito também no Cerrado, na Caatinga, do Pantanal e na Mata Atlântico, onde a destruição de todos os ecossistemas ocorre em rítimo acelerado, principalmente na região denominada de MATOPIBA – Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, outra área onde ocorre a expansão da fronteira agrícola de forma extremamente acelerada, deixando suas pegadas ecológicas.

De forma semelhante, se considerarmos que também em diversos países da África, Oceania e Ásia o desmatamento ocorre de forma acelerada, com certeza estamos diante de uma desvastação e desmatamento sem precedentes na história da humanidade.

O desmatamento e as queimadas contribuem sobremaneira para a emissão de gases que provocam o efeito estufa, contribuindo para o aumento das mudanças climáticas, cujos efeitos deletérios ja estão sendo sentidos em todos os países, inclusive no Brasil, apesar do ceticismo e omissão de diversos governantes, cuja visão distorcida quanto `as ameaças e gravidade da degradação ambiental, revelam o descaso em relação `a questão ambiental.

Tais governantes ignoram inclusive diversos alertas emitidos por estudiosos das questões ambientais e por milhares de cientistas que demonstram que o rítimo de degradação ambiental e das mudanças climáticas exigem esforços conjuntos de todos os países, conforme estabelecidos no tratado de Kyoto, na Agenda 21, nos Objetivos para o desenvolvimento sustentável, no Acordo de Paris e em todas as conferências da ONU sobre o clima.

Além da degradação dos solos, da desertificação e do desmatamento acelerado das florestas tropicais, outras aspectos também devem ser encarados com seriedade e urgência.  Dentre esses destacamos: a questão da precariedade do saneamento básico que polui todos os cursos d’água; a produção de resíduos sólidos (lixo) de uma forma crescente, principalmente do lixo plástico; a poluição do ar principalmente pela emissão de gases tóxicos das fábricas, da exploração agropecuária, da frota de veiculos movidos a combustível fossil (petróleo, gás natural), a existência de uma matriz energética suja e altamente poluente, ainda muito dependente de combustiveis fósseis, inclusive o carvão.

Na questão da produção de resíduos sólidos (lixo), com dados alarmantes, cujo incremento é muito superior tanto `as taxas de crescimento populacional quanto crescimento urbano e a cada dia coloca em risco a sobrevivência do planeta e a saúde das pessoas e da fauna marinha e da água doce (ocenanos, rios, lagos, manguezais, baias).

Por ano morrem no mundo mais de 7 milhões de pessoas com doenças respiratórias, causadas pela poluição do ar, além de milhões por doenças de massa, decorrentes da falta de condições de moradia, sujeitas `as doencas relacionados com esgotos escorrendo a céu aberto e destino inadequado do lixo.

Com excessão de alguns poucos, a grande maioria dos países não atingem sequer 10% quando se trata da reciclagem do lixo gerado. Além disso não podemos deixar de mencionar a questão do desperdício em todos os setores: água, alimentos, energia, construção civil, producao agropecuária, transporte e o impacto econômico e ambiental que este desperdício, em torno de um terço de tudo o que é produzido no mundo, inclusive no Brasil, acaba no lixo. Isto significa o uso predatório de recursos naturais, baixa produtividade econômica e a geração de um passivo ambiental, praticamente impagável, deixando para as futuras gerações um planeta doente, cujos custos de reparação recairão sobre os ombros das gerações que irão nos suceder.

Da mesma forma que estamos pagando na atualidade os custos de um desenvolvimento predatório, imediatista de nossos antepassados que nunca tiveram uma visão de futuro, a nossa geração, principalmente nossos atuais governantes parece que só pensam no lucro imediato e no seu proprio bem estar e acumulação de renda e riqueza.

É por isso que o Papa Francisco estará se reunindo com jovens e estudiosos das questões econômicas, sociais, ambientais, culturais e sociais para discutir o que ele denomina de A NOVA ECONOMIA ou a ECONOMIA DE FRANCISCO.

A principal tônica em suas exortações se alinham no que tem denominado do paradígma da ECOLOGIA INTEGRAL e que este novo Sistema econômico, a Nova Economia, precisa estar embasado/embasada em alguns pilares como: respeito e parcimônia no uso dos recursos naturais; empregabilidade e salários justos, única forma de reduzir a pobreza e a desigualdade social e econômica; um maior equilíbrio entre as nações evitando todas as formas de hegemonia e exploração dos países mais pobres, subdesenvolvidos ou de baixa renda.

Enfim, diante de tantas e claras evidências da degradação ambiental que estão em curso no mundo, não podemos perder tempo em seu enfrentamento, afinal, a crise ambiental exige urgência e comprometimento de todos os paises e, internamente em cada país, de todos os segmentos sociais, econômicos, religiosos, politicos e culturais.

Este pode ser considerado o nosso maior desafios na atualidade. Pense, reflita e veja o que voce pode fazer para salvar o planeta e melhorar a qualidade de vida em sua localidade, seu municipio, seu Estado e nosso pais. O desafios é de todos e todas!

*JUACY DA SILVA, professor universitario, fundador, titular e aposentado UFMT, sociologo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

Quinta, 28 Novembro 2019 13:16

 

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Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 

Quem mora em grandes ou  médias cidades, em regiões que possam ser atingidas por terremotos, maremotos, furacões, tornados, encostas de morros ou áreas alagadiças  como no Brasil e em varios países, onde desastres naturais ou ataques/bombardeios aéreos, como em regiões afetadas por guerras civis,  está mais do que acostumado com as sirenes de ambulância, corpo de bombeiros ou da defesa civil a qualquer hora do dia ou da noite. Isto é o que representa emêrgencia.


A razão desses alertas é para reduzir as perdas humanas durante esses desastres e catástrofes. Mas nem sempre tais alertas tem conseguido atingir seus objetivos e cada vez mais milhares e milhares de pessoas acabam perdendo a vida ou bens materiais incalculáveis. Emêrgencia então serve como um alerta permanente para evitar as consequencias das catástrofes.


O mundo todo e não apenas alguns países estão em estado de EMERGÊNCIA CLIMÁTICA. Há mais de meio século praticamente todos os anos, milhares de cientistas vem alertando governantes, empresários e a população em geral quanto aos riscos crescentes resultantes das mudanças climáticas, decorrentes do aquecimento global, provocado por emissões crescentes de gases do tipo efeito estufa, fruto da ação humana, em certo sentido, irresponsável.


As mudanças climáticas provocam, além do aumento da temperatura média do planeta, também o aquecimento das águas e elevação do nível dos oceanos,  podendo desalojar mais de duzentos milhões de pessoas que moram em regiões próximas dos mesmos; aumentar a poluição do ar, afetando também dezenas de milhões de pessoas.


Segundo os dados dos últimos relatórios da ONU e da OMS sobre as mudanças climáticas e saúde, atualmente mais de sete milhões de pessoas morrem todos os anos em decorrência da poluição do ar. Esta já é a terceira maior causa de mortalidade no mundo.


No último relatório do Painel intergovernamental das mudanças climáticas da ONU, desta última semana de novembro de 2019, a grande maioria dos países, principalmente os integrantes do G20, responsáveis por praticamente 80% das emissões  de gases de efeito estufa não cumpriram com as metas estabelecidas no Acordo de Paris em 2015, metas essas aceitas pelos referidos países.


Além de não terem conseguido reduzir a quantidade de emissão desses gases, na contra-mão dos termos do referido acordo, tais emissões aumentaram em media entre 8% e 10%, colocando em risco não apenas o cumprimento das metas estabelecidas mas também a sobrevivência da espécie humana no planeta terra e  a destruição da biodiversidade.


Por outro lado, as mudanças climáticas vão impossibilitar o cumprimento dos 17 objetivos do desenvolvimento sustentável, estabelecidos pela ONU e homologados por todos os países, inclusive o Brasil, tendo como horizonte temporal o ano de 2030, mesmo ano também estabelecido pelo Acordo de Paris para que o aumento da temperatura do planeta não ultrapasse 1,5 graus centígrados e a emissão de gases do tipo efeito estufa retorne aos patamares de 1990.


O Brasil, por exemplo, pouco ou quase nada tem feito, principalmente pelo governo Temer e atualmente pelo Governo Bolsonaro, para cumprir as metas estabelecidas, tendo, pelo contrário aumentado em 8% as emissões de gases efeito estufa, cujas origens são o Sistema de transporte, o parque industrial obsolete e em desacordo com as normais ambientais, o desmatamento e as queimadas em todos os biomas, principalmente na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal,  a precariedade do saneamento básico, principalmente a questão da produção e tratamento de lixo/resíduos sólidos e a falta de  coleta e tratamento de esgotos, entre outros desafios.


Esses são apenas alguns dos principais desafios que a COP 25, reunião do Clima que será realizado , sob os auspícios da ONU em Madrid, a partir da próxima semana, entre os  dias 02 e 13 de Dezembro de 2019, quando mais de 25 mil pessoas, entre representantes de governos, entidades não governamentais, empresariais, cientistas, estudiosos e ativistas contrários `as mudancas climáticas e ao aquecimento global estarão debatendo o estado atual das questoes ambientais e o futuro do planeta.


O Relatório do Painel intergovernamental das mudanças climáticas e os resultados de outros relatórios climáticos e do meio ambiente tanto da ONU quanto de outras organizações que tem sido divulgados são mais do que um alerta geral, chegando mesmo ao nível de indicar que estamos diante de um desastre ambiental sem precedente e cuja gravidade parece que tem sido simplesmente ignorada por governantes e empresários ao redor do mundo, muito mais preocupados com o poder, com as próximas eleições ou outras mediocridades que embasem suas ações. No caso do setor empresarial, ignoram todos os alertas quanto `a emergência climática e ambiental e se debruçam única e exclusivamente na exploração predatória dos recursos naturais, na busca do lucro imediato e na acumulação de renda, riqueza e propriedades, deixando para  o presente e para as próximas gerações um passivo ambiental impagável tanto em termos econômicos/financeiros quanto social e ambiental.


Ao assim agirem tanto governantes quanto empresários e, em certo sentido boa parte da população, agem como criminosos a quem pouco importa a sorte do planeta, das camadas mais empobrecidas, continuam insensíveis como tem acontecido com grileiros, madeireiros, latifundiários e falsos empresários que destroem as florestas ou empresas mineradoras a quem pouco importa a sorte de pessoas que perdem suas vidas e propriedades quando crimes ambientais são cometidos.


O alerta contido no  último e mais recente relatório do painel do clima diz textualmente “ nossos oceanos, nossas terras, o ar que respiramos, enfim, a humanidade inteira estão na iminência de um risco gravíssimo, ou seja, uma EMERGÊNCIA CLIMÁTICA jamais vista, se os niveis da emissão de gases tipo efeito estufa não forem reduzidos drásticamente em curto tempo, até 2030”.


As discussões na COP 25, na próxima semana em Madrid, deverão girar em torno de alguns objetivos que também são os desafios mais prementes relacionados com as mudanças climáticas, cabendo destaque para: 1) Que os países, principalmente os integrantes do G20, que são responsáveis por, praticamente, 80% das emissões de gases de efeito estufa, principalmente a China, os EUA, a Índia, a Rússia, o Brasil, o Japão e alguns países da União Européia; cumpram com os termos do ACORDO DE PARIS, de 2015 e as resoluções da COP 24, de 2018 na Polônia, para que o aumento da temperatura do planeta não exceda 1,5 graus centigrados até 2050.


Tanto no acordo de Paris quanto na COP 24, vários compromissos foram firmados por todos os países no sentido de que até 2020 e depois até 2030, todos os países reduzissem/ reduzam as emissões de gases de efeito estufa. No entanto, tais compromissos foram e continuam simplesmente ignorados e o volume das emissões aumentaram e continuam aumentando significativamente.


2) Que todos os países signatários do ACORDO DE PARIS e das resoluções da COP 24 cumpram integral, fielmente e imediatamente com seus compromissos, para que as metas relativas `as emissões de gases efeito estufa sejam cumpridas de fato.


3) Que o Mercado de carbono como aprovado na COP 24 seja uma das prioridades nas discussões da COP 25 e que os mecanismos de redução das emissões sejam efetivamente colocados em vigor.


4) Que a questão do acesso aos mecanismos de mitigação das perdas e danos estabelecido no Acordo de Warsóvia em 2013, associados aos impactos que as mudanças climáticas tem provocado nos países sub-desenvolvidos e emergentes seja debatida e aprofundada, estabelecendo as bases de ação em relação a tais perdas e danos ambientais, econômicos e sociais.


5) A imperiosa necessidade do avanço das discussões e negociações quanto aos fundos e recursos financeiros que os países desenvolvidos se comprometeram a repassar aos países sub-desenvolvidos e emergentes, para implementarem ações de combate `as mudanças climáticas, o chamada Fundo Verde do Clima.


Ainda no contexto das disccussões a serem travadas na COP 25, temas como produção e consumo sustentáveis; a economia circular, reciclagem, logística reversa, redução do desperdício, redução da produção, tratamento e destino do lixo , agroecologia, a agricultura urbana e peri urbana, o reflorestamento, cidades sustentáveis, substituição das matrizes energética e elétrica que atualmente usam combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão) por energias limpas e alternativas como energia solar, eólica, biomassa; eficiência energética; ampliação e modernização do Sistema de transporte público de massa,  de qualidade em substituição ao uso de transporte indivual por carros e outros veiculos movidos a combustíveis fósseis (gasolina e óleo diesel).


Outro aspecto que começa a ganhar corpo nessas discussões é a questão de um imposto sobre danos ambientais e poluição a ser cobrado de todos os setores e agentes poluidores e que degradam o meio ambiente, incluindo frota de veiculos,  fábricas, mineradoras, ou seja, a ideia é que quem polui e degrada o meio ambiente deve pagar pela poluição e degradação provocada e não deixar a conta para o público em geral ou as futuras gerações.
A lógica atual da privatização lucro e a socialização das perdas, em todos os setores, mas principalmente em relação ao meio ambiente é danosa `a sociedade em geral e aos cidadãos em particular e incentiva práticas degradadoras.


Esta lógica perversa precisa acabar e em seu lugar estabelecer ônus a quem não respeita o meio ambiente e pensa apenas no lucro imediato.
Enfim, mais uma vez, como em anos anteriores, o mundo estará sendo confrontado com desafios que não podem ser postergados e muito menos ignorados como tem acontecido até o momento. Este é o sentido do ativismo ambiental que temos visto crescer de forma significativa mundo afora e que precisa ser tambem estimulado no Brasil, antes que seja tarde demais!


Para que esta EMERGÊNCIA CLIMÁTICA seja enfrentada o ativismo ambiental, a luta em defesa do planeta, o compromisso de que as futuras gerações possam exercer o direito a um meio ambiente saudável, menos poluido é mais do que imperativo, é uma luta em defesa da vida, um direito humano fundamental de todos os seres humanos.


Existe um proverbio que afirma “quem não luta em defesa da vida não é digno/digna de vive-la”, ou seja, não podemos ser meros expectadores passivos do que acontece no mundo, a comecar pelo que acontece a nossa volta, em nossa vizinhança, nossa comunidade, nossa cidade, nosso Estado, nosso país. Devemos “pensar globalmente e agirmos localmente”.


Precisamos lutar para que a questão das mudanças climáticas, enfim, o meio ambiente ou o que o Papa Francisco tanto enfatiza como a Ecologia Integral, faça parte das  discussões públicas, da agenda pública nacional, estadual e municipal, principalmente, no caso do Brasil, que em 2020 estarão sendo realizadas eleições municipais, base de todas as nossas ações.


Não  podemos continuar assistindo passivamente a tanta medíocridade, ou planos de governo que pouco ou nada apresentem em termos de propostas relativas ao meio ambiente.


Precisamos urgentemente de uma politica de meio ambiente e de um Plano Nacional, Planos Estaduais e Planos  Municipais de meio ambiente, com o estabelecimento de objetivos, metas, indicadores, recursos a serem investidos nesta área, mecanismos de artiulação das ações governamentais em todos os niveis de poder e mecanismos de controle e avaliação dos resultados. Sem isso estaremos perdendo o bonde da história e colhendo apenas os resultados negativos que esta omissão produz.


Discursos vazios, demagogia ou obscurantismo ambiental não podem continuar como práticas de governantes e empresários que simplesmente ignoram a degradação ambiental, crimes ambientais e o future do planeta.


Só assim estaremos combatendo as mudanças climáticas e salvando nosso planeta de uma destruição sem volta.


*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Blog www.professorjuacy.blogspot.com Twitter@profjuacy

 

Terça, 26 Novembro 2019 13:18

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*

Costuma-se dizer que para resolver qualquer problema, primeiro a gente tem que aceitar/constatar que o problema existe, depois analisar detalhamente suas origens, consequências, gravidade e, só então, estaremos em condições de planejar as ações para o seu enfrentamento, sob pema de, se assim não agirmos, estarmos imitando o avestruz e  a ema, que, ao perceberem um perigo `a vista, procuram o primeiro buraco e enfia a cabeça dentro, na ilusão de que, ao ignorar o problema estarão a salvo do mesmo e de suas consequências.

Desde o final dos anos cinquenta, tanto nos EUA quanto na Europa e em outros países, estudiosos, pesquisadores e cientistas vem alertando governos nacionais, setor empresarial, lideranças em geral e a população como um todo que o modelo de desenvolvimento e de crescimento econômico em curso desde o inicio da revolução industrial há praticamente dois séculos, não tem levado em consideração a capacidade de suporte do planeta terra e que na esteira deste modelo, que produz lucro e acumulação de  capital, renda, riquezas em poucas mãos, em detrimento da grande maioria da população que continua `a margem deste processo, vivendo na pobreza, na miséria e em precárias condições de vida, está também deixando um grande passivo ambiental.

O problema ambiental a nível mundial e, em maior ou menor grau em cada país, é agravado de forma direta ou indireta por alguns outros fatores como aumento global da população mundial, aumento da urbanização, aumento do consumo e do consumismo e do desperdício.

Este passivo ambiental é representado pelo uso e abuso de combustiveis fósseis, destruição das florestas, principalmente das florestas tropicais, em que a Amazônia pode ser considerada a “bola da vez”, após o desmatamento desenfreado na Ásia, África, Europa, Américas do Sul, do Norte e Central e tudo leva a crer que, a continuar neste rítmo dentro de poucas décadas não apenas a amazônia brasileira, mas toda a pan amazônia poderá se transformar em uma grande estepe ou mesmo um deserto, com a degradação dos solos, a desertificação, contaminação e assoreamento dos cursos d’água e até mesmo a morte de rios e córregos, inviabilizando a “galinha dos ovos de ouro” que é o agronegócio nesta vasta região e outras do Brasil e de outros países.

Ao par do uso indevido dos solos e também a construção de grandes barragens e atividades mineradoras, incluindo garimpos ilegais, não apenas na Amazônia, mas praticamente em todas as regiões do Brasil e de diversos países sul americanos, africanos, Austrália e Europa, estamos assistindo uma teimosia em manter a mesma matriz energética suja e altamente poluidora, que de forma direta contribui para as mudanças climáticas.

Em recente relatório para ajudar nas discussões da reunião do clima, a COP 25, que inicialmente deveria ser realizada no Brasil, mas que ante a decisão do governo Bolsonaro em desisitir de tal evento, o mesmo foi transferido para o Chile e, diante do clima de violência social e politica naquele país, foi transferida para Madrid, o referido relatório destaca que a maioria dos países, principalmente os integrantes do G20, estão aquém das metas estabelecidas e aceitas como compromisso de todos os países signatários do ACORDO DE PARIS, em que todos os países se comprometeram a implementar ações para que o nível de aquecimento global, que é o principal fator das mudanças climáticas, não ultrapasse 1,5 graus do considerado aceitável, em relação ao que foi constatado no inicio da revolução industrial, sob pena de que essas mudanças climáticas contribuam para o aumento dos desastres naturais, como tempestades, maremotos, furacões, estiagens prolongadas, aumento do nível do mar e da temperatura dos oceanos.
Aqui cabe o destaque que a COP 25, será realizada nas duas primeiras  semanas de dezembro próximo em Madrid, quando são esperadas discussões muito acirradas em torno dos compromissos assumidos pelos países , cujas metas não estão sendo cumpridas.

No referido relatório é dito com todas as letras que a grande maioria dos países do G20, que são responsáveis por mais de 80% de toda a poluição/degradação do planeta, incluindo o Brasil, não apenas deixaram de cumprir com as metas estabelecidas mas também aumentaram os niveis de emissão de gases de efeito estufa, principalmente gás carbônico, metano e outros mais que afetam não apenas a atmosfera mas trazem consequências muito sérias para a saúde da população, com aumento da mortalidade.

Só a poluição do ar, afora outras formas de poluição e degradação, ambiental é responsável pela morte de mais de CINCO MILHÕES de pessoas a cada ano, podendo ser considerado a terceira causa de morte no mundo, atraz apenas das doenças cárdio-vasculares e dos diversos tipos de cancer. Estudos da Organização Mundial de Saúde recentes tem demonstrado uma correlação positiva, ou seja, contribuem para o aumento de diversas doenças, principalmente doenças pulmonares em crianças e idosos. Isto pode ser observado com o aumento de procura de atendimento medico/abulatorial/hospitalar durante o periodo das intenas queimadas que ocorreram na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal e nos demais estados e tambem áreas urbanas no Brasil. No caso de idosos, constata-se também que as mudanças climáticas tem contribuido para o aumento da incidência dos vários tipos de demência e outras consequências mais.

Recentemente veio a público uma matéria em que as 20 maiores empresas ligadas ao ramo do petróleo, incluindo a Petrobrás que é a vigéssima neste ranking mundial, contribuem sobremaneira para a emissão de gases tóxicos, não apenas nas operações de extração e refino, mas também no uso de combustíveis fósseis nas indústrias e nos sistemas de transporte e na geração de eletricidade.

Na mesma matéria foi dito que as tres maiores empresas petrolíferas que mais poluem, em 2017 gastaram mais de US$200 milhões de dólares para tentar massificar junto `a opinião a ideia de que contribuem para o desenvolvimento, nada falando sobre as consequências negativas do uso de combustíveis fósseis, pelo contrário boicotando, através de “lobby’ junto a setores governamentais o desenvolvimento de fontes alternativas como a energia solar e eólica.

Aqui mesmo no Brasil, vemos uma grande euforia quanto `a exploração do petróleo do pre-sal e, ao mesmo tempo, um esforço do organismo regulador do setor energético em solapar a expansão do setor da energia solar, retirando o subsídio deste setor e mantendo subsidios, pouco transparentes, para tantos outros setores, inclusive de geração e distribuição de energia elétrica, na contra-mão do despertar mundial para a substituição de fontes de combustíveis fósseis por combustíveis limpos e renováveis nas matrizes energética e elétrica de nosso país.

Existe um acordo tácito entre os países, mas boa parte deste acordo não passa de letra morta, principalmente entre os países que estão no topo da lista dos grandes poluidores mundiais, a começar pela China, Estados Unidos, Índia, Brasil, Rússia, Japão, Coréia do Sul e mesmo a União Européia como um todo, apesar dos esforços de alguns paises como Alemanha, França, Holanda, Bélgica, Espanha e uns poucos mais. Este acordo é no sentido de reduzir e dentro de algumas décadas acabar com o uso de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural), substituindo esta fonte poluidora por fontes alternativas e limpas, como energia solar, eólica, biomassa, nuclear, hidrogênio, ao lado de transformações tecnológicas que facilitem maior eficiência energética, com ganhos de produtividade econômica e a a redução do consumo per capita de energia.

Isto significa também, por outro lado, a busca de um novo modelo de economia como o que o Papa Francisco e diversos econmistas e pesquisadores mundiais tem denominado de UMA NOVA ECONOMIA e também em certo sentido, a chamada economia circular. Enquanto a primeira induz a discussão quanto `a repartição dos frutos do desenvolvimento e do crescimento econômico, a segunda chama a atenção para a necessidade de ampliar o uso útil dos fatores de produção e também dos produtos em si, reduzindo, drásticamente, o desperdício global.

Outro aspecto que vem chamando a atenção nesta equação climática é a questão do desperdício, em todas as esferas da atividades humana. O desperdício, que em alguns setores chega em torno de 30% de tudo o que é produzido, como no caso dos alimentos ou também no uso da água, tanto para consumo doméstico quanto comercial, industrial, na agropecuária e outros setores mais, representa uma pressão crescente sobre o meio ambiente, comprometendo as futuras gerações.

Uma questão que também tem chamado a atenção mundial é o uso de plásticos, criando o que podemos denominar de sociedade do descartável, contribuindo para o aumento deste tipo de lixo tão pernicioso para o planeta, para a poluição dos oceanos, rios, lagos, lagoas, córregos, aumentando a quantidade de lixo produzido pelos diversos países.

Além da produção de lixo em proporções alarmantes, bilhões e bilhões de toneladas a cada ano, a falta de consciência quanto ao consumismo, o desperdício e o geração de lixo, o que agrava ainda mais a situação é que a grande maioria dos países praticamente não recicla este lixo, contribuindo para mais uma forma de desperdício. Bilhões de dolares estão sendo “queimados”, enterrados ou simplesmente permanecem a céu aberto, prejudicando a qualidade do ar, os cursos d’água, afetando de forma direta a qualidade de vida e os niveis da saúde da população.

No mundo, por ano, são produzidas mais de 2 bilhões de toneladas de resíduos/lixo e deste total nos países subdesenvolvidos e emergentes, onde o Brasil está incluido, apenas 2% são reciclados, este percentual chega a uma média de 15% nos países desenvolvidos, com destaque para a Alemanha onde 48% do lixo gerado é reciclado.

Analisando e observando a realidade ambiental que nos cerca, desde cada comunidade/bairro, município/condado, estados/províncias, países e regiões, percebemos que poucos países, e o Brasil não esta incluindo nesta lista, possuem planos detalhados, com objetivos, metas, prazos, recursos e ações articuladas para enfrentar os desafios ambientais. A questão ambiental, por mais que diversos dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, direta ou indiretamente, nos remeta a esta questão, não fazem parte das politicas, estratégias e planos dos diversos niveis de governo e nem fazem parte das prioridades de governantes, nem de empresários e lideranças politicas e da sociedade em geral, isto, com raríssimas excessões.

No Brasil, por exemplo, mesmo ante o aumento do desmatamento e das queimadas, não apenas na Amazônia, mas também no Cerrado, no Pantanal e em todos os demais biomas, basta ouvirmos, lermos ou assistirmos as declarações de nossos governantes federais, estaduais e municipais , nas tres esferas de poder: Executivo, Legislativo e Judiciário ou mesmo de organismos de controle como Ministérios Públicos Federal e Estaduais, pouca coisa vamos encontrar em termos de ação efetiva. Por exemplo, os niveis de emissão de gases tóxicos na atmosfera no caso do Brasil nos útimos 3 anos teve um aumento de 8%, conforme o relatório recente da organização Transparência Climática.

Muitos de nossos governantes e lideranças empresariais e politicas resistem `a ideia e ao fato de que estamos diante de uma EMERGÊNCIA CLIMÁTICA, que as mudanças climáticas não são meras invenções ideológicas de alguns setores e países, que querem atrapalhar o desenvolvimento de outros e, como consequência não as consideram como prioridades quando das decisões politicas ou empresariais e destinação dos recursos orçamentários correspondentes.

Por exemplo, no atual governo federal e diversos governos estaduais e municipais, a questão ambiental passa ao largo das suas preocupações, variando entre a omissão, conivência até a distorção dos fatos, como vemos com frequência nas narrativas e pronunciamentos oficiais.

Os organismos ambientais no Brasil tanto em relação ao Governo Federal quanto estaduais e municipais encontram-se totalmente sucateados, com quadros técnicos muito aquém desses desafios e das ações que dos mesmos são esperadas, seja no que tange `a prevenção, educação ambiental ou fiscalização e controle.

Basta vermos a quantas andam os investimentos em saneamento básico no Brasil, uma vergonha nacional, pois em torno de 100 milhões de habitantes não tem sequer coleta de esgotos, obrigando que toda forma de dejetos sejam lançados nas ruas, valas, valões, corregos e outros cursos d’água, como acontece em Cuiabá e Várzea Grande, o maior aglomerado urbano de Mato Grosso, com mais de um milhão de habitantes, cujos córregos de há muito foram transformados em esgotos a céu aberto, contribuindo para a progressiva morte do Rio Cuiaba e do Pantanal, como aconteceu com os Rios Tietê, Tamanduateí e Pinheiros em São Paulo, a Baixada Santista, a Baia da Guanabara e outras localidades mais.

Apesar de constar no Orçamento Geral da União em 2017 o compromisso de investimento na ordem de R$20 bilhões de reais em saneamento básico, apenas R$9 bilhões foram gastos. Tomando-se a média dos investimentos neste setor nos ultimos dez anos, pode-se concluir que serão necessários mais de 80 anos para que ocorra a universalização de esgotos tratados no Brasil. Diante do corte dos gastos públicos em geral, sob a ótica exclusiva do equilíbrio das contas públias, com certeza, isto só vai ser realizado dentro de mais de cem anos.

Na Região Norte apenas 10,24% da população tem acesso a esgotamento sanitário, no Nordeste chega a 26,87%, no Sul 43,93%; no Centro Oeste 53,88% e no Sudeste a 78,56%. Há mais de tres decadas um estudo sobre a realidade do saneamento básico no Brasil demonstrava que para universalizar este serviço essencial para a saúde publica e para a melhoria da qualidade de vida da população brasileira, principalmente das camadas excluidas, que representam mais de 80% da população que não tem saneamento básico, seriam necessários mais de R$580 bilhões de reais em um prazo de dez anos, ou seja, quase R$60 bilhões de reais por ano, incluindo dotações orçamentárias dos goverrnos federal, estaduais e municipais.
Conforme pesquisa realizada pelo Instituto Trata Brasil e o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), num ranking de 200 países, realizado em 2011, o Brasil se encontra na 112ª posição, atrás de nações do norte da África, do Oriente Médio e de alguns países da América do Sul. Passados quase dez anos deste relatório, esta situação praticamente é a mesma, o que não deixa de ser uma VERGONHA NACIONAL.

Em 2017, de acordo com dados do Instituto Trata Brasil, o volume de esgoto não tratado lançado na natureza, vale dizer, ruas, avenidas, córregos, valas, valões, rios, manguezais, pantanal, lagos, lagoas e no oceano foi de 14,06 bilhões de litros de dejetos, pela falta de coleta e tratamento de esgotos.

Tendo em vista que nossos governantes, nossos empresárrios, nossos politicos, enfim, os marajás da República e donos do poder não vivem em favelas, áreas de invasão ou de loteamentos clandestinos, enfim, nas regiões periféricas das cidades, a eles pouco importa se milhões de familias, inclusive criancas, convivem com o lixo , o esgoto e todos os tipos de dejetos e animais peçonhentos.

Existe uma máxima que diz “politico não investe em esgoto porque tal obra fica debaixo da terra e ninguem vê”, pois na verdade politicos gostam mesmo é de colocar placas anunciando obras, muitas das quais faraônicas, dezenas de milhares super faturadas e inacabadas, paralizadas como as do VLT ou do Hospital Universitário, em Cuiabá e em muitas outras cidades e estados. Afora a corrupção em torno das quais muito dinheiro público, bilhões de reais que poderiam resolver ou minimizar a degradação ambiental foram surrupiaados dos cofres públicos ou utilizados de forma pouco eficiência, eficaz e transparente.

Por exemplo, apenas nas obras incabadas do VLT entre Cuiabá e Várzea Grande, no elefante branco denominado Arena Pantanal e que antes era um estádio de futebol que se chamava José Fragelli, foram gastos mais de R$1,5 bilhões de reais, importância esta que se não universalizasse a coleta e tratamento de esgotos em Cuiabá e Várzea Grande, representaria um avanço considerável neste setor.

Assim, sem sombra de dúvida, faltam tanto `a nossa população, mas principalmente aos nossos governantes, nossos empresários e demais lideranças politicas e sociais (do terceiro setor) o despertar da consciência quanto `a gravidade da degradação ambiental, principalmente das mudanças climáticas, não apenas o despertar da consciência, mas acima de tudo a falta de responsabilidade para darmos um salto qualitativo, que represente uma mudança radical de paradígma na forma como a questão ambiental deva ser tratada, antes que o desastre seja maior , com graves consquências para o país, não apenas afetando seriamente as atuais gerações, mas principalmente as gerações futuras que irão pagar a conta por esta omissão, irresponsabilidade e obscurantismo quando questões graves são negligenciadas.

Dentro de um ano serão realizadas eleições municipais, quando mais de 5 mil prefeitos  e mais de 65 mil vereadores serão escolhidos, dentre mais de tres ou quatro centenas de milhares de candidatos, para darem um novo rumo na definição e implementação de politicas públicas.  Creio que estamos extamente no momento em que essas questões devam fazer parte não apenas dos famosos “planos de governo”, mas também da agenda das discussões públicas, a partir de agora.

A questão ambiental, em todas as suas variantes, como saneamento básico, desmatamento, queimadas, poluição do ar, poluição urbana e rural,  degradação dos solos, reflorestamento/florestas plantadas, desperdício, segurança alimentar, geração , cuidados e destinação de todos os tipos de lixos, reciclagem, economia circular, agroecologia, agricultura urbana e peri-urbana, uso de energias alternativas, com destaque para o aumento de geração e uso de energia solar, eólica e biomassa.

Enfim, é fundamental que a questão ambiental seja, de fato, uma prioridade nessas eleições municipais. Se isto não acontecer, se questões de fundo, importantes forem substituidas por acirramento ideológico, intolerância e outras narrativas que atendem aos que pretendem apenas disseminar ódio, intolerância, fanatismo e violência, estaremos perdendo  novamente o “bonde da história” e isto vai se refletir nas eleições gerais de 2020, quando o desastre e retrocesso politico, social e ambiental poderão ser maiores e estaremos cada vez mais longe da sustentabilidade, tão preconizada na Agenda 2030.

Apenas para reforçar o argumento e a importância para que a questão ambiental seja encarada de frente pelos atuais e futuros governantes municipais, estaduais e federais, dados do IBGE, do Instituto Trata Brasil e da Associação das Empresas que atuam no setor demonstram que esta realidade é vergonhosa.

Vejamos o que consta do documento que embasou a definição do marco regulatório desta área: “A tramitação do texto levantou uma discussão sobre as deficiências do Brasil na área: o país tem 57 milhões de residências sem acesso à rede de esgoto, 24 milhões sem água encanada e 15 milhões sem coleta de lixo, de acordo com os dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2018, do IBGE. Estudos mostram que essa insuficiência de saneamento pode ter impactos na saúde, na educação e no mercado de trabalho”. Com certeza nesses numeros não estão incluidos os donos do poder, esta é a realidade de milhões de pobres e excluidos do Brasil.

Não podemos deixar que a incompetência, o descaso, a insensibilidade, a falta de consciência e de responsabilidade de nossos governantes e empresários sejam os pilares da gestão pública e da economia, principalmente quando se tratar da degradação ambiental, das mudancas climáticas e dos desafios que daí surgem.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação.Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com

 

Quarta, 13 Novembro 2019 16:37

 

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JUACY DA SILVA*

Parece que a história do Brasil, nosso passado, nosso presente e nosso futuro giram apenas e tão somente em torno do “LULA LIVRE”, da decisão recente do STF- Supremo Tribunal Federal e das tentativas de inúmeros deputados federais e senadores em promoverem uma mudança casuística seja na Constituição Federal, que já está por demais emendada e remendada, desfigurada quando comparada com o texto original aprovado pelos Consituintes em 1988, ou no Código de processo penal (CPP), possibilitando que pessoas condenadas em segunda instância possam ser presas e iniciarem o cumprimento de uma pena passível ainda de revisão em instâncias superiores, a despeito de que após a decisão final da última instância (o tão decantado trânsito em julgado) essas pessoas possam ser consideradas inocentes.

Quem assim pensa e se expressa invoca a morosidade da justica e as diversas instâncias recursais,  que acabam provocando a prescrição das penas definidas em instâncias inferiors. Ora, ao invés de promoverem uma reforma profiunda para acabar com a morosidade da justica e sua imensa burocracia, esses áulicos do punitivsmo promovem na verdade mais injustiça, principalmente `as camadas mais pobres da população que não dispoem de recursos para custearem advogados de renome e com larga experiência em tribunais superiores.

Na verdade todas essas reações da extrema direita, chegando até mesmo `as raias do absurdo, como a manifestação de um deputado federal do PSL dizendo que gostaria de ver Lula morto, demonstram o nível de ódio e preconceito em que a politica brasileira está envolta ou de uma senadora de MT que de forma gratuita tentou denegrir a imagem da atual namorada de Lula, uma socióloga, chamando-a de cadeira, sem nunca a referida mulher ter sequer mantido contato ou ofendido a referida senadora.

Para esses "obnubilados", endemoniar Lula e o PT é a única saida para os problemas brasileiros, a eles parece que encarcerar ou até matar Lula e destruir o PT, os socialistas e comunistas seria a única forma de possibilitar que o nosso país resolva os problemas da corrupção que vem desde o Brasil colônia, com o caos e sucateamento dos serviços públicos, com a miséria, a fome, a pobreza, as desigualdades sociais, as queimadas na Amazônia, as rachadinhas, os laranjais do PSL, os privilégios das elites e marajás da República e outros mais que podem ter tres, quatro, cinco aposentadorias as custas dos cofres publicos e obrigam os trabalhadores a chegarem ao final da vida vivendo com um ou menos do que um salario minimo, como acontece no Chile, modelo ideal para Paulo Guedes e Bolsonaro, onde o índice de suicídios de aposentados tem aumentado a cada ano.

Se a terceira e quarta instâncias não precisam ser ouvidas para finalizar um julgamento e se as pessoas, mesmo quando considerando inocentes, a chamada presunção de Inocência, devam ir para a cadeia e começarem a cumprir pena, mesmo que no futuro, após essas instâncias decidam que a pessoa é inocente, não seria o caso de acabar com essas duas instâncias superiores do sistema judiciario?

Pois bem, esta decisão do STF não foi tomada apenas para beneficiar LULA, como a turma da direitona está tentando “vender’ e aterrorizar a sociedade, nem  irá beneficiar centenas de milhares de assassinos, estupradores, ladrões, assaltantes, sequestradores, feminicidas, parricidas, enfim, pessoas que cometeram crimes hediondos ou até mesmo corruptos que já foram condenados a mais de cem anos como os ex governadores do Rio Sérgio Cabral e Pezão, do  MDB/PMDB, apesar de que os bolsonarianos e seus simpatizantes imaginam que só a turma do PT e Lula sejam corruptos.

Longe disso, esta decisão do STF só irá beneficiar menos cinco mil presos já condenados em segunda instância, (0,6%) dos mais de 800 mil presos nas masmorras (prisões) do Brasil, das quais em torno de 357 mil presos (45% do total da população encarcerada no Brasil) que jamais foram condenadas sequer em primeira instância, nunca foram julgadas e condenadas por um juiz.

Até prova em contrário essas pessoas devem ser consideradas  inocentes, mas já estão trancafiadas pelo arbítrio do Estado e seus agentes de represssão, ante o olhar omisso tanto da defensoria pública quanto do ministério público e do próprio judiciário. Existem pessoas que ficam presas injusta e ilegalmente por anos a fio, sem culpa formada e isto é um atentado não apenas contra tais pessoas mas também contra o tão decantado e propalado estado democrático de direito, que, neste particular é apenas uma balela.

O Brasil, como já exposto em artigo recente de minha autoria, tem uma das maiores taxas de encarceramento do mundo, quase tres vezes a média mundial e muito acima de todas as grandes regiões do planeta: África, Ásia, Oceania, América do Sul, America Latina, América do Norte e Europa e, mesmo assim, parlamentares conservadores e de extrema direita, em sua sanha penalista e punitiva, querem “endurecer” as leis, alguns até defendendo a pena de morte (que já existe no Brasil e  é praticada por bandidos e por agentes do Estado que primeiro atiram e depois vão verificar do que se tratava) e a prisão perpétua, sem se dar ao trabalho de ir mais a fundo e descobrir, entender as causas que levam/empurram adolescentes, jovens, a grande maioria negros e afrodescendentes, pobres e excluidos para a vereda do crime, da delinquência e do submundo da sociedade.

Voltando ao tema deste artigo. Lula livre, e agora? Pois bem, depois de 580 dias preso em uma sala “especial” da policia federal em Curitiba, por decisão tanto do ex-juiz e atualmente ministro Sérgio Moro e pela segunda instância, mesmo afirmando e reafirmando sua inocência, Lula vai acirrar a polarização politico-partidária e ideológica por um bom tempo em nosso país, mesmo que em alguns momentos tenha falado em “paz e amor”.

Toda polarização precisa para existir de dois polos e no caso, um dos polos, o da direita e extrema direita já vinha sendo acirrado desde antes da chegada de Bolsonaro ao poder, mais precisamente no periodo que antecedeu a derrubada de Dilma, pouco importa se foi impeachment ou golpe, o nome do fato é o de menos, o que importa é que a presidente foi reeleita dentro das regras do jogo e como os perdedores não aceitaram a derrota, no tapetão, acabaram por abreviar seu mandato popular.

A partir dai, o governo Temer/ MDB, que também andou e continua com problemas na justiça, acusado de corruoção, passou a ser considerado um governo de transição, da esquerda da qual o então PMDB fazia parte para um governo de extrema direita, com o bolsonarismo em plena expansão e Guerra ideológica, do qual o agora MDB, como também a grande maioria dos partidos que integraram e mamaram nos governos petistas fazem parte.

Lula Livre, até quando só a justica com sua morosidade vai determinar, já que a tal emenda da segunda instância não terá poder para atingir processos já julgados pela referida segunda instância, seguindo o espirito da Lei que diz na Constituição  artigo 5 inciso XXXVI  quando afirma que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”, uma nova Lei não pode retroagir, a não ser para beneficiar o réu.

Desta forma, para aqueles que imaginam que se o Congresso emendar/remendar a Constituição Federal ou qualquer outra Lei ordinária, o Estado brasileiro poderá enviar novamente Lula para a cadeia, retirando-o da vida píblica/politica estão totalmente equivocados. Lula poderá voltar para a cadeia caso o processo pelo qual foi condenado (triplex do Guarujá) ou outros em que esteja sendo investigado, caso venha ser condenado em última instância (STF), o que, pela morosidade da justica pode demorar um bom tempo.

Lula livre tem vários desafios pela frente. O primeiro, é conseguir decisão favorável junto ao STF que venha anular todo o processo a que foi condenado pelo ex-Juiz Sérgio Moro e pela segunda instância em Porto Alegre, pelo que seu advogado argui como erros/falhas de origem, falta de provas cabais etc. Se isto aconter, haverá uma grande consequência que será a anulação da decisão do TSE que considerou Lula inelegível por ter sido condenado em segunda instância e, assim, se carimbado como “ficha suja”, tendo sido impedido de ser candidato nas últimas eleições presidenciais, quando todas as pesquisas indicavam que ele seria eleito novamente Presidente da República.

Esta é a razão pelas enormes e as vezes indecentes pressões a que o STF e seus ministros vem sofrendo por parte de pessoas, partidos, parlamentares, enfim, parte da elite do poder, contra suas decisões. Isto é o que podemos denominar de emparedamento do poder judiciário, retirando-lhe a autonomia e independência ao seu ofício de julgar com imparcialidade e sem amarras ideológicas. Isto é proprio de regimes autoritários, civis, religiosos ou militares, onde o poder judiciário é apenas um puxadinho do poder executivo, da mesma forma que o poder legislativo que só sabem dizer amem `as vontades dos donos do poder e seus aliados.

Se tudo isso acontecer, ou seja, se os processos em que Lula figura como réu forem anulados, como de fato imaginam os petistas e os lulistas, estará sendo dado a largada  para as eleições presidenciais de 2022, com a polarização que foi frustrada pela condenação de Lula em 2018, entre Lula e Bolsonaro, com uma vitória quase certa para Lula.

Mas além de dirimir este nó górdio jurídico/judicial, Lula também  tem pela frente alguns outros desafios. O maior desafios de Lula será unificar as chamadas esquerdas e conseguir o apoio de alguns partidos e grupos de centro, que tanto em 2002, quanto 2006, 2010 e 2014 votaram em Lula e Dilma e passaram a fazer parte dos governos petistas, com destaque para partidos tradicionais como MDB, PTB, DEM e outros mais que no momento, pelo oportunismo e fisiologismo que marcam a politica brasileira, estão com Bolsonaro, mas que não vão titubear em abandonar o capitão, ao perceberem que os ventos democráticos sopram mais fortes do que as tempestades totalitárias/ autoritárias que são formadas entre bolsonaristas e outras forças de direita.

Quanto `a esquerda, Lula precisa vencer dois outros desafios, quais sejam: primeiro, conseguir acalmar o destempero verbal de Ciro Gomes, que também se julga “o único ungido”, talvez por deuses, como Bolsonaro, e não silencia sua metralhadora verbal contra Lula e sempre que pode boicota o PT, como fez nas últimas eleições, impossibilitando a vitória de Hadad e permitindo a eleição de Bolsonaro. Basta ler ou ouvir seu discursos contra Lula, inclusive no último após Lula ser solto, a quem chamou de “encantador de serpentes”, não demonstrando nenhuma solidariedade a quem passou 580 dias na prisao.

ALém de Ciro Gomes, Lula tambem terá que conter os radicais do PT e de outros partidos que desejam um acirramento ideológico e tem se posicionado contra alianças com partidos do centrão, empurrando LULA e o PT para um esquerdismo que, no pensamento de Lenin , era a “doenca infantil do comunismo”.

Neste contexto, só existem duas alternativas, a construção de uma frente ampla que contemple tanto partidos tradicionais de esquerda incluindo PT, PCdoB, PPS, PSTU, PCO, PDT e outros e também partidos de centro/centrão, que contribuirão para uma grande aliança não de cunho exclusivo socialista/comunista, mas também com nuances de social democratas, progressistas, nacionalistas, bem como  de diversos movimentos sociais.

Se esta frente ampla  não se concretizar e as esquerdas se fragmentarem, com certeza haverá um segundo turno nas práximas eleicoes presidenciais, se antes disso um golpe não colocar tudo por terra, como foi em 1964, entre algum candidato de esquerda, que pode ser Lula, Hadad ou até mesmo Ciro Gomes x um candidato de direita, que também deverá chegar `as eleicoes bastante fragmentada, que pode ser Bolsonaro, dependendo do desempenho econômico  e de politicas sociais de seu governo ou outro a quem a direitona abracar.

Lula disse e com certeza enquanto estiver livre o fará, que vai percorrer o Brasil, em caravana, levando uma mensagem de amor e esperança e, ao mesmo tempo, tentando “desmascarar” as politicas neoliberais e conservadoras do governo Bolsonaro e seus aliados.

Para contentar seus seguidores mais radicais Lula está diante de um dilema, sabe que se exagerar na dose das críticas será alvo de ataques, pressões e até mesmo ações judiciais como já ameaçaram Bolsonaro ,líderes do PSL tanto na Câmara como no senado, enfim, parlamentares que, `a semelhança do Deputado Eduardo Bolsonaro, PSL/SP, que ameaçou as esquerdas com uma re-edição de um instrumento autoritário como o AI-5; ou como fez o senador Major Olímpio e o proprio presidente Bolsonaro, que ante alguma radicalização pode invocar a Lei de Segurança Nacional, outro instrumento draconiano, de origem dos governos militares que sempre era invocado para justificar atos arbitrários, como cassação de mandatos e direitos politicos de opositores ou até mesmo para o fechamento do Congresso.

Todos sabemos que, pela Constituição, greves, manifestações e protestos, desde que pacíficos, fazem parte dos direitos fundamentais do povo, mas tudo depende de como tais manifestações sejam interpretadas pelos atuais donos do poder, incluindo o membros dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Sempre é bom lembrar que a maior parte dos donos do poder, principalmente na atualidade brasileira, pertencem ao expectro ideológico conservador e tendem a propor medidas repressivas ante quaisquer manifestações e movimentos reivindicatórios, por mais que o ordenamento jurídico e a propria Constituição Federal “garantam”, na maior parte das vezes apenas no papel, inúmeros direitos civis, sociais/coletivos, como saúde, educação, seguranca pública, meio ambiente saudável, trabalho, salario digno etc etc.

O retorno da caravana de Lula, desde que realmente traga alento e esperança para o povo e apresente propostas de como construir um país com desenvolvimento sustentável, justo, fraterno e reais oportunidades para todos, fortalecerá também as aritculações para as eleições municipais de 2020, principalmente nas capitais, regiões metropolitanas e cidades grandes ou de porte médio, onde se concentram mais de 70% do eleitorado brasileiro.

Este será um momento em que o Governo Bolsonaro e seus aliados na extrema direita e no centrão irão testar se o “fenômeno” que aconteceu nas últimas eleições presidenciais (eleicao de Bolsonaro) foi um movimento de mudança do espectro ideológico, ante a vitória de inúmeros parlamentares de direita tanto no Congresso Nacional quanto nas Assembléias Legislativas ou apenas uma brisa temporária que já se arrefeceu e tende a retornar ao seu leito natural com pouca expressividade em termos de conquista e manutenção do poder.

Na construção deste cenário podemos observar duas tendências, pelo menos em relação ao que está acontecendo na América do Sul. De um lado os resultados das eleições na Argentina, onde, democraticamente, a população e os movimentos sociais e de massa, derrotaram de forma fragorosa o governo e modelo neoliberal de Macri, por quem Bolsonaro torcia abertamente e também as ondas de protestos, até mesmo violentos, no Chile em que o mesmo modelo neoliberal, boa parte ainda oriundo do governo Pinochet estão sendo confrontados nas ruas, exigindo que o Governo Pinera ceda a tais pressões, demitindo ministros e até mesmo convocando uma Assembléia Nacional Constituinte, quando, com certeza todo o arcabouço do modelo neoliberal será revisto, ante o aumento da miséria e penúria da população, frutos deste modelo injusto e desumano que e o neoliberalismo, que Bolsonaro e Paulo Guedes tentam implantar a toque de caixa, a ferro e fogo no Brasil.

No outro espectro, temos também a recente crise na Bolívia, que apesar de indicadores econômicos e sociais considerados excelentes até mesmo pelo FMI e Banco Mundial, chegando até a se falar em “milagre boliviano”, expresso em altas taxas de crescimento do PIB e redução significativa da pobreza, da fome e da miséria, mas que “pecou” pela ânsia de Evo Morales e seus seguidores em se perpeturarem no poder. Daí a expressao bíblica “nem só de pão vive o homem”. Além de pão e circo, a população, enfim, as massas também precisam de esperança, transparência, ética e renovação politica, aspectos que, mesmo com situação econômica favorável, foram sabiamente exploradas e catalizadas pelas forças que se opunham e se opõem a Morales e seu partido, pela direita e também por setores da esaquerda, haja vista que o segundo colocado nas eleições anuladas se diz também canditado de esquerda ou até mesmo revolucionário.

Um outro exemplo e situacao em curso é a realização do segundo turno das eleições no Uruguai, onde o candidato de esquerda, da frente ampla, o atual governo, que ficou em primeiro lugar no primeiro turno, mas que poderá ter grandes dificuldades de vencer o segundo turno, tendo em vista que o segundo, terceiro e quarto colocados pertencem aos quadros da direita.

Além dessas situações, as caravanas de Lula pelo Brasil afora ainda podem ser influenciadas pelo que está ocorrendo na Venezuela já há alguns anos, no Peru, no Equador, em alguns países Centro-Americanos e no México e até mesmo em países europeus, como na Espanha, onde os socialistas “ganharam” as eleicoes, mas não conseguem formar um novo governo, ante também o crescimento da bancada da extrema direita.

Enfim, a dinâmica politica, social, econômica e ambiental brasileira não depende apenas da correlação das forças internas em sua escalada ideológica, mas também da polarização ideológica internacional, da reeleição ou derrota de Trump nos EUA e dos indicadores sociais e econômicos do Brasil entre o momento atual e as eleições municipais daqui há um ano, situação esta que servirá de base ou pano de fundo para as eleicoes presidenciais e gerais de 2022.

Uma última observação diz respeito `as eleições americanas em novembro de 2020. Dependendo dos resultados, como por exemplo a reeleição de Trump fortalecerá a direita mundial, inclusive no Brasil, ao passo que a eleição de um candidato do Partido Democrata, poderá alterar substancialmente a politica externa dos EUA e enfraquecerá, com certeza, as forças de direita, inclusive no Brasil, particularmente Bolsonaro e seus seguidores, que tem em Trump seu ideal de ação politica.

Enfim,quem viver verá!

*Juacy da Silva, professor universitario, fundador, titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólgo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy  Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

 

Segunda, 11 Novembro 2019 09:56

 

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JUACY DA SILVA*

A decisão, por muitos considerado histórica, do STF na última quinta feira, 07 de Novembro de 2019, considerando que a prisão de condenados em segunda instância é inconstitucional, ou seja, continua valendo o que consta no art. 5º, inc. LVII, da Constituição Federal, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” e do art. 283 do CPP – Código de processo penal, que dispõe: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

Grupos mais radicais `a direita tanto no poder judiciário quanto no ministério público (federal e estaduais) e os atuais donos do poder, no Executivo e no Legislativo, vem fazendo um grande alarde como se tal decisão possibilitasse que milhares de assassinos, facínoras, estupradores, ladrões, corruptos de alta periculosidade fossem soltos e , assim, passassem a aterrorizar a sociedade brasileira, tornado o clima de violencia pior do que já está na atualidade.

Até 2016, este era o entendimento da Suprema Corte, ou seja, vale o que está escrito, o que foi deliberado democraticamente pelos consituintes e pelo Congresso  no caso do Código de processo penal. Todavia, por motivações puramente ideológicas seis ministros naquele ano resolveram rasgar a Constituição e estabeleceram que as pessoas pudessem ser presas após decisão condenótoria em segunda instância, mesmo diante da possibilidade de na última instância essas pessoas presas pudessem ser consideradas inocentes.

Como a justiça brasileira, além dos varios graus de recursos, tem como característica ser demasiadamente lenta, milhares de pessoas poderiam ficar atraz das grades enquanto estivessem aguardando a sentença final que lhe reconhecesse a inocência. Pergunta-se, quem irá pagar por esta injustiça? Quem irá resgatar a indignidade que tais pessoas sofreram ao serem encarceradas inocentemente?

Diante desta celeuma, coube ao atual presidente do STF tornar a pautar julgamento de ações que questionavam tal prática arbitrária e inconstitucional como a Suprema C orte tornou a decidir, novamente por apenas um voto 6 x 5, demonstrando que, por mais brilhantes, extensos e rebuscados votos dos ministros, o que parece estar valendo mesmo é a dimensão ideológica que cada ministro carrega consigo.

Mal o STF tomou esta decisão, que em termos imediatos possibilitará a libertação de alguns presos, pouco mais de cinco mil, condenados em segunda instância, alguns  acusados e condenados por corrupção, apesar de que alguns como o ex-presidente Lula, continuem negando tais crimes e dizendo-se inocentes, no aguardo do julgamento de todos os seus recursos, até que sejam considerados culpados ou inocentes, na sentença final, no chamada “transitado em julgado” como determina de forma clara tanto a Constituição Federal quanto o CPP – Código de processo penal, tais forças conservadoras enquistadas no Congresso Nacional, no Palácio do Planalto, no Poder Judiciário, no Ministério Público Federal e Estaduais, em diversos partidos politicos e bancadas temáticas na Câmara Federal e Senado já se articulam para aprovar mais uma emenda/remendo `a Constituição Federal possibilitando a prisão após condenação em segunda instância.

A probabilidade de que isto venha a acontecer por vias legislativas não é tão grande e irá provocar uma tremenda discussão politica e mobilizações pelo pais afora, esgarçando ainda mais o tecido social que já está mais do que roto, prestes a descambar em ondas de violência, na esteira de problemas reais que afetam a população brasileira, como o desemprego, subemprego, miséria, fome, exclusão social, precariedade e casos na saúde publica, educação, transporte etc, principalmente as camadas mais pobres que ficarão mais pobres ainda, graças `a truculência e desumanidade das politicas econômicas e sociais do governo neoliberal de Bolsonaro e Paulo Guedes, que tem demonstrado uma enorme aversão pelos pobres, porque esses não tem capacidade de poupar.

Seria o caso de pergungar ao ministro e ao presidente como fariam para viver se ganhassem apenas um salário minimo por mes e quando poderiam poupar.

Voltando ao titulo deste artigo, com muita frequência ouvimos os donos do poder e seus seguidores, acólitos encherem o peito para exaltarem que estamos vivendo em um “estado democrático de direito”, sob o império de instituições sólidas, uma democracia pujante que consegue superar desafios de setores que sonham com regimes autoritários e práticas totalitária de governar.

Todavia, parece que esses donos do poder ou marajás da República que recebem altos salários, privilégios, mordomias e muitas mutretas tudo custeado com o dinheiro público, não percebem que o Brasil é um país extremamente desigual social, econômica e políticamente, um dos paises com as maiores taxas de concentração de renda, riqueza e oportunidade do planeta, com altas taxas de desigualdades regionais, setoriais e de gênero.

Além disso, o Brasil é um dos países mais policialescos do planeta, onde a população tem mais medo dos aparelhos de repressão do Estado do que da bandidagem que tanto atormenta a vida de todos.

O Brasil é o quinto país mais populoso do mundo com 2,72% da população mundial e é o terceiro país em termos de população prisional que em julho de 2019 era de 812 mil presos, dos quais 41,5% jamais foram sequer julgados por um juiz em primeira instância. Isto representa  337.126 presos sem culpa formada, ou seja, até que se comprove são pessoas inocentes que estão encarceradas pelo arbítrio do Estado, seus aparelhos e agentes de repressão.

No mundo em 2017 existiam em torno de 10,74 milhões de pessoas encarceradas. Apesar da população brasileira representar apenas 2,72% da população mundial, quando se trata de população encarcerada o Brasil representa 6,4% deste universo sombrio, pois o sistema prisional brasileiro pode ser considerado a ante-sala do inferno, onde quem de fato “manda” neste submundo, onde imperam a violencia e a corrupção generalizadas, não é o Estado, mas sim, as faccões criminosas, como lamentavelmente tem cordado tanto a população quanto diversas autoridades em todos os poderes da República.

Pessoas presas, por pequenos delitos, como crimes ditos de “fome famélica” ou até mesmo inocentes, ao serem enviadas para essas masmorras que muito se assemelham `as masmorras da idade media, acabam sendo cooptadas ou obrigadas a ficarem sob o commando dessas faccões.

O Brasil tem uma taxa de 324  presos por cem mil habitantes. Esta taxa é a maior entre todos os países da América do Sul, entre os países do G20 (com excessão dos Estados Unidos), muitissimo acima do que a China (que tem a segunda maior população carcerária do planeta, só perdendo para os EUA) que tem taxa de 118 presos por cem mil habitantes, ou da Índia cuja taxa de de apenas 33 presos por cem mil habitantes.

Para se ter ideia do que representa este estado policialesco  em vigor no Brasil há décadas, enquanto nossa média de população encarcerada, justa ou injustamente, é de 324 presos por cem  mil habitantes, a média mundial é de apenas 145, menos da metade do Brasil. As diversas regiões tambem apresentam taxas de encarceramento bem menores do que o Brasil. Norte da África 53; Sul da África 244; América do Sul 233; América do Norte 311, com destaque para os EUA cuja media é a maior no continente 655, superior até mesmo da taxa de Cuba que é de 510; América Central 316; Ásia 160; Oceania 183 e Europa 81 presos por cem mil habitantes.

Ao julgar uma ação apresentada pelo PSOL ha poucos anos, questionando se o Sistema prisional brasileiro fere a Constituição Federal e o ordenamento jurídico nacional, o STF decidiu peremptóriamente que o Sistema prisional brasileiro viola de forma sistemática os direitos dos presos em relação `a dignidade fisica e psíquica dos presos e que a responsabilkidade para resolver esta questão é dos tres poderes da República, respectivamente, poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e reconheceu também que o país/Brasil vive, em relação ao Sistema prisional um “estado de coisas inconstitucional”.
No julgamento desta ação impetrada pelo PSOL em seu voto, o relator, ministro Marco Aurélio Mello, avaliou a situação dos presídios como “vexaminosa”.
"A superlotação carcerária e a precariedade das instalações das delegacias e presídios, mais do que inobservância, pelo Estado, da ordem jurídica correspondente, configuram tratamento degradante, ultrajante e indigno a pessoas que se encontram sob custódia”, sustentou o relator.
 
“As penas privativas de liberdade aplicadas em nossos presídios convertem-se em penas cruéis e desumanas. Os presos tornam-se ‘lixo digno do pior tratamento possível’, sendo-lhes negado todo e qualquer direito à existência minimamente segura e salubre”, afirmou Marco Aurélio na oportunidade. Diante de tudo isso, tendo em vista que a prisão após condenação em segunda instância que afeta não apenas Lula ou menos de duas cdentenas de condenados pela Lava Jato, centenas de milhares de pessoas continuam encarceradas indevidamente, ilegalamente ou injustamente.

Se o Estado brasileiro, já por demais draconiano ou o que eu denomino de Estado policialesco, pior do que a situação vigente em diversos estatos autocráticos, totalitários ou ditaduras religiosas, militares ou politicas, o que podemos esperar de uma legislação que clama por mais violência por parte do Estado, incluindo a chamada “licenca para matar” (excludente de licitude), que a cada dia está mais presente nas operações em comunidades pobres, favelas, onde o uso da força policial é extrermamente exagerada, conforme apontam os dados de mortes cometidos por policiais tem aumentado nos últimos meses.

Pergunta-se: alguém já viu operações policiais com tais requintes de violência em bairros de classe alta, em edifícios de luxo, na caça aos corruptos, que acabam soltos após delações premiadas, que na verdade premiam criminosos de colarinho branco.

Quando os dados do Sistema prisional são analisados percebe-se que a grande maioria das pessoas presas são negras ou afrodescendentes, jovens masculinos entre 18 a 30 anos, com baixos niveis de instrução/escolaridade, sem formacao professional, que cometeram crimes não violentos como uso de drogas, posse de pequenas porções e passam a ser consideradas traficantes, quando os grandes barões das drogas, do tráfico de armas, do tráfico humano, contrabandistas e, pior, os grandes corruptos, se forem de partidos que apoiam os donos do poder, acabam ficando fora do Sistema prisional.

Portanto, precisamos ter outro foco, outra visão quando se discute as decisões do STF ou outras instâncias do Poder Judiciário, que a considerar o cenário futuro práximo terá uma composição muito mais conservadora e muito mais punitiva do que na atualidade.

O presidente Bolsonaro já disse por diversas vezes que quando abrirem as duas novas vagas para o STF ele irá indicar alguem “terrivelmente evangélico” para tal ou tais vagas, quando na verdade o que se deveria exigir para ser ministro dos tribunais superiores seria alguém que, independentemente da filiação religiosa/ideológica, fosse um “expert” em direito constitucional e um ser humano com espirito de justiça, justiça social e, acima de tudo, um defensor dos direitos humanos e não um carrasco ou algóz de pessoas que muitas vezes foram empurradas para o mundo do crime por um processo de exclusão social e econômica.

*JUACY DA SILVA, professor universitario, fundador, titular e aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com
 

Quarta, 06 Novembro 2019 13:52

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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JUACY DA SILVA*
 

Existe uma máxima que afirma ser a imprensa o quarto poder da República, ao lado dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, demonstrando que a existência de uma verdadeira democracia, onde os direitos civis, individuais, sociais e politicos devam ser respeitados pelos governantes/donos do poder são os pilares fundamentais, ao lado da liberdade de expressão, de organização e de manifestação do pensamento.

Todos sabemos que o atual Presidente da República tem uma personalidade autoritária, talvez pela sua formação militar, além de sentir-se ungido por Deus, imagina-se também ser o  único repositório da verdade. Como corolário alimenta uma guerra continua e permanente contra seus opositores,  baseado na teoria da conspiração, em que se sente constantemente perseguido e ameaçado por inimigos verdadeiros ou imaginários, contra os quais não pode “baixar a guarda” como se diz no jargão popular.

A prova disto foi a prodção e veiculação de um video recentemente em que se imagina um leão (o que na fauna animal é considerado o rei dos animais), sendo atacado por hienas que seriam seus adversários  e instituições que estariam atacando seu governo. Entre as hienas o referido video, identificava tais felinos como sendo o STF, a OAB, partidos de esquerda e até o seu próprio partido o PSL, a ONU, a Igreja Católica, o MST, a CUT e , enfim, todas as organizaçõe que não lhe obedeçam ou se recusam a seguir a sua cartilha e, por extensão todas as pessoas que não comungam com suas idéias e formas de governar.

Diante da repercussão negativa e da resposta dura de diversas dessas organizações, inclusive nota por parte de Ministros do STF, mais do que depressa, com apenas duas horas de divulgação, Bolsonaro, apagou o conteudo do video nas redes sociais e pediu desculpas a quem, “porventura tenha ofendido”. Há quem diga que este pedido de desculpa foi apenas uma forma para testar os limites da reação dos inimigos/adversários.

Aliás, esta tem sido uma prática comum tanto de Bolsonaro quanto de seus filhos,  com destaque oferender as instituições e voltarem atraz e pedirem desculpas, como fez no ano passado um de seus filhos/deputado federal que em palestra no Paraná disse que para fechar o STF bastava um cabo e um soldado e  na última semana ameaçando a oposição/ de esquerda que se não se comportasse bem, obediente ao governo, o mesmo (governo) poderia baixar um novo AI-5, o instrumento mais totalitário, arbitráriio criado pelo Governo militar e que serviu de base para todas as formas de violência e arbítrio contra quem se opunha ao referido governo, inclusive o fechamento do Congresso e a institucionalização da tortura contra presos politicos.

Diante da repercussão negativa e critica de todos os partidos, até do PSL do Governo Bolsonaro, além dos presidentes da Câmara, do Senado, Ministros, ex-presidentes da República e tantos outros setores e instituições, o referido deputado Bolsonaro veio a público dizer que não quis oferender a democracia e outras desculpas esfarrapadas, para tentar disdizer o que havia dito com todas as letras e palavras.

De forma semelhante, um outro filho do Presidente, Vereador no Rio de Janeiro, quando de uma visita ao pai que se recuperava de uma cirurgia disse que as mudanças que o Brasil precisa, com urgência, jamais acontecerão via reformas democráticas, insinuando que para governar e realizar reformas o atual presidente deveria estabelecer um regime de excessão. Isto é o que pode ser lido nas entrelinhas de sua narrativa, exaltando regime de excessão em detrimento da democracia.

Todo este embate, que é na verdade uma verdadeira Guerra psicológica perpetrada e conduzida pela familia Bolsonaro e por boa parte da cúpula do poder executivo, pelo Palácio do Planalto e seus acólitos, seguidores, inclusive grandes empresários, aos poucos tentam minar e desconstruir a imprensa que ainda não foi domesticada totalmente pelos atuais donos do poder.

Por mais que os bolsonaristas teimem em difundir "fake news", em sua guerra contra a rede/grupo globo (TV, jornal, radio, revista etc), até ameaçando não renovar a concessão da emissora em 2022, dados que medem a audiência de todos os canais de TV abertas, no mes de outubro de 2019, apontam a primazia da TV Globo, com maior audiência do que todas as demais emissoras em conjunto/somadas.

Não é novidade que Bolsonaro foi apoiado por uma grande maioria de pastores e "donos" de diversas seitas/religioes/igrejas evangélicas, de base fundamentalista e pentecoscais, alguns dos quais são donos de redes de TV como o Bispo Macedo em relação a Record, o Missionario RR Soares  da Igreja da Graça e do Apostolo Valdomiro, da Igreja Mundial do Poder de Deus, e da Assembléia de Deus, que possui a maior rede de Rádios, ao lado da Igreja Deus é Amor que também domina boa parte das redes de radio difusão.

Prova disto foi o crescimento da chamada bancada evangelica que apoia em sua quase totalidade as pautas conservadoras de Bolsonaro, tendo conseguido emplacar uma pastora como ministra  e diversos outros aliados em postos importantes como AGU e outros cargos de destaque no segundo escalão.

Assim, existe uma verdadeira Guerra nao apenas pela audiência dos noticiários televisivos ou radiofônicos, mas também pelas verbas oficiais, sejam da administração pública direta, ou indireta, das Estatais e fundações públicas federais, estaduais e municipais. Todos sabemos que existe uma relação nada republicana e as vezes muito promiscua entre grupos de comunicação e os donos do poder em todos os niveis.

Existem duas formas dos donos do poder/governantes atentarem contra a liberdade de imprensa, de livre manifestação do pensamento e da veiculação de conteudos criticos em relação as ações dos governantes.

A primeira forma é a censura direta, ou seja, como ocorre em todos os governos totalitários e autoritários, quando censores decidem o que pode ou não pode ser publicado ou veiculado, como aconteceu durante os periodos ditatoriais no Brasil, no Estado Novo de Getulio Vargas e entre 1964 e 1985, durante a ditadura militar, muito "endeusada" em seus métodos por Bolsonaro.

A segunda maneira é definindo quem pode ou deve receber recursos públicos na forma de publicidade ou matéria paga e quem deve ser alijado, como no caso do atual governo em relação ao grupo globo e outros mais que sistematicamente são criticados por Bolsonaro.

Em ambas as situações esta forma de censura direta ou indireta e maléfica ao avanço e consolidação das liberdades democráticas e contrárias `as demais liberdades civis, sociais e políticas. Para coibir os exageros, as mentiras, as feke news, as ofensas, calúnias, difamações que por ventura sejam veiculados ou produzidas por profissionais de imprensa, pelos diversas meios de comunicação ou por autores, colaboradores existem diversos dispositivos legais que os donos do poder/autoridades podem impetrar ações junto ao poder judiciário, jamais com ameaças e manipulação no uso/destino de recursos públicos/orçamentários a favor deste ou daquele grupo, isto mais se parece com chantagem do que governança transparente, eficiente e ética.

Ameacar cortar verbas píublicas ou dizer que não vai renovar concessão pública, como forma de domesticar a imprensa e seus profissionais é um grande atentado contra a democracia, contra as liberdades civis e contra os direitos humanos.

Democracia exige partidos politicos verdadeiros e atuantes, coerentes com suas doutrinas e  ideologias, com liberdade de organização da sociedade, movimentos sociais e também imprensa livre e responsável. Somente governantes de indole totalitária, autoritária que se julgam os únicos donos da verdade e que se imaginam acima da lei é que não suportam uma imprensa livre, investigativa e transparente.

Quanto ao conteúdo e audiência ou predileção por parte das pessoas, imagina-se que em sendo as pessoas livres para pensarem, sentirem e agirem, não compete aos governantes, donos do poder, cercearem a liberdade nem das pessoas decidirem suas preferências nem qual o conteúdo que cada veiculo pode ou venha a disrtribuir aos seus ouvintes, tele espectadores ou leitores.

Para melhor entender esta guerra psicológica que está sendo travada em nosso país atualmente, levada a cabo pelo governo Bolsonaro e seus seguidores, seria muito interessante que os leitores, eleitores e contribuintes pudessem ler uma obra prima sobre como governantes tentam a todo o custo e por todas as formas manipular as massas, formar e deformar a consciência coletiva.

Recomendo a leitura de um clássico da literatura politica do século XX intitulado “A Mistificação das massas pela propaganda politica” de autoria de Serguei Tchakhotine e tradução de Miguel Arraes, publicado no inicio dos anos sessenta, mas ainda muito atual, principalmente nos dias de hoje.

Nesta obra escrita em 1938, o autor desenvolve uma teoria acerca dos efeitos da propaganda sobre opinião pública , a partir de suas vivências dos regimes totalitários europeus. Demonstra como os nazistas e facistas confrontavam os socialistas no periodo que antecedeu e durante a segunda guerra mundial e como Hitler e Goebels montaram uma verdadeira máquina de propaganda e qual o papel das “tropas de choque” nazistas na guerra ideológica.
Estudou os diferentes mecanismos de criação de refelexos condicionados, através da propaganda politica. Sua obra, A Mistificação das Massas pela Propaganda Política, mostra a eficácia dos discursos repetitivos e uniformes difundidos através de distintos canais de comunicação. Analisou como os partidos politicos desenvolvem seus singos de identidade (hinos, insígnias, etc.) como pontes de comunicação simples e massiva com as multidões. Estudou de maneira especial a propaganda nazista como forma de controle e de luta política, abordando o emprego de simbolos, cenários e expressões retóricas como instrumentos de fascinação e submissão.

E pensar que naquela época não havia internet, redes sociais, nem televisão, sites, blogs,  twitters, revistas e jornais eletrônicos, smart fones,whats app e nem esta miríade de novas formas de comunicação. Isto nos leva a concluir que o poder da mistificação dos governantes atualmente, principalmente os autoritários, hoje é muito maior e muito mais deletério do que quando Hitler, Goebels and Mussolini dominavam as massas por seus discursos inflamados e de ódio, tanto pela intimidação quanto pela Guerra psicológica em todos os domínimos possíveis

Da mesma forma que Hitler, Goebels, Mussolini e os nazistas e facistas criaram seus inimigos internos e externos nas figuras dos judeus, negros, homo-sexuais,  deficientes fisicos, comunistas e socialistas, contra os quais brandiam suas armas ideológicas e violência física, também atualmente, os atuais donos do poder precisam criar seus inimigos internos e internacionais como os constantes do video do leão Bolsonaro, as hienas e o leão patriota (aliados) este último podendo ser as forças armadas ou parte da população que segue cegamente o bolsonarismo e sonham com um Brasil onde a oposição não tenha lugar e que precisa ser destruida como vociferou o deputado Bolsonaro, filho do presidente, como pode ser percebida de sua fala na entrevista a uma rede social, quando enaltece o AI-5 como mecanismo de confrontar a oposição, principalmente o que chama de esquerdas.

É bom que os amantes das liberdades, da democracia, do respeito ao ordenamento constitucional e da justica no Brasil possam estar atentos e vigilantes, afinal, antes de acabar com a democracia alemã, Hitler também foi eleito democraticamente, tornando-se Chanceler e logo que percebeu seu poder não titubeou em destruir a democracia e instalar seu regime totalitário, um verdadeiro instrumento do terror. Que o digam milhões de opositores, principalmente os judeus que foram dizimados nos campos de concentração e nos fornos crematórios.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, colaborador de alguns veiculos de comunicação. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy Blog www.professorjuacy.blogspot.com