Segunda, 16 Maio 2022 09:50

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.

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JUACY DA SILVA*
 


“Os direitos trabalhistas nasceram das lutas solidárias do povo. Estão fundamentados na DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA: O amor pelos pobres está no centro do Evangelho. Terra, teto e trabalho – isto pelo qual vocês lutam, são direitos sagrados. Reivindicar, isso é DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA” (Papa Francisco, I Encontro com os Movimentos Populares, 2013).
 
“Solidariedade é uma reação espontânea de quem reconhece a função social da propriedade e o destino universal dos bens como realidades anteriores `a propriedade privada. A solidariedade deve ser vivida como a decisão de devolver ao pobre o que lhe corresponde (o que lhe é de direito). Essas convicções e práticas de solidariedade abrem caminho para outras transformações estruturais, tornando-as possíveis”. (Papa Francisco, EG Evagngelii Gaudium 189, 2013)

Mesmo em meio `a degradação Ambiental, `a destruição dos ecossistemas,  `a fome, miséria e exclusão de bilhões de pessoas ao redor do mundo e milhões no Brasil, às guerras e violência indiscriminada, contra tudo e contra todos, para nós, cristãos, nunca podemos perder a esperança de que conseguiremos superar todos esses desafios e construirmos ou reconstruirmos um mundo melhor, onde as pessoas possam viver com dignidade e felizes; onde a exclusão social, econômica e política, o racismo, os preconceitos, a omissão diante do sofrimento e da morte de milhões de pessoas sejam coisas de um passado que jamais deveria ter existido.

É neste contexto que o Papa Francisco tem insistido que um dos requisitos para a construção de um mundo melhor, o fortalecimento da civilização do amor e da sociedade do bem viver, somente serão possíveis se substituirmos os modelos econômicos, capitalista, socialista ou capitalismo de Estado, que excluem as pessoas e degradam a natureza,  repito, sejam substituídos por uma economia solidária, por um sistema que tenha como base a sustentabilidade, a justiça social, intergeracional e a garantia dos direitos humanos. Este é o cerne da Economia de Francisco e Clara.

A Economia de Francisco e Clara representa, pois, um novo modelo de economia, proposto e estimulado pelo Papa Francisco, o Papa que veio do “fim do mundo”, com uma JUSTA DISTRIBUIÇÃO dos frutos do crescimento econômico e do desenvolvimento sustentável, é uma forma concreta de combatermos as desigualdades sociais, econômicas e políticas, a uma melhor distribuição de renda, riquezas e oportunidades tanto dentro dos países quanto no contexto das relações internacionais.

A economia solidária, a agroecologia, o associativismo, o cooperativismo, a produção e o consume conscientes, responsáveis e sustentáveis, o fim do uso de combustíveis fósseis e sua substituição por uma matriz energética energia limpa e sustentável, fazem parte desses pilares, tendo em vista que o consumismo, o desperdício, o uso dos combustíveis fósseis, a civilização dos plásticos e a economia do descarte só levam `a degradação ambiental, `as mudanças climáticas, ao aquecimento global, às catástrofes, à fome, à miséria e à morte.
 
No encontro de Assis, Itália, inicialmente previsto para ser realizado entre 26 a 28 de março de 2020 presencialmente, mas devido `a pandemia da COVID-19 foi realizado através de Plataforma virtual em novembro do mesmo ano, nos deparamos com o pedido do Papa Francisco para que os jovens, os empresários, os cientistas, pesquisadores, os governantes, os trabalhadores, enfim, para que os cristãos, católicos e evangélicos e os não cristãos, enfim, todas as pessoas, para praticarem uma economia diferente, mais racional, sustentável e mais humana.

Nas palavras do Sumo Pontífice, precisamos, com urgência repensar, reinventar e criar novos paradigmas de produção e consumo, uma nova forma de economia, em suas palavras, “que parta das necessidades dos pobres”, “Aquela que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da Criação e não a depreda.” Quanto `a reunião suas expectativas foram para “um evento que nos ajuda a permanecer juntos e a nos conhecer, e nos leve a fazer um ‘pacto’ para mudar a economia atual e dar uma alma à economia do amanhã.”

No mesmo encontro, o Papa Francisco também disse com clareza e objetividade sobre a nova economia que propõe, como um antídoto para os males gerados pelos atuais modelos, desta maneira, dirigindo-se diretamente aos jovens, já que a juventude e as próximas gerações no futuro viverão em um mundo, conforme todos os estudiosos e cientistas indicam que, se não for radicalmente alterado, transformado profundamente, deixará uma herança terrível, de destruição e morte da biodiversidade, de esgotamento dos recursos naturais, do solo, aquecimento global, crise climática, desertificação, degradação das águas, desmatamento, poluição de todas as formas, sem florestas, de fome, miséria, desigualdades mais profundas do que as atuais, de grandes massas humanas empobrecidas, com imensas correntes migratórias internacionais e um passivo ambiental IMPAGÁVEL.

Vejamos um dos destaques da fala de Francisco, quando disse: “A chave para o futuro está nos sonhos dos jovens, no seu olhar sem rodeios e preconceitos para um amanhã que seja de esperança verdadeira e não de cálculos matemáticos, interesses ou especulações”.

Sobre o mesmo Encontro, o Vaticannews, site oficial da Igreja Católica, em Roma, em 21 de novembro de 2020 assim estampava:“Foi com o entusiasmo, a imaginação e a criatividade deles (participantes) que o Papa Francisco procurou, na esteira da Laudato Si que deu ao mundo “o grito da terra e dos pobres”, relançar um grande e exigente desafio:”restituir uma alma à economia”.

A ECONOMIA DE FRANCISCO E CLARA, representa um novo modelo de economia, proposto e estimulado pelo Papa Francisco, com uma JUSTA DISTRIBUIÇÃO dos frutos do crescimento econômico e do desenvolvimento sustentável, de uma ECONOMIA VERDE e que esteja baseada na solidariedade, na ECOLOGIA INTEGRAL, na JUSTIÇA SÓCIOAMBIENTAL e no direito das futuras gerações a um planeta saudável, enfim, nos cuidados da CASA COMUM.

Os modelos econômicos, sociais e políticos atuais no mundo todo, tem levado `a degradação ambiental, a destruição da biodiversidade, ao aquecimento do planeta, a emergência climática, às crises hídricas, à desertificação, além de uma injusta concentração de renda, riqueza e propriedade nas mãos dos poderosos, das elites politicas e econômicas dominantes, do aumento da pobreza, da miséria, dos conflitos, da exclusão socioeconômica, polítita, enfim, a morte!

Precisamos repensar, com urgência, nossas relações sociais, econômicas e politicas e também, nossas relações com a natureza, pois, o destino do planeta e da humanidade está em nossas mãos, nossas atitudes , nossas ações, nossas omissões e nosso estilo de vida materialista e predatório.

Neste contexto, é imperiosa a substituição da matriz energética mundial, baseada em combustíveis fósseis que poluem, degradam o meio ambiente e matam, por fontes alternativas, limpas e renováveis, como a ENERGIA SOLAR, EOLICA principalmente.

Precisamos substituir a agricultura baseada no uso excessivo e abusivo de agrotóxicos que envenenam os alimentos e matam os consumidores, degradam o solo, polui o ar e os mananciais (águas), por uma agricultura inteligente, que respeite o meio ambiente, que é a AGROECOLOGIA.

Precisamos substituir o apego exagerado com os bens materiais, com uma competição desenfreada, e a busca por lucros fáceis, com o desperdício, com a economia do descarte, do supérfluo, por uma ECONOMIA SOLIDÁRIA, mais justa, duradoura, que VALORIZA e respeita o ser humano, os trabalhadores, os consumidores e também a natureza.

Precisamos impedir que nossas florestas sejam derrubadas, desmatadas e queimadas , pois este é um processo irracional que alimenta as queimadas, a degradação dos solos, a contaminação das águas, a poluição do ar e aumenta as doenças, as epidemias, as pandemias, enfim, provoca mais sofrimento e a morte.

Precisamos substituir o atual sistema logístico, baseado em veículos movidos com energia oriunda de combustíveis fósseis, altamente poluidores, que tornam nossas cidades um verdadeiro caos e com ar irrespirável, por um sistema de transporte público urbano mais eficiente, mais humano, com mais dignidade para os usuários e os moradores das cidades, baseado em fontes limpas e renováveis de energia.

Precisamos substituir o Sistema de transporte rodoviário de cargas e passageiros, também de custos elevados e baseado no uso de combustíveis fósseis, por um Sistema ferroviário moderno, eficiente, rápido, de menor custo e alimentado com energia renovável e limpa.

Precisamos garantir a posse e o uso da terra e os bens da natureza , inclusive as matas, a biodiversidade, os rios e demais fontes de água e vida, para agricultores familiares, para quilombolas, povos indígenas, os verdadeiros guardiões das florestas e do meio ambiente.

Precisamos garantir o direito `a moradia digna para a população de baixa renda e excluída, aos moradores em habitações sub-humanas, que colocam em risco, todos os anos a vida de milhões de pessoas no Brasil e ao redor do mundo, por habitações dignas onde esgoto a céu aberto, acúmulo de lixo, ruas sem pavimentação e sem arborização sejam substituídas por condições dignas, áreas realmente urbanizadas, para que tenhamos, de fato CIDADES SUSTENTÁVEIS, CIDADES VERDES, com arborização urbana, como forma de amenizar o clima urbano e outras condições compatíveis com as exigências de todas as camadas da população e não verdadeiros “guetos fechados, onde vivem as camadas privilegiadas”, enquanto as massas populares vivem em favelas, palafitas, cortiços e outras formas indignas para um ser humano.

Enfim, também a ECONOMIA DE FRANCISCO E CLARA representa um modelo em que o trabalho humano não seja colocado na condição de trabalho escravo e semiescravo, com altos índices de desemprego, subemprego e trabalho informal, sem garantia de direitos e perspectivas de mobilidade social.

O trabalhador merece uma justa remuneração pelo seu trabalho, pela sua contribuição para o processo produtivo, jamais um salário mínimo que é um salário injusto, um salário de fome, que não garante sequer o atendimento das necessidades básicas do trabalhador e sua família, que gera mais pobreza, miséria, fome e exclusão , além de uma grande manipulação politica eleitoral por parte dos “donos do poder e da economia”.

Na Economia de Francisco e Clara não existe lugar para a exploração do trabalhador, para o desemprego aberto e o subemprego (que são reservas de mão de obra barata para que a exploração do trabalhador continue alimentando a cultura da pobreza e da exclusão social).

Cabe lembrar aqui também o princípio da Doutrina Social da Igreja quando estabelece que “ sobre toda a propriedades privada recai ou pesa uma hipoteca social”, princípio coerente com o que estabelece o Concílio Vaticano II quando afirma que “Deus destinou a terra, com tudo que ela contém, para o uso de todos os homens e de todos os povos, de tal modo que os bens criados devem bastar a todos, com equidade, segundo a regra da justiça, inseparável da caridade” (Gaudium et Spes, n.69).

É por isso que o Papa Francisco tanto tem enfatizado em seu magistério, em suas Encíclicas, em suas Exortações apostólicas e em seus pronunciamentos a imperiosa OPÇÃO PREFERENCIAL PELOS POBRES, para as ações de uma Igreja missionária, em saída, sinodal, samaritana, misericordiosa e, também, PROFÉTICA, a única forma de construirmos um mundo novo, uma nova economia, uma nova sociedade, baseada em princípios éticos e morais, em que todas as pessoas, independente de classe social, “status” socioeconômico, raça/etnia, cor da pele, outras características ou preferências, sejam tratados como irmãos e irmãs, que vivem na mesma Casa Comum, com fraternidade, com amor e solidariedade e a NATUREZA como parte da criação divina.

Neste contexto é que surgem os conceitos de pecado social, pecado ecológico e CONVERSÃO ECOLÓGICA, cidadania ecológica, justiça socioambiental e intergeracional como mecanismos de defesa da ECOLOGIA INTEGRAL, da vida em todas as suas formas e dos CUIDADOS COM A CASA COMUM, pois “tudo esta interligado, como se fôssemos um, nesta casa comum”.

TERRA, TETO E TRABALHO, dignidade humana, justiça socioambiental para todos, são fundamentais para a Economia de Francisco e Clara, por isso precisamos dizer alto e bom som: Viva a Laudato Si, Viva a Economia de Francisco e Clara! Viva a Pastoral da Ecologia Integral.

Só assim, as ações pastorais da Igreja podem impulsionar essas transformações nas sociedades, nos países, em nossas cidades e comunidades!

Devemos, também, refletir sobre as palavras do Papa Francisco no Encontro de Assis: “Queridos jovens, sei que vocês são capazes de ouvir com o coração os gritos cada vez mais angustiantes da terra e dos seus pobres em busca de ajuda e de responsabilidade, ou seja, de alguém que ‘responda’ e não se vire para o outro lado.

Se vocês ouvirem o seu coração, vão se sentir portadores de uma cultura corajosa e não terão medo de arriscar e de se comprometer a construir uma nova sociedade.”, com certeza esta exortação do Sumo Pontífice também é endereçada a todos quanto sonham com um mundo mundo melhor e uma sociedade econômica e socialmente justas, ambientalmente sustentável e politicamente democráticas e participativas.

Para finalizar esta reflexão transcrevo os 10 princípios da Economia de Francisco e Clara, destacados pela Articulação Brasileira da Economia de Francisco e Clara - ABEFC, no dia 02 de outubro de 2021, data comemorativa do 2º Encontro Virtual Global da Economia de Francisco e Clara sobre o “Encontro de Assis”, que tem como objetivo ser subsídio condutor na caminhada de construção da Economia de Francisco e Clara: 1).Ecologia integral; 2) Desenvolvimento integral; 3) alternativas anti e pós capitalistas; 4) Bem comum/bens comuns; 5) Tudo está interligado; 6) Potência das periferias vivas (onde vivem os pobres e excluídos); 7) Economia a serviço da vida; 8) Comunidades como saídas; 9) Educação integral e, 10) Solidariedade, clamor da terra, dos pobres e dos povos.

Esses são os princípios da Economia de Francisco e Clara, no contexto dos fundamentos bíblicos/evangélicos, da Doutrina Social da Igreja, do Magistério de Papas que antecederam ao Papa Francisco, alguns que, inclusive, se tornaram Santos.

Vale a pena refletir, conhecer e lutar por esta nova economia e sonhar com um mundo novo, melhor, mais humano, com justiça social e intergeracional e sustentabilidade. A esperança deve ser a energia que, como cristãos, nos move nesta direção!

*Juacy da Silva é professor universitário, fundador, titular e aposentado pela Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, articulador da Pastoral da Ecologia Integral no Centro Oeste, incluindo a Arquidiocese de Cuiabá e Mato Grosso. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. 
 

Sexta, 13 Maio 2022 14:48

 

 

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JUACY DA SILVA*
 


Neste domingo, 15 de Maio de 2022, estamos comemorando, melhor dizendo, a Igreja Católica, comemora 131 da “Rerum Novarum”, Encíclica do Papa Leão XIII, sobre os conflitos sociais da época, as precárias condições de trabalho, de sobrevivência e de exploração a que eram submetidos trabalhadores, trabalhadoras e suas famílias.

Ao longo desses 131 anos, muitas coisas mudaram, várias guerras ocorreram, mas o drama, a exclusão, a fome, a miséria, a violência, os conflitos armados, as guerras continuam presentes, acompanhadas de degradação ambiental, mudanças climáticas, aquecimento global e outros problemas graves que continuam desafiando tanto a Igreja quanto outras organizações nacionais e internacionais que lutam por justiça, por direitos humanos, pela ecologia integral e por dignidade humana.

E neste contexto que a Igreja no Brasil, tanto a CNBB quanto Arquidioceses, Dioceses, Paroquias e Comunidades voltam suas energias e ações, tendo os Evangelhos, a Doutrina Social da Igreja, as Encíclicas Papais, com ênfase no Magistério do Papa Francisco, para uma melhor formação, mais aprofundada e mais engajada do LAICATO, leigos e leigas na Evangelização, através das Pastorais Sociais, movimentos e organismos que atuam na dimensão sociotransformadora.

Por iniciativa da CNBB e também de inúmeras arquidioceses, dioceses, paróquias e comunidades a Igreja Católica no Brasil tem feito um grande esforço em relação a uma melhor formação de leigos e leigas, para que a atuação e as ações dessas pessoas tanto nas pastorais sociais, nos movimentos e nos organismos , os quais e as quais estão inseridas no contexto da “Ação sociotransformadora”, possam fazer a diferença.

Sempre é bom lembrar que essas ações do laicato (leigos e leigas a serviço da Igreja e da Evangelização), não ficam restritas apenas `as dimensões internas da Igreja, mas estão presentes também nas diversas organizações públicas, principalmente como representantes da Igreja em Conselhos de defesa de direitos; em parcerias com outras organizações que também atuam junto `as camadas pobres, excluídas e injustiças de nossa sociedade e também em cargos eletivos e funções de gestão públicas. Só assim, seremos “sal da terra e luz do Mundo”. (Evangelho de São Mateus, 5:13)

A Doutrina social da Igreja representa o compromisso da Igreja ao longo de mais de um século, desde a publicação da Encíclica Rerum Novarum (Das coisas novas), pelo Papa Leão XIII, em 1891, em meio a uma desumana exploração dos trabalhadores e trabalhadoras, período também de um grande debate entre capitalistas, proprietários dos meios de produção e do movimento socialista/comunista nascente.

A Igreja procurou posicionar-se, de forma clara, tanto condenando a exploração , sem limites, desumana, dos trabalhadores pelos proprietários dos meios de produção, em que nenhum direito era reconhecido para quem tinha apenas sua “força de trabalho” para ser vendida, sob condições extenuantes de jornadas de trabalho que as vezes superava 16 horas diárias, em locais insalubres, sem sequer repouso semanal remunerado, sem proteção da saúde da massa trabalhadora, onde crianças, adolescentes, jovens, adultos, homens e mulheres trabalhavam em condições análogas à escravidão,  quanto as propostas do movimento socialista/comunista, que acenava com um coletivismo autoritário e totalitário, onde a figura do Estado todo poderoso substituiria a figura dos proprietários dos meios de produção.

Neste sentido a Encíclica Rerum Novarum, tanto condenou tais práticas e formas desumanas de relações de trabalho, então vigentes, quanto o modelo defendido pelo movimento socialista/comunista, de uma sociedade dominada por um Estado absolutista e um modelo político de partido único e socioeconômico estatizante, autoritário e totalitário.

Como alternativa para que os trabalhadores rompam com essas cadeias, a Rerum Novarum sugere o associativismo, cooperativismo dos mesmos, a autoajuda e a caridade, para socorrer a quem não tenha condições de uma sobrevivência digna.

Não é sem razão que o Teólogo Padre Antônio Aparecido Alves, na introdução de seu artigo “Conhecer e praticar a Doutrina Social da Igreja, em tempos de obscurantismo, de 02 de Fevereiro de 2021, publicado em Universidade Católica de Santa Caterina, enfatiza que “A Doutrina social da Igreja nasceu como resposta ética aos desafios da revolução industrial, iluminando a chamada questão social. Para este momento histórico, foi importante o ensinamento sobre trabalho, salário, Estado, entre outros temas, contemplado na Encíclica de Leão XIII, a Rerum Novarum (1891)… Urge visitar o patrimônio da Doutrina social da Igreja, para buscar as balizas corretas, a fim de orientar hoje a prática dos cristãos.”

Seguindo nesta mesma linha de pensamento ele destaca que “Desde a Encíclica Mater et Magistra, de São João XXIII, a Igreja vem insistindo na necessidade do ensino e da divulgação da Doutrina social da Igreja (DSI). Ela deveria ser divulgada e conhecida por todos os cristãos, pois seu conteúdo faz parte da concepção cristã da vida, de modo que uma sadia educação da fé não poderia descurar esse aspecto social. Era um vivo desejo de São João XXIII que a DSI fosse ensinada de forma sistemática em todos os Seminários e Escolas Católicas, bem como nos programas de formação das Paróquias e Associações de Leigos. Além disso, que fosse divulgada por todos os meios possíveis: rádio, televisão, obras científicas, periódicos e imprensa diária, motivando a prática social dos cristãos, a partir do método ver-julgar-agir”.

Vale também ressaltar que, meio século antes da Rerum Novarum, foi fundada a primeira cooperativa de consumo na Inglaterra. “Criada em 1844 por 28 operários – 27 homens e 1 mulher , em sua maioria tecelões, no bairro de Rochdale-Manchester, na Inglaterra, e reconhecida como a primeira cooperativa moderna, a “Sociedade dos Probos de Pioneiros Rochdale” (Rochdale Quitable Pioneers Society Limited) forneceu ao mundo os princípios morais e de conduta que são considerados, até hoje, a base do cooperativismo autêntico. Esses operários enxergaram o associativismo como forma de contornar, por meio da compra e venda comum de mercadorias, os efeitos perversos do capitalismo sobre a condição econômica dos trabalhadores assalariados – tendo alugado, com o capital inicial de 1 (uma) libra, um armazém para estocar produtos que, adquiridos em grande quantidade, poderiam ser consumidos a preços mais baratos.”

Desde então, o cooperativismo e o associativismo passaram a ser uma alternativa para superar, de um lado o capitalismo extremamente liberal que explorava desumanamente os trabalhadores e de outro lado, a proposta de uma sociedade socialista/comunista com as restrições políticas, sociais e econômicas já mencionadas.

Como hoje, também naquela época, apesar de que quase dois séculos se passaram desde a fundação da primeira cooperativa de consumo e mais de 130 anos da publicação da Rerum Novarum, os trabalhadores continuam enfrentando dois grandes desafios; o aviltamento do poder aquisitivo dos salários que mal é suficiente para a sobrevivência física e reprodução da força de trabalho  de um lado e, de outro lado, a exploração a que são submetidos nas relações de consumo, com a ajuda do processo inflacionário, que representa uma transferência de renda dos mais pobres, os trabalhadores e classe média, para as camadas mais ricas, os donos do capital e dos meios de produção, isto também é facilitado pela definição e implementação de políticas públicas que aprofundam o fosse entre os donos do poder e as massas excluídas.

É neste contexto, que também estão inseridos a luta pela garantia dos direitos dos trabalhadores no mundo inteiro, inclusive no Brasil. Tendo em vista a opção preferencial que a Igreja faz pelos pobres, a Doutrina Social da Igreja reveste-se de uma grande importância para a formação do laicato e também na formação da religiosos, religiosas e dos pastores da Igreja, como instrumento de ação para uma Igreja que se pretende ser missionária, sinodal, profética, samaritana e pobre, conforme tanto nos exorta o Papa Francisco e seus antecessores.

A Igreja Católica, desde o  advento  da Rerum Novarum até os dias de hoje, com maior ou menor ênfase, vem apostando nesta “terceira via”, tendo por base o solidarismo, uma economia solidária e que atualmente está presente na proposta do Papa Francisco, quando o mesmo advoga a “Economia de Francisco e Clara”,  com a alternativa para eliminar as consequências de um capitalismo selvagem que explora `a exaustão tanto a forca de trabalho da classe operária quanto degrada e destrói os recursos naturais, a biodiversidade, enfim, o Planeta Terra.

Neste sentido, a Encíclica Laudato Si e a Exortação Apostólica “Minha querida Amazônia”, representam a inserção definitiva da Ecologia Integral em todas as suas dimensões, como um enriquecimento da Doutrina Social da Igreja, razão pela qual este componente não  pode estar alheio na análise, reflexão e ação social da Igreja.

Ao longo desses 131 anos da publicação da Encíclica Rerum Novarum, com frequência todos os Papas escreveram e publicaram Encíclicas relativas `as comemorações da primeira que é a base do pensamento social da Igreja. Apenas como referência vamos destacar tais Encíclicas.

Quadragésimo ano. Papa Pio XI, em 15 Maio de 1931, comemorando 40 anos da Rerum Novarum, em plena recessão econômica e crise que se abatia sobre o Sistema capitalista americano, com repercussões políticas, sociais e econômicas no mundo inteiro.

Rádio mensagem. Papa Pio XII, em 01 de Junho de 1941, comemorando 50 anos da Rerum Novarum, em meio a Segunda Guerra Mundial, em que a Europa e praticamente o mundo todo sofria com os horrores daquele conflito.

Mater et Magistra (Mãe e mestra). Papa João XXIII, em 15/05/1961, comemorando 70 anos da Rerum Novarum, período em que o mundo vivia o auge da Guerra fria e a ameaça do terror nuclear, dos conflitos ideológicos, golpes de estado, revoluções e muita instabilidade política, social e econômica.

Ocatogésimo adveniens. Papa Paulo VI, em 14 de Maio de 1971, em comemoração aos 80 anos da Rerum Novarum. É importante destacar o que nos exorta Paulo VI sobre a responsabilidade dos cristãos em meio a tantos desafios quando afirma nesta Encíclica: “Não basta recordar os princípios, afirmar as intenções, fazer notar as injustiças gritantes e proferir denúncias proféticas; estas palavras ficarão sem efeito real, se elas não forem acompanhadas, para cada um em particular, de uma tomada de consciência mais viva da sua própria responsabilidade e de uma ação efetiva. E por demais fácil atirar sobre os outros a responsabilidade das injustiças sem se dar conta ao mesmo tempo de como se tem parte nela, e de como, antes de tudo o mais, é necessária a conversão pessoal. Esta humildade fundamental servirá para tirar à ação todo o caráter de intolerância e todo o sectarismo; além disso, ela evitará também o descoroçoamento em face de uma tarefa que pode aparecer como desmesurada. A esperança do cristão provém-lhe, antes de mais, do fato de ele saber que o Senhor está operando conosco no mundo”.

Centesimus annus. Papa João Paulo II, em 01 de Maio de 1991, Dia dedicado a São José Operário, o patrono dos trabalhadores. Esta Encíclica foi escrita em comemoração ao centenário da Rerum Novarum, em meio ao estabelecimento de uma nova ordem mundial, decorrente da queda do muro de Berlim e o fim do império soviético, o fortalecimento da União Europeia, a hegemonia dos EUA e o crescimento acelerado da China, que surge como uma super potência emergente.

CARITAS IN VERITATE. Encíclica de Bento XVI , de 29 de Junho de 2009, exatamente na metade de seu papado. Tendo sido eleito Papa em 19 Abril de 2005 Bento XVI renunciou ao seu magistério `a frente da Igreja em 11 de Fevereiro de 2013.

Apesar de seu curto papado, Bento XVI nesta Encíclica Caritas in Veritate enfatiza o bem comum no contexto da caridade, da verdade, da justiça e da Doutrina Social da Igreja. Vejamos algumas referências deste Papa em sua Encíclica.

A caridade é a via mestra da doutrina social da Igreja. As diversas responsabilidades e compromissos por ela delineados derivam da caridade, que é — como ensinou Jesus — a síntese de toda a Lei (cf. Mt 22, 36-40). A caridade dá verdadeira substância à relação pessoal com Deus e com o próximo; é o princípio não só das microrrelações estabelecidas entre amigos, na família, no pequeno grupo, mas também das macrorrelações como relacionamentos sociais, económicos, políticos. Para a Igreja — instruída pelo Evangelho —, a caridade é tudo porque, como ensina S. João (cf. 1 Jo 4, 8.16) e como recordei na minha primeira carta encíclica, « Deus é caridade » (Deus caritas est): da caridade de Deus tudo provém, por ela tudo toma forma, para ela tudo tende. A caridade é o dom maior que Deus concedeu aos homens; é sua promessa e nossa esperança. Caritas in veritate » é um princípio à volta do qual gira a doutrina social da Igreja, princípio que ganha forma operativa em critérios orientadores da acção moral. Destes, desejo lembrar dois em particular, requeridos especialmente pelo compromisso em prol do desenvolvimento numa sociedade em vias de globalização: a justiça e o bem comum”.

Segue Bento XVI afirmando que “Depois, é preciso ter em grande consideração o bem comum. Amar alguém é querer o seu bem e trabalhar eficazmente pelo mesmo. Ao lado do bem individual, existe um bem ligado à vida social das pessoas: o bem comum. Querer o bem comum e trabalhar por ele é exigência de justiça e de caridade. Comprometer-se pelo bem comum é, por um lado, cuidar e, por outro, valer-se daquele conjunto de instituições que estruturam jurídica, civil, política e culturalmente a vida social, que deste modo toma a forma de pólis, cidade. Ama-se tanto mais eficazmente o próximo, quanto mais se trabalha em prol de um bem comum que dê resposta também às suas necessidades reais. Todo o cristão é chamado a esta caridade, conforme a sua vocação e segundo as possibilidades que tem de incidência na pólis. Este é o caminho institucional — podemos mesmo dizer político — da caridade, não menos qualificado e incisivo do que o é a caridade que vai directamente ao encontro do próximo, fora das mediações institucionais da polis”.

Cremos que nunca é demais enfatizar as três formas de caridade/fraternidade que a Caritas Brasileira nos indica: Caridade assistencial (dar o peixe); caridade promocional (ensinar a pescar) e caridade libertadora (pescar junto, caminhar junto, lutar junto `aqueles que são excluídos/excluídas e injustiçados).

Laudato Si. Encíclica do Papa Francisco, escrita em 24 de Maio de 2015, menos de dois anos após ter sido eleito (13 de Março de 2013),  chamado então de “o papa que veio do fim do mundo, primeiro Papa oriundo da América Latina.

Nesta Encíclica o Papa Francisco sintetiza o pensamento da Igreja em relação `as questões ecológicas/ambientais, enfatizando que neste contexto “tudo está interligado nesta Casa Comum”, e que não existem duas crises separadamente, de um lado uma crise social (e econômica e política) e de outro uma crise Ambiental; mas sim, apenas uma e complexa crise socioambiental.

Assim, o Papa Francisco amplia o entendimento da Doutrina Social da Igreja, incluindo na mesma a dimensão da ecologia integral, aprofundando esta ligação ao escrever a Exortação Apostólica “Minha querida Amazônia” (02 de fevereiro de 2020), quando insiste que deseja uma Igreja nesta vasta região com a cara dos povos que nela habitam  e destacar seus quatro sonhos: o social; o cultural, o ecológico e o ecclesial.

Vale a pena refletirmos sobre este aspecto, que, em minha opinião, vai ao âmago da Doutrina Social da Igreja e não se esgota apenas em relação `a Amazônia, mas a todos os demais territórios onde a presença da Igreja se faz sentir.

Assim diz o Papa Francisco “Sonho com uma Amazônia que lute pelos direitos dos mais pobres, dos povos nativos, dos últimos, de modo que a sua voz seja escutada e que a dignidade seja promovida. Sonho com uma Amazônia que preserve a riqueza cultural que a caracteriza e na qual brilha de maneira tão variada a beleza humana. Sonho com uma Amazônia que guarda zelosamente a sedutora beleza natural que a adorna, a vida transbordante que enche os seus rios e suas florestas. Sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e de se encarnar na Amazônia, a tal ponto que deem `a Igreja novos traços amazônicos” (in Minha Querida Amazônia, 7).

Fratelli Tutti. (Sobre a Fraternidade e a Amizade Social), Encíclica do Papa Francisco, de 03 de Outubro de 2020, onde o mesmo aponta caminhos para a construção de um mundo novo, com mais solidariedade, com mais dignidade e com mais humanidade, enfim, como podemos aprofundar a construção da civilização do amor e da sociedade do  bem viver.

Vamos sonhar juntos. O Caminho para um futuro melhor. Reflexão do Papa Francisco em conversa com Austen Ivereigh, em dezembro de 2020, durante a pandemia da covid-19, que assolou  e continua assolando o mundo de forma terrivel, afetando 520 milhões de pessoas que contrairam a doença e que causou a morte de 6,26 milhões de pessoas, até esta quarta feira, 11 de Maio de 2022, com repercussões profundas e consequências como aumento do desemprego, da exclusão social, da fome, da miséria e de outras formas de violência.

Mesmo em meio a tanta dor, sofrimento e morte, o Papa Francisco insiste na necessidade de termos esperança em um mundo melhor, esperança que deve caracterizar todos  os cristãos.

Gostaria de destacar um pensamento/reflexão do mesmo quando diz “ Em momentos de crise, é possivel ver o bom e o mau: as pessoas mostram-se como são. Algumas dedicam tempo a servir aos necessitados, enquanto outras enriquecem `a custa das necessidades dos demais. Alguns vão ao encontro dos outros - de formas novas e criativas , sem se afastarem do próprio lar - ao passo que alguns se refugiam atrás de uma couraça protetora. O coração mostra-se como é”.

Ao longo desta reflexão podemos perceber que nesses 131 anos do surgimento da Rerum Novarum, a realidade politica, social, econômica, cultural, científica e tecnologica sofreu uma transformação profunda.

Todavia, apesar dessas ttransformações, os desafios que se apresentam para a Igreja ainda permanecem, razão pela qual a atualidade da Doutrina Social da Igreja continua presente, agora com a inserção de novos desafios, onde a questão da ecologia integral pode ser considerada fundamental para a atuação de leigos e leigas, bem como toda a hierarquia da Igreja, incluindo religosos e religiosas.

O fortalecimento das ações de pastorais, movimentos e organismos que se inserem na dimensão sócio transformadora requer um aprofundamento na formação desses/dessas agentes. Essas são algumas das razões que embasam os cursos de Doutrina social da Igreja e de Fé e cidadania e de um engajamento maior dos cristãos nas questões socioambientais/ecologia integral.

Concluindo, “⁠Sonho que se sonha só É só um sonho que se sonha só Mas sonho que se sonha junto é realidade” Raul Seixas
 
Vamos  sonhar e agirmos juntos, pois, juntos somos mais fortes e vamos mais longe.
 
*JUACY DA SILVA, sociólogo, mestre em sociologia, professor titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. Twitter@profjuacy

Terça, 26 Abril 2022 10:08

 

 

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JUACY DA SILVA*

Em DEFESA DA ECOLOGIA INTEGRAL e dos cuidados com a CASA COMUM, o Movimento LAUDATO SI, cuja sede mundial está localizada em Washington, DC (EUA), todos os anos estimula, para que pessoas, movimentos, pastorais e organizações comemorem, durante uma semana, o aniversário de publicação da Encíclica “LAUDATO SI” (DEUS SEJA LOUVADO), pelo Papa Francisco, que ocorreu em Assis, na Itália, em 24 de Maio de 2015.

Neste ano de 2022, a SEMANA LAUDATO SI será comemorada de 22 a 29 de maio, e no dia 24 de Maio estaremos comemorando exatamente 7 anos da publicação desta importante Encíclica,  um marco no pensamento social da Igreja quanto `a questão socioambiental, que também e chamada de Encíclica VERDE.

Antes de avançarmos em nossa reflexão creio que seja interessante destacarmos o que disse o Presidente Macron,  reeleito para mais 5 anos `a frente dos destinos da França, que em seu discurso após a confirmação de sua reeleição, disse estar assumindo solenemente o compromisso de transformar a França em uma país, uma nação e um governo fundamentalmente ECOLÓGICOS, discurso coerente com o avanço dos espaços  ocupados pelos Partidos Verdes na Europa e os movimentos Ecológicos, inclusive com participação da Igreja Católica no fortalecimento da Luta ecológica, tendo como bússola a Encíclica “LAUDATO SI” e as constantes exortações do Papa Francisco em seus pronunciamentos.

Diante da continuidade da degradação Ambiental, do aprofundamento da crise socioambiental, incluindo o aumento da poluição do ar, das águas, inclusive dos oceanos, dos solos, aumento do desmatamento, principalmente das florestas tropicais, das queimadas, das atividades mineradoras que deixam atrás de si um rastro de destruição e um passivo ambiental imenso, impagável e das mudanças climáticas, com destaque para o aquecimento global, como bem enfatizou o último relatório (março último) do IPCC – Painel de Cientistas da ONU, que estamos diante de uma EMERGÊNCIA CLIMÁTICA, é mais do que importante, é mandatório que as autoridades de todos os países, inclusive do Brasil,  deixem de lado os discursos demagógicos e realizem ações concretas, como constam do Protocolo de Kyoto, do Acordo de Paris e dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e suas metas, que foram aprovadas em Assembleias da ONU e firmados como compromisso para a AGENDA DE 2030 por todos os países, inclusive pelo Brasil.

Comemorar a “SEMANA LAUDATO SI”, para a Igreja Católica é fundamental, afinal, não tem sentido que a Igreja, tanto em termos de hierarquia Eclesiástica (Arcebispos, Bispos, Padres, Religiosos e Religiosas), bem como Leigos e Leigas engajados e engajadas em pastorais, organismos e movimentos estejam omissos e omissas quanto aos apelos, exortações e recomendações do Papa Francisco, em relação `a ecologia integral.

A omissão diante dos  desafios de uma crise socioambiental que se agrava a cada dia, é um “pecado ecológico”,  uma afronta ao Criador (Deus) e `as obras da Criação, por duas razões, primeiro por que, como cristãos e católicos, cremos que todas as coisas, tanto o ser humano quanto a natureza, ai incluídas todas as espécies animais e  vegetais, a biodiversidade, foram criadas por Deus para uso de toda a humanidade e, segundo, o aspecto bastante enfatizado pelo Papa Francisco na Laudato Si, quando ele afirma que “tudo está interligado, nesta Casa Comum”.

Por isso, não tem sentido a gente ficar imaginando que a degradação ambiental que ocorre em um país, que uma matriz energética que utilize basicamente fontes de energia de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão vegetal), ou o desmatamento de florestas tropicais ou a poluição por plásticos e outros tipos de resíduos sólidos/lixo, que a falta de saneamento básico, o desperdício de alimentos e tantos outros materiais, que aumentam a poluição sejam questões que devam ser tratadas no contexto do conceito de soberania nacional, como se cada país se julgasse no direito, como acontece com os grandes poluidores do planeta, como China, EUA, Índia, Rússia, Japão, Canadá , a União Europeia, e outros mais, entre os quais o Brasil que a cada dia ocupa um lugar de destaque neste triste “ranking”, devesse ser decidido apenas levando em consideração os conceitos de independência e de soberania nacional.

Apenas para se ter uma ideia, 75% das emissões de gases de efeito estufa que estão aumentando a temperatura da terra e destruindo a camada de oxônio do planeta em 2021 foram produzidos por 7 países: pela ordem de volume em milhões de toneladas métricas: China, EUA, Índia, Indonésia, Rússia, Brasil, Japão e pela União Europeia. O volume total de gases de efeito estufa lançados na atmosfera em 2020 foi de aproximadamente 51 bilhões de toneladas. Os demais países (em tono de 150) produziram apenas 25% do total desses gases poluentes.

O Planeta Terra ou como alguns denominam de a “Mãe terra”, é único, o aquecimento global e seus reflexos ou consequências como aumento do nível do mar, do derretimento das geleiras, o aumento dos desastres naturais provocados pela ação irracional dos seres humanos, o consumismo, o desperdício,  que levam ao aumento da fome, da miséria, do aumento das migrações internacionais e nacionais, mortes desnecessárias por pandemias e outras doenças decorrentes da falta de cuidado com o meio ambiente  e outras formas de degradação ambiental afetam a humanidade como um todo.

Tanto as emissões de gases de efeito estufa quanto o acúmulo desses gases na atmosfera colocam em risco a camada de oxônio que protege o planeta terra como um todo, e não apenas alguns países, e se o nível desse aquecimento global ultrapassar os parâmetros que foram definidos e aceitos pelos países signatários do Acordo de Parias, que é de 1,5 graus a mais do que era a temperatura media da terra no início do período da industrialização, gerando grandes ondas de calor, seguidas de temperaturas baixíssimas, secas prolongadas, chuvas torrenciais, enfim, tudo isto está agravando e vai agravar o regime das chuvas, dos ventos e dos oceanos. Afetando a produção de alimentos e outras materiais primas e, também, com certeza as condições de vida no planeta, para todas as formas e espécies, inclusive da vida humana serão insuportáveis.

Vale a pena refletir sobre o significado que o  anteriormente denominado, Movimento Global Católico pelo Clima, atualmente MOVIMENTO LAUDATO SI, está divulgando em relação `a “SEMANA LAUDATO SI” 2022, material que acabo de receber em meu correio eletrônico (E-mail) e que compartilho nesta reflexão.

“Movimento Laudado Si, Católicos pela nossa Casa Comum”

 

Olá Juacy,

 

Temos o prazer de anunciar que de 22 a 29 de maio nos reuniremos para celebrar juntos a Semana Laudato Si’ 2022, comemorando o sétimo aniversário da histórica encíclica do Papa Francisco sobre o cuidado da criação.

 

“Ouvir e caminhar juntos” é o tema que nos guiará este ano, junto com o lema: “Unir toda a família humana para proteger nossa casa comum”. (LS 13) Será uma semana festiva, que mostrará ao mundo o quanto a Igreja mudou nestes sete anos e inspirará milhões de católicos em todo o mundo.

 

O programa se concentrará nos 7 Objetivos Laudato Si’, apresentando um deles a cada dia e enriquecendo a conversa com atividades online e presenciais, além de recursos para oração, estudo e ação.

 

Sobre o  conteúdo deste “convite”, cabe ainda nesta reflexão, destacar quais são esses sete objetivos, inserindo-os no contexto das orientações da Plataforma de Ação Laudato Si:

 

“Discernir uma resposta para a crise ecológica é um profundo cuidado. Neste momento de “kairós”, a ação é necessária. Os Objetivos Laudato Si, guiam as nossas ações. Eles redefine e reconstroem a nossa relação uns com os outros e com a nossa casa comum. Sua abordagem holística leva em conta os limites planetários de todos os sistemas socioeconômicos e as raízes humanas da crise ecológica. Estes objetivos nos chamam a uma revolução spiritual e cultural, para alcançar a ecologia integral”

 

Os setes objetivos Laudato Si são os seguintes: 1) Resposta ao clamor da terra; 2) Reposta ao clamor dos pobres; 3) Economia ecológica; 4) Adoção de estilos de vida sustentáveis; 5) Educação ecológica; 6) Espiritualidade ecológica e, 7) Resiliência e empoderamento das comunidades.

 

Vale também ressaltar que esses objetivos da LAUDATO SI, estão em perfeita coerência e consonância com o conteúdo da CARTA DA TERRA, firmada na Eco 92, no Rio de Janeiro; com os termos do Acordo de Paris, com os Objetivos do Milênio e com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, bases da Agenda 2030 da ONU, com ampla aprovação e adesão de todos os países, inclusive do Brasil.

 

Finalizando esta reflexão, transcrevo a seguir o significado desta caminhada em prol da ecologia integral, como deseja e nos estimula a Plataforma Laudato Si, uma organização e, ao mesmo tempo, um movimento que pretende inserir de uma forma mais efetiva a Igreja Católica no Mundo inteiro, inclusive no Brasil, nesta caminhada, atendendo ao chamado do Papa Francisco quando escreveu esta importante Encíclica.

 

“A Plataforma de Ação Laudato Si’ capacita a Igreja universal e todas as pessoas de boa vontade para atenderem à Laudado Si, a Encíclica do Papa Francisco sobre a importância e urgência de melhor cuidarmos da nossa casa comum, que é o Planeta Terra.

Explorando os antigos ensinamentos da nossa fé à luz da crise ecológica de hoje, a Laudato Si’ nos ensina que “tudo está interligado” (LS 91). Como nossa relação com nosso divino Criador foi negligenciada, as relações humanas esmoreceram e nosso mundo esquentou, tornou-se menos estável e com menos vida. Consequentemente, todos nós sofremos e os mais pobres e vulneráveis sofrem ainda mais. Encaramos uma  “ não existem duas crises separadas, uma social e outra Ambiental, mas sim, uma única e complexa crise socioambiental” (LS 139).

Há esperança. O Papa Francisco nos chama a desenvolver uma “consciência amorosa” desta casa que compartilhamos e agir a partir dos valores em que cremos. (LS 220)

Sobre a base concreta de “três relações fundamentais intimamente ligadas: as relações com Deus, com o próximo e com a terra,” nos comprometemos a embarcar nos “longos processos de regeneração” (LS 66, 202). Assumimos nosso devido lugar na “ordem e dinamismo” que nosso Criador estabeleceu e buscamos com urgência novas maneiras de viver com “criatividade e entusiasmo” (LS 221, 220).”.

Volto a insistir, a caminhada pode ser longa, os desafios e obstáculos, com certeza, são imensos, a ganância humana, a busca incessante por lucro imediato estão destruindo o planeta, Podemos ouvir a cada momento os “gemidos da mãe terra”.

Diante deste desafio, como cristãos, cidadãos, contribuintes e eleitores, brasileiros e brasileiras, pergunto, o que podemos, devemos ou somos movidos a realizar? Com certeza  nem a omissão e muito menos a conivência são as melhores respostas, afinal, que planeta vamos deixar para as gerações futuras? Pior do que recebemos de nossos antepassados?

Pergunto, você já leu a Encíclica Lautado Si? O que sua paróquia, sua comunidade, sua Diocese, Arquidiocese estão fazendo, como Igreja, para atender ao chamado do Papa Francisco na Laudato Si? O que você e sua comunidade tem feito pelo meio ambiente? Pela Ecologia Integral?

Pense nisso, procure a resposta e junte-se a tantas outras pessoas, pastorais, movimentos e organizações que acreditam em um mundo melhor, com desenvolvimento para todos, mas com respeito ao meio ambiente e com mais igualdade, equidade, justiça e fraternidade, isto também pode ser denominado de Justiça Social e Justiça Ambiental ou Justiça socioambiental.

Não se omita e nem seja conivente com a degradação ambiental e com a destruição do Planeta. Este é o momento de agirmos, amanhã pode ser tarde demais!

 

 

*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado Universidade Federal de Mato Grosso, Sociólogo, mestre em sociologia. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Terça, 19 Abril 2022 15:35

 

 
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JUACY DA SILVA*
 


Com frequência o CIMI, outras entidades que lutam pelos direitos dos povos indígenas e diversas lideranças de diferentes povos, etnias e culturas indígenas vem denunciando VIOLÊNCIA cometida contra tais povos originários, inúmeras invasões das terras/territórios indígenas, por madeireiros, garimpeiros, caçadores, mineradoras que, de forma praticamente `a luz do dia e não apenas clandestinamente, estão destruindo esses territórios, como também diversas áreas públicas, florestas nativas, reservas ambientais, ante a OMISSÃO e até certa conivência dos organismos públicos, a maioria dos quais, totalmente sucateados nos últimos anos, retirando-lhes a capacidade de fiscalizarem e defenderem essas áreas das ações ambientais criminosas.

Defender a CAUSA INDÍGENA, é uma forma também de defender a natureza, defender a ECOLOGIA INTEGRAL, impedir a destruição da biodiversidade, a degradação do solo, a poluição das águas por mercúrio, o desmatamento, as queimadas como tem acontecido em todas essas atividades criminosas, principalmente as de  extração mineral, não apenas na Amazônia, mas também em todas as demais regiões onde tais praticas predatórias estão sendo utilizadas.

Vejam/leiam a seguir matéria que está circulando hoje, mas que já é do conhecimento público há muito tempo, em uma demonstração de como a OMISSÃO e a CONIVÊNCIA de organismos públicos e autoridades que deveriam defender e proteger os povos indígenas, contribuem para a destruição não apenas da natureza, mas uma violência inominável contra povos ancestrais (indígenas, suas culturas) e também quilombolas, ribeirinhos e agricultores familiares nessas regiões onde impera a Lei do mais forte, do crime Ambiental organizado!

Garimpeiros detidos na Terra Xipaya são liberados no PA
Fonte: Site Fonte: Site Climainfo, 19/04/2022

A operação de forças de segurança pública na Terra Indígena Xipaya, no sul do Pará, que resultou na apreensão de uma balsa utilizada por garimpeiros que invadiram a reserva na semana passada, acabou sem prender ninguém. As cinco pessoas detidas pela Polícia Federal na ação acabaram sendo liberadas.

De acordo com a cacique Juma Xipaya, que denunciou a invasão nas redes sociais, os garimpeiros foram liberados “com a alegação de que não teria transporte para retirar eles e levar para Altamira para efetuar a prisão”. Já a PF afirmou que os garimpeiros não chegaram a ser presos porque a região é de difícil acesso e que não foi possível chegar ao local antes do final do prazo de 24 horas exigido para configurar prisão em flagrante. O g1 deu mais informações.


As aldeias Xipaya, que já convivem com o avanço do garimpo ilegal em suas terras, temem agora que os garimpeiros se vinguem contra os indígenas. O Ministério Público Federal confirmou no domingo (17/4) que a Procuradoria-Geral da República (PGR) acompanha a situação dos Xipaya e determinou uma investigação sobre a invasão de garimpeiros à Reserva. O procurador-geral Augusto Aras também pediu à FUNAI providências para evitar um confronto armado entre garimpeiros e indígenas.


Por falar em mineração ilegal, André Borges destacou no Estadão um esquema de fraude promovido por empresas mineradoras para “esquentar” estoques de manganês explorado em áreas ilegais com documentos falsos de origem. O Pará está no epicentro do esquema: milhares de toneladas do minério estão sendo retiradas todos os anos de Unidades de Conservação; no entanto, as empresas recorrem a endereços de minas desativadas em outros estados para legalizar o produto antes de sua venda e exportação.

Por fim, Cleyton Vilarino contou no Globo Rural a situação de um assentamento de reforma agrária em Senador José Porfírio (PA), onde o INCRA fez uma “troca” com a mineradora canadense Belo Sun para permitir a exploração de ouro na área. Destacamos o caso no ano passado: em troca de parte dos lucros no projeto da Belo Sun, o INCRA reduziu o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, criadas há mais de duas décadas, em 2,4 mil hectares. Para assentados e representantes do Ministério Público, o acordo não é apenas ilegal, mas também o INCRA atenta contra sua própria missão institucional ao agir em desfavor dos interesses das famílias assentadas.

 

*JUACY DA SILVA, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), sociólogo, mestre em sociologia. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

Quarta, 13 Abril 2022 09:27

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

“A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que a poluição do ar está diretamente ligada a 24% das mortes por doenças cardíacas e 29% das mortes por câncer pulmonar. Esses dados mostram como o cuidado com a saúde vai além das visitas ao médico, mas envolve fazer escolhas mais saudáveis em diferentes momentos, como na hora da alimentação e do cuidado com a saúde mental. Para aumentar a discussão sobre os cuidados com a saúde, a OMS criou o Dia Mundial da Saúde. Neste ano (2022), o tema é “Nosso planeta, nossa saúde”.

Falar em saúde das pessoas, como algo desligado do contexto socioambiental, em que a degradação dos biomas, a destruição da biodiversidade, o desmatamento em geral e particularmente das florestas tropicais, o aumento da produção de lixo, o aumento da produção de gases de efeito estufa, que provocam as tão temidas mudanças climáticas e aquecimento global, enfim, falar em saúde das pessoas como algo fora do contexto da saúde do planeta, soa como algo sem sentido. Por isso, é fundamental cuidar das pessoas e também cuidar do planeta, sem o que não haverá saúde individual e nem vida planetária!

O mundo nos últimos dois ou quase três anos tem sido sacudido por uma das mais severas pandemias que se abateu sobre o planeta terra. Até o surgimento do coronavírus, pouca ou quase nenhuma atenção era dispensada a refletir sobre a interação entre degradação ambiental, mudanças climáticas e a saúde individual e coletiva. Todavia, as mortes decorrentes de problemas ambientais aumentam a cada ano e muita gente nem se dá conta desta triste realidade.

Desde o seu surgimento a OMS – Organização Mundial de Saúde, em 1948, vem alertando governantes e a população em geral para a importância de bem cuidar da saúde da população, bem como os impactos globais e setoriais (no caso da saúde) que a crise socioambiental, particularmente as mudanças climáticas vem afetando a qualidade de vida no planeta.

Quando de seu surgimento, a OMS definiu o que deve ser entendido por saúde. Na visão da OMS “saúde não significa apenas a ausência de doenças, mas o mais completo bem-estar físico, mental e social”, ou seja, como sempre afirma o Papa Francisco “tudo está interligado, nesta Casa Comum”.

Em sua primeira Assembleia Geral, em 1948, a OMS definiu que a partir de 1950, deveria ficar definido que todos os anos, haveria um momento especial para que a comunidade internacional pudesse refletir sobre a importância da saúde das pessoas e que a nossa saúde está diretamente relacionada com a SAÚDE DO PLANETA.

Assim surgiu o DIA MUNDIAL DA SAÚDE, a ser comemorado em todos os países em 07 de Abril de cada ano; ademais, ficou também definido/acertado que a cada ano um tema específico/especial deveria servir de base para as reflexões e ações nos diversos países.

Neste dia mundial da saúde, em 2022; o tema escolhido pela OMS foi o seguinte: “Nosso planeta. Nossa saúde: Ar, água e alimentos saudáveis e limpos para um amanhã mais saudável”. Tendo em vista que nos dois últimos anos e ainda neste ano de 2022, o mundo ainda está inserido  no  contexto da pandemia da COVID-19, o pronunciamento do Secretário Geral da ONU alusivo a esta data, deixa bem claro do que se trata e qual o alcance que devemos estabelecer para que tanto a saúde das pessoas quanto à saúde do planeta terra, sejam atingidas.

Mensagem do secretário-geral da ONU, António Guterres, no Dia Mundial da Saúde em 2022.

“Neste Dia Mundial da Saúde, chamamos a atenção para as injustiças e desigualdades dos nossos sistemas de saúde. A crise da covid-19 expôs o quanto as nossas sociedades são desiguais. Em todos os países, a doença e as mortes por covid-19 têm ocorrido mais entre as pessoas e comunidades que enfrentam a pobreza, condições de vida e trabalho desfavoráveis, discriminação e exclusão social. Mundialmente, a grande maioria das vacinas administradas deu-se em países ricos ou países produtores de vacinas. Graças à iniciativa COVAX, mais nações começam a receber fornecimentos de vacinas, mas a maioria das pessoas em países de baixo e médio rendimento ainda está à espera. Estas desigualdades são imorais e ameaçam a nossa saúde, as nossas economias e as nossas sociedades. Enquanto recuperamos da pandemia, devemos implementar políticas e mobilizar recursos para que todos possam desfrutar dos mesmos resultados na saúde. Isso significa alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável até 2030. E significa oferecer cobertura universal de saúde para que todos, em todos os lugares, possam ter sucesso. Neste Dia Mundial da Saúde, vamos comprometer-nos a trabalhar juntos por um mundo saudável e igualitário”.

Dados estatísticos, fruto de estudos e pesquisas realizadas em diferentes países, por universidades e, também, pelo IPCC (Intergovernamental Panel on Climate Change), grupo criado pela ONU, para conduzir tais estudos ao longo dos últimos anos, traduzindo “Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas”, cujos resultados estão lançando luzes sobre importantes questões, como as relações entre meio ambiente e, particularmente, as mudanças climáticas afetam os níveis e qualidade da saúde das pessoas.

Este Painel é constituído por cientistas de deferentes países e diferentes especialidades e seus relatórios tem sido considerados como verdadeiros alertas quanto `a uma tragédia anunciada, em decorrência das ações humanas, consideradas irracionais, porquanto visando apenas o lucro imediato e o acúmulo de capital em poucas mãos, deixando para a população em geral, principalmente as camadas pobres e excluídas e as próximas gerações, um passivo ambiental impagável, com consequência em todas as esferas da vida humana, inclusive na saúde das pessoas.

De acordo com dados da ONU em 2020 ocorreram 55,4 milhões de mortes no mundo, dessas nada menos do que 6,8 milhões, ou seja, 12,3% foram óbitos cuja causa principal foi a poluição do ar; se agregados outros óbitos tendo como referência a degradação ambiental de forma mais ampla, como falta de saneamento básico, falta de água tratada e potável; alimentos contaminados por agrotóxicos, mercúrio, pesticidas, fungicidas; desnutrição aguda provocada por frustração de colheitas, aumento da desertificação e degradação dos solos, falta de um tratamento adequado para os resíduos sólidos erosão, as migrações em massa devido a questões ambientais e outras mais, o total de mortes decorrentes ou relacionadas com problemas ecológicos ou ambientais, seriam mais de 35 milhões de óbitos, ou seja, 63,2% das mesmas são causadas por problemas ambientais.

Costuma-se dizer que para cada real, dólar ou outra moeda qualquer investido na preservação e cuidados com o meio ambiente, representam entre cinco a dez vezes de retorno em redução dos gastos/investimentos em saúde individual ou coletiva. Pena que governantes do mundo todo, inclusive do Brasil não tenham percebido a importância de bem cuidar do planeta, chegando a perseguir, assassinar ou ridicularizar ambientalistas e demais pessoas que lutam por um planeta mais saudável.

Apenas para se ter uma ideia de parte da realidade socioambiental do mundo, a ONU destaca que em 2020 em torno de 6,0 bilhões de pessoas não tinham sequer privadas ou instalações sanitárias para depositarem suas fezes. Isto representa 46,2% da população mundial. No Brasil naquele mesmo ano em torno de 49% da população não tinham acesso a esgoto coletado e tratado, o que tem transformado nossos rios, córregos e o oceano Atlântico na costa brasileira em uma grande lixeira ou esgoto a céu aberto, com sérias consequências para a saúde da população.

Ainda segundo estatísticas da ONU, demonstram uma situação alarmante quando em torno de 90% da população mundial (7 bilhões de pessoas) vivem em locais com elevados índices de poluição do ar, das águas, do solo e outras formas de degradação Ambiental, incluindo a falta de coleta e tratamento de resíduos sólidos/lixo.

Diante desses e de outros dados, que demonstram a precariedade tanto em relação ao meio ambiente quanto à saúde das pessoas, Podemos afirmar com toda a Certeza de que cuidar do meio ambiente, da ecologia integral é uma forma inteligente, racional e humana de investir em saúde, de promover o bem-estar e a melhoria da qualidade de vida a população. Só não enxerga isso governantes míopes, demagogos e corruptos.

A OPAS – Organização Pan Americana de Saúde, braço da OMS para os países das Américas, principalmente para a América Latina e Caribe, também tem estado engajada nesta esforço coletivo no sentido de vincular a questão ou os desafios da saúde `a necessidade de um melhor cuidado com o meio ambiente, ou seja, cuidar melhor do nosso planeta terra.

Para tanto a OPAS definiu a sua Agenda para as Américas, no período de 2021 até 2030, coincidindo com a Agenda 2030, dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

A meta e objetivos da Agenda para as Américas, da OPAS, de forma sintética é a seguinte: “assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos (todas as pessoas que vivem no continente americano e no Caribe), utilizando um enfoque sustentável e equitativo, que priorize a redução das iniquidades e exclusão das grandes massas em relação aos cuidados com a saúde”, dentro do conceito estabelecido pela OMS e aceito por, praticamente, todos os países membros da OPAS, inclusive o Brasil.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 106, estabeleceu o marco legal para o que significa saúde em nosso país “saúde é um DIREITO DE TODOS (todas as pessoas) e um DEVER DO ESTADO (Poderes Públicos), garantido (este direito) mediante políticas (públicas) sociais e econômicas que visem reduzir os riscos de doenças e de outros agravos ao acesso universal e igualitário `as ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.

A Lei que define os objetivos, as ações e formas de atuação do SUS – Sistema Único de Saúde (Lei 8.080 de 1990) assim estabelece: “A saúde é UM DIREITO fundamental do ser humano, devendo o ESTADO (Poderes Públicos) prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”.

A referida Lei estabelece e deixa claro que, para haver saúde, segundo o conceito da OMS e OPAS, alguns fatores precisam estar presentes nas políticas públicas, tais como: alimentação correta e saudável; moradia digna, trabalho e salários dignos; meio ambiente saudável e bem cuidado; educação de qualidade, atividades físicas, sono, lazer, transporte seguro, acesso a bens e serviços públicos essenciais e de qualidade e, também financiamento e dotações orçamentárias compatíveis com os níveis de demanda população.

Neste último aspecto, há várias décadas o SUS vem sendo sucateado por sucessivos governos, com precariedade de recursos financeiros, humanos e técnicos, o que pode ser comprovado pelas longas filas físicas ou virtuais, de pacientes que, mesmo necessitando de atendimento com certa urgência, inclusive cirurgias, precisam esperar meses ou até anos nesta fila, resultando em sofrimento, descaso e mortes/óbitos desnecessários.

Já que estamos tentado refletir sobre as interações entre meio ambiente e saúde, como tem sido enfatizado pela OMS/OPAS e diversos outras entidades e profissionais de ambas as áreas, é bom observarmos o que diz, sobre meio ambiente, a nossa Constituição Federal de 1988.

Em seu artigo 225, podemos perceber a intenção dos constituintes quando está escrito ( com Certeza muito mais para inglês ver, como se diz, já que em boa parte esses dispositivos constitucionais e legais não passam de letra morta) “Todos (e não apenas algumas pessoas e camadas privilegiadas) tem o DIREITO ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo (e não das elites econômicas e políticas ou dos donos do poder) e essencial `a sadia qualidade de vida, IMPONDO – SE ao Poder Público (Estado) e `a coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações.

O último relatório do IPCC – Painel Intergovernamental sobre as mudanças climáticas, vinculado `a ONU, de poucos dias atrás (04 de abril de 2022), com quase três mil páginas, traz um rico material sobre os impactos da degradação Ambiental, particularmente das mudanças, na saúde da população e em todos os demais setores das atividades humanas.

Respondendo a “uma pergunta que não quer calar”, este relatório afirma que as mudanças climáticas, afetam todas as áreas das ação humana, tais como: a) aumentam o sofrimento, os desastres naturais e as mortes de pessoas indefesas e inocentes; b) facilitam o surgimento e proliferação de vetores que causam doenças, inclusive epidemias e pandemias; c) aumentam as doenças e consequências relacionadas com a falta de água potável e de qualidade, falta de saneamento básico, aumento da poluição; de alimentos contaminados por agrotóxicos, mercúrio, pesticidas, fugicidas e herbicidas nocivos a saúde humana; d) aumento das doenças e mortes decorrentes da poluição e degradação dos solos; e) aumento dos desastres naturais provocados pela ação humana, f) aumento da pobreza, da miséria, da desnutrição e da fome, que também contribuem para o aumento de mortes de pessoas, grupos vulneráveis e camadas populacionais excluidas; g) aumento da destruição da biodiversidade e da desertificação afetando o suprimento de alimentos, gerando mais insegurança alimentar e facilitando as chamadas doenças de massa.

Como podemos perceber , como afirma o Papa Francisco, não existem duas crises separadas, uma crise ecológica/ambiental de um lado e do outro lado uma crise sócio-econômica-política; mas sim, uma “única crise, que é a crise sócio ambiental, onde está inserida umbilicalmente a crise da saúde humana, individual ou coletiva.

O Papa, hoje São João Paulo II, conforme enfatiza o Papa Francisco na Encíclica Fratelli Tutti, de 03 de Outubro de 2020, referindo-se ao meio ambiente e suas implicações para a sobrevivência das atuais e futuras gerações, assim se manifestou: “Deus deu/criou a terra para todo o gênero humano, para que ela (a terra) sustente todos os seus membros (população mundial), sem excluir e nem privilegiar ninguém’

E segue o Sumo Pontífice (Para Francisco) em suas exortações dizendo “Por conseguinte, ninguém pode ser excluído, não importa onde tenha nascido e contam menos ainda os privilégios que outros possam ter por nascerem em lugares com maiores possibilidades….. É inaceitável que uma pessoa que o local de nascimento ou residência determine menores oportunidades e vida digna e desenvolvimento….O Desenvolvimento não deve orientar-se para a acumulação sempre em mãos de poucos, mas há de assegurar “os direitos humanos, pessoais, sociais, econômicos e políticos, incluindo os direitos das nações e dos povos…. “quem possui uma parte é apenas para a administrar em benefício de todos” (Laudato Si, 95).

Como percebemos através desta singela reflexão, o mundo está diante de um paradoxo, ou cuida melhor do meio ambiente, reduz os impactos da degradação ambiental, principalmente das mudanças climáticas ou terá que enfrentar mais problemas nas áreas da economia, da saúde, d bem-estar e da vida digna para as atuais e futuras gerações.

Precisamos, urgentemente, encontrar e estabelecer novos paradigmas tanto para as relações em sociedade, das pessoas, classes sociais em termos de uma convivência mais harmônica, mais justa e igualitária, seguindo os parâmetros do bem viver, da doutrina social da Igreja e dos ensinamentos das Sagradas Escrituras, principalmente dos Evangelhos , quanto das relações da sociedade e dos diversos grupos entre si, principalmente com os sistemas de produção com o meio ambiente; se nada disso for feito, com certeza estamos e estaremos caminhando para um grande desastre, muito maior e pior do que as consequências da COVID-19.

Esta é a mensagem que precisamos relembrar sempre, não apenas no DIA MUNDIAL DA SAÚDE, para ao longo de todos os anos, décadas a fio, destacando o ano de 2030, quando o mundo deverá realizar um balanço quanto `a Conquista dos objetivos do desenvolvimento sustentável e suas metas, na verdade um compromisso assumido solenemente por todos os países.

*JUACY DA SILVA, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), sociólogo, mestre em sociologia. E-mail O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

 

Segunda, 04 Abril 2022 08:02

 

 

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JUACY DA SILVA*

“A luta contra a fome exige a superação da lógica fria do mercado, concentrada avidamente no mero benefício econômico e na redução do alimento a uma mercadoria como tantas outras e no fortalecimento da lógica da solidariedade. O tema proposto este ano pela FAO enfatiza a necessidade de ação conjunta para que todos tenham acesso a uma alimentação que garanta a máxima sustentabilidade ambiental e que seja adequada e a um preço acessível. Cada um de nós tem uma função a desempenhar na transformação dos sistemas alimentares em benefício das pessoas e do planeta, e todos podemos colaborar para o cuidado da criação, cada um com sua cultura e experiência, suas iniciativas e capacidades. Os nossos estilos de vida e nossas práticas diárias de consumo influem na dinâmica global e ambiental, mas se aspiramos a uma mudança real, devemos exortar produtores e consumidores a tomarem decisões éticas e sustentáveis e conscientizar a geração mais jovem sobre a importante tarefa que ela desempenha para tornar realidade um mundo sem fome. Cada um de nós pode dar sua contribuição para esta nobre causa” Papa Francisco, em pronunciamento/mensagem enviada ao Presidente da FAO, por ocasião do Dia Mundial da Alimentação, em 16 de outubro e 2021 (Vatican News).

Seguindo esta exortação do Papa Francisco, a CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil definiu e decidiu que o tema da CF Campanha da Fraternidade para o ano de 2023 será FRATERNIDADE E FOME, buscando, com esta iniciativa colocar na Agenda Nacional esta, que volta a ser novamente, uma questão crucial na definição de políticas públicas, nos níveis nacional e estadual, tendo em vista que no próximo ano novos governantes estarão ocupando essas instâncias de poder.

A fome é cruel, traz sofrimento e morte para milhões de pessoas que não conseguem ter este sagrado direito atendido, não apenas em decorrência das consequências da COVID-19, mas sim por causas estruturais, mais profundas que geram desigualdades de renda e oportunidades, fruto também de uma imensa concentração de renda nas mãos de uma minoria, deixando a maioria da população na pobreza e na miséria, tem aumentado muito A FOME NO MUNDO e, inclusive, no Brasil.

Estamos em um ano eleitoral, precisamos fazer de tudo para que a FOME, a DESIGUALDADE SOCIAL, ECONÔMICA, REGIONAL e SETORIAL sejam colocadas na ordem do dia, na agenda das discussões politicas e eleitorais.

Precisamos saber o que os candidatos se comprometem a fazer, seja no Poder Legislativo Federal (Congresso Nacional) seja nas Assembleias Legislativas e, claro, os candidatos aos cargos de Governador e de Presidente da República, chefes dos respectivos poderes executivos, se propõem a realizar, não com promessas e discursos demagógicos e falsos, ou medidas de cunho meramente assistencialistas, eleitoreiras, mas sim, através de politicas públicas para combater e equacionar este grave problema e desafio, única forma de construirmos um pais desenvolvido, justo e sustentável, além do que, a fome destrói a dignidade humana e avilta quem não tem segurança alimentar, tornando tais pessoas massa de manobra dos donos do poder.

A seguir transcrevo alguns dados sobre a fome no mundo, creio que esses dados estão um pouco desatualizados e precisamos realizar uma atualização dos mesmos, principalmente quanto aos impactos que a COVID-19 teve e está tendo sobre o mapa da fome no Brasil e no mundo.

Além dos dados, precisamos identificar as verdadeiras causas da fome no Mundo e no Brasil, o interessante é que, os dados disponíveis demonstram que nas ultimas 5 décadas o crescimento da produção de alimentos foi e continua sendo muito maior do que o crescimento da população em geral e da população urbana também, isto significa que não existe, globalmente, mundialmente, escassez de alimentos, mas sim, a falta de renda por parte da grande massa da população que impede milhões, bilhões de pessoas adquirem alimentos e terão que se contentar com migalhas que caem da mesa dos poderosos e dos donos do poder, na forma de assistencialismo, elites políticas e econômicas que também se apropriam do Estado/poderes públicos em benefício próprio e de uma minoria e definem politicas públicas que contribuem para aumentar o acúmulo de capital, via subsídio e outras benesses, de um lado e de exclusão, miséria e fome do outro. A fome  é também uma forma de violência contra essas massas excluídas.

Politicas assistencialistas minoram apenas temporariamente o drama da fome, da pobreza e da miséria, precisamos de medidas mais profundas que reduzam, drasticamente, os mecanismos que geram concentração de renda, riqueza, propriedade e oportunidades.

Dados de 2020 indicam que no mundo cerca de 100 milhões de pessoas estão sem teto; existem 1 bilhão de analfabetos; 1,1 bilhão de pessoas vivem na pobreza, destas, 630 milhões são extremamente pobres, com renda per capta anual bem menor que 275 dólares; 1,5 bilhão de pessoas sem água potável, mais de 3,5 bilhões sem saneamento básico; 1 bilhão de pessoas passando fome; 150 milhões de crianças subnutridas com menos de 5 anos (uma para cada três no mundo); 12,9 milhões de crianças morrem a cada ano antes dos seus 5 anos de vida, tendo como a principal causa a fome e a desnutrição aguda.

De acordo com a ONG Banco de Alimentos, durante o período da COVID-19, entre 2020 e 2021, a situação da fome no Brasil piorou drasticamente. “A fome sempre foi um problema grave no Brasil, mas com a Covid-19, a situação piorou muito. Antes da pandemia, havia 57 milhões de pessoas vivendo em insegurança alimentar no país, sem acesso pleno e permanente a alimentos; em abril de 2021, 116,8 milhões de pessoas passavam a viver em insegurança alimentar, sendo que 43,3 milhões não tem acesso aos alimentos em quantidade suficiente (insegurança alimentar moderada) e 19 milhões passam fome (insegurança alimentar grave), segundo pesquisa da Rede PENSSAN – Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, realizada em dezembro de 2021, o que revela a urgência da mobilização”.

Conforme reportagem da Revista Radis em 24/06/2021, “em 2014, graças ao Programa FOME ZERO, desenvolvido durante o Governo Lula, apenas 3,6% dos brasileiros estavam em situação de insegurança alimentar grave, o que fez o Brasil deixar o Mapa da Fome pela primeira vez na história, já em 2020, o país voltou a figurar no relatório produzido pelas Nações Unidas sobre a situação da pobreza, fome e  miséria.

Desde então, o fantasma da fome passou a atormentar e provocar dor, sofrimento e morte de milhões de brasileiros. A fila dos ossos/ossinhos, em Cuiabá, que ganhou destaque no noticiário nacional no final de 2021, é apenas uma das faces desta crueldade e desumanidade que é a fome endêmica.

Ainda de acordo com a mesma reportagem da Revista Radis, “um estudo coordenado por cientistas do grupo “Alimentos para a Justiça”, divulgado em abril (2021) e que também mediu os níveis de insegurança alimentar no país, revelou um número ainda mais alto: 125,6 milhões de brasileiros não comeram em quantidade e qualidade ideais desde a chegada do novo coronavírus”. Isto é o que se chama fome endêmica, que produz consequências físicas, mentais, psicológicas terríveis em pessoas que não tem o que comer. De forma semelhante não deixa de ser uma forma de tortura e que vai matando aos poucos tais pessoas. Que praticamente perdem a dignidade humana e se transformam em figuras esquálidas, como chamamos de “mortos vivos”.

Mesmo que a realidade se apresente de forma diferente, muita gente, ainda hoje imagina que a principal causa da fome no mundo seja o desequilíbrio entre produção e oferta de alimentos e o aumento populacional, do  mundo ou de alguns países.

Essas pessoas, sabendo ou não, conhecendo ou não, na verdade estão utilizando o arcabouço do malthusianismo, uma teoria criada por um sacerdote anglicano, de nome Thomas Malthus, que viveu na Inglaterra entre os anos 1.766 e 1.834.

Ao estudar a dinâmica demográfica da Inglaterra, das colônias inglesas e da Europa, elaborou uma teoria em que afirmava que enquanto a população crescia em progressão geométrica, a produção e disponibilidade de alimentos crescia apenas em progressão aritmética.

Em um determinado período este desequilíbrio provocaria o surgimento da fome que dizimaria milhões de pessoas e ai, haveria um novo equilíbrio entre crescimento da população e a produção e oferta de alimentos.

Desta teoria alarmista, que não imaginava como poderia ser o futuro em termos de avanços científicos e tecnológicos e como este avanço poderia contribuir para o aumento da produção de alimentos, muitos outros teóricos criaram as chamadas teorias neomalthusianas, que, em lugar de advogar o avanço da produtividade, graças `as mudanças nos sistemas de cultivo e de novas tecnologias, passaram a advogar o controle da natalidade.

Tanto Malthus quanto os neomalthusianistas escamoteiam a dimensão política, social e econômica que, de fato reduz o poder aquisitivo das massas trabalhadoras e, em decorrência, como não dispoem de renda suficiente, mesmo que a produção de alimentos esteja crescendo, essas camadas passam fome.

Vejamos o que aconteceu no Brasil nesses últimos 40 anos, após o deslanche da revolução verde que aconteceu nas duas décadas após a segunda Guerra mundial. Foi, na verdade após os anos 80 que uma nova revolução aconteceu na produção agropecuária brasileira, com o avanço das fronteiras agrícolas em direção ao cerrado, a pré-amazônia nas regiões Centro-Oeste, parte do Nordeste (a chamada região do MATOPIBA – Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e a incorporação de milhões de ha de áreas até então consideradas imprestáveis principalmente para a produção de grãos.

Outro aspecto foi e continua sendo a utilização de maquinário cada vez mais sofisticado e insumos que reduzem a necessidade de mão de obra e aumentam a produtividade de maneira significativa.

Diante disso, entre os anos de 1980 e as previsões da corrente safra (2021/2022), pode-se perceber esta relação entre aumento da população brasileira e a produção de alimentos, bem como o aumento da produtividade no campo.

Em 1980 o Brasil tinha uma população de 120,7 milhões de habitantes e uma produção de grãos na ordem de 52,5 milhões de toneladas. Em 2022 a população estimada do nosso país é de 214,8 milhões de habitantes, ou seja, um crescimento de 1,78 vezes. Enquanto isso a produção de grãos está estimada em 284,4 milhões de toneladas, um crescimento de 5,42 vezes.

Quanto a produtividade, toneladas x ha de área cultivada, vemos o mesmo Quadro já mencionado, um aumento expressivo da produtividade, ou seja, a cada ano ou a cada década, uma maior produção por ha de área cultivada.

A área plantada em 1980 foi de 49,3 milhões de ha e em 2022 são 72,1 milhões de ha. A produtividade em 1980 foi de 1,06 ton/ha e em 2022 é de 3,94 ton/ha; ou seja, um crescimento de 3,72 vezes, muito além do crescimento populacional, que foi de apenas 1,78 vezes.

Pelo menos no Brasil e também em nível mundial a teoria malthusiana tem se mostrado equivocada, ou seja, não é o aumento da população que tem gerado e continua gerando o flagelo da fome, mas sim políticas de governo que favorecem de um lado o enriquecimento e acumulo de capital, renda, riquezas e oportunidades nas mãos de uma minoria e a perda constante do poder aquisitivo dos salários, principalmente do salário mínimo.

Cabe ressaltar que aproximadamente 80% da massa trabalhadora, sejam os trabalhadores que ainda estão na ativa, aposentados ou pensionistas ganham no máximo dois salários mínimos, valor aquém do poder aquisitivo e das necessidades básicas como alimentação, habitação (aluguel), transporte, artigos de higiene e limpeza, saúde – medicamentos, educação e cultura, que eram os itens constantes do que estabelecia a Lei de criação do salário mínimo nos anos quarenta do século passado.

Algumas pesquisas, como estudos do DIEESE, indicam que o valor do salário mínimo, em 2022, ao invés de R$1.200,00 (mil e duzentos reais), para atender ao que estabelecia a referida Lei, deveria ser de aproximadamente R$4.800,00 (quatro mil e oitocentos reais), ou seja, 4  vezes maior. Esta diferença representa o que muitos economistas denominam de “mais valia’, ou seja, quanto que o fator trabalho perde nas relação de produção e trabalho como acontecem no modelo politico, econômico e social em vigor na atualidade.

Portanto, o problema, a questão da fome não apenas um problema de saúde pública, ou nutricional ou cultural, mas fundamentalmente um problema politico, ou seja, é fundamental o estabelecimento de políticas públicas que reduzam este processo pernicioso de concentração de renda que leva ao empobrecimento, à fome e à miséria mais da metade da população brasileira.

Alimentos não faltam, como bem atesta manchete do Jornal do Comércio de 15/10/2020 quando estampava em primeira página “Brasil produz comida para alimentar 1,6 bilhões de pessoas”, ou outros pronunciamentos de governantes e líderes do agronegócio dizendo que nosso país é celeiro do mundo.

Todavia, nada é falado sobre milhões de pessoas que passam fome, sofrem e morrem e que vivem neste país que tanto se orgulha de seu papel no cenário internacional como um grande “player” das commodities, principalmente alimentos.

Medidas paliativas, assistencialismo, distribuição de quentinhas, sacolões e cestas básicas minoram o problema da fome de alguns, por alguns dias, mas o que é necessário e urgente são medidas que enfrentem os fatores que causam a pobreza, a fome e a miséria, ou seja, reformas estruturais mais profundas que alterem os sistemas politico, econômico e social do Brasil, rumo a uma sociedade justa, verdadeiramente democrática, ambientalmente sustentável, participativa e transparente.

Antes de encerrar esta reflexão, gostaria de chamar a atenção para um aspecto muito enfatizado pelo Papa Francisco de que “tudo esta interligado, nesta Casa Comum”, ou seja, a questão, problema e desafio da FOME está intimamente interligado com diversos aspectos de nossa realidade, tais como: sistemas produtivo, tanto industriais quanto agropecuário, níveis de concentração e distribuição de renda e salário; políticas públicas, principalmente políticas de saúde, educação e saneamento básico, política de preços dos alimentos, formas de organização dos trabalhadores, papel das organizações não governamentais no encaminhamento das discussões e busca de solução para os problemas que afetam as camadas populacionais excluídas, defesa do consumidor e outros aspectos.

Neste contexto é que surgem as propostas que conduzem os excluídos, os famintos e marginalizados para participarem das soluções, atitudes e ações que contribuam para a busca de uma saída para esses desafios, novos paradigmas, já que os modelos econômicos, políticos e sociais não tem sido suficientes para, de fato, enfrentarem a pobreza, a miséria e a fome, que, na verdade são consequências desses modelos.

Novos paradigmas podem ser encontrados na economia solidária, no cooperativismo/associativismo tanto do trabalho quanto do consumo, na geração de energia compartilhada (solar e eólica), na agroecologia, na Economia de Francisco e Clara, na agricultura urbana e periurbana, hortas domésticas, escolares e comunitárias, enfim, na busca de uma nova sociedade que facilite a prática do “bem viver”, reduzindo o consumismo, o desperdício e a geração de resíduos sólidos (lixo) que estão destruindo o meio ambiente e o planeta.

Tudo isso, de forma direta ou indireta, faz parte da Agenda 2030, dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos pela ONU em 2015 e homologados/aceitos por todos os países, inclusive pelo Brasil, para que 17 objetivos sejam alcançados e os desafios possam ser equacionados até 2030.

Vários desses objetivos estão diretamente relacionados com o assunto desta reflexão (fome): 1) Erradicação da pobreza; 2) Fome Zero; 3) Boa saúde e bem-estar; 7) Energia accessível e limpa (sustentável); 8) Emprego digno (condições e salários justos) e crescimento econômico; 10) Redução das desigualdades; 11) Cidades e comunidades sustentáveis; 12) consumo e produção responsáveis (sustentáveis); 13) Combate `as mudanças climáticas; 14) Vida debaixo d’água e, 15) Vida sobre a terra.

Esses aspectos deverão nortear a Campanha da Fraternidade de 2023, vamos acompanhar o que acontece com a fome no Brasil e no mundo.

Finalizando, precisamos  reforçar a ideia de que fraternidade assistencial (dar o peixe), que eu denomino de distribuição de migalhas, em momentos críticos, é importante, mas não resolve, de forma definitiva, o problema da fome, que é gerada pela exclusão social, política e econômica, precisamos ir mais além, para outros tipos de fraternidade/caridade promocional (ensinar a pescar), até chegarmos `a caridade/fraternidade libertadora (pescar juntos) que, de fato, transforma os pobres, marginalizados, excluídos, famintos de objeto de manipulação, de toda ordem, em protagonistas de sua própria história e, realmente, fator de transformação das estruturas sociais, econômicas e políticas injustas, as verdadeiras causas da pobreza, da miséria e da fome, no Brasil e no mundo.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

Sexta, 25 Março 2022 10:34

 

 

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JUACY DA SILVA*

“Quando uma parte da sociedade pretende apropriar-se de tudo o que o mundo oferece, como se os pobres não existissem, virá o momento em que isso terá suas consequências. Ignorar a existência e os direitos dos outros provoca, mais cedo ou mais tarde, algumas formas de violência, muitas vezes inesperadas.  Por conseguinte, um pacto social realista e inclusivo deve ser também um pacto cultural ( econômico e politico, acréscimo meu), que respeite e assuma as diversas visões de mundo, as culturas e os estilos de vida que coexistem na sociedade” Papa Francisco, Carta Encíclica Fratelli Tutti (sobre a fraternidade e a amizade social), 03/10/2020.

Os cristãos, tanto católicos quanto evangélicos, bem como pessoas que professam outros credos, filosofias ou religiões, também são cidadãos e cidadãs, são contribuintes, são trabalhadores, trabalhadoras, donas de casa, empresários, profissionais liberais, vivem em um território determinado, com inúmeros problemas e desafios prementes, e, mais do que tudo isso, SÃO ELEITORES, espera-se, conscientes de suas responsabilidades, e como tais tem o direito e o dever de participarem ativamente da vida polítca e institucional do país em que vivem.

O verdadeiro  cristão não pode ser alienado, nem omisso ou aliado de quem comete injustiça e oprime os trabalhadores e os pobres, diante da realidade que nos certas e dos desafios que tanto angustiam, trazem sofrimento e até mesmo mortes evitáveis para o povo. Foi Jesus quem disse aos seus discípulos sobre a importância e o papel dos profetas ao denunciarem as injustiças e a opressão como os poderosos de antigamente (que eram iguais aos donos do poder atualmente). “Eu digo a vocês", respondeu ele; "se eles se calarem, as pedras clamarão." Evangelho de Lucas, 19:40.

Por tudo isso, os cristãos, católicos e evangélicos, que representam em torno de 80% da população adulta no Brasil,  são e serão os responsáveis diretos pela escolha dos nossos governantes, que se julgam e agem, muito mais como donos do poder, do que defensores do povo, repito, por tudo isso, os cristãos não podem se omitir em relação ao debate politico eleitoral, seja para cargos legislativos ou executivos.

Esta parcela significativa da população, para exercer sua cidadania, tem a obrigação de conhecer a vida pregressa dos candidatos, o que fizeram ao longo de suas vidas ou  estão fazendo, caso sejam detentores de mandatos eletivos e estejam pleiteando a reeleição ou algum outro cargo, e, também, claro, precisam dizer para a população o que pretendem fazer ou farão, caso consigam votos suficientes para garantirem um assento nas Assembleias Legislativas, no Congresso Nacional , nos cargos de governadores estaduais e no posto máximo da politica brasileira que e a Presidência da República.

Assim, as instituições religiosas e seus líderes, que representam os fiéis, católicos ou evangélicos, não podem se omitir diante desses desafios, devem promover discussões politicas e eleitorais, para ouvirem os candidatos e melhor orientar e refletirem com seus fiéis os rumos, não apenas da vida politica do pais, mas, fundamentalmente, como nossos governantes se dispõem a definirem politicas públicas que resolvam os problemas e desafios que tornam a vida da grande massa da população um sofrimento, um desrespeito aos direitos fundamentais da pessoa humana (direitos humanos em sua dimensão ampla) e a dignidade do ser humano.

No caso da Igreja Católica, existem alguns parâmetros que podem ser utilizados para julgarem as ações, as omissões e as propostas dos candidatos, esses parâmetros, a nosso ver são a Bíblia Sagrada, principalmente os Evangelhos; a Doutrina Social da Igreja, o Magistério dos Papas, principalmente, o Magistério, as Encíclicas e exortações do Papa Francisco, além, claro de princípios éticos e valores que significam o respeito `a dignidade das pessoas, bases para um projeto nacional, visando a construção  de um país e uma nação com equidade, com justiça, com melhor distribuição  de renda, com participação popular e sustentabilidade, ou seja, respeito pela ecologia integral.

Dentre os temas mais  candentes que precisam ser tratados pelos candidatos e apresentadas as propostas para a solução de problemas estruturais, não podemos esquecer de alguns como: A questão ambiental/ecologia integral; as mudanças climáticas, o desmatamento, destruição da biodiversidade, o destino da Amazônia e da população que nela habita, principalmente os povos ancestrais (povos indígenas), a degradação do cerrado , do pantanal e de outros biomas; a baixa qualidade da educação e da saúde pública; o problema da violência em geral em todas as suas formas; o problema da burocratização e sua irmã gêmea que é a corrupção que grassa em todas as esferas dos poderes da república; o problema da falta de saneamento básico, a precariedade da infra estrutura urbana e também da infra estrutura dos sistemas de logística e de transporte de cargas e passageiros; o grave problema habitacional, em que dezenas de milhões de pessoas “moram” em casebres, palafitas, favelas, enfim, núcleos habitacionais sub-humanos, o desemprego, sub emprego e baixos salários que geram exclusão e dependência nas pessoas e nas famílias, o problema das desigualdades de renda, de oportunidade, que geram fome, miséria e exclusão social; o problema fundiário e dos territórios indígenas que estão sendo invadidos e grilados, enfim, precisamos saber o que de fato os candidatos se propõem a realizar pelo bem do país e do povo, principalmente os pobres, excluídos e marginalizados.

É neste contexto que a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, como consta de um de seus informes recentes, “já se adiantou e definiu um grande debate com os candidatos a Presidente da República, a ser realizado e transmitido pela TV Aparecida, no dia 13 de setembro, das 21h às 23h, em Aparecida, São Paulo, o debate que reunirá candidatos à Presidência da República para as eleições de 2022. O projeto é uma iniciativa da Igreja no Brasil, coordenada pela CNBB e produzida pela TV Aparecida”.

Conforme o mesmo informe, “o debate entre os candidatos a presidente aprofundará temáticas importantes à nação brasileira”. Segundo o padre Tiago Síbula, assessor da Comissão para a Comunicação da CNBB, a iniciativa não se trata de um debate estritamente religioso, mas sobre o futuro do Brasil, que busca, de modo democrático, eleger seus representantes e estar cientes de suas compreensões, posturas e ações que promovam a dignidade humana a todos”.

Talvez seja também o caso da CNBB, através de seus Regionais patrocinarem e promoverem debates nos Estados com candidatos a governadores e senadores, que são cargos majoritários, bem como realizar seminários e conferências para incentivar os debates em torno das eleições que se aproximam e que irão definir o futuro de nossos estados e do Brasil pelos próximos anos.

É fundamental que essas discussões possam, também, considerar as dimensões ecumênicas, afinal, quando se trata de pensar o futuro de nosso pais e o futuro das próximas gerações devem ter muito mais o que nos une do que o que nos separa.

Assim realizando, os eleitores tanto católicos quanto evangélicos poderiam ter elementos para melhor avaliar o perfil desses candidatos, fazerem escolhas melhores para termos a certeza de que teremos governantes comprometidos com o futuro de nosso país e não apenas usarem as estruturas de poder para se enriquecerem ou até mesmo roubarem o dinheiro público que faz tanta falta para a solução dos grandes e graves problemas nacionais, estaduais e municipais.

Não importa se você é católico, evangélico, espirita, adepto de outra religião, agnóstico ou ateu, se você vive no Brasil deve estar consciente da gravidade dos problemas que nos afetam e que cabe aos poderes públicos e seus agentes (governantes, gestores e servidores) agirem de forma eficiente, eficaz, efetiva, democrática, transparente e participativa para encontrarmos a resposta.

Afinal, o povo paga imposto para que o poder público (o Estado) devolva esta imensa e pesada carga tributária na forma de bens e serviços públicos de qualidade, para a população como um todo e não para manter uma casta de marajás da República, a que meu chamo de “donos do poder, representados por verdadeiras oligarquias e famílias que se enquistam nas estruturas de poder por décadas a fio, como se o Estado (poder público/instituições públicas) fossem de propriedade familiar e possam passar de pais para filhos e demais parentes que se sucedem no “mando politico”.

Pense nisso desde agora, bem antes do dia das eleições e não se deixe levar pela propaganda enganosa, pelo “marketing” politico e muito menos pelas fake news, que além de serem mentirosas, são também crimes contra a democracia, contra as instituições e contra o povo.

*JUACY DA SILVA, professor universitário, fundador, titular e aposentado da UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia. Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

Terça, 22 Março 2022 18:13

 

 

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JUACY DA SILVA*
 

“O meio ambiente é um bem coletivo, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos. Quem possui uma parte ( pessoas ou países, grifo meu) é apenas para administrá-la em benefício de todos (da humanidade, grifo meu). Se não o fizermos, carregamos na consciência o peso de negar a existência aos outros” Papa Francisco, Laudato Si, 95.

Conforme deliberação da Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada pela  ONU em 1992, na chamada ECO-92, no Rio de Janeiro, foi aprovado que, a partir de 1993, todos os anos em 22 de Março seria comemorado o  Dia Mundial da Água.

A cada ano, um novo tema é escolhido para despertar a atenção da opinião pública mundial e também para despertar a conscientização das pessoas, das organizações públicas e privadas, enfim, dos governantes, do setor empresarial, das entidades representativas da sociedade civil e, também, das Igrejas, quanto `a importância da água na dinâmica da vida humana.

Em sua mensagem alusiva ao Dia Mundial da Água neste ano de 2022, o Secretário Geral da ONU, António Guterres, assim se expressou “A humanidade precisa cada vez mais de água. O uso excessivo, a poluição e as alterações climáticas estão a colocar uma pressão crescente sobre os recursos hídricos. As secas e as vagas de calor são cada vez mais intensas e frequentes. A subida do nível do mar está a provocar uma infiltração de águas salgadas nos aquíferos costeiros. Os lençóis freáticos estão a degradar-se. A água pode ser uma fonte de conflito, mas também de cooperação. É essencial que trabalhemos juntos para alcançar uma melhor gestão de todos os recursos hídricos, incluindo as reservas mundiais de água subterrânea.

Existem alguns elementos (dimensões da vida planetária) sem os quais não pode existir vida. Podemos mencionar o próprio planeta terra, que, até a atualidade, mesmo diante do avanço da ciência é o único em que  existe vida, em todas as suas esferas ou dimensões, inclusive a vida humana.

O segundo elemento é a água, tanto as que formam os mares e oceanos, quanto as que estão nos rios, lagos, córregos e ribeirões , bem como as águas subterrâneas, os chamados aquíferos. O terceiro elemento é a energia e o calor propiciados pelo sol.

Somente a combinação desses três elementos: terra (solo/subsolo); calor/energia e água fornecem as condições para todas as formas de vida , animal e vegetal, que conhecemos no planeta terra. Para a manutenção da vida animal, inclusive da vida humana, é fundamental que haja disponibilidade de alimentos, sem os quais também a vida desaparece.

Como mencionamos anteriormente, a ONU escolhe, com certa antecedência, um tema a ser abordado durante as reflexões e discussões no DIA MUNDIAL DA ÁGUA e neste ano de 2022,  tema é; “ Águas subterrâneas: Tornando o invisível visível“.

Conforme publicação da ONU alusiva a este evento, “embora escondidas sob os nossos pés, as águas subterrâneas enriquecem as nossas vidas, apoiando o abastecimento de água potável, sistemas de saneamento, agricultura, indústria e ecossistemas. Em muitos locais, ocorre exploração sem planejamento, além da poluição das águas subterrâneas. É necessário viabilizar essas águas “invisíveis” para que possa ser melhor gerenciada por todos (UN Water, 2022).

Antes de ampliarmos nossas reflexões, é importante identificarmos como a água é consumida no mundo, em relação aos diferentes setores e tipos de usuários. Conforme dados da ONU, a agricultura e pecuária consomem 70% da água disponível; a indústria, o comércio e os serviços 22% e o consume doméstico é responsável por apenas 8% do total. No Brasil a agricultura e a pecuária consomem 80,7% da água, a indústria, comércio e serviços 10,6% e o consume doméstico 8,7%.

Todavia, a regulação sobre os setores que mais consomem água é bem tênue enquanto o Governo e os legisladores querem simplesmente transformar a água em mera mercadoria, que gera lucro aos detentores do capital, sacrificando, ainda mais os consumidores urbanos.

Nada ou pouco se fala sobre as práticas agropecuárias, mineradoras e industriais que poluem, alteram os cursos d’água e desperdiçam este precioso líquido, já que seu custo é praticamente zero, quando comparado com o preço que o consumidor urbano acaba pagando. O Rios Tietê, Tamanduateí e Pinheiros, Paraíba, São Francisco e diversos outros pelo Brasil, inclusive na Amazônia, que estão sendo contaminados por mercúrio e outras substâncias nefastas ao ser humano e aos peixes, são exemplos da leniência do Poder Público em relação aos grandes poluidores das águas e do meio ambiente no Brasil. Outro exemplo foram os desastres de Mariana e Brumadinho, em que o Rio doce, o córrego do feijão e alguns outros acabaram totalmente degradados, além da morte de inúmeras vítimas.

O importante é entendermos e compreendermos que, como sempre menciona o Papa Francisco na Encíclica Laudato Si, que trata da ECOLOGIA INTEGRAL, “tudo está interligado, nesta Casa Comum”, ou seja, da grave crise socioambiental que o mundo está vivendo, cujas consequências danosas estudiosos e cientistas nos tem alertado sobejamente, a DEGRADAÇÃO AMBIENTAL está presente na destruição das florestas, no desmatamento, nas queimadas, na mineração, na destruição do solo e do subsolo, através de práticas que provocam erosão, contaminação pelo uso abusivo dos agrotóxicos (pesticidas, herbicidas, fertilizantes, enfim, produtos químicos altamente nocivos `a vida); degradação das águas doces dos rios e outros mananciais e também dos mares e oceanos.

O consumismo, o desperdício, a economia do descarte e as desigualdades sociais, econômicas, políticas e regionais,  também fazem parte desta equação em que com o aumento da população, da urbanização a cada dia uma quantidade maior de resíduos/lixo, tanto per capita quanto global, é produzido, contribuindo, assim para fechar este ciclo de degradação, afetando diretamente todas as fontes de água no planeta.

Diferente do que muitos acreditam, ao imaginarem que não existe uma saída, o Papa Francisco nos aponta esta saída no que ele chama de Economia de Francisco e Clara, ou seja, um Sistema econômico e social que esteja assentado no respeito ao meio ambiente, na valorização do trabalho e dos trabalhadores através de salários mais justos e na partilha mais justa e humana dos frutos do desenvolvimento que é a economia solidária, o cooperativismo e outras formas assemelhadas. Isto é o que nos levará `a “sociedade do bem viver”, a um mundo melhor, com menos ganância, violência, preconceitos e exclusão.

Os resultados estão diante de nossos olhos, cotidianamente, mostrados pelos mais diversos meios de comunicação, em escala planetária, como o aumento dos desastres naturais, boa parte dos mesmos são provocados pela forma destruidora do meio ambiente em que a humanidade caminha e outras formas de destruição da natureza que precisa parar, enquanto é tempo.

São chuvas torrenciais, secas prolongadas, geleiras que estão derretendo, mudanças no clima e no regime de chuvas, indicando que se não houver uma mudança radical nos modelos econômicos e nas formas de relação da humanidade com o planeta terra, com a natureza, caminhamos para um mundo extremamente hostil, ecologicamente falando.

A destruição da biodiversidade e a destruição da cobertura vegetal nas cabeceiras de rios e nascentes das principais bacias hidrográficas do mundo todo, inclusive no Brasil, onde o desmatamento e as queimadas na Amazônia, no Cerrado, na Caatinga, na Mata Atlântica, nos Pampas e no Pantanal, enfim, em nossos seis biomas, estão interferindo diretamente tanto no volume de água dos principais rios brasileiros quanto afetando profundamente os aquíferos, as chamadas águas subterrâneas, que também estão sendo exploradas sem um maior controle por parte das autoridades governamentais, o que facilita a ação de pessoas e empresas que não tem o mínimo de respeito em relação ao meio ambiente e nem com as gerações futuras.

Durante esta semana, em que o DIA MUNDIAL DA ÁGUA está inserido, em Dacar, no Senegal está ocorrendo o Nono Fórum Mundial da Água, com participação de praticamente todos os países, quando o foco das discussões será a questão da segurança hídrica, no contexto de que o acesso á agua potável, por exemplo, é um direito humano fundamental, da mesma forma que o saneamento básico.

E, conforme destacado pelo Secretário Geral da ONU neste Dia Mundial da Água 2022, “A Conferência das Nações Unidas sobre a Água que decorrerá no próximo ano proporcionará uma oportunidade decisiva de impulsionar a ação para o desenvolvimento sustentável focada na água”.
Por isso, quando falamos sobre a água, não podemos esquecer que ela está vinculada a outros aspectos da dinâmica social, política, ecológica e econômica, como produção de bens e serviços, inclusive alimentos e outros produtos industriais necessários `a nossa vida.

De forma semelhante, a água está relacionada com a questão do saneamento básico, pois quando não existe coleta e tratamento de esgoto esses dejetos acabam poluindo os cursos d’água e tornando a água imprópria para uso humano e animal, além de dizimar/matar outras espécies animais e vegetais, como está acontecendo no Brasil e tantos países em que córregos, rios, as baias e oceanos estão se transformando em grandes lixeiras e esgotos a céu aberto, como acontece inclusive em Cuiabá e milhares de cidades Brasil afora.

Á água também está diretamente relacionada com a saúde humana, afetando os níveis de incidência de doenças e mortes, desnecessárias, evitáveis, diga-se de passagem.

É estarrecedor saber que em pleno século XXI nada menos do que um terço da população mundial , ou seja, 2,6 bilhões de pessoas não tem acesso á água potável e mais de 60% da população mundial ( 4,7 bilhões de pessoas) não tem acesso ao saneamento básico, isto é, no mínimo, injusto e desumano.

O custo desta desigualdade social e exclusão em relação ao direito fundamental das pessoas terem acesso á água e ao saneamento básico e não serem obrigadas, como acontece inclusive no Brasil em diversas cidades, inclusive capitais, a conviverem em meio ao lixo, esgoto a céu aberto, poluição, incide sobre os índices de agravamento de inúmeras doenças, acarretando uma pressão muito grande sobre os sistemas de saúde, cujo custo anual, em nível mundial é superior da US$ 260 bilhões de dólares por ano, além dos custos indiretos que são representados pela baixa produtividade econômica, ausências nos locais de trabalho e nas escolas e outros mais.

O custo x benefício dos investimentos em água e saneamento básico é de um real ou dólar para um retorno de 5 da 10 vezes em termos de saúde pública, qualidade de vida e dignidade humana.

Estudo recente do BNDES (2021) analisando os impactos dos investimentos em água e saneamento básico na saúde pública, na produtividade do trabalho e da economia, demonstra a importância desses investimentos, citando relatório da UNESCO de 2015 em que é dito: “estima-se que, em países em desenvolvimento, cada dólar investido no setor (água e saneamento básico) pode gerar um retorno de US$ 5 a US$ 28 para a economia (UNESCO, 2015). Não existe outro investimento público mais rentável do que este, apesar da negligência e descaso de nossas autoridades em relação ao mesmo.

Diante disso, fica difícil de entender porque quando da elaboração do PPA (plano plurianual), da LDO (Lei de Diretrizes orçamentárias) e OGU (orçamento geral da União) por parte do Poder Executivo e do Congresso Nacional e o de forma semelhante na definição das leis orçamentárias estaduais e municipais, os investimentos públicos nesta área tão importante para o bem estar e qualidade de vida da população não são contemplados, demonstrando o desinteresse e omissão de nossos governantes em relação aos problemas que afetam negativamente a população. Discursos demagógicos, corrupção e até orçamento secreto sobram enquanto os interesses da população continuam sendo negligenciados.

As agências especializadas da ONU como FAO, UNICEF, UNESCO, Organização Mundial de saúde  e inúmeros estudos e pesquisas tem demonstrado sobejamente que sem água potável, de qualidade, de forma universal, sem acesso ao saneamento básico é impossível ter sequer higiene pessoal e privacidade, além de que esta carência e exclusão aumenta a incidência de diversas doenças como diarreia, doenças de pele, que anualmente são causas de internações hospitalares e de morte de milhares ou dezenas de milhares de pessoas.

Dados do Ministério da Saúde ( Sistema de informações sobre mortalidade, 2017), do IBGE e de outras fontes oficiais indicam que entre os anos de 2000 e 2015 foram registradas 3,4 milhões de internações devido a diarreias e doenças correlatas e dessas 72 mil pessoas, a maioria crianças e idosos acabaram indo a óbito (morreram).

Também é possível observar nesses mesmos estudos que essas mortes e internações apresentam uma desigualdade em relação `as regiões e a proporção que cada região representa em termos de população.

A região Norte que representa 8,7% da população, registrou 21,3% dessas internações e mortes; a região Nordeste onde estão 26,8% da população foi responsável por 47,7% dos casos de internação e mortes; já a região Sudeste que tem 42,4% da população registrou apenas 17,6% das internações e mortes; a região Sul com 14,4% da população teve apenas 4,8% dos casos de internações e mortes e, finalmente, a região Centro Oeste com 7,7% da população, participou com 8,5% das internações e mortes por diarreias.

Quando os dados relativos ao acesso `a água potável e ao saneamento básico são considerados neste equação, percebe-se que as duas piores regiões em termos de cobertura de água e saneamento básico são exatamente as regiões Norte e Nordeste.

No mundo, anualmente morrem 526,5 mil crianças recém nascidas, cuja causa básica é a falta de acesso `a água potável, de qualidade e de forma universal. Por esta mesma causa mais 263,2 mil crianças com menos de cinco anos também acabam morrendo. Quando outros grupos demográficos são agregados a esses dois mencionados, o total de mortes por falta de acesso `a água e saneamento básico atingem mais de um milhão de pessoas, geralmente os chamados grupos mais vulneráveis que além dos aspectos demográficos, também são bem conhecidos: são os pobres e excluídos de todos os países. Mas essas mortes não causam comoção  e nem recebem a mesma atenção da mídia, como acontece com guerras, atos terroristas e outras calamidades, cujo número de vítimas é bem menor.

No mundo todo, os sistemas econômicos costumam privilegiar os donos do capital e poucos investimentos públicos são feitos em setores que deveriam beneficiar a população mais pobre e excluída. Enquanto existem subsídios bilionários, como no caso do Brasil, para grandes grupos empresariais, sobram apenas migalhas para serem investidos no abastecimento de água com qualidade e regularidade e em saneamento básico.

O Instituto Trata Brasil anualmente apresenta um relatório sobre as condições do abastecimento de água e do saneamento no Brasil e os dados e indicadores não são nada animadores.

Aproximadamente 50% da população urbana brasileira não tem acesso a coleta e tratamento de esgoto e esta situação afeta diretamente a qualidade de vida de milhões de pessoas, inclusive poluindo as águas.

Cabe ressaltar, por exemplo, que, conforme dados do Instituto Trata Brasil no relatório de 2021, das cem maiores cidades brasileiras, onde estão incluídas, por exemplo Cuiabá e Várzea Grande, o acesso `a água se apresenta em pelo menos 25 dessas cidades como universal; mas ainda existem mais de 20% da população brasileira, incluindo a população rural e de boa parte da periferia urbana, com maior incidência nas regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste que não tem acesso `a água ou quando tem é de forma irregular e com qualidade duvidosa.

Quanto ao saneamento básico, coleta e tratamento de esgoto, em 35 das cem maiores cidades o acesso é de mais de 90% da população, em cinco cidades este índice é inferior a 10% ou seja, mais de 90% da população precisam conviver com esgoto correndo a céu aberto e os cursos d’água sendo contaminados; em 30 dessas cidades maiores o acesso ao saneamento básico fica entre 10% e 50%.

O absurdo é quando capitais e cidades grandes com mais de um ou dois milhões de habitantes, tanto o abastecimento de água quanto o acesso aos serviços de esgotamento sanitário excluem 70%, 80% ou 90% da população, geralmente famílias pobres que vivem nas periferias urbanas, onde o desemprego, sub emprego ou a dependência das migalhas públicas , na forma de ajuda oficial, apenas minoram este drama humano.

A título de exemplo, vamos mencionar algumas capitais em relação ao saneamento básico, cujos índices são gritantes em termos da quantidade de famílias que não tem acesso `a coleta e tratamento de esgoto. Belém 84%; Manaus 80%; Macapá  95%; Rio Branco 78%; Porto Velho 88%; Recife 56%; Maceió 67%; São Luís e Fortaleza 50%. Entre as 40 cidades com índices extremamente precários quanto ao acesso ao saneamento básico, pasmem, uma vergonha, estão 13 capitais e outras cidades que fazem parte das respectivas regiões metropolitanas em seu entorno, onde geralmente estão a maior parte da população dos Estados.

Se nas capitais, onde estão concentradas as sedes dos governos estaduais, municipais e todos os organismos federais o panorama é este, podemos imaginar como está a situação nas demais cidades que carecem de recursos públicos e a população, com raras exceções, é mais pobre, de baixa renda e excluída de todas as formas.

Por exemplo, o Aglomerado urbano Cuiabá/Várzea Grande que já está próximo de um milhão de habitantes, a conferir neste censo que está sendo realizado este ano, aproximadamente 55% da população, em torno de mais de 480 mil pessoas não tem acesso ao saneamento básico. Mesmo em Cuiabá é comum em diversas ruas movimentadas, centrais as pessoas se depararem com esgoto correndo pelas calçadas, as vezes nas proximidades de hospitais e outras unidades de saúde.

Além disso, todos os córregos e ribeirões que fazem parte da Bacia do Rio Cuiabá e estão localizados nos referidos municípios foram aterrados para dar lugar a edificações ou, simplesmente, se transformaram em grandes esgotos a céu aberto, afetando a qualidade da água do Rio Cuiabá e contribuindo para a degradação Ambiental do Pantanal. Vide estudo e projeto do Ministério Público Estadual “Águas do Futuro”, que documenta esta triste realidade dos outrora córregos (hoje esgotos a céu aberto) de Cuiabá.

Outro aspecto que está chamando a  atenção da população são algumas iniciativas legislativas que estão em tramitação no Congresso Nacional que simplesmente querem alterar profundamente o marco legal da água e do saneamento básico no Brasil, transformando este setor em mais uma área a ser totalmente privatizada, ou seja, estão querendo transformar água e esgotamento sanitário em meras mercadorias sujeitas à logica capitalista do lucro e dos interesses privados.

Parece que nossos legisladores estão esquecendo de como a concentração e a distribuição de renda no Brasil são vergonhosas, onde mais de 80% das famílias vivem ou sobrevivem com apenas um ou dois salários mínimos, mais de 11 milhões de pessoas estão desempregadas, mais de 30 milhões são subempregadas e não dispõem de renda sequer para se alimentar e manter suas famílias, de onde irão conseguir renda para pagar um preco exorbitante que acaba sendo cobrado pela água e o saneamento básico, como já ocorre com a eletricidade e o  transporte coletivo?

O acesso `a água e ao saneamento básico são fundamentais para a qualidade de vida , o bem estar coletivo e a dignidade humana, por isso é considerado como um Direito humano fundamental das pessoas e das famílias, da mesma forma que a saúde, a educação, o meio ambiente, tudo isso é dever do Estado, ou seja, do Poder Público propiciar condições para que a população exerça este direito.

Se os Governos Federal, Estaduais e Municipais concedem mais de R$500 bilhões de subsídios a grandes empresas e diversos setores da economia, em que apenas a camada mais privilegiada da população é beneficiada, porque não investe igual valor todos os anos em abastecimento de água potável de qualidade e universaliza o acesso `a coleta e tratamento de esgotos, recuperação de nossos rios e outras fontes de água? Com a resposta nossos governantes e autoridades constituídas.

Oxalá nas próximas eleições o povo, os eleitores escolham representantes e governantes que realmente estão do lado dos trabalhadores, dos pobres e excluídos, que são a grande maioria da população brasileira e também são filhos e filhas de Deus.

*JUACY DA SILVA, professor universitário aposentado (Universidade Federal de Mato Grosso), sociólogo, mestre em sociologia . Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.
 

 

Segunda, 21 Março 2022 12:13

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.

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JUACY DA SILVA*


“Muitos daqueles que detêm mais recursos e poder econômico ou politico, parecem concentrar-se, sobretudo em mascarar os problemas ou ocultar  os seus sintomas, procurando apenas reduzir alguns impactos negativos das mudanças climáticas” Papa Francisco, Laudato Si, 20.

 

No último dia 16 deste mês de Março foi o DIA NACIONAL DA CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS e no dia 26, próximo sábado, será mais uma oportunidade para voltarmos nossas atenções e ações para o que está sendo convencionado como A HORA DO PLANETA 2022, cujo lema este ano é: Construir o futuro com justiça climática.

Entre esses dois marcos teremos o DIA MUNDIAL DA ÁGUA, a ser “comemorado”, na próxima terça-feira, dia 22 de Março de 2022, que será objeto de uma reflexão especial oportunamente.

O mundo está diante de uma grave crise socioambiental, onde no âmago desta crise está a questão das mudanças climáticas, decorrentes do aquecimento global e da destruição da camada de oxônio, com sérias consequências para todas as formas de vida no planeta, inclusive a vida humana e a sobrevivência das espécies.

A ONU aprovou em sua Assembleia Geral em 2015 e definiu o que passou a ser denominado de Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que, de fato é um grande acordo firmado entre, praticamente, todos os países, inclusive o Brasil, para que sejam realizadas medidas e ações concretas, para combater este processo de destruição do planeta, tendo o ano de 2030 como horizonte temporal. Isto é o que passou a ser chamado de AGENDA 2030.

Aprovada em uma cúpula internacional realizada entre 25 e 27 de setembro de 2015, a Agenda foi acordada pelos 193 Estados-membro da ONU e inclui uma Declaração, 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) e 169 metas.

Para refrescar a memória de nossos governantes em todos os níveis e leitores, já que o Brasil é signatário do acordo da ONU que estabeleceu esses objetivos, vamos mencionar nesta oportunidade os mesmos:

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são um apelo universal da Organização das Nações Unidas à ação para acabar com a pobreza, proteger o planeta e assegurar que todas as pessoas tenham paz e prosperidade.
 
Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) começaram a ser definidos/moldados nas discussões do clima quando da Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável no Rio de Janeiro em 2012.  O desafio foi produzir um conjunto de objetivos que suprisse os desafios ambientais, políticos e econômicos mais urgentes que nosso mundo enfrenta há décadas, mas que estão se agravando rapidamente nesses últimos 20 anos.
 
1. Erradicação da pobreza - Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares.
2.  Fome zero e agricultura sustentável - Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável.
3. Saúde e bem-estar - Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades.
4. Educação de qualidade - Assegurar a educação inclusiva, e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos.
5. Igualdade de gênero - Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.
6. Água limpa e saneamento - Garantir disponibilidade e manejo sustentável da água e saneamento para todos.
7. Energia limpa e acessível - Garantir acesso à energia barata, confiável, sustentável e renovável para todos.
8. Trabalho de decente e crescimento econômico - Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos.
9. Inovação infraestrutura - Construir infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável, e fomentar a inovação.
10. Redução das desigualdades - Reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles.
11. Cidades e comunidades sustentáveis - Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.
12. Consumo e produção responsáveis - Assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis.
13. Ação contra a mudança global do clima - Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos.
14. Vida na água - Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares, e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.
15. Vida terrestre - Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da Terra e deter a perda da biodiversidade.
16. Paz, justiça e instituições eficazes - Promover sociedades pacíficas e inclusivas par ao desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.
17. Parcerias e meios de implementação - Fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.
 

Todavia, poucos países, e o Brasil não parte desta lista, de fato tem se empenhado em realizar ações que possam reverter significativamente este processo de degradação ambiental e destruição do planeta, apesar de muitos discursos, leis belíssimas aprovadas, mas que ficam apenas no papel e ações perfunctórias que em nada alteram a destruição do planeta. No caso do Governo brasileiro atual o lema tem sido “vamos passar a boiada”, ou seja, flexibilizar a legislação,  sucatear os organismos de fiscalização ambiental para colaborar com a sanha destruidora de desmatadores, madeireiros, mineradores, garimpeiros, grileiros e poluidores ambientais.

Diversas são as causas que contribuem para o aumento da produção de gases de efeito estufa que destroem a camada de oxônio e geram consequências sociais, ambientais, políticas, econômicas e que também contribuem para a ocorrência de situações extremas como os desastres naturais fruto da ação humana irresponsável e irracional, que todos os anos causam tristeza, dor e mortes ao redor do mundo e também no Brasil.

As principais causas deste desastre anunciado, dentre outras, são: desmatamento e queimadas, principalmente as que ocorrem nas florestas tropicais como na Amazônia e Cerrado; na África e na Ásia; poluição oriunda do uso de combustíveis fósseis altamente nocivos `a saúde humana e dos demais animais, `as plantas e os cursos d’água, incluindo a poluição dos oceanos, neste aspecto incluindo também a contaminação do ar, que a cada ano causa mais mortes do que a tragédia da COVID-19 em quase três anos.

A poluição do ar mata mais de 7 milhões de pessoas a cada ano, mas isto não tem sido motivo de tanto alarde e cobertura da mídia nacional e internacional como tem acontecido, por exemplo, com conflitos, guerras, atos terroristas, assassinatos ou outras pandemias.

Neste aspecto o grande responsável ou vilão nesta tragédia é matriz energética e o sistema rodoviário de transporte de passageiros e cargas, alimentada por fontes de energia suja (petróleo, carvão e gás natural).

Enquanto a Europa, países asiáticos, o Canadá ou até mesmo os EUA estão investindo de forma “pesada” em fontes renováveis de energia como, por exemplo, a energia solar, eólica e das marés, o Brasil ainda está sonhando com o pré-sal ou subsidiando as usinas termelétricas, que usam óleo diesel, sub produto do petróleo que é uma energia suja e altamente poluidora.

Quando se fala em crise socioambiental e degradação dos ecossistemas/biomas não podemos deixar de mencionar o uso abusivo dos agrotóxicos, que estão na base dos sistemas de produção de alimentos, principalmente em grande escala, na forma de monocultura, cujas consequências e efeitos negativos  afetam a qualidade dos alimentos consumidos pela população, além de danos `a saúde humana, a contaminação do solo, sub solo, das águas e do próprio ar, neste caso, quando ocorre pulverização aérea em larga escala.

O Brasil é considerado o campeão no uso de agrotóxico e Mato Grosso, neste particular, é o campeão nacional desta triste estatística e suas consequências sociais e humanas, mas nada disso importa para os donos do poder e os barões da economia, onde o referencial é apenas o lucro, de preferência fácil, rápido e `as custas do tesouro (subsidiado).

Existem diversas ações, a grande maioria das quais de forma pontual, que contribuem para reduzir/mitigar um pouquinho essas consequências como arborização urbana, reflorestamento, limpeza e recuperação de nascentes; estímulo quanto `a reciclagem, incluindo campanhas contra o desperdício e o descarte que geram mais lixo/resíduos sólidos, que por sua vez aumentam a poluição. Poucas são as ações por parte dos grandes conglomerados econômicos, depredadores do meio ambiente, dos grandes poluidores, cuja consciência ecológica jamais existe ou quando “existe” não tem passado de discurso fácil veiculado pela mídia domesticada pelo grande capital.

Outra forma de combater a degradação ecológica/socioambiental, mesmo que ainda muito incipiente, que é agroecologia, ante o poderio econômico e politico do grande negócio/grande capital que domina a produção das “commodities”, que, normalmente, são exportadas e geram grandes lucros para tais grupos; repito, em contraposição a este modelo que gera contaminação, degradação ambiental, sofrimento e morte.

A agroecologia, é uma forma sustentável que consegue produzir alimentos saudáveis, de forma sustentável, sem o uso de agrotóxicos, que destroem e degradam o meio ambiente e também estimula relações de trabalho mais humanas e solidárias, como, por exemplo, o trabalho familiar.

Cabe ressaltar que boa parte da agroecologia é praticada pela agricultura familiar, cuja produção destina-se quase que única e exclusivamente para o mercado interno.

Muita gente ainda resiste ao consumo de produtos agroecológicos, quando comparam os preços finais, julgados mais caros do que os produtos oriundos de uma agricultura feita na base de agrotóxico, degradação ambiental e relações de trabalho não condizentes com a dignidade do trabalhador.

Todavia, esta comparação não é correta e nem verdadeira, pois na produção de “commodities” não estão incluídos os custos da destruição e da degradação ambiental que geram custos indiretos, como os decorrentes do aumento de diversas doenças, incluindo câncer; cujos custos acabam recaindo parte para as famílias e a maior parte para os sistemas de saúde pública, nem a exploração do fator trabalho, muitas vezes que estão próximas ao trabalho escravo e semiescravo.

Estudos recentes articulados na forma de uma publicação, fruto de pesquisas científicas de vários estudiosos de algumas instituições , coordenada pelo Professor Doutor Vanderlei Pignati, que foi “lançada” há poucos dias na ADUFMAT – ANDES/SN, sindicato dos professores da Universidade Federal de Mato Grosso, demonstram cabalmente, com dados estatísticos, os danos socioambientais e econômicos que o uso indiscriminado de agrotóxicos, como vem acontecendo no agronegócio, trazem sérias consequências, como as anteriormente mencionadas.

Pior é que tudo isso é financiado através de políticas públicas, como a política agrícola, que subsidiam os grandes produtores e grupos empresariais que dominam este setor e também a política nacional e estadual. Basta ver o poder da Bancada do Boi/Bancada ruralista/Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) no Congresso Nacional brasileiro.

Em 2011 esta bancada era composta de 13 senadores e 120 deputados federais, em 2020, mais do que dobrou, passando a ser integrada por 39 senadores e 245 deputados federais, uma demonstração de poder no Parlamento, com suas ramificações nos órgãos do Poder Executivo.  Em conjunto deputados e senadores da Bancada Ruralista representavam 22,4% do Congresso Nacional em 2011 e em 2020 já eram 47,8% dos Congressistas. O mesmo pode ser observado no que concerne `a composição das Assembleias Legislativas Estaduais.

Diante disso, percebe-se como a dinâmica política interfere diretamente na definição das políticas públicas e para onde são direcionados os recursos orçamentários, afinal, os integrantes da bancada agropecuária no Congresso e no Executivo  irão defender os interesses do capital e jamais dos trabalhadores, mesmo que tenham recebido votos desses que estão fora de suas áreas de interesse econômico e financeiro, isto faz parte do jogo politico e dos “lobbies” que atuam junto aos Poderes Legislativo e Judiciário. Para tanto não titubeiam em mascarar seus discursos, induzindo a população, incluindo os segmentos excluídos dos frutos do progresso e do desenvolvimento, a acreditar que atuam na defesa de interesses nacionais ou coletivos, quando, na verdade defendem interesses corporativos.

Há décadas, a cada ano mais de R$ 250 a 300 bilhões de reais, com juros subsidiados, são patrocinados pelo Governo Federal, enquanto para a agricultura familiar o volume deste crédito não ultrapassa a 10% daquele total e para a produção agroecológica, praticamente sobram migalhas.

Durante décadas, no caso do Brasil, o Governo Federal concedia incentivos fiscais e dedução de Imposto de Renda para quem ‘investisse” na área da Amazônia Legal, contribuindo para a corrupção, para o avanço do desmatamento, da degradação dos solos e das águas, cujos resultados econômicos e financeiros jamais foram devidamente avaliados , levando-se em consideração a equação custos x benefícios (inclusive ou principalmente os benefícios sociais, como geração de emprego e renda, e melhoria na qualidade de vida da população que está na parte inferior da pirâmide social ( os 10%; 20% ou 30% mais pobres da população).

O mesmo pode-se dizer da política de incentivos fiscais patrocinados, por exemplo, pelo Governo de Mato Grosso, que, ao ser desvendado em anos recentes, demonstrou que em nome do “desenvolvimento”, uma verdadeira quadrilha serviu-se desta política para ganhos/lucros de forma corrupta, tudo isso em associação com altos signatários da politica mato-grossense.

Alguns estudos indicam que tem havido um acúmulo de capital (renda, riqueza, propriedades) nos estratos superiores (os 10%, 5% ou 10%, do topo da pirâmide social), isto demonstra que as políticas públicas tanto do Governo Federal quanto estaduais e municipais contribuem para o aumento da concentração de renda, de poder politico; nas mãos de uma minoria. Ou seja, o Estado (poder público) age como sócio do capital nesta dinâmica social, política e econômica perversa, cujas vítimas são as camadas populacionais excluídas e o meio ambiente que acaba degradado, incluindo, quando existem, atividades mineradoras, legais ou ilegais (garimpos).

Este, talvez seja o maior desafio, quando se trata da crise socioambiental, desvendar e desvelar como a dinâmica política, econômica e as relações de poder contribuem para a degradação ambiental, para a perpetuação dos crimes ambientais, para a destruição da biodiversidade e todos os males que tanto tem e continuarão a promover tristeza, sofrimento e morte, como bem enfatiza o Papa Francisco, afetam mais diretamente os pobres e excluídos.

Neste sentido, as soluções não serão alcançadas apenas através de uma dinâmica tecnológica ou de cunho mitigatório, como querem algumas pessoas, mas sim, com a mudança de paradigmas que redefinam as relações das sociedades com a natureza/meio ambiente, das relações de trabalho e produção e, também, das relações de poder. Por isso, os donos do poder, as elites dominantes tanto se opõem a irem mais fundo na solução da crise socioambiental.

*JUACY DA SILVA, sociólogo, mestre em sociologia, professor universitário aposentado (UFMT). Email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

Sexta, 18 Março 2022 11:21

 

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.

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JUACY DA SILVA*

 

Conforme os termos da Lei federal 12.533, de 02 de Dezembro de 2011, 16 de Março de cada anos, desde então, passou a ser considerado o DIA NACIONAL DE CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS.

O objetivo principal de a referida Lei Federal ter sido aprovada está diretamente relacionado com os impactos que as mudanças climáticas provocam em todos os ecossistemas, no mundo todo e a necessidade de promovermos mudanças, radicais, sobre como ocorre nossas relações com a natureza, com o meio ambiente.

Desde as reuniões que ocorreram durante as discussões do Protocolo de Kyoto até as mais recentes reuniões do Clima, como a COP 26 e também os termos do Acordo de Paris de 2015, bem como os relatórios do Painel Intergovernamental que trata das mudanças climáticas, integrado por cientistas de vários países, sob o patrocínio e coordenação da ONU, dados estatísticos, cada vez com maiores detalhes e rigor científico, tem demonstrado que estamos diante de uma catástrofe anunciada ou agimos agora ou estaremos condenados a um futuro imprevisível.

Esta é uma das grandes preocupações da ONU quanto, em 2015, estabelceu os OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, a chamada AGENDA 2030, entre os quais existem diversos diretamente relacionados com o meio ambiente e com a questão climática de forma mais específica.

Cabe ressaltar que o Protocolo de Kyoto foi firmado em 1997, como um Acordo ambiental fechado durante a 3ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, realizada em Kyoto, Japão,. Foi o primeiro tratado internacional para controle da emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.

Nesses 25 anos, pouca coisa mudou na sanha destruidora do meio ambiente em todos os países, a não ser os discursos, propostas vagas e, mesmo assim, não cumpridas pelos diversos países, inclusive o Brasil.

O mesmo está acontecendo com os compromissos assumidos pelos países no contexto e termos do Acordo de Paris, que em boa parte ou talvez na maior parte de suas cláusulas serem mera figura de retórica e de discursos demagógicos dos governantes.

O volume de gases de efeito estufa tem aumentado e vem colocando em risco os níveis do aquecimento global, provocando as mudanças climáticas que bem conhecemos e presenciamos, acarretando custos sociais, econômicos, financeiros e humanos impagáveis.

Nos modelos econômicos, polóticos, sociais, científicos e tecnológicos em vigor, em todos os países, pouco importa os aspectos ideológicos que tais modelos advogam ou defendem, é possível notar que nenhum deles tem levado em conta, de forma séria, as relações dos sistemas produtivos com a capacidade de suporte Ambiental.

A busca do lucro a qualquer preço, a ganância, o consumismo, o desperdício e a economia do descarte, só levam `a degradação Ambiental, ao aumento das catástrofes naturais provocadas pela ação irresponsável e criminosa, aumentando a fome, a miséria e o sofrimento humano, com consequência muito piores do que as decorrentes de todas as pandemias que ao longo de décadas tem ocorrido, como no caso recente da COVID-19.

Tais modelos estão destruindo, de forma acelerada milhões de espécies animais e vegetais, tanto a vida terrestre quanto aquática, lacustre e marinha; contribuindo de forma indelével para o desequilíbrio ambiental de forma irreparável, colocando, em risco todas as formas de vida no planeta, inclusive a própria sobrevivência da espécie humana.

Os níveis de produção de gases de efeito estufa estão alterando de forma acelerada o clima em geral, o regime de chuvas, aumentando secas prolongas e tempestades torrenciais, provocando, em ambos os casos, sérios problemas sociais, econômicos, destruição e morte, como tem ocorrido todos os anos no Brasil e em diversos outros países. Só não vê, não enxerga quem não quer ou finge que tudo, no meio ambiente, está perfeito e nada de errado existe com sistemas que poluem, desmatam, produzem queimadas, usam e abusam dos agrotóxicos envenenando alimentos, o solo, o subsolo e as águas e outros prejuízos para a saúde e a vida humana.

As principais causas do aumento acelerado da produção e emissão de gases de efeito estufa, em sua origem está o consumismo que gera cada vez um maior volume de resíduos sólidos/lixo, hábitos de consumo que induzem ou provocam desmatamento, queimadas e, claro, os grandes vilões que são os combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás), além do uso de madeira para produzir energia.

É neste contexto que surge a necessidade de um despertar coletivo para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, redução esta que irá contribuir para a manter a temperatura média do planeta terra em níveis toleráveis para a sobrevivência das espécies, inclusive do ser humano.

Mas para tanto, é urgente que ocorra uma mudança radical da matriz energética em todos os países e apressar o fim deste modelo poluidor e sujo , substitui-lo por outro que tenha sua base nas fontes sustentáveis e renováveis de energia (eólica, solar principalmente), pois até mesmo a fonte renovável que é a hidrelétrica, tendo em vista o alteração do regime de chuvas tem se mostrado insuficiente e não sustentável.

Isto pode ser visto no caso do Brasil, que, mesmo tendo a maior parte da eletricidade oriunda das usinas hidrelétricas, nos últimos anos tem entrado em colapso e não oferecendo garantias aos usuários, exigindo complementação com energia de fonte suja, como as termelétricas, que além de mais cara também é altamente poluente.

E urgente que a população, as lideranças politicas, empresariais, educacionais, religiosas, as ONGS, os organismos públicos despertem para a gravidade deste problema e desafio, que está contribuindo para a destruição dos ecossistemas, da biodiversidade, da vida marinha, terrestre e, inclusive, ameaçando a sobrevivência da espécie humana,

Você já parou para refletir sobre esta triste realidade? Reflita, hoje e todos os dias, é o momento oportuno para você despertar e decidir mudar seu estilo de vida, seus hábitos consumistas, sua omissão em relação `a degradação Ambiental e destruição dos biomas e dos ecossistemas, e, também engajar-se nos movimentos e ações em defesa do meio ambiente e da ecologia integral e, ao mesmo tempo, pressionar todas as autoridades e organismos públicos, em todos os âmbitos; federal, estaduais e municipais a implementarem políticas públicas que preservem e respeitem o meio ambiente.

Não podemos ficar omissos e nem alheios quando um ministro, com no atual governo há pouco tempo, afirmou em reunião ministerial, claramente, de que lado está tanto o ministério do meio ambiente e o atual governo, fazendo coro com os desmatadores, mineradoras e garimpos ilegais e outros crimes ambientais, quando disse “vamos deixar a boiada passar”, demonstrando que este governo não tem compromisso com a ecologia integral e sim com a destruição ambiental.

Existem vários momentos, datas comemorativas, em que podemos utilizar e contribuir para despertar a conscientização da população em geral, da opinião pública, tanto em relação às mudanças climáticas, quanto outras dimensões do meio ambiente e da ecologia integral.

Entre tais momentos, dias podemos mencionar, por exemplo: na próxima terça feira, 22 de Março é o DIA MUNDIAL DA ÁGUA, logo a seguir, no sábado, dia 26 de março será comemorada A HORA DO PLANETA 2022, tendo como lema: construir o futuro com justiça climática, que será uma ação que visa também conscientizar as pessoas sobre a importância de restaurar a natureza, como consta da década da ONU sobre a restauração dos ecossistemas degradados.

Cabe destacar também o DIA DA TERRA a ser comemorado em 22 de abril, além do DIA DO ÍNDIO, a ser destacado em 19 de abril. Defender o planeta terra é, também, defender os territórios, a cultura e os direitos dos povos indígenas  que faz parte do compromisso internacional firmado por todos os países, inclusive o Brasil, junto `a ONU.

O DIA INTERNACIONAL DA BIODIVERSIDADE é comemorado em 22 de Maio, cabendo ressaltar que a perda de biodiversidade é afetada diretamente pelas queimadas, pelo desmatamento, pela poluição de toda ordem afetando os biomas terrestres e marinhos e, também, é claro, pelas mudanças climáticas.

De forma semelhante, o DIA MUNDIAL DO MEIO AMBIENTE, em 05 de Junho, que deverá ser enfatizado em programação especial da ONU a partir da Suécia, neste ano de 2022, também é um momento oportuno para refletirmos e contribuirmos para despertar a consciência ambientalista e a certeza de que não existe plano B, só existe um planeta, ou defendemos o Planeta Terra agora ou estaremos cada dia sofrendo mais devido `as consequências tanto das mudanças climáticas quanto da degradação Ambiental em geral.

Todas as formas de omissão, facilitam a conivência com práticas nefastas `a saúde do planeta terra, oxalá a população em geral, principalmente as gerações mais novas, as crianças, adolescentes e juventude também sejam alertadas quanto `a gravida da destruição ambiental em curso, afinal, esses contingentes populacionais são e serão os que mais sofrerão os impactos e os custos deste imenso passivo ambiental que a atual geral geração e os atuais governantes, corruptos, demagogos e irresponsáveis, ambientalmente falando, estão deixando para o nosso “futuro comum”.

Afinal, como sempre tem dito o Papa Francisco, principalmente na Encíclica Laudato Si, em relação a Ecologia Integral, “tudo esta ligado, nesta Casa Comum”, mas os efeitos da destruição da biodiversidade, da degradação ambiental, das catástrofes ambientais, da poluição, das mudanças climáticas, dos crimes ambientais afetam de uma maneira mais severa os pobres e excluídos em todos os países, inclusive no Brasil.

Pense nisso, acorde desta letargia que a alienação e a passividade provocam nas pessoas, antes que seja tarde demais. Existe um provérbio que diz “no futuro, todos estaremos mortos”, portanto, precisamos agir enquanto estamos vivos, o amanhã talvez nem chegue!

 

*Juacy da Silva, sociólogo, mestre em sociologia, professor universitário aposentado UFMT, email O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.