Quinta, 31 Outubro 2019 17:32

 

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Espaço Aberto é um canal disponibilizado pelo sindicato
para que os docentes manifestem suas posições pessoais, por meio de artigos de opinião.
Os textos publicados nessa seção, portanto, não são análises da Adufmat-Ssind.
 
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Dirceu Grasel
Professor FE/UFMT

 
 

Tenho andado meio inquieto há muito tempo, estamos num momento complexo.

Na verdade tenho tido mais perguntas do que respostas, mas cheguei a algumas conclusões. Uma delas é de que estamos vendo a Universidade, MT e o Brasil excessivamente como são e não como deveriam ser.

COMO VOCÊS VEEM O FUTURO? Eu falo de futuro próximo, o nosso futuro:

Só pra citar algumas questões:

1) Estamos diante de uma campanha mundial contra o abate de animais;

- Já produzimos hambúrguer de carne feito à base de plantas;

- Com a célula tronco já se pode fazer carne de qualquer animal;

- Já produzimos leite e ovo de laboratório;

2) As hortas verticais podem ser cultivadas o ano inteiro, com capacidade para alimentar milhares de pessoas, com o mesmo sabor e qualidade e sem nenhum agrotóxico e tudo é feito por computador;

3) Já existem carros e caminhões, sem motorista;

4) Já existem lojas e fábricas, completamente automatizadas, sem mão de obra. Não há funcionários nestas lojas;

5) Hoje já se fábrica quase tudo em impressoras 3 D, inclusive peças de ferro personalizadas, se quiser na sua própria casa;

6) Quase todas as profissões que existem hoje vão ser extintas ou substituídas por máquinas no futuro próximo;

7) Vão surgir outros poucos empregos altamente especializados, que serão para poucos.

Alguém consegue IMAGINAR as mudanças que isso implicará no atual modo de produção e consumo, aquele que nós ensinamos nas salas de aula?

Vejamos um exemplo, se você não tem emprego, não tem renda, se não tem renda não consome. Quem vai consumir? Como serão as relações sociais de produção e consumo?

Precisamos entender, quais serão as oportunidades de inserção de MT e Brasil nesta nova realidade? Uma economia dependente de alguns produtos básicos e de baixo valor agregado e que também serão produzidos de forma alternativa, quem discute isso?

Em termos de profissões, vejamos a minha área de atuação:

- O que se espera de um economista para os próximos anos?

- O que será dos cursos de economia ou da educação como um todo? Não vejo ninguém discutindo isso na UFMT.

- Eu vejo que a questão central é: realmente estamos discutindo as questões importantes para o país? Ou estamos nos limitando a discutir questões não resolvidas do passado? Estas questões serão importantes no futuro?

Diante de tudo isso, a minha preocupação não é nem se estamos fazendo as perguntas certas, na verdade não estamos nem fazendo perguntas.

Tenho visto que no dia a dia as pessoas estão focadas em defender discursos radicais de esquerda e de direita, que disseminam o ódio e o rancor e dividem as pessoas, enquanto isso as coisas vão acontecendo.
 
 

Terça, 11 Setembro 2018 11:01

 

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Por Dirceu Grasel*
  

Como aconteceu nas eleições da maioria dos países pelo mundo afora, tudo indica que estamos caminhando da esquerda radical populista, incompetente e corrupta para a direita radical, ambas retrógradas, ultrapassadas e perigosas.

É tempo de falar muito e não dizer nada. Quando votarmos, temos que lembrar que existe uma grande diferença ENTRE SABER O QUE FAZER e SABER COMO FAZER. Não vejo nada em nenhum plano de governos ou discurso, sobre como fazer. É aquele mesmo conversê de sempre em época de eleição, quando surgem os salvadores da pátria.

Falando nisso, quem é Paulo Guedes, nunca ouvi falar. De uma hora pra outra virou o maior e melhor economista do mundo. O que sei é que li uma entrevista dele que parecia não ser editada e fiquei muito confuso. Precisei ler e reler para achar alguma consistência.

Na verdade este é o problema, a história se repete, é um ciclo em que a aparência muda para que a essência permaneça a mesma. É difícil ser otimista num contexto assim, especialmente quando existem indícios de que as coisas podem piorar.

Enquanto isso, estamos há quatro décadas sem planejamento e sem projeto de Brasil. Neste período o Brasil se tornou um paraíso para os especuladores e vem se desindustrializando, com a perda acelerada das poucas indústrias que geravam algum valor agregado. Tudo isso é agravado pela incapacidade de gerar conhecimento tecnológico que possa dar sustentação a um novo ciclo de crescimento e desenvolvimento econômico. Resultado, estamos recuando a passos largos e nos tornando sempre mais exportador de soja em grão, minério bruto e boi vivo.

*Dirceu Grasel
Professor FE/UFMT

Terça, 14 Novembro 2017 11:20

 

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Dirceu Grasel

Professor Titular da Faculdade de Economia/UFMT

 

 

Estudos mostram reiteradamente que a carga tributária do Brasil é muito alta ou a maior do mundo, detalhando percentuais de incidência de alíquotas de impostos sobre alguns produtos que chegam próximos de 50% do preço de mercado, para exemplificar e sustentar o argumento.

A carga tributária se refere ao percentual do PIB que é arrecadado pelo setor público na forma de impostos. No Brasil, ela gira em torno de 32 a 35% do PIB, o que é equivalente aos países europeus desenvolvidos. Deste total, no Brasil, aproximadamente, 69% é arrecadado pela União, 25% pelos Estados e 6% pelos municípios.

Como não é possível saber com precisão qual é o nível de sonegação no Brasil, é comum que os estudos realizados desconsiderem esta informação e se limitem a trabalhar com dados oficiais, mas fazem comparações com outros países, onde a sonegação não existe ou é bem menor e chegam à conclusão de que a carga tributária no Brasil é elevada e em alguns casos a maior do mundo. Esta é uma comparação inconsistente, pois desconsidera especificidades da economia brasileira e pouco contribui para o debate, especialmente ao se propor a opinar sobre a necessária reforma fiscal e tributária no Brasil. Um estudo mais realista deveria partir dos dados oficiais e trabalhar com cenários de sonegação.

Neste sentido, para efeitos de ilustração, não é exagero considerar que aproximadamente 20% do PIB do Brasil é informal, portanto, não tributado, o que em termos de comparação com países europeus, onde a economia informal não existe ou é muito inferior; levaria a carga tributária brasileira para algo em torno de 25 a 26% do PIB, bem próximo das cargas tributárias mais baixas do mundo. Sendo assim, a carga tributária real do Brasil não é alta e muito menos a maior do mundo, na verdade uma das mais baixas.

Merece destaque que, diferentemente da maioria dos países europeus, no Brasil não existem serviços públicos como contrapartida ao pagamento dos impostos e quando existem são de qualidade questionável, o que de fato torna qualquer imposto elevado.

De fato nem poderia ser diferente, é difícil fornecer serviços públicos com qualidade comparada a dos países europeus, com aproximadamente 40% do orçamento público federal sendo destinado para o pagamento de juros. No país dos bancos, do incentivo a especulação e desestímulo a produção, todos os que trabalham e quase todos os que produzem, sustentam esta realidade. Ou seja, a economia toda trabalha para engordar os rentistas e os bancos.

Logo, diante disso, já podemos considerar algumas questões: 1) não é a carga tributária no Brasil que é alta, mas os impostos para alguns; 2) estudos que desconsideram especificidades da Economia Brasileira escondem questões importantes que não interessa à alguns que sejam respondidas, por exemplo, quem realmente paga imposto no Brasil? Questão que passo a me dedicar a partir de agora.

A resposta a esta pergunta é complexa, mas é possível afirmar, que: 1) a maioria paga muito, 2) outros pagam pouco e 3) outros não pagam nada ou quase nada. Isto porque a maior incidência dos impostos no Brasil é sobre o consumo, aproximadamente 50% de toda a arrecadação; o que é ruim, pois torna os preços elevados e prejudica a competitividade dos produtos que são produzidos no Brasil, já que nem todos os impostos podem ser retirados na hora de exportação para atender ao princípio de não exportação de tributos, principalmente os que incidem em cascata.

Uma estrutura fiscal e tributária eficiente e razoável deveria fazer incidir os impostos mais fortemente sobre a renda de forma progressiva, pagando mais, quem ganha mais e não sobre a produção e sobre o consumo.

A questão que se coloca então, como o imposto incide mais fortemente sobre o consumo, quem de fato paga imposto no Brasil? 1) evidentemente os que consomem, porque o imposto incide predominantemente sobre o consumo, o que é ruim e injusto, pois quem ganha um salário mínimo paga o mesmo que aquele que ganha um  milhão por mês ao adquirir os mesmos produtos que ambos consomem. 2) os que produzem e não conseguem repassar isso para os preços, o que justifica uma parte de informalidade da economia brasileira.

Portanto, temos o seguinte quadro: 1) os trabalhadores e os pequenos empresários, que são tomadores de preço e não podem repassar custos maiores aos preços, por causa da elevada competição, pagam muito. Aqui é preciso destacar que o simples alivia a carga dos impostos sobre a empresa em si, mas como a grande maioria dos pequenos empresários empreende para sobreviver, a lógica destes empresários passa a ser a mesma logica dos trabalhadores.

2) Os rentistas e os grandes empresários que não sonegam, pagam pouco. Os rentistas, porque os tributos que incidem sobre seus rendimentos são baixos. Os grandes empresários, porque eles não são tomadores de preço, ou seja, eles (por serem oligopólios[1]) têm o poder de repassar todos os custos para os preços. Nestas empresas, qualquer aumento de custos, inclusive impostos, resulta em aumento dos preços e repasse do ônus ao consumidor.

3) Os grandes empresários sonegadores não pagam nada ou quase nada, pois além de repassar o imposto aos preços, cobram impostos também sobre a parte informal do seus negócios, já que não existem diferenças nos preços das vendas formais e informais (com nota ou sem nota fiscal). Ou seja, cobra o imposto sobre a parte informal do consumidor e não repassa ao governo por ser venda informal (sem nota fiscal), tendo assim na prática um lucro extraordinário, que se refere ao lucro normal, mais imposto recolhido do consumidor e não repassado ao setor público.

É fato que para estes a sonegação está se tornando sempre mais difícil, em função de informatização dos sistemas de fiscalização. Além disso, eles também são grandes devedores de impostos pelo simples motivo de não pagar o imposto formalmente devido, com a alegação de que a carga tributária é impraticável, mesmo que na prática não paguem imposto, apenas repassem. Algumas destas empresas também não pagam o imposto formalmente devido para capitalizar a empresa e assim deixam a dívida do imposto acumular para ver no que dá; e no futuro negociam, porque no Brasil da impunidade se convencionou que é melhor receber uma parte do imposto que é devido do que falir com a empresa. Além deste, existe ainda o discurso adicional da perda de emprego e renda futura.

Sendo assim, a carga tributária no Brasil não é alta e muito menos a maior do mundo. Os impostos para os trabalhadores e pequenos empresários (apesar do simples) são elevados, porque alguns não pagam e outros pagam pouco imposto.



[1] Estrutura de mercado em que poucas grandes empresas dominam o mercado.

Quinta, 17 Agosto 2017 11:46

 

Embora sem confirmação oficial, os meios de comunicação alternativos têm anunciado que a corte americana autorizou a abertura de processos grupais contra a Petrobrás, que arruinou fundos de pensões americanos devido à quebra da empresa pela corrupção e administração ineficiente e fraudulenta. Os americanos estimam que a corrupção no Brasil relacionada à Petrobrás gerou um rombo de US$ 28 bilhões o que em reais atinge perto R$ 130 bilhões. Alegam também que os balanços foram mentirosos e fraudulentos. Além da corrupção, a gestão ineficiente condenou a Petrobras a um atoleiro de dívidas que alegam atingiram a soma de R$ 600 bilhões. Segundo estas fontes, as estimativas são de que com estes processos já autorizados, as dívidas, as indenizações e ressarcimentos podem chegar a R$ 1,5 trilhão.

 

As previsões são que isso e o já caótico estado das finanças públicas do governo Federal, vão trazer ainda mais sofrimento para o povo brasileiro, que mais uma vez vai pagar a conta, porque para quitar o rombo da Petrobrás (por ser uma empresa de capital misto e controlada pelo governo Federal), o governo terá que aumentar a arrecadação, penalizando ainda mais o pequeno produtor (já que os grandes têm mecanismos de defesa), o trabalhador e empobrecendo o país. Para cobrir esse rombo, provavelmente o governo usará o dinheiro da Seguridade Social, o que compromete a assistência e aposentadoria dos trabalhadores.

 

No entanto, acreditasse que isso será só a ponta do iceberg. As mesmas fontes informam que existe a possibilidade de que mais 16 países venham a processar o Brasil.

 

O estranho é que as empresas Americanas, a Enron e a AIG, fizeram a mesma coisa e ninguém processou os EUA. Estas empresas (e outros que não vem ao caso) falsificaram balanço, e faliram diversos fundos de pensões (aposentadoria privada dos trabalhadores). Neste caso, não eram empresas de capital misto, mas o Estado tem a obrigação de acompanhar o desempenho de certas empresas de elevado interesse público, especialmente os bancos e os fundos de pensões.       

               

Essa vontade toda de processar o Brasil se sustenta no fato de que eles sabem que o Brasil é administrado e representado por grupos com interesses estritamente particulares, sem compromisso com a nação e com o povo, capazes de engendrar planos e programas de governo totalmente desconectados com as necessidades reais do País.

 

Mas a história não acaba ai. Na realidade eles querem a Amazônia, só não a tomaram ainda porque tem muita gente que a quer. Os EUA a China a Europa, todos disputam por ela, mas ainda não se entenderam ou terminaram a negociação. Assim que se entenderem o nosso território ficará menor.

 

Além disso, não será só a Petrobrás, mas todas as empresas que tem alguma inserção internacional e estiveram envolvidas em esquemas de corrupção, por exemplo, as grandes construtoras e a JBS. Será a mesma história, estas provavelmente também vão falir por causa de processos internacionais. Importante destacar que a JBS foi a que fez o maior estrago para o país, já que seria um dos setores que o Brasil poderia dominar e hoje apresenta grandes chances de internacionalização.       

 

Tudo isso mostra mais uma vez que o empresariado brasileiro é extremamente incompetente e dependente do Estado e dos esquemas que já conhecemos. A maioria das grandes fortunas foi feita assim. São gananciosos e incompetentes.

 

Não tem esse negócio de público ruim e privado bom, é tudo ruim, isso é apenas um discurso ideológico. Quando afirmo isso, me refiro à maioria dos setores oligopolizados, principalmente dos bancos. Na verdade eu gostaria de ver os oligopólios nacionais com uma competição internacional séria, certamente contribuiria com o debate entre público e privado.

 

O sistema financeiro alardeado como um dos mais sólidos do mundo, por sua vez, mesmo com a economia toda trabalhando a seu favor, com a taxa de juros e o spread maior do mundo, esbanja incompetência, pois, apesar de tudo isso, a falência de bancos vira notícia, especialmente os menores. Isso deveria ser incluído no dicionário como um exemplo do cúmulo da incompetência.  Ver os bancos financiando a produção no Brasil em vez de obter ganhos fáceis e sem riscos com títulos da dívida pública e sacrifício de milhões de empreendedores e famílias, geraria um caos. Na verdade, todos iriam a falência, não sobraria um, nem grande nem pequeno.

 

Portanto, o buraco é bem mais embaixo, é cada um por sua conta.        

        

O futuro será maravilhoso. O Brasil será um produtor e exportador de soja em grãos e exportador de boi vivo, provavelmente sem a Amazônia.

 

E tem mais uma, enquanto o Brasil não for uma potência militar, não poderá nem dar bravatas com a Coréia do Norte.

 

Precisamos de governos sucessivos que saiba defender os interesses nacionais, saiba distinguir contas públicas e privadas, distinguir o interesse público do privado e que não vendam o Brasil só pra garantir o futuro dos seus.

 

Dirceu Grasel

Prof. Faculdade de Economia

 

Terça, 24 Maio 2016 10:02

 

 

 

Dirceu Grasel

Faculdade de Economia / UFMT

 

Diante da nova configuração política, com um governo de coalizão, um presidente com seus direitos políticos cassados, sem pretensões para novos mandatos e sem compromisso com popularidade, existe uma grande possibilidade de que as reformas voltem à pauta e sejam aprovadas a toque de caixa.

 

Dentre as reformas necessárias ou que sempre são lembradas temos a reforma da previdência que afeta diretamente os interesses dos trabalhadores, principalmente dos funcionários públicos. Portanto, algumas questões precisam ser aprofundadas: 1) a reforma é necessária? 2) realmente existe um déficit na previdência? Este artigo pretende trazer e interpretar alguns resultados de um estudo realizado em janeiro de 2016, referente ao período de 1999 a 2015, pelo professor de Economia da FGV, Nelson Marconi e publicado na revista Conjuntura Econômica de abril de 2016.

 

Neste artigo não discuto a necessidade ou não do ajuste fiscal, que pode ser objeto de outro artigo, pois entendo que o caos nas finanças públicas, o crescimento do endividamento público federal e sua tendência tornam esta discussão desnecessária, levando naturalmente o foco para como fazê-lo e como o ônus deveria ser distribuído entre todos os brasileiros e não parte deles e, além disso, com a esperança de que o quadro atual que é herança do governo impedido não comprometa reposições salariais aos funcionários públicos e os avanços nas políticas sociais, mesmo sendo pouco provável.

 

I - A PREVIDÊNCIA DOS TRABALHADORES DA INICIATIVA PRIVADA (INSS):

 

O estudo mostra um déficit crescente no resultado da previdência dos trabalhadores de iniciativa privada (INSS), que chegou a R$ 90,3 bilhões no ano de 2015. Este déficit resulta basicamente do déficit de previdência rural, que foi de R$ 95,8 bilhões, pois a previdência urbana, apesar do impacto negativo da redução do emprego formal, ainda apresentou um superávit de R$ 5,5 bilhões.

 

Portanto, o déficit na previdência dos trabalhadores de iniciativa privada (INSS) ocorre basicamente em função do déficit da previdência rural, que resulta de confusão entre os conceitos de previdência (contribuir para depois se aposentar) e assistência (aposentar quem nunca ou pouco contribuiu). Não se trata de ser contra esta forma de inclusão social do homem do campo, apenas destacar esta confusão de conceito e suas implicações.

 

A ideia de aposentadoria está relacionada a uma contribuição durante a vida ativa e a garantia de uma segurança financeira quando as condições físicas já não permitem o mesmo desempenho na garantia do seu sustento e manutenção do seu padrão de vida. Sendo assim, para afirmar que existe déficit na previdência dos trabalhadores de iniciativa privada (INSS), seria necessário fazer um estudo atualizado que mostrasse os gastos na previdência rural com aposentadorias e assistência, dados que não tive acesso. No entanto, é possível afirmar que o déficit apresentado é maquiado e se existir é bem menor do que os números oficiais mostram.

 

O fato é que a sociedade, através dos seus lideres e governantes, ampliou a assistência ao homem do campo, o que é louvável, mais tem implicações sobre a previdência como um todo e não me surpreenderia que esta confusão de conceito se trate de uma estratégia para construir argumentos para fazer uma nova reforma e jogar todo ônus ao trabalhador, especialmente ao aposentado.

 

O ponto central neste aspecto é que é injusto que os aposentados paguem uma conta que deveria ser paga por toda sociedade, ou seja, pelos trabalhadores da ativa, aposentados, pelos empresários e rentista.

 

II - A PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS:

 

Da mesma forma como a previdência dos trabalhadores de iniciativa privada (INSS), o déficit da previdência dos servidores públicos federais vinha crescendo no período de 1999 a 2015, mas mostra sinais de estabilização a partir de 2015, resultado da reforma que mudou os critérios para os novos servidores que ingressam na carreira. Mesmo assim, em 2015 o déficit é de R$ 92,8 bilhões, portanto, superior ao da previdência dos trabalhadores de iniciativa privada (INSS), que foi R$ 90,3 bilhões, com o agravante de que no setor público são 980 mil beneficiados e no INSS 32,7 milhões.

 

Neste caso não se trata de maquiagem dos dados, o déficit realmente existe, mesmo com uma contrapartida dobrada do governo federal, isto é, a cada 1 real que o funcionário público federal contribui (11% do salário), o governo federal contribui com 2 reais (22% do salário).

 

Apesar dos sinais de estabilização do déficit e de um possível recuo com a diminuição gradual dos aposentados no sistema paritário e integral, é muito provável que novas propostas de reforma surjam, com foco na ampliação nos anos trabalhados, estratégia que o governo Dilma já tentou implementar e/ou aumento do percentual de contribuição dos ativos e aposentados deste sistema.

 

Outro aspecto que merece ser mencionado, é que quando se trata da aposentadoria dos funcionários públicos federais sempre surge à discussão de que este sistema oferece privilégios, pois permite: 1) a aposentadoria integral (aposenta com o último salário, exceto alguns benefícios) e 2) paritária (direito a reajustes automáticos de acordo com reposições ou aumentos do salário dos servidores da ativa), o que não acorre com os trabalhadores da iniciativa privada, que tem um teto para aposentadoria e perda considerável do poder de compra ao longo do tempo.

 

A ideia de privilégio se difunde com facilidade porque existem regras diferenciadas entre servidores e trabalhadores da iniciativa privada e se sustenta pelo fato de que nem todas as informações são apresentadas. Por exemplo, não se mostra os motivos que levaram a implementação do regime jurídico único. O setor público diante de uma crescente dificuldade para pagar o FGTS negociou com os servidores um regime diferenciado, com o fim do FGTS, concedendo em troca estabilidade no emprego e aposentadoria integral e paritária.

 

É natural que esta discussão apareça, quando se tem regras diferentes de um sistema para outro. Contudo, isto não quer dizer que realmente existem privilégios, por dois motivos: 1) os servidores contribuem sobre seu salário integral e os trabalhadores da iniciativa privada sobre o salário registrado, até o limite do valor máximo de aposentadoria, 2) Os trabalhadores da iniciativa privada recebem o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e os servidores não.

 

Além disso, qualquer servidor hoje trocaria seus “alardeados privilégios” por um montante significativo de saldo do FGTS, que seguramente poderia ser visto como uma aposentadoria mais segura, tendo em vista que se receberia este recurso na hora da sua aposentadoria e o próprio beneficiário poderia administrá-lo como quisesse, eliminando riscos elevados ao deixar estes recursos nas mãos de terceiros que são remunerados por comissões e expõem estes fundos a elevados riscos. Veja o caso dos fundos de pensões nos EUA na crise de 2008 e os desfalques nos fundos de pensões no Brasil, que ainda estão sendo apurados.

 

O seguinte fato também merece ser destacado. Como os servidores que ingressam no serviço público após a implementação das novas regras perderam a paridade e integralidade, pois ingressam em condições semelhantes dos trabalhadores da iniciativa privada, seria justo que também recebessem o FGTS. Na verdade o recomendável seria que existisse uma única regra para todos os trabalhadores, para evitar ideias errôneas de privilégio, onde não existe.

 

Em síntese: diante deste quadro, é muito provável que o governo que está sendo implementado a partir de do dia 12 de maio faça uma reforma na previdência dos servidores públicos federais que pode resultar nos seguintes ônus: 1) ampliação do tempo de serviço mínimo para ter direito a aposentadoria e, 2) aumento da contribuição mensal dos servidores.

 

Referências:

MARCONI, Nelson. Porque a reforma da Previdência é urgente? In: Revista Conjuntura Econômica, vol. 70. nº. 04, Abril 2016.

Quarta, 27 Maio 2015 07:54

 

Em 2012, quando fui cursar 1 ano da graduação em Serviço Social na Universidad de Deusto, em Bilbao, Espanha. Tive o privilégio de cursar a disciplina de " Sociologia da Marginalização e da Exclusão Social " com o professor Alain Touraine. Inúmeras vezes o professor Touraine elucidou em suas aulas que o socialismo estava morto, havia sido superado pela sociedade pós - industrial, que já havia se tornado sociedade globalizada. O professor argumentava e defendia a tese de que hoje as lutas dos movimentos sociais já não se centra mais nas lutas de classes, tanto, que há desentendimento no interior dos movimentos sociais. O professor Alain Touraine é um sociólogo francês conhecido por sua obra dedicada à sociologia do trabalho e dos movimentos sociais. Tornou-se conhecido por ter sido o pai da expressão "sociedade pós-industrial". Seu trabalho é baseado na "sociologia de acção" e seu principal ponto de interesse tem sido o estudo dos movimentos sociais. Touraine acredita que a sociedade molda o seu futuro através de mecanismos estruturais e das suas próprias lutas sociais. Tem estudado e escrito acerca dos movimentos de trabalhadores em todo o mundo, particularmente na América Latina. Em seus escritos, Touraine aponta para as transformações pelas quais a sociedade moderna e industrial vem passando. Trava diálogos com os autores clássicos da sociologia como Durkheim e Marx - com este último, sobre as novas formas de conflitos sociais. Touraine faz parte de uma linha teórica denominada pós-moderna, ainda que critique a mesma em alguns pontos e de fato não assuma todas as teses dessa vertente, como algumas asserções a respeito do fim da história, fim dos conflitos e principalmente da inviabilidade da compreensão racional dos mecanismo sociais. Para Touraine, a sociedade pós-industrial, longe de acabar com os Em “A sociedade pós-industrial", afirma que a sociologia não é fruto da revolução industrial, mas somente se consolidou a partir da segunda metade do século XIX, quando a sociedade passa a ter um maior controle dos mecanismos econômicos surgidos com as revoluções industriais, os quais, no momento de seu surgimento, levaram às construções teóricas do início do século XIX que identificavam um desenvolvimento econômico intervindo na organização social. Com a retomada do controle social das mudanças econômicas é que, portanto, a sociologia pode se constituir numa ciência que não mais fetichizava o social, tal como o indivíduo da filosofia. Passa-se da identificação de uma natureza social para o reconhecimento da historicidade, ou seja, da ação social e da capacidade desta em direcionar o desenvolvimento do conjunto da sociedade. conflitos, generaliza-os. É sob estas premissas que Touraine fala da sociologia de uma sociedade pós-industrial. Com os primórdios do desenvolvimento industrial, a empresa capitalista e o proletariado eram de fato os elementos centrais na transformação social e política. Porém na sociedade pós-industrial, segundo o autor, esta centralidade da indústria - e, portanto, do fator econômico produtivo - se perde. Nesta nova sociedade, o conhecimento e a informação passam a constituir elementos chaves na produção. Os conflitos sociais, da mesma maneira, não se concentram mais no elemento econômico. Apesar dos conflitos de classe não desaparecerem (a indústria não desaparece), a relação trabalhador-patronato não detém mais a proeminência de outrora. Isto, principalmente, pelo fato destes conflitos de classes terem, de uma forma geral, se institucionalizado, abrindo espaço para outras reivindicações sociais, agora não mais econômicas, mas destacadamente culturais: surgem os movimentos feministas, de homossexuais, estudantil, etc. Os laços que unem estes novos movimentos são mais comunitários e localizados, apesar de uma abrangência socialmente ampla. Se permanecerem reivindicações localizadas e restritas não se constituem, segundo Touraine, em movimentos sociais propriamente ditos. Para tanto devem adquirir um destaque mais amplo e nacional. A direção para a qual devem caminhar tais movimentos são as instituições e, portanto, o âmbito das decisões políticas. A sociedade, segundo Touraine, deve lutar para democratizar o acesso aos mecanismos decisórios da política. Daí a importância que este autor dá ao tema da alienação - esta, pautada pela participação dependente, ou seja, a integração dos indivíduos no jogo dos aparelhos dominantes que visam impor um modelo de desenvolvimento econômico sob um aspecto impessoal, de forma a aparecer como única alternativa possível e no interesse de toda a sociedade. Os termos de que Touraine se utiliza para descrever esta alienação são a integração, a manipulação e a sedução. 
 
Dirceu Grasel